Acórdão nº 0394/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Agosto de 2018

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução08 de Agosto de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    UNIDADE DE SAÚDE A…………. - SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE ……….

    [US/SCM…….] interpõe «recurso de revista» do acórdão proferido a 31.01.2018 pelo Tribunal Central Administrativo Sul [TCAS] que negou provimento ao recurso de «apelação» que interpusera da sentença pela qual o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra [TAF/S] «julgou procedente» o pedido formulado por B…………..

    e a intimou a «no prazo de quinze dias, proceder à reprodução e ao envio ao requerente, por mensagem de correio electrónico, dos seguintes elementos: - Informação relativa à data e hora de registo de entrada do Dr. ………., nas instalações da entidade requerida, no dia 25.08.2016 [data em que a intervenção cirúrgica de extracção de uma unha ao pai do requerente teve início e fim], e indicação da data e pessoa que obteve as fotografias enviadas ao Dr. ………., e comprovativo do dia, hora e meio [e-mail, telemóvel ou fax] em que as mesmas foram enviadas ao profissional indicado; - Registos médicos, registos de enfermagem, e fotografias que foram enviadas pela entidade requerida ao Dr. ………., todos relacionados com o procedimento médico realizado no dia 25.08.2016, que conduziu à extracção de uma unha ao pai do requerente, com intermediação médica.

    Concluiu assim as suas alegações: A- O presente recurso de revista excepcional deve ser admitido pois as questões ora trazidas, além de terem forte importância jurídica e social - com interesse para outras situações semelhantes à apresentada e que vão sendo submetidas a Tribunal - necessitam claramente de uma melhor aplicação do direito, pelo que se mostram preenchidos os requisitos para a admissão do presente recurso de revista excepcional, nos termos do artigo 150º do CPTA; B- São duas as questões trazidas que se relacionam com o douto acórdão ora posto em crise, a saber: 1. A decisão de não verificação da violação do artigo 7º, nº4, da Lei nº26/2016, conjugada com o artigo 6º, nº5, confirmando que o requerente, terceiro, filho do titular dos dados, tem interesse compósito directo, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido, e que fundamenta o acesso por justificar tal interesse compósito com a salvaguarda de direitos fundamentais como o de responsabilizar terceiros por danos sofridos e o de dar notícia para procedimentos disciplinares ou criminais em defesa ou a favor do seu pai; 2. Condena a ré, ora recorrente, SCM… em custas, concluindo que «Este tipo de processo, regulado nos artigos 104º e seguintes do CPTA e concretizador do artigo 268º, nº2, da CRP, nada tem a ver com os fins estatutários prosseguidos pela requerida na área da saúde ou noutra». Pelo que, conclui, não cabe na previsão do artigo 4º, nº1, alínea f) do Regulamento das Custas Processuais; C- Encontram-se preenchidos os requisitos do artigo 150º do CPTA, na medida em que resulta das situações apresentadas no ponto I supra a importância fundamental para melhor aplicação do Direito, e bem assim, pela sua relevância jurídica e social, vejamos: D- A questão principal, trata-se de questão relevante para uma melhor aplicação do direito e é de relevância jurídica de importância fundamental, não apenas num plano meramente teórico mas também com relevo no plano prático em termos de utilidade da revista, vejamos: 1. O facto de o tribunal recorrido ter mantido a decisão de primeira instância, que intima a entidade requerida a, no prazo de 15 dias, proceder à reprodução e ao envio ao requerente, terceiro, a saber, filho do titular dos dados de saúde que não está declarado incapaz, por mensagem de correio electrónico, da informação, nomeadamente dos registos médicos, registos de enfermagem, [...], todos relacionados com o procedimento médico realizado no dia 25.08.2016, que conduziu à extracção de uma unha ao pai do requerente, com intermediação médica, 2. E mais concretamente o facto de o TCAS ter concluído que não se encontra violado o disposto nos artigos 7º, nº4, da Lei nº26/2016, em conjugação com o artigo 6º, nº5, na medida em que requerente, terceiro, filho do titular dos dados [não declarado incapaz], alega que a informação recolhida se destina a poder ajuizar e accionar ou não, eventuais responsabilidades civil, disciplinar ou criminal do caso, 3. Ou seja, o TCAS defende que o direito de intentar acções de responsabilidade civil, entre outras, por causa do ocorrido com o seu pai corresponde a um interesse compósito que visa salvaguardar direitos fundamentais, com mais peso concreto do que o previsto no artigo 26º, nº1 da CRP - como o direito fundamental de responsabilizar civilmente terceiros por danos próprios sofridos [483º CC] e o direito de dar notícia para procedimentos disciplinares ou criminais em defesa ou a favor de seu pai, 4. Concluindo que a afectação do sigilo do processo clínico do pai do requerente [titular dos dados] e ao segredo médico é baixa quando está em causa intentar acções de responsabilidade [civil/disciplinar/criminal]; 5. É efectivamente uma aplicação do artigo 7º, nº4, da Lei nº26/2016 que cumpre escrutinar; E- Relativamente a esta questão principal, decidida pelo tribunal a quo no sentido de se permitir o acesso por terceiro, não expressamente autorizado pelo titular dos dados, desde que alegue para tal o poder ajuizar e accionar eventuais responsabilidades [civis, disciplinares ou criminais do caso] trata-se de uma questão com forte importância jurídica e social que necessita claramente de uma melhor aplicação do direito e que é de importância fundamental para outras situações semelhantes à apresentada e que vão sendo submetidas a tribunal; F- As questões que se pretendem ver respondidas na presente revista são as seguintes: 1. Pode, ou não, um terceiro, ainda que filho do titular dos dados, que não expressamente autorizado, e sem que o pai esteja declarado incapaz, aceder a registos médicos de enfermagem do pai? 2. O facto de tal terceiro não expressamente autorizado pelo titular dos dados de saúde pode aceder aos dados de saúde deste pelo facto de invocar a finalidade da informação pretendida o poder ajuizar e accionar, ou não, eventuais responsabilidades [civil, disciplinar ou criminal]? Tal questão tem associada a questão de saber se tal interesse consubstancia, como defendeu o tribunal recorrido, um interesse compósito que visa salvaguardar direitos fundamentais com mais peso concreto do que o previsto no artigo 26º, nº1, como o direito fundamental de responsabilizar civilmente terceiros por danos próprios sofridos [483º do CC] e o direito de dar notícia para procedimentos disciplinares ou criminais em defesa ou a favor de seu pai, com «baixa afectação do artigo 26º, nº1»; G- Relativamente à condenação em custas da recorrida, que, no caso, alegara pela aplicação do regime de isenção, tal decisão colide com a jurisprudência e merece uma melhor aplicação do direito, com utilidade para outras acções; H- Mostram-se, assim, plenamente preenchidos os requisitos para a admissão do presente recurso de revista excepcional por as questões ora trazidas, além de terem forte importância jurídica e social - com interesse para outras situações semelhantes à apresentada e que vão sendo submetidas a Tribunal - necessitarem claramente de uma melhor aplicação do direito atenta a contradição das decisões proferidas acerca das mesmas.

    DOS VÍCIOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO Sobre a violação do artigo 7º, nº4, da Lei nº26/2016 I- O TCAS manteve a decisão de primeira instância, que intima a entidade requerida a, no prazo de 15 dias, proceder à reprodução e ao envio ao requerente, terceiro, a saber, filho do titular dos dados de saúde [o qual não se encontra declarado incapaz], por mensagem de correio electrónico, da informação, nomeadamente dos registos médicos, registos de enfermagem, e fotografias que foram enviadas pela entidade requerida ao Dr.

    ……….

    , todos relacionados com o procedimento médico realizado no dia 25.08.2016, que conduziu à extracção de uma unha ao pai do requerente, com intermediação médica; J- A recorrente, em reacção à decisão de 1ª instância, havia já imputado o «erro de julgamento por errada aplicação do artigo 7º, nº4, da Lei nº16/2016» porquanto no presente processo está em causa o acesso a documentos administrativos nominativos, alguns dos quais relativos a dados de saúde, de que o requerente não é titular nem tem autorização escrita dos titulares dos dados que permita o acesso; K- Efectivamente, nestas situações, como resulta do artigo 6º da Lei nº26/2016, e também, do artigo 3º da Lei nº12/2015, de 26.01, só terá direito de acesso se demonstrar ser titular de um interesse directo, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante, após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, dos direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação; L- Foi concluído na sentença que existe interesse directo e pessoal por o pai do requerente se encontrar incapacitado e caber a este tomar as decisões relativas a esta matéria; M- A ora alegante não se conformou com o decidido, na medida em que o requerente não logrou demonstrar a existência de um interesse legítimo e constitucionalmente protegido pelo requerente; N- Tendo por base a alegação do requerente, de que terão sido cometidas irregularidades, incongruências e omissões, e que a informação solicitada pode resultar a decisão de apresentar procedimento disciplinar junto da Ordem dos Médicos e instaurar procedimento civil e/ou criminal contra as pessoas envolvidas, o tribunal de 1ª instância concluiu que está em causa o acesso a informação relacionada com uma intervenção médica e a saúde de uma pessoa que está em situação de incapacidade, e que o pedido do requerente/filho tem como finalidade verificar se foram prestados os cuidados médicos adequados ao doente e, em caso negativo, adoptar as providências necessárias para reagir contra esse incumprimento; O- Ora, não deve proceder este argumento invocado pelo requerente, ora recorrido, na...

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