Acórdão nº 0552/16.3BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | JOSÉ GOMES CORREIA |
Data da Resolução | 04 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.
A Autoridade Tributária e Aduaneira, interpõe recurso do despacho proferido no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em 11/10/2018, que rejeitou a reclamação que aquela entidade deduzira da nota justificativa e discriminativa de custas de parte.
1.1.
Apresentou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “
-
Foi o Director de Finanças de Leiria notificado, em 2018/08/10, do pedido de pagamento de Custas de Parte, no valor de €3.264,00, referente aos honorários e taxa de justiça suportada em 1ª Instância pela sociedade A………., Lda, no âmbito do processo de Impugnação Judicial que correu seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria sob o n° 552/16.3BELRA-2ªUO, cuja sentença havia transitado em julgado em 29/01/2018.
-
A RFP, não aceitando o pagamento que veio assim solicitado, em tempo, lançou mão do único mecanismo legal que lhe permitia discutir o aludido pedido, mediante a apresentação da Reclamação da Nota Justificativa e Discriminativa de Custas de Parte, ao abrigo dos artigos 25° e 26° do RCP e o artigo 33° da Portaria n° 419- A/2009, de 17/4bril.
-
A Mma Juiz a quo rejeitou tal Reclamação, dizendo que “não tendo a referida nota justificativa sido remetida a este Tribunal, não pode considerar-se desencadeado, no âmbito do próprio processo a que respeitam as custas, o incidente cuja apresentação tem os pressupostos estabelecidos no n° 1 do artigo 25° do RCP, por ausência de verificação desses mesmos pressupostos”.
-
O pedido que veio formulado só podia encontrar o seu respaldo legal nos artigos 25° e 26° do Regulamento das Custas Processuais (RCP), dado que no seu introito referia pretender “(...) apresentar Nota Discriminativa e Justificativa de Custas de Parte (…)”.
-
O aludido requerimento não observou o prazo legalmente estabelecido para a sua legal apresentação junto da Representante da Fazenda Pública, não observando o prazo legal de 5 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença, para solicitar o pagamento de custas de parte — art. 25°/1 do RCP.
-
O chamamento da parte obrigada ao pagamento das custas de parte dentro do prazo legalmente estabelecido resulta absolutamente necessária, sob pena de caducidade do direito a obter tal reembolso — artigo 298°/2 do Código Civil.
-
Caducidade do direito que, clara, expressa e tempestivamente, se invocou junto do Mmo Juiz a quo — artigo 303° do Código Civil.
-
Tal entendimento encontra suporte na Doutrina e Jurisprudência firmadas.
-
Veja-se o Parecer de Salvador da Costa, de Maio de 2018, em sede do qual se conclui “1. A omissão da parte credora de custas de parte de remeter à parte devedora, no quinquídeo previsto no artigo 25°, n° 1 do regulamento das Custas processuais, impede a relevante exigência do crédito à última pela primeira no âmbito do processo da acção declarativa ou, fora dele, em qualquer espécie de acção. (…)”.
-
E, com a devida vénia, ainda o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19/02/2014, proferido no processo 269/10.2TAMTS-B.P1: “I — A caducidade, se estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente.
II — O pagamento de custas de parte é matéria que está na inteira disponibilidade das partes, excluindo a natureza oficiosa do seu funcionamento.
III — O requerimento, a solicitar o pagamento de custas de parte, deve ser apresentado no prazo previsto no art.° 25° do RCP.” K) E também os Acórdãos da Relação de Lisboa datado de 7/10/2015, processo 4470/11.3DLSB 1.L1-3 e da Relação de Coimbra de 8/03/2016, processo 224/09.5TBCBR.
-
Tendo a Sentença proferida nos autos de Impugnação Judicial transitado em julgado em 29/01/2018, o terminus do prazo para solicitação do pagamento das custas de parte devidas, no limite, situou-se em 05/02/2018, pelo que, em 10/08/2018, o pedido de Custas de Parte era manifestamente extemporâneo, com a consequente caducidade do correspondente direito.
-
Constituindo o pedido de reembolso e de pagamento das custas de parte matéria na total disponibilidade das partes envolvidas, dado que o credor pode, ou não, solicitar o seu reembolso à parte contrária, e esta pode conformar-se com o solicitado pagamento ou opor-se ao mesmo, mediante fundada Reclamação, sempre o credor tem de exercer o seu direito dentro do prazo legalmente cominado, sob pena de extinção do direito de praticar o acto — artigos 298°/2 do Código Civil e 139°/3 do Código de Processo Civil (CPC).
-
E assim, não tendo interpelado tempestivamente a Fazenda Pública para o pagamento das custas de parte, o requerimento apresentado constitui acto inútil para o fim que visa.
-
Qualquer outra interpretação, nomeadamente aquela sufragada pelo Despacho sob recurso, ofende o Princípio da Segurança Jurídica e o quadro legal aplicável, verificando-se erro de julgamento consubstanciado na deficiente e desacertada interpretação dos artigos 25° e 26° do RCP, artigos 298°/2 e 303° do Código Civil e artigo 139°/3 do CPC., pelo que o Despacho recorrido não deve manter-se.
Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Exas, deverá ser concedido provimento ao presente, com o que se fará como sempre JUSTIÇA.” 1.2.
Não foram produzidas contra-alegações.
1.3.
O magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer: “1. O recurso da decisão da nota justificativa e discriminativa de custas de parte não é admissível, porque o valor da nota (€3 264,00) é inferior a 50 UC, equivalente a €5 100 [50 UC x €102 = €5100] (art. 33° n° 3 Portaria n° 419-A/2009, 17 abril; art.22° DL n° 34/2008, 26 fevereiro.) 2. Sem prescindir A omissão de envio da nota ao tribunal e o seu envio à parte vencida após o termo do prazo legal (cinco dias após o trânsito em julgado da sentença) constituem pressupostos impeditivos da relevante exigência do crédito, designadamente por via da instauração de execução pelo Ministério Público para cobrança coerciva (arts. 25° n° 1 e 35° n° 1 RCP; cf. jurisprudência e doutrina citadas nas conclusões H)/K) das alegações).” 1.4.
A recorrida A………………., Lda.
, melhor identificada nos autos, veio pronunciar-se nos termos que se seguem: “1. No parecer emitido, o Digno Magistrado do Ministério Público começa por referir que a decisão de indeferimento da reclamação apresentada pela Fazenda Pública não admite recurso «porque o valor da nota (€ 3 264,00) é inferior a 50 UC, equivalente a € 5 100 [50 UC X € 102 = € 5100] (art. 33° n° 3 Portaria n° 419-A/2009, 17 abril; art. 22° DL n° 34/2008, 26 fevereiro)».
-
Neste contexto, importa desde logo sublinhar que a missiva apresentada não configura uma nota discriminativa e justificativa de custas de parte elaborada nos termos dos artigos 25.º e 26.º do Regulamento das Custas Processuais (“RCP”), mas antes uma interpelação para pagamento do montante devido pela Recorrente, na qualidade de parte vencida, a título de custas de parte, elaborada ao abrigo do artigo 716.° do Código de Processo Civil (“CPC”).
-
Saliente-se, aliás, que tal resulta inequivocamente da própria missiva apresentada: «As custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas devendo ser pagas directamente pela parte vencida à parte que delas seja credora, isto é, à parte vencedora. Assim, tendo a Fazenda Pública sido condenada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria no pagamento da totalidade das custas judiciais, vem a Requerente, para efeitos do disposto no artigo 716.°. n.° 1. do Código de Processo Civil, tornar líquida a quantia em dívida» [sublinhados nossos] 4. Por outras palavras, a Recorrida, através da missiva apresentada, visou tornar líquida a quantia devida pela Recorrente a título de custas de parte e, dessa forma, garantir o recurso à via executiva para satisfação do seu direito de crédito caso esta não procedesse voluntariamente ao referido pagamento.
-
Assim sendo, a referida carta de interpelação não admite reclamação ao abrigo do artigo 33.°, n.°1, da Portaria n.° 419-A/2009, de 17 de Abril.
-
Em todo o caso, mesmo que assim não se considere e se enquadre a missiva apresentada no regime ínsito nos artigos 25.º e 26.° do RCP, necessariamente se concluirá, em conformidade com o parecer emitido, pela irrecorribilidade da decisão em crise, uma vez que, nos termos do artigo 33.º, n.° 3, da Portaria n.° 419-A/2009, de 17 de Abril, as decisões de reclamações de notas discriminativas e justificativas de custas de parte apenas são recorríveis caso o valor reclamado exceda 50 UC, i.e., EUR 5.100,00.
-
Em face do exposto, tendo a Recorrida apresentado uma carta de interpelação para pagamento do montante de EUR 3.264,00 a título de custas de parte, e independentemente de se enquadrar ou não a mesma no regime previsto nos artigos 25.° e 26.º do RCP, sempre se concluirá pela inadmissibilidade do presente recurso, seja porque a missiva apresentada não admitia sequer reclamação ao abrigo do disposto no artigo 33.°, n.° 1, da Portaria n.° 419-A/2009, de 17 de Abril, seja porque a nota reclamada não excedia 50 UC (cfr. artigo 33.º, n.° 3, da mesma Portaria).
-
Por outro lado, refere o Digno Magistrado do Ministério Público que «a omissão de envio da nota ao tribunal e o seu envio à parte vencida após o termo do prazo legal (cinco dias após o trânsito em julgado da sentença) constituem pressupostos impeditivos da relevante exigência do crédito».
-
Ou seja, o Digno Magistrado do Ministério Público parece considerar que o direito da Recorrida ao pagamento das custas de parte se extinguiu pelo decurso do tempo, em virtude do seu não exercício dentro do prazo de cinco dias após o trânsito em julgado da sentença, previsto no artigo 25.º, n.° 1, do RCP.
-
Ora, contrariamente a tal entendimento, a não apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte no prazo previsto no artigo 25.°, n.° 1, do RCP não preclude o direito da parte vencedora ao seu pagamento pela parte vencida, uma vez...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO