Acórdão nº 0759/16.3BESNT 0521/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelNEVES LEITÃO
Data da Resolução01 de Julho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1. A……….., Lda interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 8 fevereiro 2018 que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra decisão de indeferimento de reclamação graciosa apresentada contra liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios (ano 2012) no montante global de € 92 066,02 1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões: 1.

    Nos termos do artº 104º nº 1 da CRP a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

  2. Nos termos do artº 75º da LGT, já atrás enunciado, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. A presunção aqui referida poderá ser elidida nos termos do nº 2 do mesmo artigo caso se verifiquem algumas das quatro situações aí referidas.

  3. Nos termos da Inspecção realizada pela AT em 2013 e 2014, esta considerou a Contabilidade da Recorrente como não credível no período de 2009 a 2012 inclusive.

    Deste modo avançou para aplicação de métodos indirectos no ano de 2011 e de correcções aritméticas nos anos de 2009,2010 e 2012.

  4. As liquidações adicionais de 2012, em sede de Iva, no montante de Euros 92.066,02, foram obtidas pela AT através de análise informática da composição das mesas e dos seus outputs em sede de eventual facturação (não produzida no seu entendimento), pondo em causa o sistema informático da Recorrente e não o próprio sistema de facturação certificado pela AT.

  5. Ora contrariando o que seria razoável e como é expresso na pág 9 do Relatório, a utilização de métodos indirectos cingiu-se apenas ao exercício de 2011, procurando a AT por em causa a Margem bruta do negócio e os resultados tomando por base as chamadas correcções aritméticas, quer as mesmas se consubstanciem em presunções de vendas com base em depósitos, quer, como no caso do exercício de 2012, em que não sendo suficiente o acréscimo de proveitos por via de tal processo, utilizaram a análise informática das consultas de mesa versus vendas a dinheiro emitidas, (informação 35/2013) e ainda o valor médio por documento versus número de cafés por documento, numa análise ficcional e insuficientemente fundamentada, com estimativa de custos para o acréscimo de vendas, este, conjuntamente com as vendas declaradas, acima dos depósitos realizados.

  6. O subjectivismo dos pressupostos e critérios utilizados pelos serviços informáticos da AT, que não põem em causa a facturação certificada, mas antes procuram descredibilizar os serviços informáticos da empresa, demonstram o desconhecimento da estrutura do software para chegar a conclusões que no fundo põem em causa o mesmo.

  7. Não é correcto afirmar que o software não garante a integridade da informação pois eram criadas séries por dia e mesa. Por um lado apenas as séries de consultas de mesa são por mesa. As séries de documentos são por posto. Tal prática, além de ser legal, permite que na mesma série seja mantida a integridade de todos os documentos através da chave hash prevista por decreto-lei.

  8. Por outro lado, a AT afirma que os registos foram manipulados devido aos campos de referência (números ID) não terem uma estrutura crescente. Isto não é uma verdade indiscutível, pois se existir em determinado momento no tempo uma reposição de alguma cópia de segurança, é possível que os registos não sejam repostos pela mesma ordem em que foram criados. Só por si a análise dos ID’S não é suficiente para garantir uma verdade inquestionável, pois existe pelo menos uma possibilidade dos factos terem acontecido de outra forma, o que gera dúvidas globais sobre as conclusões tiradas.

  9. A análise da relação entre as consultas de mesa e os correspondentes documentos, esquece um factor que tem uma importância determinante no valor real a que se pode chegar. O facto de mesas terem sido transferidas pode não dar origem a um documento final, o mesmo acontecendo com mesas agrupadas. Esta situação põe em causa alguns valores determinados. O único sintoma que existe de uma transferência ou agrupamento de mesa, é precisamente o facto de que as consultas tiradas antes dessa acção não irão ter uma correspondência directa nos documentos emitidos.

  10. Ao acréscimo de proveitos gerado pela análise informática da AT, de que aqui se reclama, foi acrescentada a presunção de custos adicionais, em que se desconhecem quais as provas da sua existência e da sua justificação documental e financeira.

  11. Como decorre do atrás exposto, as chamadas correcções aritméticas, baseadas em análise informática da AT, assentam em pressupostos não exactos, questionáveis e duvidosos, acrescentados de presunções e estimativas próprias de métodos indirectos aqui não aplicados pela AT, ao contrário do que realizou em 2011 e que se contestam vivamente.

  12. Diz o Acórdão de 13/9/2013 do TAF do Porto no processo 00120/03 -2ª secção do contencioso tributário que "são correcções meramente aritméticas da matéria tributável aquelas em que a AT não recorre a qualquer método de avaliação da matéria colectável (directo ou indirecto) para determinar o imposto devido e se limita a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações".

  13. Com o devido respeito, tal conceito legal nada tem a ver com o aplicado pela AT e que foi sufragado indevidamente pelo Tribunal a quo.

  14. A Douta Sentença do Tribunal a quo disserta do ponto de vista da aplicação de métodos correctivos por parte da AT, afirmando, o que já é conhecido, que a AT pode utilizar métodos indirectos e correcções aritméticas em simultâneo.

  15. Na página 29 de tal Sentença é dito que nada impede que em relação a exercícios distintos sejam utilizados métodos diferentes, desde que devidamente justificados.

  16. Ora o exposto em 15) seria verdadeiro se a realidade de partida em cada um dos anos fosse diferente. Ora o que aconteceu é que o Relatório Inspectivo declara taxativamente que a Contabilidade da Recorrente não era credível no período entre 2009 e 2012. Não há qualquer alteração ano a ano para o exposto.

  17. Mas mesmo admitindo que tal fosse verdade, aquilo que a AT e o Tribunal a quo não podem fazer ou permitir é fazer avaliações de base informática às mesas e indiciar omissões de facturação e vendas, sem por em causa o sistema certificado pela AT e afirmar que os valores assim obtidos, em contradição com a empresa informática que apoia o sistema da Recorrente, são correcções aritméticas.

  18. Ao invés do que foi afirmado, a AT está a proceder a avaliação indirecta, sem o reconhecer, como já foi dito nas questões prévias. Aliás a Douta Sentença do Tribunal a quo, na página 29, linha 19, diz sobre o procedimento da AT " ... restringindo deste modo e como legalmente se lhe impunha, ao mínimo essencial, o recurso à avaliação indirecta.

  19. Então é também a Douta Sentença que reconhece o recurso da AT à avaliação indirecta, na sua óptica em dose mínima, na da Recorrente em dose máxima, em contravenção com o que afirmam, ou seja que as correcções foram obtidas por correcções aritméticas.

  20. Como não deve ser desconhecido do Tribunal a quo, o recurso à avaliação directa ou indirecta está fora do conceito de correcções aritméticas e no caso de avaliação indirecta terá de ser fundamentada a sua aplicação e conceder à Recorrente todo o direito de defesa inerente nomeadamente o pedido de revisão da matéria colectável, o que não foi feito.

  21. Ora o que verdadeiramente aconteceu, foi que a AT ao arrepio das suas próprias conclusões inspectivas e do explicitado na lei, e ao invés do aplicado no ano de 2011, aplicou avaliação indirecta aos anos de 2009 e 2010 e ao de 2012 aqui em Recurso, chamando-lhe de correcções aritméticas, dentro daquele princípio conhecido de sacar impostos passando por cima de tudo e todos. Em relação a 2012 utilizaram a análise informática que contradiz os próprios meios financeiros, (o acréscimo de vendas gerado é maior que os depósitos efectuados), assentes em critérios e pressupostos subjectivos, não condizentes com a realidade da empresa e com o tratamento do seu próprio sistema informático, gerando elevada dúvida sobre a sua razoabilidade.

  22. Só que a utilização de métodos directos, incluindo as correcções aritméticas, para além de ter por base a contabilidade do contribuinte, têm de se consubstanciar em correcções e ajustamentos efectuados concretamente à contabilidade do mesmo, aplicadas de forma objectiva e não eivada de insuficiente fundamentação.

  23. Mas para além da contradição de procedimentos aplicados a realidades iguais, torna-se necessário que a fundamentação dos actos de liquidação seja expressa, no sentido de explícita e contextual, não podendo ser tácita ou implícita, como decorre do nº 3 do artº 268º da CRP (Ver Acórdão do STA de 1/3/2000). Por seu lado, o artigo 125º do CPA define "equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que por obscuridade, contradição, ou insuficiência, não esclareçam a motivação do acto." Ou seja, a fundamentação tem de ser adequada ao acto tributário e aos casos concretos.

  24. No entendimento da Reclamante, a violação alegada dos artºs. 17º e 120º do CIRC, por omissões e inexactidões nas declarações modelo 22, constitui uma fundamentação contraditória e insuficiente. Contraditória porque o método seguido é aplicado sobre uma contabilidade que não merece confiança e diverge do aplicado à mesma contabilidade no ano de 2011 e é insuficiente porque não está apta completamente a justificar as correcções em concreto. Uma fundamentação insuficiente não é fundamentação e a falta de fundamentação gera a anulabilidade dos actos, o que aqui se requer.

  25. Por outro lado, atendendo à especificidade do IVA, não pode a Administração Fiscal operar alterações à base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido...

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