Acórdão nº 01089/04.9BESNT 0600/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução27 de Novembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. METROPOLITANO DE LISBOA, E.P, vem interpor recurso de revista do acórdão do TCAS de 28 de fevereiro de 2018, _que concedeu parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto do acórdão do TAF de Sintra proferido em 14 de março de 2006, que havia mantido o despacho do Secretário de Estado dos Transportes de 22.03.2004, julgando improcedente a ação administrativa especial, movida em 16 de julho de 2004, por A………., contra o MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, TRANSPORTES E HABITAÇÃO e a ORA RECORRENTE, esta na qualidade contrainteressada, _ e que julgou a ação parcialmente procedente anulando o referido despacho.

    Nessa ação foi requerido, a final: - A declaração de nulidade ou anulado o despacho impugnado, que declarou a utilidade pública e tomada de posse administrativa imediata, no âmbito da expropriação de parcela de terreno do prédio misto, propriedade do então Autor, sito no Sítio ……….., …………, freguesia ………., concelho da Amadora, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Amadora sob o número 01621, de 23.09.2003 e inscrito na matriz predial urbana sob os art.s 158, 159, 160, 161, 162, 163, 164 e 632, e na matriz predial rústica sob o art. 299º da Secção 9.º; - A condenação dos RR. a adotar os atos e operações materiais necessárias à reconstituição da situação que existiria se o ato impugnado não tivesse sido praticado.

  2. Para tanto conclui as suas alegações da seguinte forma: " A. O presente recurso de revista deve ser admitido não só porque está em causa a apreciação de questões fundamentais em termos da sua relevância jurídica e social, como também porque estamos perante uma situação em que a relevância da questão impõe uma melhor aplicação do direito.

    1. É que na presente ação está em causa a delimitação de um dos direitos fundamentais da nossa sociedade, o direito de propriedade e a colisão de direitos no que se refere aos poderes públicos para a execução de obras públicas.

    2. Sendo que a ação incide ainda sobre um aspeto particular do direito de propriedade que se prende com os direitos e as limitações de utilização do subsolo por entidades públicas para a execução de obras subterrâneas.

    3. Por outro lado, a decisão recorrida baseou-se numa fundamentação que, para além de consubstanciar uma errada aplicação do direito, revela-se altamente lesiva do direito das entidades públicas utilizarem o subsolo dentro dos limites do direito de propriedade e da expropriação por utilidade pública.

    4. O processo expropriativo levado a cabo pela ora Recorrente não enferma de qualquer dos vícios que lhe são imputados pelo acórdão recorrido.

    5. Desde logo porque não se verificou qualquer ocupação ilegal da parcela por parte da Recorrente.

    6. Os factos provados que são referidos no acórdão recorrido para fundamentar a imputação de uma ilegalidade no comportamento da recorrente são patentemente contrariados pelos factos provados na ação, salientando-se os factos i) do qual resulta que a Contrainteressada passou a ocupar o terreno em março de 2002, o) do qual resulta que o Autor e a Contrainteressada logo desde o "Verão de 2002" iniciaram reuniões "para acordarem sobre a ocupação do terreno", p) do qual resulta que a Contrainteressada Metropolitano de Lisboa em 09.08.2002 enviou uma proposta de acordo ao Autor e y) do qual resulta que "em finais de outubro de 2003" o Autor solicitou à Contrainteressada a imediata suspensão da execução da obra.

    7. Analisados estes factos não se pode concluir que houve uma "apropriação irregular de um bem alheio" ou que a Recorrente "apropriou-se do terreno do ora Recorrente (Autor) fora de um procedimento expropriativo" e muito menos se pode "concluir pela ilicitude da conduta do ML e da correspondente culpa".

      I. Pelo contrário, tendo em consideração o facto i) e os factos o) e y), pode concluir-se que o Autor pelo menos entre "o Verão de 2002" e "finais de outubro de 2003", data em que expressamente manifestou a sua oposição à execução da obra no seu terreno, consentiu na ocupação da parcela expropriada por parte da Recorrente e negociou com esta os termos de um acordo relativo a essa ocupação.

    8. Acresce que a tentativa de celebração de um acordo previamente à expropriação, o que se pode designar por uma expropriação amigável constitui uma obrigação legal da entidade expropriante que a Recorrente cumpriu.

    9. Por outro lado, não existe qualquer proibição ou impedimento legal para que a entidade expropriante, possa ocupar desde logo a parcela a expropriar para dar início à execução da obra se o proprietário o autorizar.

      L. É certo que no facto k) ficou provado que a Contrainteressada aquando da ocupação da parcela que ocorreu em março de 2002, não estava "munida de qualquer autorização por parte dos legítimos proprietários", no entanto, resulta dos autos que decorreu um longo período em que diversos herdeiros discutiram entre si a propriedade da parcela expropriada.

    10. Tal resulta, por exemplo, do facto n) no qual se dá como provado que "a Contrainteressada foi informada pelo mandatário do herdeiro B………. de que este deixou de deter quaisquer direitos sobre o terreno".

    11. Face aos factos provados terá de se concluir que, não obstante a não existência de uma autorização formal, os herdeiros ou algum dos herdeiros e também o Autor, terão consentido expressa ou tacitamente na ocupação da parcela pela Recorrente.

    12. Aliás, a folhas 46 do Acórdão recorrido pode ler-se que o Tribunal a quo refere expressamente que “dos autos resulta que o A. terá consentido uma ocupação do terreno para estaleiro, o que é também indicado pelas referidas testemunhas", pelo que não se poderá deixar de concluir que o Tribunal a quo reconhece expressamente que a Contrainteressada estava autorizada a ocupar a parcela expropriada e que a conclusão do acórdão recorrido que a Recorrente ocupou ilegalmente a parcela traduz um erro de julgamento.

    13. Outra das questões colocadas pelo acórdão recorrido prende-se com essa autorização concedida que, refere o aresto, terá sido concedida para estaleiro, resultando do acórdão que o tribunal a quo fez uma interpretação restritiva, senão mesmo errada deste conceito, o que consubstancia igualmente um erro de julgamento.

    14. De facto, o Tribunal entendeu que a autorização para estaleiro referia-se apenas à realização de atividades de apoio à obra e não incluía uma autorização para executar os trabalhos da empreitada, o que contraria a noção legal de estaleiro.

    15. De facto, o n.º 5 do artigo 24.º do Decreto Lei n.º 59/99, de 2 de março define estaleiro como "o local onde se efetuam os trabalhos, bem como os locais onde se desenvolvem atividades de apoio direto à obra" (sublinhado nosso).

    16. Resulta, portanto, da definição legal de estaleiro, que este integra duas finalidades, a execução de trabalhos da empreitada e a execução de atividades de apoio direto à obra.

    17. Acresce que da leitura dos factos provados não se pode concluir de forma alguma que a autorização para a montagem do estaleiro na parcela não abrangia o consentimento para a execução de todas as atividades contidas na definição legal de estaleiro.

    18. Pelo que quando o tribunal a quo considera que terá havido uma autorização para instalação de estaleiro e não para a execução da obra, labora num manifesto erro de julgamento, que contraria o próprio conceito legal em causa.

      V. Acresce que esta interpretação do Tribunal a quo contraria frontalmente o disposto no facto provado y) no qual se refere que "o Autor solicitou à Recorrente a imediata suspensão da obra - acordo", uma vez que, se o Autor comunicou à Recorrente que pretendia a imediata suspensão da execução da obra, é porque o mesmo tinha conhecimento que a Recorrente estava a executar uma obra na parcela sem qualquer oposição da sua parte.

    19. Assim, encontra-se provado que a ocupação da parcela por parte da Recorrente não foi ilícita e que a expropriada ora Recorrente executou as obras na parcela expropriada com o consentimento do expropriado pelo menos até outubro de 2003.

      X. Esta conclusão prejudica outros dos vícios erradamente imputados pelo tribunal a quo ao despacho da DUP, o qual se traduz na conclusão de que a Recorrente desencadeou o processo expropriativo para legalizar uma apropriação ilícita do terreno do Autor.

    20. De facto, da matéria de facto provada tem de concluir-se que a Recorrente deu início à tentativa de aquisição da parcela através do direito privado e que tal aquisição não foi possível por não se ter alcançado um acordo.

    21. Pelo que, cumprido este requisito legal e esgotadas que foram todas as possibilidades de celebrar um acordo amigável com o Autor com vista à aquisição da parcela, a Recorrente iniciou os procedimentos com vista à expropriação da parcela por utilidade pública.

      AA. Considerar que o despacho anulado foi proferido para legalizar uma ocupação ilícita da parcela, face à matéria de facto provada consubstancia um manifesto erro de julgamento.

      BB. O acórdão recorrido conclui também que a expropriação da parcela do Autor violou o princípio da proporcionalidade, designadamente porque a Recorrente não ponderou o recurso a outras soluções para além da expropriação da propriedade do imóvel que, designadamente, "permitissem a desapropriação apenas do subsolo do imóvel" e, nessa medida "terá violado o princípio da proporcionalidade enquanto proibição de excesso".

      CC. A imputação deste vício ao despacho traduz igualmente um erro de julgamento.

      DD. A Recorrente promoveu a expropriação da parcela para aí instalar um estaleiro com vista à construção de um túnel de metropolitano e de outras infraestruturas de apoio ao mesmo.

      EE. Para o efeito, a Recorrente ocupou o terreno, procedeu a várias demolições e escavações para a construção da referida obra pública, sendo que a ocupação do terreno e posteriormente a sua expropriação foram essenciais para a execução de todos os trabalhos de construção desta obra pública.

      FF. O Tribunal a quo considerou que teria bastado à Recorrente a "expropriação" do subsolo, ou mais concretamente do direito de...

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