Acórdão nº 02104/15.6BEPNF 0915/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Setembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de embargos de terceiro com o n.º 2104/15.6BEPNF Recorrente: A………………. S.A.

Recorridos: Fazenda Pública e Banco B………………….

  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada como Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, julgando caducado o direito de embargar de terceiro, por a apresentação da petição inicial ser ulterior à venda, absolveu a Fazenda Pública do pedido nos embargos de terceiro que aquela sociedade deduziu contra a ordem de entrega do imóvel vendido em execução fiscal.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1- Foi ordenada nos autos de execução, a entrega ao Banco B……………. (Portugal) dos imóveis correspondentes aos artigos urbanos 4528 e 1495- A, que lhe foram adjudicados.

2- A embargante é titular de direito real de gozo que lhe advém de contrato de arrendamento para fins não habitacionais, celebrado em 30-08-2008, com a executada, tendo por objecto os dois sobreditos artigos matriciais urbanos.

3- Os aludidos artigos matriciais não dispõem de entrada autónoma para o Largo ………….., tendo por tal motivo a embargante celebrado com C………….., um outro contrato de arrendamento para fins não habitacionais, tendo como objecto o artigo matricial urbano 3422, com entrada pelo referido largo, permitindo dessa forma a circulação, pelo interior, de pessoas e bens desde a sua entrada até ao extremo oposto dos imóveis tomados de arrendamento à executada.

4- É referido no texto da sentença, que no dia 18-03-2010, se procedeu à abertura das propostas em carta fechada.

5- Bem como que o B…….. obteve para si a adjudicação dos referidos artigos urbanos, mediante o pagamento à Fazenda Pública, do preço no valor de 936.000,00 €.

6- Encontra-se fixado na sentença, que por ofício n.º 1893/1813-30, de 19/06/2015, o Serviço de Finanças do Marco de Canavezes notificou a embargante para proceder à entrega até 27-07-2015 dos imóveis artigos urbanos 4528 e 1495-A, ao B………….

7- A embargante na sua p.i., alegou que os presentes embargos não são intentados contra qualquer “(...) outra providência executiva anterior – penhora ou venda – ofensiva da sua posse ou direito (...)”.

8- A sentença ora em crise decidiu, além do mais, pela intempestividade da propositura dos embargos de terceiro.

9- No que ora interessa, não se revê a embargante na fundamentação da invocada intempestividade da propositura dos embargos.

10- Encontramo-nos no âmbito de embargos de terceiro de natureza preventiva (conservatória) relativamente à posse pela embargante, mercê de um direito real de gozo, titulado por arrendamento.

11- Regula este muito concreto embargo de terceiro, o art. 350.º do CPC, artigo, este, que encerra a subsecção III, da secção III, do capítulo III do CPC.

12- A subsecção III regula a Oposição mediante de embargos de terceiro.

13- Terceiro, refere-se a quem não sendo parte na causa principal, vê surtir desta, prejuízo para a posse ou um direito de que seja legítimo titular, incompatível com a realização ou o âmbito da diligência.

14- Conforme se encontra bem salientado nos autos, a posse da embargante sobre o prédio art. 3422, é ofendida pela execução da diligência de entrega ordenada, mas não realizada, das fracções adquiridas pelo B……………….

15- Entendemos que o art. 350.º, pela sua colocação sistemática no final da sobredita subsecção III, contém um regime próprio, com alguma especialidade relativamente ao regime que lhe antecede na subsecção em causa. Daí a sua razão de existir na lei.

16- Sucede que a sentença centrou a atenção na questão da tempestividade de dedução dos embargos, tendo sido decisiva e apreciação que sobre a mesma recaiu.

17- Sendo certo que no nosso entendimento, com o devido respeito, o direito foi mal aplicado tendo em conta a factualidade fixada.

18- Aqui ressalta que a Fazenda Pública recebeu no dia 18-03-2010 o preço no valor de 936.000,00 €, relativo aos artigos urbanos 4528 e 1495-A, adjudicados ao B………….

19- Formalmente a Fazenda Pública encontra-se paga pelo valor atribuído aos imóveis artigos urbanos 4528 e 1495-A, que tomou de garantia mediante a imposição do ónus de penhora sobre os mesmos.

20- Sobre estes imóveis já a Fazenda Pública não tem a possibilidade de fazer valer qualquer pretensão própria, atinente à satisfação da dívida exequenda, na medida em que mediante a sua adjudicação já não a garantem.

21- No entanto, faz parte da fundamentação da sentença, que a preocupação aí referida reiteradamente, para também ela fundamentar a intempestividade dos embargos, vai no sentido de estes poderem prejudicar a satisfação da dívida tributária.

22- Salvo o devido respeito, nesta fase, nestes autos como em muitos outros de embargo de terceiro preventivo, conservatória da posse, tal argumento carece de sustentação, peia própria natureza das coisas, tendo sido a própria Fazenda Pública a desenvolver os trâmites legais e processuais conducentes à venda dos referidos artigos urbanos.

23- Sendo nosso entendimento que, atenta tal natureza das coisas e fase processual, que o art. 350.º do CPC se revela como estatuindo um regime especial relativamente ao regime que o antecede em matéria de oposição mediante embargos.

24- Razões quanto a nós suficientes para se enquadrarem os presentes embargos no regime especial do art. 350.º do CPC, que estabelece como que uma cláusula de salvaguarda de terceiros afectados, por o regime geral dos embargos não permitir uma salvaguarda tão “alargada” dos mesmos para, perante situação específica, tentarem proteger a sua posse ou direito, potencialmente atingidos por diligência judicial ordenada mas ainda não realizada.

25- O que se constata da sentença em causa, é que por via do raciocínio nela seguido, se retira razão de existência ao art. 350.º do CPC, remetendo para a regulação geral, salvo a questão do prazo de trinta dias para a sua dedução, dos preceitos que o antecedem, ao arrepio das realidades do comércio jurídico, que existem e deram a razão de ser do referido regime especial.

26- Determinando a parte final do n.º 1 do referido preceito legal, que se aplicam a estes embargos o disposto nos artigos anteriores, “com as necessárias adaptações”, diremos nós atenta a especialidade da situação que determina a dedução de embargos desta natureza, a sentença na prática e salvo o devido respeito, submete os embargos em causa, apenas ao regime geral dos artigos que antecedem o art. 350.º, ao arrepio da natureza dos factos dados como provados.

27- Conforme se retira a págs. 18 “in fine” da sentença, onde é afirmado que atento o disposto no art. 344.º n.º 2 do CPC, resulta de modo cristalino que “(...) os embargos serão sempre de rejeitar se foram apresentados depois dos respectivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados”.

28- Este entendimento, que não perfilhamos, equivale a uma derrogação do regime do art. 350.º do CPC, já não a uma adaptação a este, do regime geral, esvaziando o artigo de razão de ser.

29- Na sentença é invocado o Acórdão do STA de 10/10/2012, proferido que foi no Processo n.º 0933/12, discordando o julgador do sentido no mesmo expendido.

30- Não por uma questão oportunística, mas porque como conclusão legítima de quanto vimos a alegar, concordamos com tal Acórdão.

31- Não colhe quanto a nós e salvo o devido respeito, a apreciação que sobre o aludido Acórdão se encontra inserta na pág. 22, a final, da sentença, no sentido de que o mesmo recaiu sobre embargos deduzidos em execução para entrega de coisa certa, “(...) e, consequentemente, não se colocando a questão em concreto da dedução dos embargos após a venda.

”. “Deste modo, consideramos ser de acolher a jurisprudência constante do citado Acórdão da Relação do Porto, que se debruçou sobre uma situação similar à dos presentes autos, ponderando devidamente todos os interesses envolvidos, acrescendo, ainda, conforme referido, o interesse público subjacente à cobrança dos créditos tributários, tudo razões que nos levam a concluir pela intempestividade dos presentes embargos de terceiro”.

32- Cabe aqui e a este propósito realçar, novamente, que os bens já foram adjudicados e o respectivo preço pago, pelo que os imóveis já não garantem a dívida exequenda.

33- Por outro lado, sendo certo que o efeito pretendido nos autos poderia eventualmente ser...

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