Acórdão nº 01445/11.6BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução09 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO I- RELATÓRIO A…………, SA, com os sinais dos autos, inconformada, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra prolatada em 22 de Novembro de 2018, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação da tarifa de ligação de esgotos emitida pelos SMAS, titulada pela factura nº1100063, de 18/02/2011, no valor de €1.229.420,95, relacionada com o imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o nº3264, da freguesia da ………, de que é proprietária em 72%, o que fez na sequência do indeferimento de reclamação graciosa que apresentou.

Nas alegações que expostas formulou as seguintes conclusões: “A. Ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal recorrido, a TLE não cabe, de todo, na noção de taxa, uma vez que viola o princípio da equivalência. Na verdade, não lhe está subjacente qualquer vantagem específica directa para os sujeitos passivos, de modo a poder concluir-se pela existência de uma relação de correspectividade ou sinalagmaticidade entre o pagamento do tributo e o serviço público prestado.

  1. Esta ausência de bilateralidade é observada, em primeiro lugar, pelo facto de a finalidade da TLE ser totalmente imperceptível, e de não se encontrar de todo provada nos autos a razão pela qual ela deve ser paga pelos proprietários ou usufrutuários dos prédios, ou por quem proceder à inscrição dos mesmos na matriz. Isto é, não é possível dizer que a TLE constitui a contrapartida de qualquer prestação pública específica e individualizável, ou identificar qual o serviço prestado, qual o seu custo e qual o valor do benefício retirado pelo particular.

  2. A TLE é uma espécie de tributo adicional residual, indiferenciado, que não serve para pagamento de nenhum serviço específico e que, pelo contrário, utiliza a justificação formal da contraprestação da instalação do sistema de tratamento de águas residuais como subterfúgio para arrecadar uma receita extra para as despesas gerais do Município de Oeiras.

  3. Em segundo lugar, a ausência de bilateralidade é comprovada pela circunstância de a TLE assentar numa base ad valorem - o valor patrimonial tributário dos imóveis - que é absolutamente inidónea para cumprir o princípio da equivalência. A base tributável em causa foi escolhida como manifestação de capacidade contributiva (e não de equivalência). O que interessou foi atingir a robustez económica dos sujeitos passivos, ou seja, tributá-los de acordo, não com o valor ou a utilidade de qualquer prestação pública, mas com a sua capacidade contributiva.

  4. A TLE é, pois, um imposto.

  5. Sendo um imposto, a TLE é organicamente inconstitucional (e, nessa medida, inexigível), por violação do princípio da legalidade fiscal, uma vez que foi criada por regulamento municipal e não por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei do Governo autorizado por lei parlamentar, com a consequência da anulação do acto impugnado nos autos.

  6. Para além disso, a TLE é também materialmente inconstitucional, por determinar uma restrição ao direito de propriedade em violação do princípio da proporcionalidade, em todas as suas dimensões - adequação, exigibilidade e equilíbrio. Com efeito, trata-se de uma medida de extraordinária violência, que sacrifica o direito de propriedade dos particulares, de modo incompreensivelmente exagerado - excessivo -, em nome de um interesse geral cujos custos já são financiados, por uma variedade de outras vias, pelos próprios particulares que a àquela estão sujeitos.

  7. Sendo uma “taxa” que desrespeita o princípio da equivalência, a TLE é também ilegal, por violação do n.° 1 do artigo 4º do RGTAL, segundo o qual o valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade pública local ou o benefício auferido pelo particular.

  1. Por fim, a TLE cobrada à Recorrente é ainda ilegal por falta de fundamentação, na medida em que a notificação da liquidação impugnada não foi acompanhada da justificação económico-financeira do tributo (seja de modo expresso seja por remissão para qualquer documento ou diploma que a pudesse conter), justificação essa que constitui um elemento essencial para aferir a natureza equitativa do tributo e, portanto, a sua validade material.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, por provado, com todas as consequências legais.” A recorrida apresentou contra-alegações pugnando, no fundamental, pelo bem julgado da decisão recorrida, como se capta claramente das seguintes conclusões que expressou: “i. Através de Sentença proferida pelo douto Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual julgou totalmente procedente a Impugnação Judicial deduzida pela ora Recorrida contra a Tarifa de Ligação de Esgotos, no valor total de € 1.229.420,95; ii. Inconformada com aquela douta Sentença, a Recorrente interpôs o presente Recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, invocando, em síntese, que a Tarifa de Ligação de Esgotos viola a CRP, em especial, os princípios da Reserva de Lei e o princípio da proporcionalidade; que o ato de liquidação da Tarifa de Ligação de Esgotos padece de falta de fundamentação económico-financeira e, por último, que a tendo impugnado judicialmente a segunda avaliação dos prédios aqui em causa, para efeito de IMI, e tendo sido emitida a liquidação antes do trânsito em julgado, houve violação da tutela judicial efetiva; iii. Desde logo, e quanto à violação da CRP importa frisar que a Tarifa de Ligação de Esgotos não constitui um imposto, mas antes uma taxa porque “constitui contrapartida do acesso e evacuação das águas residuais até a rede pública”; iv. Contrariamente ao refere o Recorrente nas suas alegações de recurso o sinalagma inerente ao tributo resulta evidente do próprio nº 1 do art.° 65º do Regulamento, segundo o qual a taxa de ligação corresponde à contraprestação do serviço da instalação do sistema de drenagem de águas residuais a cargo da entidade gestora; v. Sendo que, a coberto do disposto no n.° 2 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 158/70 de 13 de Abril - disposição legal que estabelece que a Tarifa de Ligação de Esgotos não poderia exceder os 10% do rendimento coletável -, e em resultado de reunião ordinária de 19 de Dezembro de 1990 foi aprovada a percentagem referente a esta tarifa em 0,7%, ou seja, em menos de 10% do que o valor percentual que, nos termos legais, poderia ser fixado; vi. Importa, pois, mais uma vez, trazer à colação as doutas conclusões do acórdão proferido em 25 de maio de 2004, no processo n.° 01115/03 já proferida sobre esta matéria, segundo a qual “importa ainda considerar que quando qualquer prédio se liga à rede pública de esgotos, já está, necessariamente, construída e, por inerência, a ser objecto de conservação e manutenção, pelo que, a nosso ver, bem se compreenderá que a taxa de ligação tenha por objectivo não só a contrapartida decorrente de o prédio passar a utilizar aquela rede , mas , ainda e também , e minimizar os custos , necessariamente previsíveis, com a sua manutenção futura; Tão previsível que, depois da ligação é devida uma anual de conservação. (...)- (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.° 01115/03, de 25 de maio de 2004); vii. Esta conclusão não resulta, apenas, e contrariamente ao que sustenta a Recorrente do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.° 01115/03, de 25 de maio de 2004, citado pela Sentença recorrida, mas de vasta jurisprudência dos Tribunais Superiores, a qual conclui que a referida Tarifa de Ligação de Esgotos A tarifa de ligação de esgotos representa a contrapartida pelo bem utilizado da ligação do prédio a uma rede de esgotos instalada. 2. As tarifas apenas estão sujeitas ao princípio da legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária. Não se verifica ilegalidade na liquidação da tarifa de ligação de esgotos, fixada, ao abrigo da alteração o art. 76°do RGCECL, na redacção que lhe introduziu o Edital n° 60/90, de 7/8/90, em 0.7% do valor patrimonial do prédio, pois que, pese embora o anteriormente disposto no art. 11º do DL n° 31.674, tal alteração cai no âmbito das competências da Assembleia Municipal, nos termos dos arts. 4º n° 1 al. h) e 12° da Lei das Finanças Locais e 39° do DL n° 100/84, de 29/3 e que a definição do preço ou tarifa da taxa é da competência da CML, «ex vi» do art. 51°, nº 1, al. p) do mesmo DL n° 100/84 e já que a fixação da mesma em 0.7% do valor patrimonial do prédio a cuja ligação se refere não é constitucionalmente desproporcionada (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido, em 9 de maio de 2000, no processo n.º 900/98); viii. Sendo que esta mesma jurisprudência é acompanhada pelo Supremo Tribunal Administrativo “II - A tarifa de ligação de esgotos representa a contrapartida pelo bem utilizado da ligação do prédio a uma rede de esgotos instalada. III - A tarifa fixada em 0,7% do valor patrimonial do prédio a cuja ligação se refere não é constitucionalmente desproporcionada. IV - As tarifas apenas estão sujeitas ao princípio de legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária.” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido, em 4 de fevereiro de 1998, no processo n.° 021513); ix. Aliás, no que respeita à alegada violação do princípio da proporcionalidade é evidente que não se afigura desproporcional liquidar uma Tarifa de Ligação de Esgotos correspondente a 0,7 % do VPT quando o edifício em causa é um centro comercial composto por cinco pisos de estacionamento ao quando afluem todos os dias milhares de pessoas e que possui um VPT que ascende a € 175.631.565,60 (cfr. fls. 1 a 15 do PAT, em confronto com fls. 223 a 318 dos autos); x. No que respeita à alegada desconformidade e, consequente, falta de fundamentação de da Tarifa de Ligação de Esgotos consagrada no Regulamento de Drenagem...

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