Acórdão nº 02748/15.6BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução28 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de intimação para prestação de informação com o n.º 2748/15.6BESNT 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada (adiante também denominada Requerente e Recorrente) interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo (Apesar de o recurso ter sido interposto, inicialmente, para o Tribunal Central Administrativo Sul, na sequência da rectificação da sentença no que respeita ao facto provado sob a alínea B), a Recorrente requereu, e o Juiz do Tribunal a quo deferiu, a interposição do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo.

) da sentença proferida nos presentes autos, na parte respeitante à fixação do termo inicial da contagem dos juros indemnizatórios: o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, apesar de ter deferido o pedido de intimação da AT a restituir o montante de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) pago indevidamente, acrescido dos juros indemnizatórios até pagamento integral, fixou o início da contagem dos juros na «data de fixação do novo valor patrimonial dos prédios», em 12 de Março de 2014, e não, como requerido, a partir da data do pagamento do imposto, em 30 de Março de 2010.

1.2 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.3 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «A. Tendo o Tribunal a quo procedido à rectificação do lapso que constava do facto «B» dado como provado na sentença, e passando do mesmo agora a constar que a data do pagamento do imposto ocorreu em 30.03.2010, afigura-se inútil o recurso quanto à matéria de facto dada como provada, tal como foi manifestado pela Recorrente no requerimento de interposição do recurso, subsistindo, porém, o interesse em recorrer tão-só da parte da sentença «que condenou a Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento dos juros indemnizatórios apenas desde a data da decisão administrativa de fixação do Valor Patrimonial dos prédios», quando, como entende a Recorrente, devia a AT ter sido condenada no pagamento daqueles juros desde a data em que o imposto foi pago indevidamente (ie., desde 30.03.2010).

  1. Face à rectificação da sentença, o objecto do presente recurso passou então a cingir-se apenas à apreciação de matéria exclusivamente de direito, razão pela qual deverá ser considerado que o Tribunal Superior hierarquicamente competente para conhecer este recurso é o STA - Secção de Contencioso Tributário, e não o TCAS, em observância do disposto no n.º 1 do artigo 281.º do CPPT, requerendo-se, assim, que a admissão deste recurso seja por referência ao STA e não ao TCAS, ordenando assim a subida destes autos ao STA.

  2. Caso assim não se entenda, onde supra se lê STA deve ler-se TCAS e o recurso deve então ser dirigido aos Venerandos Senhores Desembargadores do TCAS.

  3. Se quanto à anulação dos actos de liquidação do IMT baseados nos VPT anulados e à condenação da AT em restituir o imposto pago indevidamente, a sentença não merece qualquer censura, o mesmo não sucede quanto ao processamento dos juros indemnizatórios quando o Tribunal a quo entendeu que «atento a decisão administrativa firmada na ordem jurídica, de fixação do VPT dos ditos prédios e para efeitos de liquidação do IMT devido, será de processar tais juros a seu favor em razão da omissão lesiva dos interesses e direitos do interessado a si imputável, a processar desde a data daquela decisão e sobre o montante a mais liquidado, e até à data de execução espontânea da presente decisão judicial».

  4. O objecto do presente recurso restringe-se, assim, a este segmento da sentença. Em suma, a vexata quaestio consiste em averiguar, à luz do direito, se os juros indemnizatórios devidos à Recorrente devem iniciar a sua contagem na data da decisão administrativa de fixação do VPT dos prédios em discussão – ie., em 12.03.2014 –, ou, como entende a Recorrente, na data do pagamento indevido do imposto – ie., em 30.03.2010.

  5. Nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, ex vi artigo 46.º do Código do IMT, «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido».

  6. Tal como tem sido afirmado pela doutrina e jurisprudência «[o] objectivo dos juros indemnizatórios é reparar a privação indevida de meios financeiros dos contribuintes por razões imputáveis à administração tributária. O juro é o preço do dinheiro em função do tempo e remunera o seu titular em função da sua disponibilização temporal a terceiro. O juro está para o dinheiro como a renda está para a propriedade. Os juros indemnizatórios remuneram essa disponibilização a favor do credor tributário, em razão de uma acção inadequada imputável à administração tributária» (JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES et al., Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada, Almedina, Coimbra, 2015, pág. 357).

  7. À luz do artigo 43.º da LGT, a primeira conclusão que se retira é a de que deve ser reconhecido ao contribuinte o direito a juros indemnizatórios sempre que (i) por erro imputável à AT reconhecido judicialmente (ii) seja pago imposto superior ao devido (o que causou uma privação indevida de capital por certo período), (iii) desde a data em que o imposto havia sido pago.

    I. Interpretando o artigo 100.º da LGT, a jurisprudência tem reiterado que «a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética».

  8. Extrai-se assim uma segunda conclusão: a anulação judicial de um qualquer acto tributário implica o dever, a cargo da AT, de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, uma vez que a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos ex tunc.

  9. A terceira conclusão que se retirou nas alegações foi a de que não estando perante uma daquelas situações em que a LGT fixa expressamente o termo inicial da contagem dos juros indemnizatórios [como é o caso de anulação do acto tributário por iniciativa da AT – alínea b) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT; ou o caso da revisão oficiosa do acto tributário por iniciativa do contribuinte – alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT], é aplicável para efeitos de determinação do dies a quo da contagem dos juros indemnizatórios o n.º 5 do 61.º do CPPT segundo o qual o início da contagem dos juros corresponde à data do pagamento indevido do imposto.

    L. Acresce que, a liquidação do IMT assenta no VPT arbitrado pela AT no respectivo acto de fixação quando este último valor se revela superior ao valor pelo qual o sujeito passivo adquiriu o imóvel (cfr. n.º 1 do artigo 12.º do Código do IMT). Se um determinado contribuinte suportou um imposto liquidado por referência a um acto de fixação do VPT ilegal e judicialmente anulado, o que vem dito até aqui quanto à determinação do dies a quo dos juros indemnizatórios é, por conseguinte, plenamente aplicável.

  10. A quarta conclusão é, portanto, a de que são devidos juros indemnizatórios desde a data do pagamento do imposto indevido quando o erro que gerou a liquidação e o pagamento daquele imposto indevido assenta no acto de fixação da matéria colectável (anulado judicialmente) que serviu de base ao acto de liquidação adicional.

  11. Na situação sub judice, foi declarada judicialmente a anulação do acto de fixação do VPT no qual se amparavam as liquidações adicionais de IMT que conduziram ao pagamento do imposto em excesso, pelo que, à luz dos artigos 43.º e 100.º, ambos da LGT, essa anulação pressupunha a reconstituição da situação como se o acto tributário ilegal não tivesse sido...

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