Acórdão nº 0195/20.7BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – Em 13 de Janeiro de 2020, a A…………, S.A., com os sinais dos autos, propôs no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF do Porto), contra o Município do Porto, igualmente com os sinais dos autos, uma providência cautelar de suspensão de eficácia do acto praticado em 14 de Novembro de 2019 pela Exma. Sr.ª Directora do Departamento Municipal do Espaço Público, B…………, no uso da competência subdelegada pela O.S. I/396748/18/CMP de 15/11/2018, de indeferimento do pedido de licença de utilização de espaço público com publicidade (lona/tela) a colocar na fachada de edifício, pelo período de 10 meses.

2 – Por sentença de 17 de Março de 2020, o TAF do Porto considerou estarem preenchidos os pressupostos do artigo 121.º do CPTA, relativos à antecipação do juízo sobre a causa principal, e anulou o acto impugnado e suspendendo.

3 – Inconformado, o Município do Porto recorreu dessa decisão para o Tribunal Central Administrativo Norte (TCA Norte), que, por acórdão de 15 de Julho de 2020, concedeu provimento ao recurso e revogou a sentença do TAF do Porto, por considerar que da factualidade assente resultou provada a violação das normas regulamentares em matéria de ocupação do espaço público com publicidade.

4 – Inconformada com o acórdão do TCA Norte, a A. e aqui Recorrente, A…………, S.A., interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, o qual foi admitido por acórdão de 15 de Outubro de 2020, com o seguinte fundamento «[…] O processo de licenciamento sofreu vicissitudes, já que o primeiro parecer negativo da DG de Cultura do Norte supôs erroneamente que o edifício estava em obras e recaiu sobre uma tela diferente da proposta. Por outro lado, o desfecho dos pedidos de licenciamento do género, embora suportado em juízos estéticos dificilmente sindicáveis, exige sempre à Administração - «et pour cause» - um cuidado extremo na descrição exacta dos factos a submeter aos conceitos normativos, às vezes indeterminados, que devam activar-se. Até porque as condutas licenciáveis, embora relativamente proibidas, não o são em absoluto, motivo por que a exequibilidade delas só pode ser recusada quando as regras aplicáveis indesmentivelmente o impuserem.

Ora, e ao menos «primo conspectu», só uma análise detalhada do processo administrativo poderá dizer em que medida o primeiro parecer da DG de Cultura do Norte afectou o imediato projecto de indeferimento e este, por sua vez, se repercutiu na pronúncia final impugnada. E tal análise é ainda indispensável para se averiguar se o acto - na sua fundamentação ou nos seus pressupostos - elegeu e discriminou, suficientemente e com acerto, a situação factual determinativa do indeferimento.

Afigura-se-nos, pois, necessária a admissão do recurso para, superando as posições divergentes das instâncias e as hesitações havidas no processo de licenciamento, se obter uma segura aplicação do direito […]».

5 – A A. e aqui Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] 1.ª) A factualidade que o M.mo Juiz do Tribunal de 1.ª instância considerou essencial e com relevância para a boa decisão da causa fixada em 1ª instância contém a única matéria de facto atendível na presente causa e que tem que servir de base à decisão proferida, pois não foi objecto de recurso logo não foi alterada pelo Tribunal Central Administrativo, estando definitivamente fixada, balizando também os limites da apreciação feita pelas instâncias de recurso e, nomeadamente, no presente recurso.

2.ª) O Acórdão recorrido está ferido de nulidade por falta de fundamentação, porquanto o Tribunal a quo não carreou ao seu decisório, matéria de facto que justifique a decisão; 3.ª) O acto administrativo em crise indeferiu a pretensão da Requerente da licença invocando a violação do disposto nos artigos D-1/6°, n° 1, alínea l) e D-2/5°, n° 1, alínea b) do Código Regulamentar do Município do Porto (doravante CRMP), como verte do Facto Provado n.º 3 e fls. 12 e 13 do processo administrativo e como resulta do Acórdão recorrido a págs. 26, 1º parágrafo, ponto ii), sendo o preenchimento dos requisitos constantes destes artigos que tem que ser sindicado pelas instâncias; 4.ª) Para o indeferimento do licenciamento, ambos os artigos mencionados na conclusão precedente exigem que estejam em causa “ocupações do espaço público que prejudiquem: A visibilidade ou a leitura de fachadas por se sobreporem ou ocultarem elementos decorativos ou outros com interesse na composição arquitetónica ou decorativa.”; 5.ª) É uma conclusão insofismável, inquestionável, evidente e inegável qiue [sic] não se poderá provar ou dar como verificada a violação daquelas normas sem que se prove a existência dos ditos “elementos decorativos ou outros com interesse na composição arquitectónica ou decorativa.”; 6.ª) A prova da existência desses ditos elementos teria que constar do processo e ter sido levada ao elenco dos factos provados, bem como a explanação da razão de ser do seu interesse arquitectónico ou decorativo, o que não aconteceu em momento algum, não havendo no processo administrativo qualquer referência a esses elementos, nem tendo sido carreada para os autos, pelo Município, prova sobre essa existência; 7.ª) Por assim ser, foi sem mácula que a sentença de 1ª instância decidiu: “(…) da análise dos elementos dos autos apenas se pode concluir que a tela afixada está relacionada com a atividade exercida no local e encobre e impede a leitura dos elementos que compõem a fachada do edifício (janelas no piso intermédio).

Tal não é suficiente para concluir que a mesma se enquadra no âmbito da proibição por “prejudicar a visibilidade ou a leitura de fachadas por se sobreporem ou ocultarem elementos decorativos ou outros com interesse na composição arquitetónica ou decorativa”. Com efeito, não resulta do processo administrativo a referência a elemento decorativo ou outro com interesse na composição arquitetónica ou decorativa que justifique a proibição in casu. Da análise do mesmo e dos presentes autos, resulta até que o imóvel objeto da pretensão é uma construção nova (de 2014), inexistindo elementos decorativos ou outros com interesse na composição arquitetónica ou decorativa (cf. factos provados n.ºs 4 e 10). Pelo que se conclui pela existência de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.” – cfr. págs. 21 da sentença (sublinhados e negritos nossos); 8.ª) E por assim ser, também, em nenhum momento o Acórdão recorrido identifica, remetendo para o elenco dos factos provados, quais os supostos elementos decorativos ou outros com interesse na composição arquitectónica ou decorativa que seriam prejudicados ou ocultados pela tela cujo licenciamento foi requerido, falhando na demonstração factual da fundamentação da decisão proferida; 9.ª) Não é demonstrado, no acórdão em crise, o preenchimento factual dos requisitos constantes das normas invocadas como fundamento para o indeferimento, com indicação dos concretos elementos e do seu interesse arquitectónico ou decorativo, bem como do prejuízo sofrido; 10.ª) O primeiro argumento que o Acórdão recorrido afirma não ter sido tido em consideração pela 1ª Instância, como demonstrativo da existência de elementos arquitectónicos e decorativos impeditivos do licenciamento, é inexistente, já que remete para o teor de Informações a fls. 12 e 22 do P.A. que se limitam a fazer a transcrição das normas aplicadas sem que essas normas sejam concretizadas em factos, quer nas Informações, quer no Acórdão; 11.ª) O Acórdão recorrido menciona o artigo D-1/9º, al. i) que não tem relevo para a causa porque, primeiro, não é esse o artigo que serve de fundamento ao indeferimento; segundo, ainda que esse artigo fosse relevante, não há qualquer indicação da existência de elementos vazados ou salientes em causa, não se podendo confundir a mera referência à existência de uma janela com a existência de “elementos vazados” mencionada no dito artigo, porque são conceitos diferentes; 12.ª) O segundo argumento seria o facto de o edifício em crise estar inserido na Zona Histórica do Porto, classificada de Interesse Público só que, se é certo que não é pelo facto de a construção do imóvel datar de 2014 que, necessariamente, não tem elementos arquitectónicos relevantes, também é certo que o raciocínio inverso, feito pelo tribunal recorrido, também está errado: pois não é pelo simples facto de o edifício novo ter sido construído em zona histórica que passou a ter elementos arquitectónicos relevantes; 13.ª) Tanto assim que, de facto, não os tem e, por isso, não consta de nenhuma Informação que tenha sido levada aos Factos Provados, e portanto não pode ser apropriado pelo Acórdão em crise, qualquer referência à existência de elementos arquitectónicos relevantes a proteger; 14.ª) O preenchimento das normas invocadas como fundamento do indeferimento, como resulta do seu texto, não apela a qualquer juízo de valoração subjectiva, critérios estéticos ou qualquer exercício discricionário, antes indicando com clareza os elementos cuja existência tem que ser verificada para a sua aplicação, pelo que errou o Acórdão recorrido ao decidir que o Tribunal de 1ª instância “avaliou aspetos arquitetónicos e condições estéticas que se encontram no âmbito da discricionariedade técnica do Recorrente, sendo por isso, insindicáveis pelo tribunal, salvo casos extremos de erro manifesto, erro manifesto que, de forma alguma, se verifica nos presentes autos”, antes tendo andado bem o tribunal de 1ª instância ao declarar o erro manifesto dos serviços; 15.ª) O Acórdão recorrido viola o artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, o artigo 94.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e o artigo 158.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 1.º do C.P.T.A.) por padecer do vício de falta de fundamentação; 16.ª) O Acórdão recorrido viola o artigo 615º, nº 1, al. b) do Cód...

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