Acórdão nº 01005/18.0BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução26 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.

A………..

[abreviadamente «A……»], devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante «TAC/L»] a presente ação de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias nos termos dos arts. 109.º e segs. do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA] [na redação que lhe foi introduzida pelo DL n.º 214-G/2015, de 02.10 - cfr. seu art. 15.º (presente que as alterações produzidas pela Lei n.º 118/2019, de 17.09, não se mostram, ainda, vigentes - cfr. seu art. 14.º) - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos deste Código sem expressa referência em contrário] contra «ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL» [abreviadamente «ERC»] e os contrainteressados «B………., SA» e C……… [doravante «Contrainteressados»], nos termos e com a motivação aduzida na petição inicial de fls. 01/44 dos autos [paginação «SITAF» - tal como as ulteriores referências à mesma sem expressa menção em contrário], peticionando a declaração de nulidade da deliberação da «ERC» [«ERC/2018/75» (DR-TV), datada de 24.04.2018] e a condenação da mesma «a reconhecer o direito de resposta da Autora e a praticar todos os atos necessários e decorrentes do reconhecimento desse direito», e, a título subsidiário, «a substituição da intimação por uma providência cautelar, com decretamento provisório, que reconheça o direito de resposta da Autora e condene a ERC a praticar todos os atos necessários e decorrentes do reconhecimento desse direito».

  1. O «TAC/L», por sentença de 23.10.2018 [cfr. fls. 495/538], julgou totalmente improcedentes as exceções de incompetência absoluta do tribunal [em razão da matéria] e de inadequação do meio processual que haviam sido suscitadas pelos demandados e procedente a pretensão e, em consequência, intimou a «ERC» «a reconhecer o direito de resposta da Requerente, relativamente aos episódios transmitidos no programa “Jornal das 8” da B….., nos dias 11 a 15 e 18 a 21 de ……. de ………, no âmbito da reportagem “D………”, e a emitir decisão que ordene a transmissão das respostas».

  2. A «ERC», inconformada com aquela decisão, interpôs então recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul [doravante «TCA/S»], o qual, por acórdão de 21.02.2019 [cfr. fls. 624/650], negou total provimento ao recurso e manteve integralmente a sentença recorrida.

  3. Invocando o disposto no art. 150.º, n.º 1, do CPTA, a «ERC», de novo inconformada com o acórdão proferido pelo «TCA/S», mas, agora, apenas no segmento em que no acórdão se confirmou o juízo de improcedência da matéria excetiva firmado na sentença, interpôs o presente recurso de revista, produzindo alegações [cfr. fls. 889/910], com o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: «… O) Nos presentes autos de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias foi peticionada a declaração de nulidade de uma deliberação do Conselho Regulador da ERC e a intimação desta a reconhecer o direito de resposta da Recorrida; P) O Acórdão recorrido não anulou ou declarou nula a deliberação em causa, limitando-se a intimar a ERC a reconhecer o direito de resposta da Recorrida e a emitir decisão que ordene a respetiva publicação; Q) Em primeiro lugar, no âmbito de um processo de intimação, não podem ser formulados pedidos de declaração de nulidade ou anulação de atos, matéria reservada ao âmbito da ação administrativa.

    R) Em segundo lugar, a decisão recorrida, ao não anular ou declarar nula a deliberação aprovada pela ERC torna-se inexequível e ilegal; S) Tudo porque a obrigação de aprovar uma deliberação na qual se reconheça o direito de resposta da Recorrida (sem ter sido anulado ou declarado nulo o ato anterior de sentido contrário) torna a decisão recorrida inexequível e ilógica; T) Em terceiro lugar, a decisão recorrida mais não faz, sob o ponto de vista material, do que condenar a ERC a proceder a uma anulação administrativa de uma deliberação, o que se revela violador do n.º 3 do artigo 168.º do CPA, porquanto se encontra já encerrada a fase de discussão; U) Em quarto lugar, não é lícito a um qualquer tribunal, quando confrontado com um ato alegadamente ilegal, condenar a Administração a anulá-lo administrativamente, mas antes devendo proceder à respetiva anulação ou declaração de nulidade (o que, como vimos, não é suscetível de ser efetuado em sede de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias); V) Assim que a decisão recorrida haja adotado um conteúdo fora do âmbito das determinações específicas que os tribunais podem dirigir à Administração Pública (no mesmo sentido o recente acórdão do STA, proferido em 26.02.2019, no âmbito do processo n.º 16/19.3BALSB); W) Termos em que o acórdão recorrido é nulo, devendo ser revogado e substituído por outro que declare a inadequação do meio processual utilizado pela Recorrida; X) A utilização do meio processual da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias está dependente da verificação de uma impossibilidade ou insuficiência, no caso concreto, de tutela cautelar (com decretamento provisório); Y) Ao contrário do que foi o entendimento vertido no acórdão recorrido, uma decisão proferida em sede de processo cautelar, designadamente uma decisão no sentido de ser ordenada a publicação de uma resposta, não retira utilidade à decisão a proferir em sede de ação principal (conforme foi já decido por este STA em acórdão de 28.04.2016, no âmbito do processo n.º 0393/16); Z) Termos em que, sendo improcedente o acórdão recorrido no que se refere a impossibilidade ou insuficiência da tutela cautelar (sendo a mesma possível no caso vertente) não se encontrava preenchido um dos pressupostos de que depende a utilização do meio processual da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias; AA) Este meio processual exige, outrossim, a absoluta indispensabilidade da sua utilização tendo em vista o exercício, em tempo útil, de um determinado direito; BB) A notícia em apreço nos presentes autos foi publicada há mais de 1 ano, o que demonstra a falta de urgência do caso vertente; CC) Por outro lado, o Recorrido poderia ter lançado mão da ação judicial prevista no n.º 3 do artigo 68.º da Lei da Televisão, num contencioso direto contra o órgão de comunicação social em causa, junto dos tribunais judiciais, no qual seria proferida uma decisão num prazo de 4 dias úteis (sendo, nessa medida, bastante mais célere do que a jurisdição administrativa); DD) Termos em que fica demonstrada a falta de preenchimento do requisito de imprescindibilidade do meio processual exigido pelo n.º 1 do artigo 109.º do CPTA; EE) Por outro lado, a decisão recorrida procede a um corte radical com o que tem sido uma jurisprudência de décadas em sede de direito de resposta, concretamente no que se refere à possibilidade de decisões do regulador, proferidas em sede de queixa por recusa de transmissão de resposta, serem objeto de tutela cautelar; FF) Com efeito, a decisão recorrida concluiu no sentido de que uma eventual decisão proferida em sede de providência cautelar – concretamente no sentido de transmissão da resposta – teria como efeito antecipar o juízo da ação principal, resultando na inutilidade desta decisão e, consequentemente, pela impossibilidade de utilização da via cautelar (o que, como vimos, foi já contrariado por este STA); GG) Ora, se tal fosse procedente, então seria igualmente de concluir no sentido de que uma decisão do regulador no sentido de não ser publicada qualquer resposta também não poderia ser objeto de tutela cautelar; HH) É que o direito de resposta apenas subsiste na ordem jurídica enquanto estivermos dentro de um período temporal que possibilite que a resposta tenha a mínima eficácia aquando da respetiva publicação; II) Quer isso dizer que determinar que uma resposta tenha de aguardar pela decisão da ação principal (o que, em condições de normalidade, demorará, pelo menos, 3 a 4 anos), concretamente por via do indeferimento de uma providência cautelar destinada a determinar a publicação da resposta, não poderá deixar de conduzir a uma conclusão no sentido de que a sentença a proferir em sede de ação principal também não apresentará qualquer efeito útil; JJ) Tudo porque o direito que se visava proteger - o direito à publicação da resposta - já se encontraria materialmente ferido de morte, atenta a sua completa e total ineficácia em face do período de tempo decorrido entre a publicação da notícia e a resposta; KK) É certo que, do ponto de vista estritamente formal, a resposta poderá ainda ser publicada, no entanto, o princípio da primazia da materialidade subjacente e bem assim o princípio da tutela jurisdicional efetiva (que exige a possibilidade de uma tutela judicial em prazo razoável) impediriam uma conclusão no sentido de que tal publicação - determinada apenas em sede de ação principal - apresentaria, ainda assim, um efeito útil; LL) Consequentemente, e porquanto fica exposto, a consequência direta e necessária da decisão recorrida seria, precisamente, no sentido de que seja qual for a decisão proferida em sede de providências cautelares relativas a direito de resposta, sempre estaria a decisão a proferir em sede de ação principal desprovida de qualquer utilidade - porquanto o litígio havia ficado materialmente decidido em sede de providência cautelar; MM) Mas se assim fosse, então, a conclusão a alcançar seria no sentido da impossibilidade - em todos os casos - de recurso à tutela cautelar em sede de direito de resposta; NN) Tudo o que foi desconsiderado pela decisão recorrida e que nos conduz a uma abrupta rutura - sem qualquer razão justificativa - com décadas de tratamento jurisprudencial e doutrinal da matéria relativa ao direito de resposta; OO) Mais, ainda, caso existisse uma decisão em sede de providência cautelar que determinasse a publicação de um texto de resposta - sendo que existem inúmeros...

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