Acórdão nº 0122/14.0BEFUN de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução05 de Março de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA [RAM] interpõe recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [TCAS], de 26.09.2019, que, confirmando a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal [TAF/F], julgou procedente a acção de contencioso pré-contratual na qual foi demandada pela B…………., S.A.

    [a que sucedeu a agora recorrida A…………, S.A.], peticionando que fosse determinada a ilegalidade das cláusulas 5ª, nº1, e 23ª, ambas do Caderno de Encargos, e a consequente anulação do concurso público internacional em causa - nºCP03/SRF-DRI/2014 para Estabelecimento de uma Rede de Comunicações Privativa do Governo Regional da Madeira, no âmbito do Projecto EGOV@Madeira [Anúncio nº1532/2014, publicado na II série, nº57, de 21.03] - indicando como «contra-interessadas» C………….

    , S.A., D…………, S.A.

    , E……… TV CABO MADEIRENSE, S.A.

    , E……….

    MULTIMÉDIA - Serviços de Telecomunicações e Multimédia, SGPS, S.A., e F…………, Lda.

    Na pendência dos autos foi adjudicado o objecto do concurso, e celebrado o respectivo contrato, entre a RAM e a F…………., tendo sido requerida, e admitida, a «ampliação do objecto da acção» à impugnação desse contrato celebrado.

    A recorrente RAM culmina assim as suas alegações de revista: 1- Este caso configura uma das raras situações em que a admissão do recurso excepcional de revista se justifica com fundamento nas várias alternativas activas previstas nas alíneas do nº1 do artigo 150º do CPTA; 2- Desde logo, o elevado valor do contrato em causa, que ascende a 4.326.272,00€; 3- A decisão a proferir, considerando o objecto do contrato em causa, mostra-se de importância fundamental, atenta a criticidade da rede de comunicações privativa do Governo Regional, bem como das ferramentas que nela assentam para a actividade da administração pública regional e respectiva racionalidade e eficiência; 4- O impacto da decisão, poderá determinar a interrupção das prestações do contrato, o que terá por efeito paralisar a actividade da Administração Pública Regional por período de tempo indeterminado, até ser aprovado, e adjudicado, outro procedimento pré-contratual com idêntico objecto; 5- A decisão a proferir é susceptível de conduzir à aplicação de correcções financeiras, as quais podem implicar a necessidade de reposição do financiamento europeu concedido, como resulta do artigo Regulamento UE nº1303/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17.12.2013, bem como da Decisão da Comissão de 19.12.2013 - relativa à definição e à aprovação das orientações para a determinação das correcções financeiras a introduzir nas despesas financiadas pela União no âmbito da gestão partilhada, em caso de incumprimento das regras em matéria de contratos públicos; 6- O potencial impacto da decisão dos autos nas vertentes explanadas constitui um indício da especial relevância social das questões emergentes, que justificam plenamente a intervenção do mais alto Tribunal da jurisdição administrativa; 7- Também as questões jurídicas suscitadas são de grande importância; 8- Com efeito, a amplitude dos poderes do tribunal no que se refere ao controlo da decisão de estabelecer uma duração do contrato superior a 3 anos, admitida expressamente nos artigos 48º e 440º do CCP, por um lado, e o grau de exigência que a fundamentação dessa opção deve revestir, por outro, são questões fundamentais que se colocam com grande frequência e com acuidade em sede de procedimentos de contratação pública; 9- Há ainda outra questão, igualmente importante, que diz respeito à interpretação do juízo de invalidade derivada do contrato face a acto procedimental antecedente, prevista no artigo 283º, mais precisamente se deve ser automático, ou pelo contrário exigir que o vício em que incorreu o acto haja tido influência efectiva no conteúdo essencial do contrato [objecto e identidade do co-contratante]; 10- E por fim a boa interpretação do artigo 283º, nº4, do CCP, referente ao afastamento do efeito anulatório, mais precisamente quando esteja em causa um vício meramente formal e o contrato se ache executado em medida relevante; 11- As questões jurídicas suscitadas são, pois, estruturantes na área da contratação pública e são susceptíveis de se repetir com frequência perante os tribunais administrativos, pelo que se justifica plenamente a intervenção do mais alto tribunal da jurisdição, como meio adequado à fixação de orientações interpretativas destes institutos; 12- Por último, importa referir que o tribunal «a quo», cometeu erro grave na decisão proferida sobre o afastamento do efeito anulatório, ignorando aspectos fundamentais, como a criticidade do objecto do contrato, o impacto da anulação, e o facto de o contrato ter sido celebrado há mais 5 anos, exigindo-se, assim, a admissão do recurso para assegurar a melhor aplicação do direito; 13- O artigo 440º, nº1, do CCP, confere à Administração margem de livre decisão quanto ao juízo relativo à necessidade ou conveniência de fixação de prazo contratual superior a 3 anos, em função da natureza das prestações objecto do contrato ou das condições da sua execução; 14- Trata-se, portanto, de um juízo de mérito ou de conveniência próprio e reservado da função administrativa e insindicável em sede de controlo jurisdicional; 15- Ao contrário do dito no acórdão recorrido, a fundamentação expendida no procedimento para a fixação do prazo contratual superior a 3 anos não é, de forma alguma, vaga e genérica, mas antes claramente suficiente; 16- Como é evidente, ao contrário do que pressupõe o acórdão recorrido, a fundamentação exigida no artigo 48º do CCP não obriga a entidade adjudicante a verter no conteúdo das peças do procedimento administrativo qualquer estudo económico financeiro, nem tão pouco análises técnicas relativas à depreciação e amortização dos equipamentos ou declarações de técnicos ou peritos da especialidade ou de entidades independentes; 17- Sendo tais exigências desproporcionadas, desrazoáveis e destituídas de fundamento legal; 18- A fundamentação suficiente basta-se com a enunciação sumária dos motivos subjacentes ao juízo [de mérito] da entidade adjudicante relativo à necessidade ou conveniência de fixação de um determinado prazo contratual, de molde a permitir a um destinatário normal apreender as razões por trás de tal decisão; 19- E esses estão, indiscutivelmente, contidos na deliberação da entidade demandada; 20- Ao assim não entender, a decisão reclamada enferma de erro de julgamento, violando os artigos 48º e 440º, nº1, do CCP; 21- Ao contrário do decidido no acórdão recorrido, a invalidade derivada do contrato não opera de forma automática, apenas porque um acto que o antecedeu cronologicamente está eivado de um qualquer vício; 22- Pelo contrário, para que a invalidade do acto contamine o contrato é imprescindível poder concluir-se, com segurança, que o vício em que aquele incorreu condicionou decisivamente o conteúdo essencial do contrato, seja no que diz respeito ao objecto, seja no que diz respeito à identidade do co-contratante; 23- Ao dar por adquirida - de modo acrítico e automático - a invalidade derivada do contrato, quando no caso dos autos o vício do acto procedimental é meramente formal [eficiente fundamentação da duração contrato] e não teve qualquer influência no objecto do contrato, nem na selecção do co-contratante, o acórdão recorrido viola o artigo 283º, nº2, do CCP; 24- Caso o vício imputado ao acto de adjudicação não tivesse ocorrido, e a informação de abertura do procedimento contivesse fundamentação exaustiva e pormenorizada [ilegalmente] exigida pelo tribunal «a quo» para a justificação da duração do contrato, fixada no Caderno de Encargos, o contrato teria exactamente o mesmo conteúdo e teria sido celebrado exactamente com o mesmo co-contratante; 25- Assim, não há como não concluir que está inequivocamente demonstrado que o vício não implicaria modificação...

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