Acórdão nº 0441/16.1BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução30 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

O representante da Fazenda Pública interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 12 de Dezembro de 2018, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………….. e B……………… contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao exercício de 2007, no valor global de 613.879,56€, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo: I - Salvo o devido respeito que merecem as opiniões e a ciência do Tribunal “a quo”, entende a Recorrente que a douta sentença, proferida a 12/12/2018, no âmbito do processo de Impugnação Judicial acima identificado, e que considerou o pedido dos Impugnantes, ora Recorridos, totalmente procedente, não se pode manter na ordem jurídica.

II - A Recorrente não se conforma com a sentença em causa, na medida em que entende que a mesma padece de erro de julgamento, em matéria de direito, ao ter concluído, nomeadamente, que “Em suma, na base da liquidação impugnada encontra-se uma motivação de direito – inaplicabilidade do regime jurídico da neutralidade fiscal – que não é apta a sustentar a decisão em crise, não sendo externada qualquer outra, padecendo, por isso, a fundamentação adoptada da invocada insuficiência”.

III - Tal como (bem) consta da douta sentença aqui posta em crise, «Nos presentes autos, compulsado o relatório a que se alude em l) dos factos provados, extrai-se que “o que está em causa, no caso em apreço, é determinar se estão ou não reunidas todas as condições para a aplicação do designado regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 38º do CIRS”, tendo o mesmo concluído pelo incumprimento dos requisitos previstos no citado artigo».

IV - No caso que ora nos ocupa o objectivo visado pela exigência legal e constitucional de fundamentação foi plenamente atingido, tal como se alcança a partir da simples leitura do requerimento inicial que deu origem à instauração da reclamação graciosa a que se alude no ponto L) do probatório, e tal como se alcança, igualmente, a partir da simples leitura da petição inicial da presente impugnação judicial.

V - Ademais, encontra-se demonstrado à saciedade no “Relatório/Conclusões”, doravante abreviadamente designado “RIT”, a que se alude no ponto I) do probatório, as razões de facto e de direito que estiveram na base das correcções à matéria colectável aí efectuadas, ou seja, em suma, o não cumprimento por parte da Recorrida dos requisitos legais do regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 38.º do CIRS, tendo sido especificadas quais as alíneas da referida norma legal que não foram preenchidas, bem como os motivos pelos quais tal sucedeu.

VI - E, parece-nos não subsistirem dúvidas de que tal fundamentação foi correctamente percebida e apreendida, na sua plenitude, pelos Recorridos, ou não tivessem os mesmos começado a petição inicial da presente impugnação judicial exactamente pela defesa do preenchimento dos referidos requisitos no caso concreto.

VII - De igual modo, a nosso ver, também não assiste razão alguma à M.ma Juíza do Tribunal “a quo” quando refere que «(…) na base da liquidação impugnada encontra-se uma motivação de direito – inaplicabilidade do regime jurídico da neutralidade fiscal – que não é apta a sustentar a decisão em crise, não sendo externada qualquer outra, padecendo, por isso, a fundamentação adoptada da invocada insuficiência».

VIII - Na verdade, no caso em apreço, o que está em causa, essencialmente, é uma divergência entre os recorridos e a AT no que respeita à questão de se saber - tal como vem referido no item III.4 (“Verificação do cumprimento dos pressupostos legais subjacentes ao Regime de Neutralidade Fiscal”) do capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, - “se estão ou não reunidas todas as condições para a aplicação do designado regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 38º do CIRS”.

IX - No caso em apreço, os Recorridos pretenderam, ao enquadrarem a aludida transmissão de elementos patrimoniais da sua esfera empresarial privada para a esfera da sociedade “Farmácia das C…………. Unipessoal, Lda.” no regime de neutralidade fiscal previsto no artigo 38.º do CIRS, que tal transmissão de elementos patrimoniais não fosse objecto de tributação na sua esfera empresarial privada (em sede de IRS) no ano em que ocorreu tal transmissão (2007).

X - Tal como vem referido no item III.3 do capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, o designado regime de neutralidade fiscal, a que alude o artigo 38º do CIRS, foi criado pelo Decreto-Lei nº 280/95, de 26/10, e tal como consta do respectivo preâmbulo, teve por objectivo o seguinte (sublinhado e negrito nosso): “No âmbito da evolução normal das unidades económicas, muitas empresas em nome individual transformam-se em sociedades, no intuito de adoptar a estrutura jurídica que melhor corresponda às suas necessidades.

Quando existe uma continuidade económica, designadamente pelo facto de o empresário em nome individual continuar a deter a maioria do capital da nova sociedade e de a actividade a exercer se manter idêntica, justifica-se que aquela transformação não seja dificultada por razões fiscais, mas, pelo contrário, que seja instituído um regime de neutralidade fiscal.

Assim, respeitadas as condições que aconselham esse tratamento especial, difere-se a tributação, relativamente aos elementos patrimoniais transmitidos, para o momento ulterior da sua realização, acolhendo-se um regime semelhante ao já instituído para as fusões, cisões e entradas de activos”.

XI - Tal como vem igualmente referido no item III.3 do capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, o aludido objectivo foi materializado no artigo 38.º do CIRS e no artigo 77.º do CIRC (actual artigo 86.º do CIRC).

XII - Os pressupostos legais, de natureza material e formal, subjacentes ao regime da neutralidade fiscal, enunciados nas alíneas a), b), c), d, e e) do n.º 1 do artigo 38.º do CIRS, são de verificação cumulativa.

XIII - Ora, tal como resulta do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, e da prova documental aí referida, os aludidos pressupostos legais, subjacentes ao regime da neutralidade fiscal, enunciados nas alíneas a), b), c), d, e e) do nº 1 do artigo 38.º do CIRS, não se verificam, na sua totalidade, no caso concreto.

XIV - Desde logo, não se verifica o cumprimento, por parte da sociedade “Farmácia das C…………. Unipessoal, Lda.”, e por parte dos Recorridos, do pressuposto a que alude a alínea e) do n.º 1 do artigo 38.º do CIRS - (Pese embora no capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, não se faça alusão expressa à falta de cumprimento do pressuposto enunciado nesta alínea, o certo é que tal alusão é efectuada no capítulo IX do RIT – item “Da apreciação dos fundamentos”).

XV - Bem como não se verifica o cumprimento dos pressupostos a que aludem as alíneas c) e d) do nº 1 do artigo 38.º do CIRS.

XVI - Atento tudo o exposto, nomeadamente, nos itens 1. a 6. do capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, e uma vez ter-se concluído, tendo presente a operação aí analisada, não se encontrarem reunidas as condições legais para que os Recorridos pudessem beneficiar do regime da neutralidade fiscal, impunha-se concluir, como se concluiu no ponto 7. do capítulo III do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, que tal operação se subsume no regime geral do IRS, com as consequências legais aí melhor explicitadas.

XVII - Em suma, tal como nos parece decorrer do RIT, estamos perante um trespasse que os Recorridos pretenderam fazer com a sociedade “D………….. – Unipessoal, Lda.” e, para tal, decidiram constituir uma sociedade unipessoal que seria utilizada para tal fim, eventualmente, com a finalidade de diferir e atenuar no tempo o pagamento dos tributos que seriam devidos.

XVIII - No entanto, verifica-se que a utilização para tal fim da sociedade “Farmácia das C……………. Unipessoal, Lda.” não pode ser aceite por, tal como demonstrado, não cumprir os respectivos requisitos legais.

XIX - Assim, salvo o devido respeito por melhor entendimento, afigura-se-nos que, atenta a fundamentação jurídica e factual constante do RIT, a que se alude no ponto I) do probatório, dúvidas não...

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