Acórdão nº 01339/18.4BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelADRIANO CUNHA
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1. “B………, SA” intentou contra “TURISMO DE PORTUGAL, IP” e a Contrainteressada “A………., SA” ação de contencioso pré-contratual onde peticionou: «

  1. Ser determinada a exclusão do concorrente “A……….

”; e, B) Ser anulado o Relatório Final, no que respeita à decisão de exclusão da ora A. do procedimento concursal, bem como todos os actos subsequentes do concurso, designadamente, a decisão de adjudicação a favor da Concorrente ora Contra-interessada; ou caso assim não se entenda, C) Ser o Relatório Final anulado, por ilegalidade, e declarada a insanável nulidade do presente procedimento concursal».

  1. Por sentença do TAC de Lisboa de 4/5/2019 (cfr. fls. 1050 e segs. SITAF) foi a ação julgada improcedente. E considerou, em consequência, prejudicado o pedido de levantamento do efeito suspensivo deduzido, a título incidental, pela Entidade Demandada “Turismo de Portugal”.

  2. Inconformada com esta sentença, a Autora “B………” interpôs recurso de apelação para o Tribunal Central Administrativo Sul na parte em que aquela sentença manteve a admissão da proposta da Contrainteressada “A……….” e decidiu sobre a legalidade do procedimento pré-contratual.

  3. A Entidade Demandada “Turismo de Portugal” interpôs recurso subordinado da sentença relativamente à parte em que esta julgou prejudicado o seu pedido de levantamento do efeito suspensivo automático.

  4. Por Acórdão de 7/11/2019 (cfr. fls. 1257 e segs. SITAF), o TCAS concedeu provimento ao recurso interposto pela Autora “B………”, revogou a sentença recorrida e julgou a ação procedente, anulando o ato impugnado por ilegalidade na admissão da proposta apresentada pela Contrainteressada “A………”, por se encontrar impedida de participar no concurso e por violação dos princípios da imparcialidade, da isenção, da concorrência, da boa-fé, da tutela da confiança, da transparência, da igualdade de tratamento e da não discriminação; e negou provimento ao recurso subordinado interposto pela Entidade Demandada, por não provados os seus respetivos fundamentos, mantendo o efeito suspensivo automático decorrente da interposição da ação de contencioso pré-contratual.

  5. Agora inconformadas com este julgamento do TCAS, vieram a Entidade Demandada “Turismo de Portugal” e a Contrainteressada “A………” interpor os presentes recursos de revista para este Supremo Tribunal Administrativo.

  6. A Entidade Demandada “Turismo de Portugal” terminou as alegações do recurso de revista que interpôs com as seguintes conclusões (cfr. fls. 1324 e segs. SITAF): «1º- Previamente, e porquanto os presentes autos não apresentam especial complexidade, não tendo, por isso, importado um acréscimo excecional de trabalho para o tribunal, uma vez que os autos apresentam uma tramitação simples, além de que, as questões de direito colocadas neste processo são de relativa simplicidade e, bem assim, se verifica que a conduta das partes se desenrolou na mais completa normalidade, deve ser determinada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6.º, nº 7 do Regulamento das Custas Processuais.

    1. - Depois, e cuidando o interesse público em presença nestes autos, alicerçado na participação do Turismo de Portugal, ora Recorrente, nas feiras nacionais e internacionais de turismo, para representação não apenas do país, como das empresas portuguesas, o qual se encontra sem qualquer proteção jurídica desde que foi proposta a ação, impõe-se, preliminarmente, a este Supremo Tribunal determinar o levantamento do efeito suspensivo automático do ato impugnado, incidente que ainda não pôde ser conhecido por via dos erros de julgamento que sobre ele já recaíram.

    2. - Posto isto, importará agora referir que a primeira questão submetida a este órgão de cúpula reconduz-se a saber se a existência da referência à firma da Contrainteressada, inserida por lapso, no rodapé dos Anexos VI e VIII do Programa do Concurso, permite concluir pela sua participação na elaboração dos mesmos e pela violação dos princípios da imparcialidade, da isenção, da concorrência, da boa-fé, da tutela da confiança e da transparência.

    3. - A segunda questão submetida a juízo através da presente revista prende-se, por sua vez, em saber se o mero perigo ou a ameaça de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência, sem qualquer demonstração em concreto, quer da participação, quer da vantagem, são suficientes para determinar a invalidação do ato de adjudicação no procedimento concursal.

    4. - E, em terceiro lugar, cumprirá ainda a este Supremo Tribunal apreciar se a presunção judicial laborada pelo Tribunal a quo de que a Contrainteressada participou na elaboração daqueles anexos, sem que seja demonstrada a situação de vantagem que para aquela resulta dessa suposta participação, constitui impedimento de participação no concurso como concorrente por aplicação do impedimento previsto no artigo 55.º, n.º 1, alínea i) do Código dos Contratos Públicos.

    5. - Tais questões assumem importância fundamental dada a sua relevância jurídica uma vez que são questões em relação às quais existe alguma divergência jurisprudencial, desde logo, patente no aresto recorrido, onde se sufraga a tese da tutela da aparência de violação dos princípios da imparcialidade e transparência, que, porém, contraria a mais recente jurisprudência emanada nesta matéria; e onde ainda se desconsidera a existência de uma situação de vantagem para a exclusão da Contrainteressada do concurso público, dada a sua suposta participação nas peças do concurso, isto ao completo arrepio das diretrizes e jurisprudência comunitária.

    6. - Sendo ainda certo que, em matéria de impedimentos de concorrentes no âmbito da contratação pública e de violação dos princípios da transparência e da imparcialidade, matéria que aqui também estão em apreço, o Supremo Tribunal Administrativo entendeu já conferir-lhe dignidade e relevância suficientes para que por ele pudesse ser dirimida (vide Acórdão de 11 de setembro de 2010, proferido no Processo n.º 0851/10, e Relatado pelo Conselheiro Rosendo José) 8º - Por outro lado, trata-se de questões que assumem relevância social, dado o impacto negativo na comunidade social que importam, uma vez que os termos do decidido pelo Tribunal a quo tem vindo a ser veiculado através dos órgãos de comunicação social, gerando-se um clima de alarme social e de desconfiança perante as entidades públicas que é completamente injustificado e infundado, pois que estamos a falar de premissas que não correspondem, em nada, à verdade, urgindo a apreciação destas questões e solução diversa determinada por este Supremo Tribunal.

    7. - Depois, torna-se manifesto, atentas as desconformidades patentes no aresto recorrido face à jurisprudência comunitária e à própria jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e também dos Tribunais Centrais Administrativos, e ainda à divergência jurisprudencial nesta matéria, a imprescindibilidade da admissão da presente revista para a melhor aplicação do direito ao caso concreto.

    8. - Estando, assim, reunidos todos os pressupostos de admissibilidade de qualquer revista previstos no artigo 150º, nº 1 do CPTA, impõe-se, neste caso, que seja admitida a presente revista, com a apreciação das questões levadas a juízo.

    9. - Posto isto, importa afirmar que o Tribunal a quo incorreu em múltiplos e notórios erros de julgamento quanto à suposta participação da Contrainteressada na elaboração das peças do concurso, e assim quanto à violação dos princípios da transparência e da imparcialidade; na consideração de que, por isso, a Contrainteressada se encontrava impedida de participar no concurso; e ainda pelo facto de o Tribunal a quo não ter entendido como válido o ato impugnado, não concedendo provimento ao recurso do Recorrente quanto ao levantamento do efeito suspensivo automático.

    10. - Assim sendo, é patente no, aliás, douto aresto recorrido, o erro de julgamento ao não se ter considerado a existência de mero e manifesto lapso ocorrido quanto à referência da firma da Contrainteressada no rodapé dos anexos VI e VII do Programa do Concurso, mas, ao invés, sem qualquer fundamentação razoável, entender o Tribunal a quo ter existido participação daquela Contrainteressada na elaboração dos anexos, bem sabendo que o seu entendimento contrariava não apenas a justificação oferecida pela entidade pública como o entendimento já manifestado pelo Tribunal de 1.ª instância, exigindo-se-lhe por isso um maior esforço de sustentação, o que não se verificou, perfilhando-se, assim, uma ideia que não corresponde à verdade.

    11. - Cumpre, aliás, ressaltar que, o ora Recorrente pauta a sua conduta pelo mais amplo e fiel cumprimento dos princípios e ditames que lhe subjazem por assumir a veste de uma entidade pública, conformando sempre a sua atuação pela prossecução do interesse público em presença em cada situação.

    12. - Por outro lado, e contrariamente ao sugestionado pelo Tribunal a quo, o Recorrente não podia nem devia ter anulado o concurso público perante a verificação da existência daquele lapso, uma vez que, o mesmo não comprometia os princípios da concorrência, transparência e da imparcialidade, nem a regularidade do procedimento concursal, para além de que tal solução acarretaria um irremediável prejuízo para o interesse público atendendo ao calendário de feiras prevista naquele concurso público e no contrato celebrado.

    13. - Depois, será de notar que para concluir pela ilegalidade do ato de adjudicação impugnado, o Tribunal a quo acaba por sufragar uma tese que está completamente obsoleta (socorrendo-se, para tal, do Acórdão do Supremo de 20-01-1998), perante as mais recentes orientações jurisprudenciais postuladas pelo Supremo Tribunal Administrativo e pelos Tribunais Centrais Administrativos, no sentido de que bastará a observância do mero perigo ou ameaça de violação do princípio da imparcialidade administrativa para a invalidação do ato de adjudicação.

    14. ...

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