Acórdão nº 01037/14.8BEPRT 0891/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Janeiro de 2019
Magistrado Responsável | CASIMIRO GONÇALVES |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A………………….., S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na qual se julgou improcedente a impugnação judicial visando a liquidação da “contrapartida anual relativa ao ano de 2013” no montante de 1.077.344,55 Euros, referente à concessão da zona de jogo da Póvoa de Varzim, liquidação operada por TURISMO DE PORTUGAL, IP, englobando, além do mais, o imposto especial de jogo.
1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1ª. Na presente impugnação judicial, a ora recorrente contestou a liquidação efectuada pelo Turismo de Portugal, IP, referente à chamada “contrapartida anual” exigida às empresas concessionárias da actividade do jogo; 2ª. A referida contrapartida anual está prevista e regulada no Decreto-Lei n° 275/2001, de 17/10 e é constituída por 50% das receitas brutas dos jogos explorados nos Casinos; 3ª. O referido Decreto-Lei n° 275/2001, de 17/10, estabelece, também, que a referida contrapartida anual não pode ser inferior a um determinado montante, mesmo que o valor dos 50% das receitas brutas dos jogos não atinja esse mínimo; 4ª. Essa contrapartida anual tem a natureza de um imposto, desde logo porque, ao menos em parte, é pago através das liquidações de Imposto do Jogo e, fundamentalmente, porque se trata de uma prestação definitiva, pecuniária, unilateralmente determinada, coerciva e que não corresponde a uma contraprestação específica; 5ª. Ao invés do defendido na douta sentença recorrida, não obstante exista um contrato de concessão celebrado entre o Estado e a recorrente para a exploração de jogos de sorte e azar, essa contrapartida anual não tem matriz contratual; 6ª. O contrato de concessão limita-se a reproduzir o conteúdo de actos legislativos anteriores — o Decreto-Regulamentar n° 29/88, de 3/8 e o Decreto-Lei n° 275/2001, de 17/10; 7ª. A exigência do pagamento da contrapartida anual e a sua fórmula de cálculo estão estabelecidos nos referidos instrumentos legais; 8ª. Além de que, recorde-se, o pagamento, ao menos em parte, dessa contrapartida é feito com os pagamentos do Imposto de Jogo, imposto esse previsto em acto legislativo — DL n° 422/89, de 2/12; 9ª. A circunstância de haver um contrato de concessão e de o recorrente ter “aceite” o pagamento de tributos, não sana as inconstitucionalidades e/ou ilegalidades dos tributos (Imposto do Jogo e contrapartida anual) já que o Estado e os particulares apenas podem validamente obrigar-se dentro dos limites que a Constituição lhes permite; 10ª. Aliás, o STA, a propósito da questão da competência da jurisdição fiscal, já se pronunciou no sentido de que a contrapartida é um tributo; 11ª. Não há, assim, ao invés do decidido na douta sentença recorrida, qualquer impossibilidade de se apreciar as ilegalidades que a recorrente considera existirem na impugnada liquidação da contrapartida; 12ª. E que a referida liquidação é ilegal porque o diploma, com base na qual foi emitida tal liquidação (Decreto-Lei n° 275/2001, de 17/10) é organicamente inconstitucional por violação dos art.ºs 103°, n° 2 e 165°, n° 1, i), da Constituição da República Portuguesa; 13ª. É que o Decreto-Lei n° 275/2001, foi aprovado sem ser com base em qualquer autorização legislativa concedida pela Assembleia da República ao Governo; 14ª. Acresce que, conforme referido, uma parte da contrapartida anual é paga através de pagamentos do Imposto do Jogo; 15ª. Ora, o Imposto do Jogo está previsto no Decreto-Lei n° 422/89, de 2/12, diploma esse aprovado com base na autorização legislativa concedida ao Governo pela Lei n° 14/89, de 30/6; 16ª. Porém, essa autorização legislativa é amplamente genérica, não cumprindo o requisito constitucionalmente expresso de definir com rigor e precisão, “o objecto, o sentido, a extensão e a duração da mesma” (cf., à época, o art. 168°, n° 11 e, hoje, o art. 165°, da Constituição).
17ª. Na medida em que está em causa matéria fiscal, que é da competência da Assembleia da República, o referido Decreto-Lei n° 422/89, é organicamente inconstitucional e, portanto, ilegais as liquidações de Imposto do Jogo e, deste modo, ilegal a contrapartida, na parte em que ela é constituída por tal imposto; 18ª. Por outro lado, sendo, como é, a “contrapartida anual” um imposto, a sua exigência/liquidação é inconstitucional por violação dos princípios da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real; 19ª. Na verdade, a “contrapartida anual” incide sobre as receitas brutas obtidas pela recorrente e o valor de tal contrapartida nunca pode ser inferior a um mínimo estabelecido na lei; 20ª. O que quer dizer, portanto, que a recorrente é tributada de forma completamente desligada do seu rendimento real/efectivo, podendo ocorrer, até, uma relação inversamente proporcional entre as receitas que obtém e o tributo que é forçado a suportar; 21ª. No limite, com a consagração de uma “contrapartida mínima” poderia a recorrente não ter qualquer receitas e, não obstante, está obrigada a pagar a contrapartida; 22ª. Aliás, o próprio imposto de jogo que, conforme referido, “integra” a contrapartida anual, é também inconstitucional por violação desses princípios da capacidade contributiva e da tributação pelo rendimento real; 23ª. É que, como decorre do art. 85° da Lei do Jogo (Decreto-Lei n° 422/89), a tributação sobre os chamados “jogos bancados” incide sobre a receita bruta, afastando-se, assim, do lucro real e efectivo; 24ª. E, quanto à tributação sobre as máquinas automáticas, ela incide sobre um “capital” fixado administrativamente pelo Turismo de Portugal, IP, havendo, deste modo, uma tributação sobre meras presunções de rendimento; 25ª. Deste modo, a impugnada liquidação é ilegal, pelo que não pode manter-se a douta sentença recorrida.
1.3.
O Instituto de Turismo de Portugal apresentou as suas contra-alegações, relativamente às quais formula as seguintes conclusões: 1. A natureza da contrapartida contratual tem de ser aferida considerando a sua génese e a sua integração no contrato administrativo de concessão para a exploração de jogos de fortuna nos casinos existentes na zona de jogo da Póvoa de Varzim.
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A contrapartida é exigível à recorrente por força do disposto na cláusula n.° 2 do contrato de concessão.
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O contrato de concessão foi adjudicado à recorrente na sequência de concurso público, constando as obrigações mínimas e o processo do concurso de Decreto Regulamentar.
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A recorrente adquiriu o direito de explorar jogos na referida concessão por ter, no âmbito do concurso, apresentado a melhor proposta, isto é, apresentado a contrapartida inicial mais alta.
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Inexiste qualquer obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares que possa ser removido através do pagamento da contrapartida anual.
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A diferença entre uma contraprestação...
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