Acórdão nº 02517/15.3BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Processo n.º 2517/15.3BEPRT (Recurso Jurisdicional) Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO “Banco A…………, S.A.”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 27-02-2020, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com o acto de indeferimento expresso que recaiu sobre a reclamação graciosa n.º 3182 2015 0400 2121, exarado no ofício n.º 2561 de 31.07.2015, que teve por objecto a Contribuição sobre o Sector Bancário autoliquidada no ano de 2013, no valor de € 11.740.272,56.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) A. Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou improcedente a presente impugnação deduzida contra o ato de indeferimento da reclamação graciosa interposta contra a autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário relativa ao ano de 2013, no valor de € 11.740.272,56.

  1. O Tribunal a quo, circunscrevendo as questões a decidir à “(i) violação do princípio da legalidade fiscal, por os elementos essenciais da contribuição sobre o setor bancário se encontrarem definidos na Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, e ilegalidade desta Portaria, (ii) violação do princípio da igualdade e (iii) ofensa ao princípio da não retroatividade da lei fiscal;", decidiu pela improcedência da impugnação, mantendo a liquidação impugnada, justificando a sua motivação com a posição firmada no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) de 19/06/2019 proferido no processo n.º 0683/17, ao qual manifesta a sua adesão.

  2. Não merece, porém, acolhimento, a decisão recorrida e respetiva jurisprudência citada, a qual, salvo melhor opinião, incorre em erro de julgamento ao classificar a CSB como uma contribuição especial, daí retirando a consequência que as mesmas não se encontram sujeitas ao princípio da legalidade estrita nos termos em que o estão os impostos.

  3. Desde logo, há que referir que estamos em causa perante um verdadeiro imposto, o que é patente pelo facto a CSB ter sido criada com vista a “reforçar o esforço fiscal do sector financeiro”, e bem assim, pelo facto de, desde a sua criação, a CSB ter sido destinada à satisfação das necessidades financeiras do Estado. Com efeito, a título de exemplo: E. No Relatório sobre o Orçamento de Estado para 2011 explicita-se que a criação da CSB tem “o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémico, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social.” F. No Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2013, a CSB é justificada como uma medida de consolidação orçamental “com vista ao cumprimento dos limites definidos no Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF)”; G. No relatório sobre Orçamento de Estado para 2014 afirma-se o propósito de consolidação orçamental subjacente à CSB: “Também num esforço de cumprimento equitativos das metas orçamentais para 2014, será […] aumentada a contribuição sobre o sistema bancário. Estas medidas destinam-se não só a contribuir para a sustentabilidade sistémica destes setores, mas também repartir o esforço de ajustamento orçamental com as empresas de maior capacidade contributiva.

    ”; H. No Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2015, o Tribunal de Contas “sublinha que a CSB é um imposto e, como tal, uma receita do Estado.

    ” I. Acresce que, desde a respetiva criação, a receita da CSB não mereceu qualquer orçamentação específica, tendo sido incluída em globo seja em rúbrica de “outras receitas correntes”, seja em rúbrica de “outros impostos diretos”.

    J.

    É, ademais, incontroverso que, no ano ora sob discussão (2013), a receita da CSB visou a angariação de receitas para satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, pois que apenas com a Lei n.º 75-A/2014, de 30 de setembro, passou a existir afetação da receita obtida com a cobrança da CSB ao fundo de resolução.

  4. E mesmo olhando para a CSB do ponto de vista dos respetivos sujeitos passivos, se percebe que a mesma nunca poderia configurar uma contribuição especial na medida em que, admitindo-se que a mesma se destina efetivamente a financiar o Fundo de Resolução, resulta do elenco de sujeitos passivos que na verdade nem todos poderão beneficiar da respetiva intervenção, como é o caso das sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede noutros Estados Membros da União Europeia.

    L. Ora, sendo a CSB reiteradamente justificada com a intenção de aumentar a carga fiscal do sector financeiro, não se vislumbrando qualquer contraprestação para as entidades obrigadas decorrente do seu pagamento, e tendo a mesma sido destinada à satisfação das necessidades coletivas do Estado, não podem restar dúvidas que a mesma constitui um verdadeiro imposto.

  5. E nem o facto de no preâmbulo da Portaria n.º 121/2011, se fazer menção ao intuito de “reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados”, afasta a classificação da CSB como um imposto pois, não existindo uma efectiva afetação da receita àquele fim, não se pode dar o mesmo como cumprido ou prosseguido.

  6. Ora, o artigo 141.º da Lei do OE para 2011, tendo definido as linhas gerais do regime deste imposto, remeteu para regulamentação através de portaria a definição dos seus elementos essenciais, nomeadamente a taxa e respetiva base de incidência (cf. artigo 8.º do regime jurídico da CSB).

  7. No que tange em específico a taxa de imposto a aplicar, o artigo 4.º do regime jurídico da CSB estatui que a mesma poderá variar “entre 0,01% e 0,05% em função do valor apurado” no que concerne à contribuição relativa aos passivos, e “entre 0,00010% e 0,00020% em função do valor apurado” no que concerne à contribuição relativa a instrumentos financeiros derivados.

  8. Sucede que, à face da redação atual da Lei constitucional, o princípio da legalidade exige que a lei determine a taxa dos impostos e não apenas os seus limites, como se previa anteriormente no artigo 70.º da Constituição de 1933, na redação conferida pela revisão de 1971.

  9. No entanto, na decisão ora recorrida, defende-se que a Portaria se limita a densificar as características gerais do regime jurídico aprovado.

  10. Ainda que tal fosse admissível, no que não se concede, a habilitação legal de fixação de taxas de imposto através de portaria apenas se deve considerar conforme à constituição desde que estabelecida de acordo com um critério de “razoabilidade quanto ao intervalo dentro do qual o legislador regulamentar podia fixar a taxa efectiva cuja razão de ser só poderia corresponder à sua preocupação de que esse intervalo não fosse de tal modo amplo que criasse uma incerteza intolerável quanto ao grau de amputação de riqueza admissível e esvaziasse de real conteúdo o juízo de opção política expresso num tal modo de tributação exigido ao legislador parlamentar.

    ” (Cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 70/2004.) S. No caso em apreço, a lei habilitante admite uma variação de 500% (atualmente 1100%) entre os montantes mínimo e máximo previstos.

  11. Ora, é evidente que margens tão amplas não podem ser tidas como razoáveis ou adequadas o que é sintomático se tomarmos como exemplo o caso do ora Recorrente.

  12. Acresce que, ao contrário do que se afirma na douta sentença recorrida, a Portaria em apreço não se limita a densificar as características da CSB. De facto, a Portaria desrespeita os ditames impostos pelo regime jurídico da CSB! V. Determinando o artigo 4.º do regime da CSB que as taxas do imposto variam “em função do valor apurado”, é evidente que o legislador pretendia que a referida taxa fosse uma taxa progressiva, i.e., aplicando-se aos escalões mais baixos determinada taxa, e uma taxa superior aos escalões superiores.

  13. Tendo a Portaria fixado taxas únicas, logicamente o seu valor não varia “em função do valor apurado” (conforme exigido pela norma habilitante), transfigurando, por conseguinte, a natureza da taxa aplicável, transformando-a numa taxa proporcional.

    X. Pelo que o legislador ordinário arrogou-se o direito de impor sobre os contribuintes a cobrança de um montante de imposto sempre mais elevado do que aquele que lhe era permitido pelo legislador parlamentar, pelo que a Portaria não pode deixar de ser considerada ilegal à luz da norma habilitante.

  14. No entanto, a ilegalidade da Portaria n.º 121/2011 não se basta pela alteração da natureza da taxa aplicável: também na definição da base de incidência veio este instrumento normativo ultrapassar aquilo que se encontrava previsto na norma habilitante: de facto, pese embora a alínea a) do artigo 3.º do regime jurídico da CSB previsse a dedução, à base de incidência, dos depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos, veio a Portaria n.º 121/2011 determinar, na alínea c) do número 2 do artigo 4.º que estes depósitos “relevam apenas na medida do montante efectivamente coberto por esse Fundo.”.

  15. Ora, admitindo que a lei habilitante permitia alterações tão profundas aos elementos essenciais do imposto, a lei habilitante revela-se manifestamente inconstitucional, por desrespeito do princípio da legalidade, em virtude da definição, através de portaria, dos seus elementos essenciais.

    AA. Por sua vez, no que se recorta ao vício de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, é para o ora Recorrente evidente que a teologia e pensamento legislativo subjacentes a este imposto se encontram feridos do mesmo vício de inconstitucionalidade, em virtude de inadmissível atropelo do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP.

    BB. Não...

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