Acórdão nº 0357/18.7BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A…………….. e mulher, B…………, ambos com os sinais dos autos, vêm, ao abrigo do artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excecional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 21 de maio de 2020, que negou provimento ao recurso por eles interposto da sentença do TAF de Viseu que julgara improcedente a impugnação judicial por eles deduzida da liquidação de IRS relativa ao ano de 2013 e respectivos juros compensatórios derivada da correcção relativa à transmissão de acções detidas pelo recorrente marido no Banco C………..

Os recorrentes terminam as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: A.

A presente revista excecional vem interposta da decisão proferida pelo TCAN, em 21 de maio de 2020, que negou provimento ao recurso oportunamente interposto pelos Recorrentes e manteve a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu nos autos de impugnação judicial com o n.º 357/18.7BEVIS, relativos à impugnação judicial da liquidação adicional de IRS n.º 2018 5000890205, referente ao ano de 2013, inerente liquidação de juros compensatórios n.º 2018 00006845527 e respetiva demonstração de acerto de contas n.º 2018 00002730605, com o saldo global a pagar de EUR 17.239.354,48.

Da admissibilidade da revista excecional no caso concreto B.

À luz da doutrina e jurisprudência, o recurso de revista excecional é admissível no contencioso tributário, desde que verificados os requisitos de que depende o uso deste meio excecional de recurso, que, até à entrada em vigor da Lei n.º 118/2019 e respetiva redação dada ao n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, mostram-se aferidos por remissão para o artigo 150.º do CPTA.

C. A questão relativamente à qual se entende que se verifica o pressuposto de excecionalidade e que se pretende ver reapreciada é a relativa à suscetibilidade de aplicação do artigo 52.º do Código do IRS às situações, como a dos autos, em que se apura que a mais-valia foi realizada por uma outra entidade que não o sujeito passivo deste imposto, ainda que direta e indiretamente por si detida, e respetiva compatibilidade com o princípio da capacidade contributiva; ou seja, a suscetibilidade de aplicação do artigo 52.º do Código do IRS, quando a correção do valor declarado (na transmissão das ações por entrada em espécie) é feita com o objetivo de tributar um suposto aumento de capacidade contributiva assente na consequente valorização da participação social que o alienante, pessoa singular, detém/passou a deter na sociedade que, por sua vez e por um valor superior, revendeu as ações por este primitivamente transmitidas e que realizou, enquanto entidade distinta, uma mais-valia, ou numa suposta poupança fiscal daí decorrente.

D.

Estamos perante uma questão que, prendendo-se com o âmbito de aplicação de uma disposição do Código do IRS, assume dimensão substantiva transversal, potencialmente aplicável a qualquer sujeito passivo deste imposto, sabendo-se, ademais, que a transmissão de ações ou a realização de entradas em espécie em sociedades são operações frequentes, assim como proliferam no comércio jurídico os atos constitutivos de sociedades e a celebração de negócios entre partes relacionadas entre diferentes territórios.

E.

A questão reveste-se, em face de inexistência de jurisprudência anterior conhecida ou especial doutrina sobre a matéria e âmbito de aplicação do artigo 52.º do Código do IRS – tal como revela a já aludida falta de invocação de doutrina ou especial jurisprudência no Acórdão recorrido ou em 1.ª instância – de ineditismo ou novidade, e revela especial capacidade de controvérsia relativamente a futuros casos do mesmo tipo, relativos a transmissão de ações.

F. Por se tratar de uma disposição legal de que a AT poderá passar a lançar mão para tributar situações semelhantes em que ocorre uma transmissão de ações de uma pessoa singular para uma pessoa coletiva e, ulteriormente, a realização da mais-valia da alienação dessas ações na esfera dessa pessoa coletiva, urge definir o que decorre, com clareza, da lei – i.e., do disposto no artigo 52.º do Código do IRS –, mostrando-se necessário conjugar, para o efeito, tal disposição com outros regimes legais potencialmente aplicáveis, respetivos pressupostos, garantias dos contribuintes que visam acautelar e, bem assim, com as regras constitucionais a este respeito, não sendo, pois, simples a respetiva apreciação e assumindo, por isso, a questão levantada significativa relevância jurídica.

G.

É inegável a premência da intervenção do STA, enquanto órgão de cúpula da justiça administrativa e fiscal, para dissipar dúvidas e alcançar a melhor aplicação das normas jurídicas sobre a questão subjacente aos presentes autos, referente à aplicação do disposto no artigo 52º do Código do IRS, para uma melhor aplicação do direito.

H.

Igualmente, tratando-se, como se apontou, de uma questão de especial relevo jurídico, que requer um estudo aprofundado e um especial esforço interpretativo de articulação de diferentes disposições legais e constitucionais, cuja apreciação pelo STA se reveste de importância fundamental, atenta a suscetibilidade de repetição em casos futuros relativos a outros sujeitos passivos de IRS a quem a AT pretenda aplicar a citada disposição, nas frequentes situações de – nas palavras da decisão proferida em 1.ª instância nos autos – “intermediação envolvendo incrementos patrimoniais” relativos à transmissão de ações, a utilidade da decisão a proferir extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas neste litígio, mostrando-se igualmente preenchido o requisito previsto na primeira parte do n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, equivalente ao previstos na primeira parte do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, para a admissão, a título excecional, da presente revista, o que se requer.

Da revista propriamente dita I.

O Acórdão recorrido sufragou a tese de que a aplicação do disposto no n.º 1 e na alínea b) do n.º 2 do artigo 52.º do Código do IRS, na situação em discussão em juízo, não viola o princípio da capacidade contributiva, o qual é corolário do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da CRP, na medida em que “(…) não é possível afirmar que a tributação incide sobre uma riqueza que não existe ou que não está de acordo com a sua “capacidade de gastar”, pois os Recorrentes têm o incremento patrimonial que decorre da consequente valorização das ações que detêm naquelas sociedades” (Cf. página 35 do Acórdão Recorrido) e que “o facto de as mais valias apuradas na transmissão das ações não terem sido objeto de tributação, de todo em todo (ocorrendo, nas palavras da AT, uma «dupla não tributação»), permitiu aos Recorrentes uma poupança fiscal que se traduz numa evidente maior capacidade contributiva” .

J.

Decorre das palavras supracitadas do próprio Tribunal Recorrido, que o valor de alienação de EUR 55.525.600 (USD 76.000.000) presumidamente fixado pela AT no ato tributário em causa visou não tributar o valor da contraprestação direta do aqui Recorrente marido com a transmissão das ações por si detidas no C……….., mas sim: (i) tributar um aumento da capacidade contributiva decorrente da consequente valorização das...

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