Acórdão nº 0353/11.5BECTB 01017/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1.

“Sociedade A…………… Lda.”, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que julgou improcedente a Impugnação Judicial por si deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA), e respectivos juros compensatórios, relativa ao terceiro trimestre de 2006, no montante total de 6.834,65€, interpôs recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2.

Após ter sido admitido o recurso, a Recorrente apresentou as respectivas alegações, aí formulando as seguintes conclusões: «• O veículo automóvel ……… adquirido pela Sociedade A………….., Lda, pelas suas características, destina-se exclusivamente ao exercício da actividade que é prosseguido pela dita sociedade “Agricultura e Produção Animal”, características que em função da utilização dada ao mesmo pela referida sociedade agrícola, não preenchem os elementos do tipo da previsão legal estatuída na parte final do artigo 21º do CIVA que exclui o direito à dedução de imposto; • Não resultou de facto provado, que a recorrente, utilizasse ou destinasse a identificada viatura automóvel a outro fim que não fosse o prosseguido para o exercício da actividade para a qual se encontra inscrita junto do Serviço de Finanças de Campo Maior, tal como resulta dos pontos A), B) e D) da matéria de facto dada como provada; • A dedução do imposto de IVA relativo à aquisição da viatura automóvel ………, ligeiro de mercadorias, foi correctamente efectuada pelo sujeito passivo ora recorrente; • A própria lei faculta, que para o preenchimento dos elementos do tipo da previsão legal estatuída sob o artigo 21º do CIVA e para que seja deduzido o IVA suportado com a aquisição da referida viatura, se possam integrar em Alternativa (ou) os conceitos de “unicamente ao transporte de mercadorias ou a uma utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial…”; • A previsão estabelecida no Art.º 21 do CIVA de “uma utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial…” preenche as características do veículo …….., até porque da própria lei não consta que a “utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial” quer objectivamente, quer subjectivamente, se destine exclusivamente ao transporte de mercadorias ou ao transporte de pessoas, ou a uma utilização mista, mas sim a uma utilização com carácter agrícola, comercial ou industrial; • Face ao que se mostra incorreto o procedimento da administração fiscal ao não aceitar a dedução do IVA contido nas despesas relativas à aquisição do veículo automóvel .......... propriedade da recorrente; • A questão objecto de apreciação na sentença recorrida, já foi corroborada em sentido contrário mediante decisões proferidas por outros Tribunais de 1ª Instância, que julgaram ações idênticas intentadas por contribuintes, nas quais vieram igualmente demandar a Fazenda Pública para que o Tribunal reconhecesse o direito à dedução de imposto relativo à aquisição de viaturas com as mesmas e idênticas características da viatura automóvel em causa nestes autos, neste sentido invoca-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo N.º 01137/06 de 02.05.2007, proferido no âmbito do recurso per saltum interposto na sequência da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa 2 (Loures) processo N.º 101/04.6BELRS, invocando-se igualmente a decisão proferida por este Tribunal.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente por provado, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra, que julgue a presente impugnação procedente por provada, porquanto a dedução pela impugnante do imposto de IVA relativa à aquisição veículo automóvel …….., no valor de 5.793,88 € foi correctamente efectuada, por o veículo em causa não integrar os elementos do tipo da previsão legal estatuída na parte final do artigo 21º do CIVA que exclui o direito à dedução de imposto, procedendo-se à anulação da liquidação da quantia de 5.793,88 €, e dos respectivos juros compensatórios no montante de 1.041,77 €, num total de 6.835,65 €, tudo nos termos e com as demais consequências legais, nomeadamente o pagamento de juros indemnizatórios a favor da ora impugnante, pelas quantias que esta condicionadamente pagou (6.835,65 €) nos termos do disposto no Art.º 43 da LGT».

1.3.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, não obstante ter sido notificada da interposição do recurso e da sua admissão, optou por não contra-alegar.

1.4.

Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, o Senhor Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de ser apreciado o mérito do recurso e lhe ser negado provimento, por ser de concluir que o veículo em causa integra o conceito de viatura de turismo tal como previsto no artigo 21.º n. 1 al. a) do CIVA.

1.5.

Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Conselheiros Adjuntos, submetem-se agora os autos à conferência para julgamento.

  1. OBJECTO DO RECURSO 2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

    Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou apenas parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas por as não ter identificado nas conclusões do recuso (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), situação em que não podem ser reapreciadas pelo Tribunal ad quem.

    Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

    2.2. Considerando a forma muito pouco rigorosa como este recurso foi interposto e nele foram produzidas as respectivas alegações, importa começar por tecer algumas considerações sobre as razões que conduziram a que este Supremo Tribunal Administrativo aceitasse a sua competência para apreciação do seu objecto.

    O primeiro aspecto a sublinhar é que se entendeu que o que o Recorrente verdadeiramente pretende com a alegação de existência de uma “oposição de acórdãos” é sublinhar que na sentença recorrida foi perfilhada uma interpretação do artigo 21.º, n.º 1 al. a) do CIVA distinta da que alegadamente foi acolhida num outro recurso por este Supremo Tribunal. Que assim é, resulta, desde logo, de essa alegação ter sido realizada manifestamente, quer na petição inicial (artigos 34.º a 40.º) quer nas alegações de recurso (cfr. fls. § 4 de 148 a § 3 de fls. 150 dos autos), como reforço argumentativo da existência de erro de interpretação da referida norma por parte da Administração Tributária. E resulta, ainda de forma mais concludente, do facto dos alegados “distintos sentidos decisórios “ decorrerem, por um lado, de um acórdão deste Supremo Tribunal e, por outro, da sentença de 1ª instância ora recorrida, ou seja, do facto de não existirem dois acórdãos em oposição. Por fim, resulta também do próprio regime legal invocado para sustentar a admissão do recurso (artigo 281.º do CPPT) e com a subsequente tramitação processual a que foi submetido.

    O segundo aspecto a sublinhar é o de que, pese embora a forma, temos que insistir, confusa como as alegações foram elaboradas, não subsistem dúvidas, face ao teor das conclusões, que a pretensão do Recorrente se reconduz exclusivamente a uma pretensão de direito, ou seja, que o objecto do presente recurso se esgota unicamente no erro de julgamento de direito em que o Tribunal a quo terá incorrido na interpretação do artigo 21.º, n.º 1 al. a) do CIVA, especialmente na parte em que não considerou que o legislador admite a dedução do imposto em duas situações distintas ou alternativas, contrariamente ao que foi julgado na sentença recorrida.

    O terceiro e último aspecto a salientar prende-se com o teor das conclusões com que o Recorrente remata as suas alegações, que, como dissemos já, delimitam o objecto do recurso, das quais ficou claramente excluída a questão da alegada nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia [com fundamento em que o Tribunal a quo se não terá pronunciado sobre a existência de uma sentença de 1ª instância e um acórdão deste Supremo Tribunal, por si alegada nos artigos 14.º a 26.º da petição inicial, que demonstravam o erro de interpretação em que incorrera a Administração Tributária], que, nesta medida, não integrando o objecto do recurso não será por nós apreciada.

    2.3.

    Posto isto, podemos agora afirmar que são duas as questões principais a julgar.

    A primeira questão está relacionada com o âmbito de aplicação do artigo 21.º, n.º 1 al. a) do Código de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (CIVA). Mais concretamente, com o conceito de viatura de turismo consagrado na referido artigo e a susceptibilidade de uma viatura classificada como “ligeiro de mercadorias”, com um lotação de cinco lugares e exclusivamente utilizadas no exercício de actividade empresarial, não ser, como defende a Recorrente, integrada no conceito de viatura de turismo consagrado na norma citada, com a consequente admissibilidade de dedução de IVA.

    A segunda questão que teremos que enfrentar está dependente da resposta que for dada àquela primeira. Sendo-lhe dada resposta negativa, haverá que apreciar se, mesmo assim, nas circunstâncias de facto dos autos, são devidos juros compensatórios pelo sujeito passivo. Se a resposta for afirmativa e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, cumprirá então decidir se Administração deve ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios pelos prejuízos causados pela...

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