Acórdão nº 0132/14.8BECRB-A 0413/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução04 de Outubro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A…………., Ldª, instaurou acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos contra o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., ambos com os demais sinais nos autos, com vista à impugnação da decisão de 22 de Novembro de 2013 e da norma constante do nº 5, artigo 11º da Deliberação nº 1857/2013, tendo indicado como contra-interessada a B…………., devidamente identificada nos autos.

Alega, em suma, para fundamentar a sua pretensão, que apresentou uma candidatura, devidamente instruída e no prazo legal, para a instalação de um posto farmacêutico móvel na localidade de ……., concelho da Lousã, distrito de Coimbra. Refere que foi notificada pela entidade demandada que a escolha do concorrente seria efectuada por sorteio. Do sorteio resultou classificada em primeiro lugar a contra-interessada. Considera que a norma que permite que o concorrente seja escolhido por sorteio é manifestamente inconstitucional, por violação do artigo 266º da CRP. Por outro lado, mesmo considerando que o referido sorteio fosse conforme à CRP, sempre se consideraria que foi violado o princípio da imparcialidade, uma vez que um dos envelopes que entrou na tômbola estava aberto, o que permitia distingui-lo dos restantes.

Termina peticionando a declaração da ilegalidade e da inconstitucionalidade da norma constante do nº 5 do artigo 11º da Deliberação nº 1857/2013 do Infarmed, e a declaração de nulidade ou anulabilidade do ato de 22 de Novembro de 2013.

* Foi proferido despacho saneador e decisão final no TAF de Coimbra que julgou totalmente improcedente a acção e absolveu os requeridos dos pedidos contra eles deduzidos.

* Pela autora foi interposto recurso para o TCAN, que negou provimento ao recurso do despacho saneador e concedeu provimento no que respeita à sentença, revogando-a e, deste modo julgando a acção totalmente procedente.

* Deste acórdão proferido pelo TCAN foram interpostos dois (2) recursos, um pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., e outro pela contra interessada B……….., Ldª.

O INFARMED concluiu as suas alegações, formulando as seguintes conclusões: «1ª. Com o presente recurso de revista o INFARMED pretende que este Supremo Tribunal se pronuncie quanto à legalidade de existência de sorteio nos procedimentos de abertura e instalação de postos farmacêuticos móveis como critério de desempate, nos termos do artigo 11º/5 da Deliberação 1857/2013.

  1. O presente recurso deve ser admitido, dado se verificarem os pressupostos constantes do artigo 150º/1 do CPTA para o efeito.

  2. Desde logo, a necessidade de intervenção deste Supremo Tribunal no esclarecimento da questão em causa no presente recurso justifica-se pelo facto de a mesma revestir uma enorme relevância social pelo seguinte motivo.

  3. As localidades mais pequenas e isoladas não são atrativas para que os farmacêuticos tenham interesse em lá abrirem novas farmácias de oficina, pelo que o legislador criou a possibilidade de abertura de postos farmacêuticos móveis com a única função de serem estabelecimentos de dispensa de medicamentos, que são estabelecimentos cujos custos de instalação e funcionamento são, pela sua natureza, muitíssimo inferiores aos relativos às farmácias de oficina.

  4. Assim, o INFARMED, bem como outras entidades públicas que nos termos do artigo 11º/1 da Deliberação 1857/2013 podem requerer a abertura daqueles estabelecimentos, tem utilizado esta faculdade legal para suprir as carências farmacêuticas existentes nas localidades mais distantes dos grandes centros urbanos e com menor população, 6.ª para que, dessa forma, possa satisfazer o interesse público consubstanciado na boa distribuição de medicamentos pela população e pelo território.

  5. Com a interpretação efetuada pelo Venerando Tribunal a quo, para além de ser colocada em causa o interesse público da localidade de ………., ficará também colocada em causa a possibilidade de recurso a esta faculdade prevista na lei, já que não haverá critérios de desempate.

  6. Assim, é manifesta a relevância social deste recurso.

  7. Por outro lado, a admissão deste recurso é também evidente pela sua relevância jurídica, dado o manifesto erro do Venerando Tribunal a quo em considerar que o sorteio previsto no artigo 11º/5 da Deliberação 1857/2013 é um critério de classificação e não um critério de desempate.

  8. O erro em causa consubstancia-se na total desconsideração do procedimento, constante da Deliberação 1857/2013, de instalação e abertura de postos farmacêuticos móveis, nomeadamente da avaliação que o INFARMED tem que fazer dos documentos que, ao abrigo do artigo 11º/3 da Deliberação 1857/13, os interessados têm que apresentar, de forma a verificar se as propostas dos interessados são aptas a satisfazerem o interesse público inerente à abertura daquele posto.

  9. De facto, o INFARMED tem se i) a localização proposta é apta a que se instale posto farmacêutico móvel; se ii) a instalação do posto farmacêutico móvel naquele lugar coloca em causa a sustentabilidade das farmácias de oficina mais próximas; e se iii) o local em si onde o interessado pretende instalar o posto farmacêutico móvel respeita os requisitos legais.

  10. Sendo que, só haverá sorteio se todos os interessados respeitarem os referidos requisitos e tiverem o mesmo número de postos farmacêuticos averbados.

  11. Ou seja, é manifesto que o sorteio é um mero critério de desempate de propostas que satisfazem o interesse público da mesma forma.

  12. Pelo que, é manifesto o erro grosseiro do Acórdão recorrido e a necessidade de intervenção deste Supremo Tribunal para correção do mesmo.

  13. Os motivos que levam a demonstrar a necessidade de admissão do presente recurso por existência de erro grosseiro no Acórdão recorrido, são exatamente os mesmos que levam a demonstrar juridicamente a existência desse mesmo erro.

  14. Isto é, a conclusão a que o Venerando Tribunal a quo chegou não faz qualquer sentido, porquanto só haverá sorteio nos termos do artigo 11º/5 da Deliberação 1857/2013 se todos os critérios a serem confirmados pelos documentos previstos no artigo 11º/3 da referida deliberação não identificarem qual o interessado a quem deva ser conferida a autorização para abrir um posto farmacêutico móvel no âmbito de um concurso para o efeito.

  15. Por fim, conclua-se que a interpretação efetuada pelo Venerando Tribunal a quo e constante do Acórdão recorrido é inconstitucional por violação do artigo 64º/3/e) da CRP, já que impede que o Estado, através do INFARMED, consiga disciplinar eficazmente a comercialização de medicamentos junto das populações que residem em localidades isoladas ou excessivamente pequenas onde não é atrativa a instalação de farmácias sociais».

* Também a contra interessada, B……….., concluiu as suas alegações, formulando as seguintes conclusões: 1. «No entender da ora Recorrente, andou mal o tribunal a quo ao ter julgado procedente o recurso interposto pela Autora A…………, Lda. e, em consequência, declarado a ação totalmente procedente, declarando a ilegalidade da norma do concurso para instalação de um posto farmacêutico móvel na localidade de ……….., concelho da Lousã, distrito de Coimbra, que determinou a classificação e ordenação das propostas por sorteio, e anulando o ato impugnado.

  1. O presente recurso deve ser admitido, uma vez que a atividade farmacêutica é uma atividade de interesse público, sendo de conhecimento público que, em particular, na seleção dos candidatos nos procedimentos de licenciamento de postos farmacêuticos móveis se tem aplicado o critério do sorteio, colocando o acórdão recorrido em causa a forma como têm sido conduzidos estes procedimentos.

  2. Trata-se de uma situação que, em face do conteúdo do acórdão recorrido, importa ser definida pela jurisprudência, quer tendo os licenciamentos de postos farmacêuticos móveis já ocorridos, quer tendo em conta aqueles que ainda irão verificar-se, de modo a que se estabeleça um tratamento igual e justo de todos os administrados que participem neste tipo de procedimento.

  3. Deste modo, estamos perante questão que é nova e que, pela relevância de interesse público e a dimensão social que a atividade farmacêutica assume e, por outro lado, pelo potencial de incerteza jurídica que o acórdão recorrido pode gerar no setor, reveste uma importância fundamental.

  4. Ademais, o presente recurso deve também ser admitido porquanto o mesmo é necessário com vista a uma melhor aplicação do direito, em virtude do erro de direito em que incorre o acórdão recorrido.

  5. O nº 5 do artigo 11º da Deliberação do Infarmed nº 1857/2013, de 26 de setembro, não determina a classificação e ordenação das propostas por sorteio, mas determina antes o recurso ao sorteio “em caso de igualdade de número de postos averbados”. Logo, o sorteio é utilizado neste procedimento como critério de desempate e não como critério inicial de classificação.

  6. Por outro lado, o acórdão recorrido não dá, de forma clara, qualquer explicação para o recurso ao referido artigo 70º do CCP no caso concreto, nem tampouco da existência de qualquer lacuna que determinasse a necessidade de resolução do caso concreto por analogia com aquela norma legal, tornando-o, em certa medida, ininteligível.

  7. Como tal, entende a ora Recorrente incorrer o acórdão recorrido também em nulidade nos termos das alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 615º ex vi artigo 1º do CPTA.

  8. Com efeito, conforme referido, o tribunal a quo errou ao julgar no sentido da declaração de ilegalidade do nº 5 do artigo 11º da Deliberação nº 1857/2013, de 26 de setembro, porquanto a mesma não determina a utilização do sorteio como critério inicial de classificação e graduação dos candidatos, mas antes como critério de desempate.

  9. Se atendermos, em particular, ao disposto nos nºs 2 a 5 da Deliberação nº 1857/2013, de 26 de setembro, concluímos que, posto que haja mais que um candidato que cumpra com os requisitos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT