Acórdão nº 02975/10.2BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução14 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A…………, SA, impugnou o acto de liquidação de taxas relativas a renovação de licenciamento de posto de abastecimento de combustíveis bem como de instalação de publicidade, no total de € 39.053,70, praticado pelo Senhor Director da Delegação Regional de Leiria da EP – ESTRADAS DE PORTUGAL SA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) datada de 27 de Fevereiro de 2019 que julgou improcedente a impugnação da taxa pelo licenciamento da remodelação do posto de abastecimento de combustíveis, no montante de € 36.782,10 e procedente a impugnação da taxa relativa à publicidade afixada no posto de abastecimento de combustíveis, no montante de € 2.272,60, que se anula e, condena-se a entidade impugnada ao reembolso do montante pago, acrescido de juros indemnizatórios sobre este montante, contados desde a data do seu pagamento até à data da emissão da respectiva nota de crédito a favor da impugnante.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:

  1. De acordo com o teor do acto impugnado, não se mostra claro qual o facto tributário que está na sua origem, já que se deixa dito de forma contraditória, por um lado, que “(…) tratando-se de obras de remodelação do posto de abastecimento existente (…) emite parecer favorável ao abrigo do disposto na alínea c) do art. 10° do Decreto-Lei n.

    ° 13/71, de 23 de Janeiro” e, por outro lado, que o prosseguimento do licenciamento solicitado (relativamente às obras no posto de abastecimento) estaria condicionado ao pagamento de uma taxa relativa à "renovação do licenciamento do posto (…) cujo primeiro alvará data de 1991". Motivo, pelo qual, invocou a aqui recorrente, na sua petição inicial, que o acto de liquidação impugnado se mostrava ferido do vício de falta de fundamentação.

  2. Limitou-se a douta sentença recorrida a dar por reproduzido o teor do acto de liquidação e, bem assim, das normas legais ali mencionadas, sem ter procedido, contudo, à sua análise crítica, dando por assente que a "(…) a taxa no valor de € 36.782,10 (…) foi fixado tendo em conta o acréscimo no número de mangueiras existente no posto de abastecimento (em número de 27) e que não constavam do Diploma de Licença nº 133/91, de 1997, então emitido pela Junta Autónoma de Estradas - Direcção de Estradas do Distrito de Leiria (…)", cfr. alínea B) da matéria de facto dada por assente.

  3. Sucede, porém, que da leitura do mencionado Diploma de Licença n.º 133/91 (junto aos autos a fls. 23 a 26), resulta claro que a aqui Recorrente liquidou, ao abrigo do disposto no artigo 15°/i, alínea k) do DL 1/71, a taxa no valor de 864.000$00, correspondente a "18 bombas".

  4. Ora, considerando que, por via do Diploma de Licença n.º 133/91 já havia sido liquidada uma taxa correspondente a "18 bombas" e tendo o acto de liquidação, sindicado nos presentes autos, sido emitido na sequência da apresentação de pedido para a realização de obras de remodelação no posto de abastecimento (cfr. acto de liquidação junto a fls. 17 e 18), não se vislumbra justificação válida ou suficiente para que a taxa cobrada incida sobre a totalidade das 27 mangueiras instaladas, com o fundamento de corresponder à "renovação de licenciamento do posto duplo", quando não foi esse seguramente o conteúdo do pedido formulado pela Recorrente (cfr. acto de liquidação junto a fls. 17 e 18).

  5. Assim, ao considerar que o acto de liquidação se encontra devidamente fundamentado, incorreu a douta sentença recorrida em erro de julgamento, por preterição do disposto no artigo 77°/2 da LGT.

  6. Ao contrário do defendido na sentença recorrida, da interpretação do corpo do artigo 15.°, n.º 1, alínea i) do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24/01, resulta que a base de incidência da taxa deverá recair sobre cada bomba de abastecimento e não sobre cada uma das mangueiras disponíveis em cada bomba.

  7. Desde logo, efectuando uma interpretação sistemática do conceito de "bomba abastecedora", é o próprio Estado que, no Despacho SEOP n.º 37-XII/92, de 22/12, afasta o conceito de "bomba abastecedora" de "mangueira".

    Com efeito, aí se determina dever cada ilha, com as "bombas" aí instaladas, ter um comprimento compatível com o número de "elementos de abastecimento" que contiverem. Por conseguinte, o termo que o legislador aqui utilizou para designar as mangueiras foi o de "elemento de abastecimento" e não o de "bomba abastecedora", inexistindo qualquer assimilação entre o conceito de "bomba abastecedora", por um lado e "mangueira", por outro.

  8. Por outro lado, segundo a jurisprudência superior em que a douta sentença recorrida se fundamentou, o aumento do número de mangueiras em cada bomba abastecedora, de modo a satisfazer a procura de combustíveis alternativos (por exemplo, gasolina com e sem chumbo, com 95 ou 98 octanas) representaria uma maior procura e, logo, uma utilização mais intensa do posto de abastecimento e um acréscimo das perturbações no tráfego.

  9. Sucede, porém, que tal interpretação não só passa ao lado das mais elementares regras hermenêuticas, como carece sempre da demonstração da realidade fáctica que lhe subjaz, ou seja, de que a mera existência de um maior número de mangueiras acarreta um aumento do tráfego e do número de entradas e saídas de viaturas no posto de abastecimento (factos que, salvo devido respeito, não se mostram provados nos presentes autos).

  10. Pelo contrário, a mera circunstância de se substituir uma bomba com x mangueiras por uma bomba multiproduto com x + y mangueiras não traz maior afluência ao posto que ponha em causa o tráfego médio diário da utilização da via que se situa à margem do posto.

  11. Na realidade, cada bomba abastecedora ou unidade de abastecimento, podendo ser composta por um número variável de mangueiras, apenas permite abastecer um único veículo automóvel de cada vez.

  12. Independentemente do número de mangueiras que componham cada bomba de abastecimento, fornecendo diferentes espécies de combustíveis, a verdade é que tal não estimula ou possibilita mais abastecimentos por m3 ou por dia. Apenas torna a oferta mais diversificada em tipos alternativos do mesmo combustível.

  13. Aliás, a prática de preços de venda ao público mais competitivos justificaria também um agravamento das taxas, pois nada no mercado influencia mais a procura que o preço, sendo este um facto de conhecimento oficioso e facilmente apreensível a partir das regras da experiência.

  14. Assim, considerando que é a "bomba abastecedora" (entendida nos termos acima expostos) o elemento essencial para indicar a função económica do posto de abastecimento e a sua respectiva capacidade, é aquela que deverá ser tida como base de incidência da taxa prevista no citado artigo 15°, n,º 1, alínea i), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23/01 (e não já cada mangueira que a compõe).

  15. Não tendo assim considerado a douta sentença recorrida, incorreu esta numa errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 15°, nº 1, alínea l) do DL n.º 13/71.

  16. Não assiste igualmente razão à MM Juiz a quo quando sustenta na douta sentença recorrida que "a taxa por autorização ou licença de estabelecimento ou ampliação de postos de combustível, criada pelo Dec-Lei n.º 13/71 de 23 de Janeiro, com as sucessivas alterações, encontra-se em vigor e é devida à actual EP-Estradas de Portugal, S.A.

    ".

  17. Em primeiro lugar, sempre se dirá que, embora tacitamente, ocorreu uma alteração do âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, pelo que, falece de sustentabilidade a tese avançada pela recorrente (e confirmada pela douta sentença recorrida), no sentido de que possui competência para o licenciamento da taxa em questão por via da aplicação do citado diploma legal.

  18. Com efeito, à data da liquidação do tributo impugnado, competia ao Ministério da Economia e da Inovação ou às Câmaras Municipais (consoante a natureza da via onde se encontre implantado o posto de abastecimento) o licenciamento da exploração de postos de abastecimento de combustíveis (cfr. DL 267/2002, de 26/11) e tratava-se de licenciamento da "construção, exploração, alteração da capacidade, renovação da licença e outras alterações que de qualquer forma afectem as condições de sequrança da instalação" (cfr. art. 4/1), sublinhado nosso.

  19. Sem embargo de preliminar consulta, entre outras, da EP - ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A. (artigo 9.°), uma vez legalmente exigido, num procedimento administrativo que FERNANDO ALVES CORREIA escolhe como exemplo de procedimento complexo, no sentido de reunir elementos de outros anteriores procedimentos autónomos (Manual de Direito do Urbanismo, III, Ed. Almedina, 2010, p. 42).

  20. Essa consulta é um verdadeiro e próprio parecer, expressão que o próprio Decreto-lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, não ignora (artigo 18.°, n.º 2), mas que era residual, ao tempo da publicação deste último diploma, visto que o licenciamento municipal de obras particulares (ao tempo, regulado pelo Decreto-lei n.º 166/70, de 15 de Abril) deixava de fora muitas operações urbanísticas, de modo que o controlo da ex-JAE era o único exigido para a superfície dos postos de abastecimento de combustíveis e, por isso, designado o acto definitivo como licença.

  21. E nem se diga que, pelo simples facto de o legislador não ter procedido à revogação expressa das normas no artigo 10°/1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, permite dar como provado que aquele não pretendeu revogá-las, mas antes as manteve em vigor para a totalidade das estradas sob jurisdição da EP.

  22. Com efeito, da interpretação do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26/11, resulta evidente um esforço de coordenação interadministrativa (por via da solicitação de parecer a que alude o artigo 9°) e vocação universalizadora do licenciamento.

  23. Ou seja, ao invés do entendimento propugnado pela douta sentença recorrida, não existem dois licenciamentos autónomos e independentes, mas antes um único procedimento de licenciamento complexo, em que a...

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