Acórdão nº 0754/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | CASIMIRO GONÇALVES |
Data da Resolução | 19 de Setembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A Autoridade Tributária recorre da sentença que, proferida no TAF de Braga, em 18/10/2016, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, anulando, consequentemente, o acto de liquidação da “Taxa de Segurança Alimentar Mais” relativa ao ano de 2013.
Tendo o recurso sido interposto para o TCA Norte, ali foi proferida a decisão de fls. 350/354, declarando a incompetência desse tribunal, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso e atribuindo tal competência ao STA, por o recurso versar exclusivamente matéria de direito.
1.2.
A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1. Nos termos da Portaria nº 215/2012, de 17 de Julho, a área tributável apura-se ou por recurso aos dados fornecidos pelo contribuinte ou, na sua ausência, àqueles de que disponha a entidade liquidadora; II. No caso, a Impugnante não comunicou esses dados, pelo que a DGAV lançou mão daqueles de que dispunha, as listagens da DGAE (nºs. 4 e 5 do art. 5º da Portaria nº 215/2012); III. Este mecanismo substitutivo torna dispensável, para efeitos de determinação da área sujeita a tributação, a intervenção do contribuinte quando este não toma a iniciativa de comunicar à DGAV os dados referentes à área do estabelecimento; IV. O procedimento de liquidação da TSAM é relativamente simples: na ausência de comunicação do contribuinte prevista no nº 4 do art. 5º da Portaria nº 215/2012 (ou da comunicação prevista no nº 3 do art. 10º) a DGAV procede ao apuramento da área socorrendo-se dos elementos que lhe foram comunicados nos termos do nº 2 do art. 9º pela DGAE; V. Aplicando depois às áreas assim comunicadas os coeficientes da Portaria nº 200/2013, determinando a base tributária que multiplicada pelo valor da taxa para o ano de 2014 (art. 1º da Portaria nº 87/2014, 17 de Abril), resulta no montante a cobrar, resultado que comunica ao contribuinte nos termos do nº 3 do art. 5º; VI. O processo administrativo junto, pese embora possa incorrer em alguma deficiência de organização, demonstra o mencionado procedimento; VII. Existiu, pois, um procedimento de liquidação da TSAM que seguiu com rigor as regras aplicáveis pelo que não ocorre qualquer omissão de formalidade, muito menos omissão de procedimento e, em consequência, a apontada nulidade da liquidação; VIII. A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 5º, 9º e 10º da Portaria nº 215/2012, e no art. 9º do Decreto-Lei nº 119/2012.
Termina pedindo o provimento do recurso, a revogação da sentença e a improcedência da impugnação.
1.3.
Contra-alegou a recorrida A…………, S.A., formulando no final as Conclusões seguintes: A - O Tribunal a quo, no que diz respeito à ilegalidade da Taxa de Segurança Alimentar Mais, para além de fazer uma correcta interpretação e aplicação das normas e princípios do procedimento tributário, aplicou imaculadamente as regras quanto às consequências previstas no caso de preterição de formalidades essenciais.
B - O entendimento da Fazenda Pública segundo o qual era dispensável a audiência prévia prévio à liquidação porque a Recorrida não forneceu os dados referentes à área do estabelecimento é, no mínimo, enviesada, por olvidar os princípios enformadores do procedimento tributário, designadamente os princípios do inquisitório e da participação, não sendo a liquidação dotada de certeza sobre a realidade tributária.
C - No entanto, ao contrário do que pretende fazer crer, a ausência de comunicação do contribuinte não torna dispensável a participação do sujeito passivo para se obter a certeza jurídica sobre a realidade tributária.
D - A actuação da Recorrente ofende cada um dos princípios contidos no artigo 55º da Lei Geral Tributária e, em especial, o princípio do inquisitório, porquanto deveria aquela ter diligenciado no sentido de procurar saber qual a área tributável do estabelecimento comercial da Recorrida; e, mesmo que não tivesse diligenciado neste sentido, sempre poderia a Recorrente notificar a Recorrida para o exercício do direito de audição prévia contido no artigo 60º da Lei Geral Tributária, permitindo que esta demonstrasse qual a efectiva área tributável em sede de taxa de segurança alimentar mais.
E - É inadmissível que a DGAV, enquanto entidade pública, entenda como dispensável a participação e colaboração do sujeito passivo para se obter a certeza jurídica sobre uma realidade tributária que esta desconhece, preferindo, ao invés, calcular o valor da taxa estabelecendo uma presunção com base em factos desconhecidos, ou, quanto muito, indemonstrados, tendo inteira noção de que possivelmente está longe de corresponder à verdade, o que é mais grave quando é cristalino que os factos concretos estão ao alcance da Recorrida.
F - A DGAV ao recorrer à aplicação do critério de quantificação previsto na Portaria nº 200/2013, de 31 de maio, nos termos do artigo 5 nº 5, da Portaria nº 215/2012, de 17 de julho, está a estabelecer uma presunção da área de comércio dos produtos alimentares, área essa sobre a qual incide o tributo em causa.
G - A participação dos cidadãos na formação das decisões administrativas que lhes dizem respeito é uma exigência constitucional (artigo 267º nº 5 da CRP), estando vertida, inclusivamente, no artigo 60º da Lei Geral Tributária.
H - Aqui chegados, cumpre citar o lapidar Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16-11-2011 (proc. n. 0539/11), do qual resulta que “a participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, pelo direito de audição antes da liquidação (artigos 267º da CRP e 60º da LGT). A preterição da formalidade que constitui o facto de não ter sido assegurado o exercício do direito de audiência só pode considerar-se não essencial se se demonstrar que, mesmo sem ela ter sido cumprida, a decisão final do procedimento não poderia ser diferente.” I - Ora, do exposto supra resulta que a decisão final do procedimento de liquidação teria sido diferente se à Recorrida for conferida a hipótese de se pronunciar claramente em momento prévio ao da liquidação.
J - De resto, tendo por base a análise doutrinal e jurisprudencial que se faz do direito de audição prévia, também se dirá que a audição prévia dos interessados se configura como obrigatória nos procedimentos em que se verifica a existência de diligências instrutórias capazes de alterar a posição da Administração Tributária.
K - In casu, o procedimento tributário tendente à liquidação é composto por um ofício de notificação e uma factura que consubstanciam a liquidação em sentido técnico.
L - Como indica, e bem a sentença recorrida, “a nulidade advém, assim, não da omissão de certas formalidades mas da preterição das formalidades (e actos) que, no seu conjunto, formam um certo procedimento administrativo”.
M - A taxa de segurança alimentar mais, de acordo com o artigo 54º da Lei Geral Tributária, está dependente de um procedimento prévio, isto é, da sucessão de actos dirigidos à declaração de direitos tributários, sendo tal potenciado pela incerteza permanente que se vive quanto à sua natureza.
N - Seja como for, entende a sentença recorrida que se está perante uma contribuição especial e não perante uma mera taxa, pelo que se impõe um procedimento prévio à liquidação, de forma a serem respeitadas as garantias dos sujeitos passivos, levando ao procedimento as suas razões, que deverão necessariamente ponderadas pela Administração. Sucede que nada disto foi observado pela DGAV, que se limitou a fazer tábua rasa dos mais elementares direitos da Recorrida.
O - Assim, a taxa de segurança alimentar mais é composta pela área de venda de produtos alimentares, a qual é do conhecimento privilegiado do sujeito passivo, detendo este, em todo o momento, as ferramentas necessárias para conhecer da área de venda de produtos alimentares.
P - Tão ou mais...
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