Acórdão nº 02244/18.0BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelCLÁUDIO RAMOS MONTEIRO
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

I. Relatório 1.

MUNICÍPIO DO PORTO, B…………., SA, C…………, LDA E D…………., SA - identificados nos autos – recorreram para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 150.º do CPTA, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN), de 29 de novembro de 2019, que revogou a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, de 27 de março de 2019, que julgou parcialmente procedente a ação proposta por A……, SA. e A…….. MOBILITY, UNIPESSOAL LDA., que impugnou a deliberação da Câmara Municipal do Porto, de 31 de julho de 2018, que excluiu a sua proposta do concurso limitado por prévia qualificação aberto para celebração de um contrato de empreitada de obras públicas, aquisição de bens móveis e aquisição de serviços para a “Manutenção e expansão do Sistema de Gestão de Mobilidade”, e procedeu a sua adjudicação à proposta apresentada pelos Recorrentes particulares.

  1. Nas suas alegações, o Recorrente MUNICÍPIO DO PORTO formulou, com relevo para esta decisão, as seguintes conclusões: «(...)

    1. A CONSEQUÊNCIA DA NÃO APRESENTAÇÃO DO DOCUMENTO EXIGIDO NA SEGUNDA PARTE DA ALÍNEA C) DO PONTO 2.2.1. DO ARTIGO 19.° DO PROGRAMA DO CONCURSO Z. Resultava expressamente da alínea c) doponto2.2.1.do artigo 19.º do Programa do Concurso, “os concorrentes tinham que apresentar uma declaração expressa mencionando que os controladores de tráfego a instalar cumprem o protocolo de comunicações OCIT-0 e manterão, no mínimo, o mesmo durante a duração do contrato e após atualizações necessárias".

    AA.

    A vinculação do concorrente ao conteúdo do documento só se consegue alcançar se o mesmo for produzido e assinado pelo concorrente em causa.

    BB. A isso não pode obstar, ao contrário do que entendeu o douto Acórdão recorrido: i) O facto de o concorrente se ter vinculado ao cumprimento do Caderno de Encargos pela assinatura do Anexo X apresentado com a sua proposta; ii) ii) O facto de a Entidade Adjudicante ter ficado "melhor servida" com o documento que foi apresentado; iii) Ou o facto de esse mesmo documento ter sido assinado na plataforma eletrónica pelo concorrente no momento em que submeteu a proposta CC. Desde logo, resulta inequivocamente da lei que a assinatura do Anexo ao CCP pelo qual o concorrente se vincula ao cumprimento das exigências contidas ao Caderno de Encargos não supre a falta de documentos exigidos nas peças do concurso que se destinem a garantir que o concorrente se vincula especificamente ao cumprimento de determinadas exigências contratuais não sujeitas à concorrência.

    DD. E também indubitável que é à Entidade Adjudicante que compete indicar quais os documentos que pretende dos concorrentes, não podendo os tribunais substituir-se à opção feita pelas Entidades Adjudicantes. Assim, não podem os tribunais decidir que a falta de um documento exigido pela Entidade Adjudicante não deve levar à exclusão pelo facto de esse mesmo documento ter sido substituído por um outro, assinado uma outra entidade, que é, na ótica dos tribunais, mais conveniente ou adequado.

    EE. Muito menos quando é evidente que para a Entidade Adjudicante nenhuma utilidade oferece um documento assinado por uma entidade que é terceira ao contrato a celebrar - pelo que a Entidade Adjudicante nunca terá como reagir face ao incumprimento daquela declaração.

    POR FIM, FF, E também inquestionável que a aposição de uma assinatura eletrónica qualificada num determinado documento aquando da submissão da proposta numa plataforma eletrónica não vincula o "signatário" desse documento ao seu conteúdo.

    SENDO ASSIM, GG. E inequívoco que a decisão de admissão da proposta dos Autores depois de verificada a ausência do documento exigido na alínea c) do ponto 2.2.1. do artigo 19.° do Programa do Concurso implica uma violação dos artigos 57.°, n.º 1, al. c), e 146.°, n.º 2, al. d)/ ambos do Código dos Contratos Públicos/ pelo que o douto acórdão recorrido incorre num evidente vício de violação da lei.

    B) A CONSEQUÊNCIA DA NÃO APRESENTAÇÃO DA CERTIFICAÇÃO DE CUMPRIMENTO DE DUAS DAS NORMAS TÉCNICAS EXIGIDAS NA ALÍNEA B) DO PONTO 2.2.1. DO ARTIGO 19.° DO PROGRAMA DO CONCURSO.

    HH. Nos termos da alínea B) do ponto 2.2.1. do artigo 19.° do Programa do Concurso, exigia-se que os concorrentes apresentassem uma Certificação de Cumprimento de normas Técnicas relativas aos controladores de tráfego.

    II. Resulta claramente do confronto da redação dessa alínea com as alíneas c) e d) do mesmo ponto, na qual era exigida a apresentação, respetivamente, de uma Declaração expressa (que era, como já evidenciámos, do próprio concorrente), e de uma "Declaração dos fabricantes dos controladores de tráfego a instalar", que aquela Certificação de Cumprimento teria de ser emitida por uma entidade externa e independente - no caso, por um organismo certificador.

    J. Isso mesmo foi, de resto, devidamente entendido pelas próprias Autoras, que apresentou: i) uma Certificação de Cumprimento emitida por uma entidade competente relativa à norma EN 50293; ii) uma Certificação de Cumprimento, já caduca, relativa à norma 50556; e uma mera declaração do fabricante, garantindo o cumprimento da norma EN12675, logo ali adiantando, no entanto, que o processo de certificação por uma entidade externa se encontrava então em curso (declaração que só se pode ter ficado a dever à consciência da obrigatoriedade de apresentação daquele documento).

    KK. Ora, confrontado com a falta daqueles documentos ("confessada" pela própria Autora, que então referiu que essa certificação, emitida por uma entidade externa, se encontrava em curso), outra não poderia ser a atitude da Entidade Adjudicante que não a exclusão daquela proposta. Com efeito, e sendo aquele documento exigido ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 57,° do Código dos Contratos Públicos, a exclusão daquela proposta era imperativa, por força da alínea d) do n.º 1 do artigo 146.° do CCP.

    LL. A essa conclusão não obsta, nem poderia obstar, o facto de uma Diretiva Europeia estipular que o procedimento de avaliação de conformidade de um determinado produto deve ser conduzido pelo fabricante.

    MM. Deste modo, o Acórdão recorrido incorreu, também neste ponto, em violação da lei (mais concretamente dos artigos 57.°, n.º 1, al. c), e 146.°, n.º 1, al. d), ambos do Código dos Contratos Públicos), quando entendeu que o Réu, confrontado com a falta dos documentos exigidos nos pontos i) e ii) da alínea b), do ponto 2.2.1. do artigo 19.° do programa do concurso (falta essa "confessada" pelas próprias Autoras quando referiu que esse processo de certificação por uma entidade externa se encontrava então em curso), não poderia ter excluído aquela proposta.».

  2. As Recorrentes B……….., SA, C…………., LDA E D………….., SA apresentaram também alegações, em que formularam as seguintes conclusões quanto ao mérito do recurso: « AZ) Na presente lide, está em causa, em primeiro lugar, a apreciação da legalidade e vinculação jurídica decorrente da apresentação do documento relativo à alínea c); sob a forma de Declaração de Compromisso.

    B

    1. Acontece que para cumprimento desta alínea c), as Autoras apresentaram uma mera declaração de terceiro (fabricante dos controladores) a atestar que estes equipamentos estão aptos a utilizar o referido protocolo de comunicações. Mas não subscreveram qualquer declaração expressa a assumir a obrigação contratual de manter este protocolo em funcionamento durante a execução do contrato (o que motivou a exclusão da proposta em sede de Relatório Final).

      BB) Contrariamente ao que consta do Acórdão recorrido, a questão não é saber se os concorrentes são capazes de “cumprir tecnicamente o contrato”, mas sim se o concorrente assumiu a vinculação exigida! (de compromisso de cumprimento da requerida obrigação contratual para com a entidade adjudicante).

      BC) Na prática, a declaração junta pelas Autoras significa que os controladores estão aptos à utilização do protocolo exigido pela entidade adjudicante. Contudo, a entidade adjudicante impõe uma obrigação acrescida: o adjudicatário tem de comprometer-se expressamente a não utilizar um outro protocolo de comunicações durante toda a execução e vigência do contrato (uma vez que os equipamentos são multi-protocolo, estando aptos a suportar diversos protocolos distintos para além do referido OCIT).

      BD) O Tribunal, em primeira instância, considerou acertadamente, tal como a entidade adjudicante, que quem devia subscrever a referida declaração era o próprio concorrente e que a vinculação exigida pelo procedimento “só se pode exigir de quem concorre ao concurso e não ao fabricante, visto que é com o concorrente - adjudicatário e não com quem fabrica o componente eléctrico que o adjudicante vai estabelecer um vínculo contratual.” E, em consequência, confirmou a decisão de exclusão da proposta apresentada pelas Autoras.

      BE) TODAVIA, o Tribunal a quo revogou tal entendimento assente em dois argumentos, que pela importância da temática e relevância jurídica e social não pode deixar de ser apreciada superiormente, bem como por assumir orientação que contraria o que tem vindo a ser seguido pelo Supremo Tribunal.

      BF) Destarte, o TCAN considerou, por um lado, que a apresentação da citada declaração de compromisso por fabricante (terceiro alheio ao procedimento e à futura relação contratual) é suficiente para, por si só, vincular as Autoras perante a entidade adjudicante – que naturalmente extravasa o âmbito do caso em concreto e que aconselha clarificação.

      BG) E, por outro lado, considerou ainda o Tribunal a quo que – pese embora a declaração de compromisso não ter sido assinada/subscrita pelas Autoras – uma vez que estas submeteram este documento com recurso à assinatura eletrónica qualificada, então, automaticamente, as Autoras vincularam-se ao teor da declaração e à execução do contrato naqueles termos; o que nos leva à questão da utilização dos meios digitais nos procedimentos de contratação pública e às regras a cumprir quanto à utilização das assinaturas eletrónicas qualificadas e respetivos...

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