Acórdão nº 01610/10.3BELRA 0460/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. O MUNICÍPIO DE CONSTÂNCIA [MC] interpõe recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [TCAS], de 06.12.2017, que negou provimento ao recurso de apelação da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria [TAF], que o condenou a pagar ao autor da acção administrativa comum – A…………..

    - parte do que por ele havia sido peticionado, «absolvendo os dois outros réus» - B……………., S.A., e INSTITUTO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I.P.

    - do pedido.

    Culminou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: 1- A hipótese legal do contrato de actividade ocupacional, regulada pela Portaria nº192/96, de 30.05, não pode enquadrar-se no Regime Jurídico dos Acidentes em Serviço e das Doenças Profissionais no âmbito da Administração Pública, regulado pelo DL nº503/99, de 20.11, por não caber em nenhuma das hipóteses previstas no respectivo artigo 2º; 2- À data da publicação da citada Portaria estava, porém, em vigor o DL nº38.523, de 23.11.51, cujo artigo 1º § único, mandava aplicar aos agentes públicos que não fossem subscritores da Caixa Geral de Aposentações a legislação sobre acidentes de trabalho; 3- O legislador da Portaria nº192/96, de 30.05, não podendo ignorar esse preceito, que estava então em vigor, quis manifestamente excluir o seguro de acidentes de trabalho, no quadro da chamada actividade ocupacional; 4- Para salvaguarda do direito à integridade física da pessoa singular contratada no âmbito da dita actividade ocupacional impôs, todavia, à entidade promotora a celebração de um seguro de acidentes pessoais; 5- Não existe, portanto, qualquer lacuna, pelo que não é admissível a extensão analógica na interpretação do artigo 6º, nº2 alínea a), da citada Portaria nº192/96, de 30.05; 6- O que se justifica pela excepcionalidade e atipicidade da chamada actividade ocupacional; 7- Continuando o contratado a receber subsídio de desemprego, a entidade promotora, não lhe pagando propriamente um salário ou vencimento, só pode subscrever uma apólice de seguro sobre o valor que efectivamente lhe paga; 8- Razão pela qual surge como de todo desrazoável e desproporcional a interpretação feita pelas instâncias, da qual resulta sentido normativo que, em vista dessa desproporcionalidade, se revela como materialmente inconstitucional, por contrariar o artigo 13º da Constituição da República, na justa medida em que impõe à entidade promotora uma responsabilidade que lhe não é permitido abranger num contrato de seguro, posto que não existe, propriamente, um contrato de trabalho, nem, por outro lado, o valor do subsídio pago pela Segurança Social pode legalmente ser abrangido pelo seguro, o qual incluiria prestação não paga, e sendo, portanto, falso; 9- A aplicação feita pelas instâncias da norma regulamentar pressupõe, necessariamente, duas sucessivas operações lógico-jurídicas: uma prévia interpretação revogatória ou ab-rogante, eliminando o termo pessoais, que não se justifica, nem surge minimamente fundamentada, seguida da extensão analógica, para impor à entidade promotora o risco de acidentes de trabalho, sem lhe impor igualmente a obrigação de transferir esse risco para uma seguradora, como a lei geral determina; 10- Torna-se evidente que não foi o que o legislador quis, e não podem os tribunais substituir-se ao legislador, sobretudo ao colocarem as entidades promotoras numa situação de imprevisibilidade e de incerteza, vendo-se a cargo com um risco que o legislador não pretendeu, manifestamente, atribuir-lhes, visto que, se fosse esse o caso, teria determinado, sim, a obrigação de um seguro de acidentes de trabalho; 11- Não sendo concebível a cumulação dos dois seguros, de acidentes pessoais, legalmente facultativo, e de acidentes de trabalho, legalmente obrigatório; 12- O douto acórdão recorrido violou, pois, o artigo 6º, nº2 alínea a), da Portaria nº192/96, de 30.05 e, por isso, violou também o artigo 13º da Constituição da República.

    Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso de revista, que seja revogado o acórdão recorrido e julgada improcedente a acção administrativa.

    1. O recorrido A……………… contra-alegou e concluiu assim: 1- A principal questão que se coloca para superior apreciação, e decisão, e que se encontra devidamente identificada na apreciação de direito constante do acórdão que ora se recorre é saber se o tribunal a quo errou ao considerar que o autor teria legalmente direito a beneficiar de um seguro de acidentes de trabalho, a cargo do réu e cobrindo a protecção adequada contra os riscos emergentes da actividade ocupacional exercida, e não apenas ao com o valor de capital seguro correspondente ao montante do subsídio de alimentação diário única quantia efectivamente paga pelo MC ao autor; 2- O autor concorda em absoluto com a apreciação e fundamentação da sentença do tribunal a quo, bem confirmada pela apreciação e fundamentação do douto acórdão que ora se recorre; 3- O MC opta por aplicar o Seguro de Acidentes de Trabalho ao autor reconhece que beneficia da actividade do autor e equipara-o a funcionário da Câmara a desempenhar funções similares; 4- Trata-se de Seguro de Grupo de acidentes de trabalho de adesão automática regido pelas disposições constantes da Lei das Cláusulas Gerais-DL nº446/85, de 25.10, de prémio variável; 5- A zona crítica desta questão prende-se com o facto de o MC, não comunicar à seguradora todas as remunerações, previstas na lei, que «o autor recebia mensalmente», subsídio de desemprego acrescido de 20%, conforme estava obrigado nos termos dos nºs 2 e 3 do artigo 8º da Portaria nº192/96, de 30.05, e da cláusula terceira do Acordo da Actividade Ocupacional [factos provado 1 e 2] limitando-se a comunicar as remunerações pagas por si [valor mensal do subsídio de alimentação]; 6- Violando a alínea c) do nº1 do artigo 16º referente às obrigações do tomador se seguro, constantes das Cláusulas Particulares de seguro de trabalho; 7- O MC sabe pelo «Acordo» subscrito por si que o autor, pela cláusula terceira alínea d) do mesmo acordo, tem direito a «beneficiar de um seguro contra acidentes de trabalho que o proteja contra riscos e eventualidades que possam ocorrer durante e por causa da actividade ocupacional»; 8- A verdade é que a referida portaria, no seu artigo 11º nº3, estabelece que a entidade promotora deve suportar um seguro de acidentes, no caso o MC; 9- O seguro aplicável terá de tutelar efectivamente a integridade da capacidade produtiva do próprio trabalhador ainda que desempregado; 10- Devendo a ora recorrente assumir os períodos de ITA, não tendo por referência o valor do subsídio de refeição pago, mas o total das remunerações efectivamente pagas ao trabalhador pelas diversas entidades; 11- Deve ainda a recorrente assumir o pagamento devido ao autor do montante indemnizatório que lhe é devido da IPP de 10%, já reconhecida pericialmente; 12- Tal como decorre e muito bem da douta sentença do tribunal a quo conclui-se que existiu a omissão incorrecção na transmissão da totalidade das remunerações do autor pelo tomador do seguro, o réu MC, que caso fosse efectuada correctamente conduziria a alteração do prémio e influído nas condições de aceitação do contrato; 13- Existindo causalidade entre a violação do dever de informação pelo tomador e a celebração do contrato com a seguradora; 14- Cabendo, por via dessa conduta violadora, ao réu MC a imputação da responsabilidade pela reparação do acidente de trabalho nos justos termos em que foi justamente condenada; 15- «[…] a questão em causa não se esgota na forma do acordo, nem nas retribuições que por este sejam devidas. A questão central está sim na protecção adequada contra os riscos emergentes da actividade ocupacional exercida»; 16- «[…] o seguro aplicável, independentemente do nome que esta tenha, terá de tutelar efectivamente a integridade da capacidade produtiva do prestador do serviço»; 17- «[…] o autor […] tem direito a ser ressarcido das despesas e prejuízos sofridos por força do acidente ocorrido no desempenho das actividades ocupacionais no Município de Constância. E não restam dúvidas que, independentemente do tipo de contrato de seguro que o Acordo de Actividade Ocupacional exigia por força da relação estatuída na Portaria nº192/96, o contrato seguro efectivamente celebrado pelo Município de Constância e a B………………, SA foi um contrato de acidentes de trabalho de prémio variável [facto provado 4] e, por isso, é este que releva no caso [Apólice nº………………..]»; 18- «[…] não assume especial relevância a circunstância de o legislador da Portaria ter designado o seguro a contratar como ”seguro de acidentes pessoais.

      […] O que o legislador pretendeu foi que a actividade por eles desenvolvida estivesse devidamente segurada, titulada por um contrato de seguro»; 19- «[…] E quanto ao risco propriamente dito, inerente às funções...

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