Acórdão nº 0164/18.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução28 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Z……….-SGPS, SA, melhor identificada nos autos, vem, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 145.º nº3 do CPTA e 29º do RJAT, reclamar para a conferência do despacho do relator exarado a fls. 817/825 que não lhe admitiu o recurso de uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida no processo nº 162/2017 do CAAD, na parte que recaiu sobre a apreciação da aplicabilidade da cláusula geral anti-abuso aos accionistas, invocando oposição com as decisões que, sobre aquela questão jurídica, foram proferidas nos processos nºs 395/2014-T e 258/2013-T do CAAD.

2 – A reclamante veio apresentar reclamação para a conferência a fls. 830 e seguintes dos autos, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: «A. A Reclamante reclama para Conferência do Despacho proferido em 16.05.2018, e notificado a 21.05.2018, e que decidiu não admitir o recurso de uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida no processo n.º 162/2017 do CAAD.

  1. A presente Reclamação para a Conferência afigura-se como o expediente processual mais adequado para reagir ao Despacho em causa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 692.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigos 145.º, n.º 3, do CPTA e 29.º do RJAT.

  2. Com efeito, entende a Reclamante que aquele Despacho procedeu a uma errada interpretação e aplicação do Direito, por aplicar uma norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada e que se verifica in casu.

  3. Na verdade, considera a Reclamante que a interpretação sufragada pelo STA no Despacho reclamado afigura-se, salvo o devido respeito, em conflito com o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva, os princípios da justiça, segurança jurídica e proteção da confiança e princípio da igualdade, consagrados nos artigos 20.°, n.º 1º, 2.° e 13.º da CRP, respetivamente.

  4. Note-se que a uniformização de decisões judiciais (e arbitrais) é essencial para a realização de valores fundamentais do Estado de Direito Democrático, sendo que aos tribunais arbitrais tributários têm de aplicar-se todas as normas e princípios que regem os tribunais administrativos e fiscais, nomeadamente o entendimento de que o recurso por oposição de acórdãos pode ser interposto quando a referida oposição se verifica entre decisões do próprio CAAD, sob pena de violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do princípio da igualdade, consagrados nos artigos 20.° e 13.º da CRP, respetivamente.

  5. Acresce que a não admissão, em geral, do recurso para uniformização de jurisprudência nestes casos, implica aceitar que a situações em tudo idênticas seja dado um tratamento distinto sem que para isso haja qualquer fundamento válido, em violação do disposto no artigo 13.º da CRP.

  6. Assim sendo, este Tribunal, ao cingir-se a uma interpretação meramente literal da norma constante do artigo 25.º, n.º 2 do RJAT, aplicou uma norma cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada, justificando-se que, neste âmbito, a Conferência deste Tribunal seja chamada a apreciar esta questão; devendo ser a decisão de rejeição do recurso revogada e substituído por outra que admita o recurso por oposição entre decisões arbitrais.» 2 – A Autoridade Tributária e Aduaneira foi notificada da presente reclamação e nada veio dizer.

    Com dispensa dos vistos, vêm os autos à Conferência.

    1. Fundamentação 3.1 – O despacho recorrido tem o seguinte teor: «1. Vem Z……..-SGPS, SA interpor para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo recurso de uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida no processo nº 162/2017 do CAAD, na parte que recaiu sobre a apreciação da aplicabilidade da cláusula geral anti abuso aos accionistas, por um lado e à recorrente, por outro, invocando oposição com as decisões que sobre aquelas questões jurídicas foram proferidas nos processos nºs. 395/2014-T e 258/2013-T do CAAD.

    O recurso foi interposto com invocação do disposto nos arts. 152° do CPTA e n° 2 do art° 25° do RJAT, tendo a recorrente apresentado alegações que rematou com as seguintes conclusões: «A. O presente recurso tem por objeto Decisão, proferida no Processo n.º 162/2017-T, que correu termos junto do CAAD, na parte que recaiu sobre a apreciação da aplicabilidade da CGAA aos acionistas, por um lado, e à aqui Recorrente, por outro, a qual está em oposição com as Decisões fundamento indicadas, as quais versam sobre duas questões jurídicas distintas.

  7. A primeira Decisão fundamento foi proferida pelo TAMT no âmbito do Processo n.º 395/2014-T, e trata da possibilidade de a CGAA ser interpretada e aplicada ao substituto tributário, tornando-o sujeito passivo de imposto e fazendo nascer em relação a este a obrigação tributária de, retroativamente, proceder à retenção na fonte do imposto, quando na altura da prática do ato desconsiderado ao abrigo da CGAA inexistia qualquer situação de substituição tributária atenta a natureza do ato em causa.

  8. A segunda Decisão fundamento, também proferida pelo TAMT, agora no_ do Processo nº 258/2013-T versa sobre possibilidade de a parte final do artigo 38°, nº 2 da LGT — “efetuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas” — ser interpretada no sentido de considerar como sujeito passivo de imposto a entidade que foi desconsiderada por aplicação da CGAA por se entender que a sua criação apenas teve por motivação a obtenção de vantagens fiscais que não se verificariam se a mesma não existisse.

  9. A Decisão recorrida encontra-se em contradição com cada uma das citadas Decisões, quanto à concreta questão que cada uma aprecia.

  10. O presente recurso para uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 152º do CPTA, aplicável ex vi n.º 2, do artigo 25.º, do RJAT, é aplicável no caso de a oposição se verificar entre Decisões proferidas pelo TAMT, pelas seguintes razões: F. Primeira razão: o objetivo do referido recurso é obstar à prolação de decisões contraditórias sobre uma mesma questão jurídica à qual sejam subsumíveis factos idênticos, por conflituarem as mesmas com a segurança e certezas jurídicas que os cidadãos legitimamente esperam do exercício da função judicial, e que lhes é garantido, de resto, pelo artigo 2.º da CRP, sendo, neste âmbito, crucial que o STA exerça o seu papel de orientador da jurisprudência; G. Segunda razão: Este recurso deve ser admitido entre Decisões do CAAD atendendo a que a função levada a cabo pelos tribunais arbitrais é uma função jurisdicional, revestindo as suas decisões carácter imperativo e definitivo e tendo, como tal, o mesmo valor jurídico das sentenças judiciais; H. Como tal, e sendo parte integrante da jurisdição tributária, aos tribunais arbitrais tributários têm de aplicar-se todas as normas e princípios que regem os tribunais administrativos e fiscais, nomeadamente o entendimento de que o recurso por oposição de acórdãos pode ser interposto quando a referida oposição se verifica entre decisões do próprio CAAD, sob pena de violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva e do princípio da igualdade consagrados nos artigos 20.º e 13.º da CRP; I. Terceira Razão: Foi o próprio legislador que se absteve de afastar a possibilidade de aquele recurso no âmbito da arbitragem tributária. Na verdade, o respeito pelo escopo da autorização legislativa concedida compreendia a previsão de exceções à regra da irrecorribilidade das decisões arbitrais, de que é exemplo a possibilidade consagrada no artigo 25.º, nº 2 do RJAT.

  11. Contudo, quando o RJAT foi aprovado, inexistia qualquer tipo de experiência em matéria de arbitragem tributária, pelo que houve “questões” que o legislador não previu. Deste modo, impõe-se uma interpretação extensiva e atualizadora do artigo 25.º do RJAT, sob pena de intolerável violação dos princípios de justiça e confiança constantes do artigo 2º da CRP, ou, caso assim não se entenda, a integração desta lacuna por recurso à analogia.

  12. Quarta Razão: as decisões do TAMT, para efeitos de interposição de recurso de oposição, são equiparadas a decisões do TCA, resultando tal equiparação do...

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