Acórdão nº 02273/16.8BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

*** Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo, com sede em Lisboa; I A A……………., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida, no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, em 21 de dezembro de 2018, que julgou improcedente a impugnação judicial dirigida a questionar o indeferimento de processos de revisão oficiosa, que versaram autoliquidações, de Contribuição sobre o Setor Bancário (CsSB), referentes aos anos de 2012 e 2013.

A recorrente (Rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: « 1.ª A douta sentença recorrida julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida pelo ora Recorrente relativa aos atos de autoliquidação CESB 2012 e 2013; 2.ª Considera o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito na qualificação do tributo como contribuição financeira; 3.ª A evolução de regime jurídico de tributação sectorial da Banca em Portugal foi a seguinte: em 2011 e 2012 vigorou no nosso ordenamento um regime extraordinário de tributação do sector bancário, a CESB, cuja afetação de receita foram as despesas estaduais gerais; em 2013 e 2014, vigoraram em paralelo dois regimes distintos de contribuições sobre o sector bancário: (i) a CESB, cuja afetação de receita foram as despesas estaduais gerais tal como previsto na lei orçamental, e (ii) as contribuições para o Fundo de Resolução (iniciais, periódicas e especiais), àquele efetiva e diretamente destinadas; a partir de 2015, inclusive, vigoram em paralelo três regimes de contribuições sobre o sector bancário: (i) a CESB, cuja afetação de receita foram as despesas estaduais gerais tal como previsto na lei orçamental, (ii) as contribuições para o Fundo de Resolução (iniciais, periódicas e especiais), àquele efetiva e diretamente destinadas, e (iii) as contribuições comunitárias cobradas pelo Fundo de Resolução; 4.ª Sustenta o Recorrente que apenas as contribuições para o Fundo de Resolução (contribuições dos participantes, iniciais, periódicas e especiais) e as contribuições comunitárias (ex ante e ex post), pela sua estrutura, pressuposto e desígnio, são verdadeiras contribuições, não assim a CESB; 5.ª De acordo com o Tribunal a quo, a criação do Fundo de Resolução e a afetação de receitas a esta entidade assumiria uma relevância determinante para a qualificação do tributo como contribuição; 6.ª Contudo, no que concerne a CESB 2012, inexistindo qualquer afetação da correspondente receita, revela-se erróneo aludir à posterior existência do Fundo de Resolução; 7.ª No que concerne a CESB 2013, inexistiu uma afetação da correspondente receita ao Fundo de Resolução; 8.ª O artigo 153.°-F do RGICSF foi então derrogado pelas Leis do Orçamento do Estado, que destinaram a receita do imposto às despesas estaduais gerais; 9.ª Por outro lado, a transferência prevista na Lei n.° 75-A/2014, após a aplicação de uma medida de resolução, é irrelevante para efeitos da qualificação jurídica do tributo pois aquela transferência de receita, quando já há muito estava extinta a obrigação tributária, não é passível de desvirtuar a posteriori a natureza do imposto no que concerne à CESB 2013; 10.ª No âmbito da caracterização da natureza do tributo, também não releva a finalidade alegada pelo legislador de prevenção de riscos sistémicos; 11.ª Não se pode concluir por um perfil preventivo do tributo pela simples circunstância da incidência objetiva da CESB sobre o passivo pois a atividade bancária consiste, por natureza e definição, na receção de depósitos do público para a concessão de crédito, o que significa que a assunção de passivos é-lhe intrínseca; 12.ª O regime da CESB prevê uma incidência objetiva sobre o passivo de toda a espécie em balanço, não operando distinções em relação ao tipo de passivo e não atendendo ao perfil de risco das instituições de crédito, diferentemente das demais contribuições setoriais; 13.ª A base de incidência residual do tributo — instrumentos financeiros derivados — tão-pouco traduz uma dissuasão de comportamento avesso ao risco porquanto os instrumentos financeiros derivados têm, muito frequentemente, uma função de cobertura do risco e não especulativa e o facto de a lei desatender à função do instrumento (diferentemente da base de incidência da contribuição comunitária) revela a ausência, também aqui, de desígnio dissuasivo de comportamentos; 14.ª O desígnio primordial da CESB é o financeiro e não a prevenção de comportamentos, desde logo porque o imposto extraordinário, avulso e temporário aqui em causa, sempre foi exógeno (aplicado a uma realidade posteriormente a ela se ter verificado, sem que o sujeito passivo possa adequar a sua atuação); 15.ª Porém, mesmo que os fins da extrafiscalidade estivessem de facto presentes na CESB, tal natureza pigouviana do imposto mais reforçaria a correspondente natureza fiscal, e não a natureza de contribuição; 16.ª Assente que para a CESB 2012 e CESB 2013, aquando da sua génese, é indiferente em absoluto o Fundo de Resolução, então apenas resta o teste da “estrutura” do tributo para aferir da natureza unilateral ou bilateral da CESB; 17.ª Não é possível identificar na CESB a contraprestação de uma prestação pública específica porquanto: (i) a intervenção estatal para resgate de um banco, na era pré-resolução, não é juridicamente uma prestação que se possa dizer, com certeza, segura, e (ii) a estrutura do tributo, no caso particular da CESB 2012 e 2013, não reflete uma comparticipação nos potenciais encargos estatais com uma futura intervenção pública no sector bancário; 18.ª Diferentemente das posteriores contribuições para o Fundo de Resolução ou diferentemente das contribuições comunitárias, não existe na CESB qualquer pretensão de onerar em função de uma prestação pública específica, não existe qualquer pretensão de onerar em função do risco; 19.ª Em suma, desassociando a CESB daquilo que lhe não está associado (a criação e funções do Fundo de Resolução), como se impõe que se faça em termos jurídicos, não pode senão concluir-se que não é contrapartida de nenhuma prestação pública específica, mas antes se qualifica como imposto (tal como classificada pelo legislador orçamental); 20.ª No que concerne a violação do princípio da legalidade, considerou o Tribunal recorrido que os referidos normativos não violam o princípio da legalidade fiscal consagrado nos artigos 103°, n.° 2, e 165.°, n.° 1, alínea i), da CRP; 21.ª O Tribunal a quo assenta a sua conclusão no pressuposto de que a CESB tem a natureza de contribuição financeira e, como tal, não estava sujeita a uma reserva integral de lei; 22.ª Discorda o Recorrente de tal entendimento, desde logo, por considerar que, enquanto o legislador não aprovar o regime geral das contribuições financeiras, elas deverão seguir o regime jurídico dos impostos, quando o sujeito passivo não aufira um benefício individualizado; 23.ª Em todo o caso, não assiste razão ao Tribunal recorrido atendendo a que o tributo em análise tem a natureza de imposto, como tal sujeito à reserva integral de lei; 24.ª Cumpre notar que a regulamentação da Portaria não se limita a densificar os conceitos da base objetiva do imposto, alterando-a; 25.ª Acresce que não existe nenhuma justificação atendível constitucionalmente na situação dos autos para a não fixação da taxa, para além da falta dos «critérios de decisão normativa a ter em conta na fixação efectiva da taxa do imposto» (cf. Acórdão n.° 70/2004 do Tribunal Constitucional), no fundo, os critérios reveladores da justificação legítima para a não fixação imediata da taxa; 26.ª São, pois, materialmente inconstitucionais os normativos dos artigos 3.°, 4.° e 8.° do regime da contribuição sobre o sector bancário, na medida em que os mesmos não definem, como se impõe na lei constitucional, todos os aspetos essenciais do imposto, designadamente a incidência objetiva do imposto e a taxa, como também são organicamente inconstitucionais os normativos dos artigos 4.° e 5.° da Portaria n.° 121/2011, na medida em que o primeiro inova sobre a base de incidência objetiva de um imposto e o segundo fixa arbitrariamente a taxa do imposto; 27.ª A respeito da violação do princípio da igualdade, entendeu o Tribunal a quo que à CESB, porque se trata de verdadeira contribuição, regida pelo princípio da equivalência, não tem porque aplicar-se o princípio da capacidade contributiva enquanto critério uniforme de tributação; 28.ª Entende o Impugnante que, face ao carácter meramente financeiro da CESB, a qual visa aumentar a carga tributária do sector para, alegadamente, nivelá-la com a dos demais contribuintes, encerra arbítrio aplicar este adicional de imposto de acordo com um critério distinto do aplicável aos demais contribuintes e não coincidente com o da capacidade contributiva; 29.ª Como refere o Tribunal Constitucional, não pode uma determinada norma colher legitimidade e justificação na ‘ do objetivo de reforma do sistema e, simultaneamente, configurar-se como uma medida extraordinária e de vigência transitória (cf. Acórdão n.° 862/2013, de 19 de dezembro de 2013); 30.ª A igualdade na distribuição dos sacrifícios exigiria, no entender do Recorrente, que os impostos extraordinários, os adicionais, as derramas ou sobretaxas especiais, se aplicassem a todos de acordo com a capacidade contributiva; 31.ª A CESB, desrespeitando a generalidade e o critério da capacidade contributiva ao qual todos os impostos devem obedecer, é inconstitucional por violação do princípio da igualdade fiscal resultante do artigo 13.° da CRP; 32.ª Por último, ainda que se classificasse a CESB como uma verdadeira contribuição, no que não se concede, sempre esta incorreria em violação do princípio da equivalência; 33.ª Sendo verdadeira contribuição, impunha-se que houvesse uma relação entre o tributo e a prestação estadual provável, designadamente modulando a carga tributária em função dos maiores ou menores riscos, tal como sucede nas demais figuras tributárias específicas do sector bancário; 34.ª A CESB é...

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