Acórdão nº 0787/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelANTÓNIO PIMPÃO
Data da Resolução19 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: * 1.1.

A……..

reclamou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, do despacho que lhe indeferiu o pedido de extinção da execução por prescrição, proferido pelo Chefe de Finanças de Vila Nova de Famalicão no âmbito do Processo de Execução Fiscal n.º 0450199201029614.

* 1.2.

Aquele Tribunal julgou, por sentença de 29/06/2018 (fls. 32/36), a reclamação improcedente e manteve o despacho reclamado.

* 1.3.

Inconformada recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo alegando o seguinte: «A questão de direito que se coloca no presente recurso é a de apurar se o promitente-comprador de fracção autónoma de imóvel que foi penhorada no âmbito de uma execução fiscal é parte legítima para nessa mesma execução fiscal requerer a extinção da execução por via da declaração de prescrição.

Como decorre dos termos da decisão em recurso, as instâncias deram resposta negativa, entendendo falecer a mesma por não haver interesse atendível desta na pretensão.

Contudo, entende-se que as instâncias não tiveram uma correcta representação da relação jurídica e do interesse em causa. Com efeito, a consequência normal do prosseguimento da execução é a venda do bem objecto de penhora, bem em relação ao qual, a Requerente, enquanto titular de direito de aquisição da mesma, vê tal direito cerceado, pela venda executiva da fracção em causa, ou seja, a normal consequência do prosseguimento da execução é a venda em regime de leilão do bem, com a respectiva entrega da mesma ao comprador e com exclusão da promitente compradora, a qual, para além de credora, vê-se assim privada do bem. É assim atendível o seu interesse para intervir na execução, seja para reclamar o seu crédito, seja para deduzir pretensão extintiva do crédito, invocando a prescrição do mesmo.

EM CONCLUSÃO: - O Promitente-comprador é parte legítima para deduzir pedido de extinção da execução promovida em relação a fracção prometida comprar, e bem assim, para reclamar do acto que não apreciou a sua pretensão com fundamento na falta de legitimidade para intervir na execução; Termos em que deve ser julgado o presente recurso como procedente, deferindo-se a reclamação e ordenando-se a apreciação da questão da prescrição suscitada como é de JUSTIÇA.

».

* 1.3.

Não foram apresentadas contra-alegações.

* 1.4.

O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia: «I. Inconformada, veio a Reclamante interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 30/06/2013, pela M. Juíza de Direito do TAF de Braga, que julgou improcedente a presente reclamação e, em consequência, manteve na ordem jurídica o despacho reclamado, que indeferiu o pedido de extinção da execução, por efeito da prescrição, com fundamento na ilegitimidade da ora Reclamante para o formular (cfr. a sentença recorrida, constante de fls. 32 a 36 e, ainda, as alegações recursivas, insertas a fls. 41 e 42 do processo em suporte físico, doravante p. f.) A Recorrente veio imputar à decisão recorrida erros de julgamento, quanto à matéria de direito, sem que tivesse concretizado quais as disposições legais que se mostrariam concretamente violadas (cfr. as Conclusões das alegações, ínsitas de fls. 42 do p. f.) Cumpre, pois, ao Ministério Público emitir parecer, o que fará, de imediato.

  1. Do teor das conclusões alegatórias, emerge que a única questão decidenda radica na dilucidação da questão sobre a julgada ilegitimidade da Reclamante para formular o pedido de extinção da execução, por força da prescrição.

    Da análise da decisão em crise, apura-se que, para assim decidir, a julgadora estribou-se no facto de que, na sua ótica, “não se vê em que medida é que a declaração de prescrição e extinção possa afetar a esfera jurídica da reclamante, o que é inócuo para si, desde logo, porque não é a mesma a devedora das dívidas exequendas nem à mesma lhe é exigido o seu pagamento, de modo a beneficiar diretamente com a prescrição e extinção da execução, sendo certo que, mesmo o prosseguimento da execução, a manter-se a penhora sobre o bem (não sendo a penhora o ato versado, recorde-se), o mesmo não lhe pertence, de acordo com o decidido pelo Tribunal Judicial no âmbito do processo n.º 1117/12.4TJVNF, o que, igualmente, realça a sua falta de interesse em agir e legitimidade” (cfr. fls. 35 verso do p. f.) Ora, examinada a decisão judicial em crise, verifica-se que a julgadora do TAF de Braga perfilhou uma posição doutrinária antagónica à defendida pelo Ministério Público junto do TAF de Braga (v. fls. do p. f.), posição esta que secundamos inteiramente.

    Na verdade, antolha-se-nos que a solução encontrada pelo TAF a quo afronta o disposto nos artigos 103.º, n.º 2, da LGT e 276.º do CPPT, disposições que contemplam a matéria da legitimidade ativa para deduzir reclamação dos atos do órgão de execução fiscal que afetem os direitos e interesses legítimos dos interessados.

    Assim, se – utilizando a terminologia legal – os “interessados” podem lançar mão da reclamação de atos praticados pelo órgão de execução fiscal, que reputem lesivos dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, então há que concluir que lhes é lícita a intervenção a montante, no âmbito do processo de execução fiscal, tendo em vista suscitar questões tendentes a fazer valer e proteger esses direitos e interesses e, obviamente, obter decisões, por banda do mesmo órgão, passíveis de ser objeto de reclamação para o juiz de execução fiscal.

    E, em abono dessa posição, o Ministério Público reitera que secunda o sagaz entendimento do M.

    mo Juiz Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, vertido na anotação 3, ao art.º 276.º, onde se enfatiza que “(...) Não é, porém, apenas relativamente ao executado que é necessário assegurar a possibilidade de impugnação das decisões proferidas por autoridades no processo de execução fiscal, como veio a esclarecer-se na redação introduzida pela Lei n.º 109- 8/2001, ao aditar-se expressamente ao texto deste art. 276.º a referência à possibilidade de reclamação por terceiro.

    Na verdade, é constitucionalmente garantido a qualquer pessoa o direito de impugnação contenciosa de quaisquer atos da administração que lesem os seus direitos ou interesses legítimos (art. 268.º n.º 4, da CRP), pelo que esta possibilidade de impugnação terá de ser admitida a todos os que se sintam lesados.

    Por outro lado, é também esse o alcance do art. 103.º, n.º 2, da LGT, em que se admite a quaisquer interessados, e não apenas ao executado, a possibilidade de impugnação dos atos materialmente administrativos praticados no processo de execução fiscal.” (in “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, 6.ª Edição) 2011, Áreas Editores, Vol. IV, pág. 268; o destaque consta do original).

    E, para assim concluir, afigura-se-nos igualmente elucidativo o entendimento dos eminentes Jurisconsultos DIOGO LEITE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, o qual se extrai da Anotação n.º 2 ao citado artigo 103.º da LGT, segundo o qual “o direito de reclamação terá como objeto todos os atos materialmente administrativos cuja revogação total ou parcial ou cuja prática tenha utilidade objetiva, considerando-se como tal a não prática, no tempo devido, dos atos próprios do processo de execução.

    (...) Ora, naquela figura de ato reclamável poderão caber tanto decisões, como abstenções vinculadas de agir e os afetados podem ser também outros que não só o executado, como ainda estar-se perante situações em que não existe um direito ou interesse conferidos pela lei substantiva, mas haver apenas um interesse processual, como o da celeridade: pense-se na não tramitação em devido tempo dos atos consequencialmente definidos na lei para o processo de execução fiscal e que poderão afetar ora o executado, ora os credores, ora até outros interessados (depositário, por exemplo)”.

    Estamos perante uma situação em que se impõe fazer uma interpretação extensiva do preceito, dado ser evidente a falta de qualquer propósito de revogação da norma da LGT e tratar-se de caso em que o legislador se expressou, no texto, minus quam volit.

    ” (in «Lei Geral Tributária Anotada e Comentada», 4.ª...

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