Acórdão nº 0522/10.5BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;# I.

Entreposto A……………………………, S.A., …, recorre da sentença, proferida, em 31 de março de 2020, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, que julgou improcedente, impugnação judicial apresentada na sequência da determinação de dívida de contribuições, para com a Segurança Social, na importância de € 53.635,70.

Alegou e concluiu: « I. O presente recurso é interposto contra a Sentença proferida nos presentes autos de Impugnação Judicial e que julgou improcedente a pretensão da, ora, Recorrente, relativamente à ilegalidade das liquidações de contribuições para a Segurança Social, relativas a despesas de transporte e a gratificações pagas aos seus trabalhadores, no valor global de € 53.635,70.

  1. Na Petição Inicial, a Recorrente pugnou pela anulação das liquidações em apreço, com os seguintes fundamentos: a) Prescrição parcial da dívida tributária, em relação ao período compreendido entre 1/2004 a 8/2004: e b) Ilegalidade da liquidação por erro nos pressupostos de facto e de direito no que concerne à qualificação das despesas de transporte e às ‘gratificações’ como remunerações para efeitos de Contribuições perante a Segurança Social.

  2. A Sentença recorrida preconiza uma errónea qualificação jurídica das prestações pagas pela Recorrente a colaboradores e a título de despesas de transporte, bem como a título de bónus/gratificações, na medida em que considerou que tais prestações consubstanciam remunerações sujeitas a contribuições para a Segurança social.

  3. De igual modo, no que concerne à prescrição parcial da dívida tributária relativa ao período compreendido entre Janeiro de 2004 e Agosto de 2004, no montante de € 7.090,18, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria entendeu, indevidamente e tanto quanto é possível compreender, que não dispunha de todos os elementos para conhecer tal vício em sede de Impugnação Judicial.

    Da nulidade da Sentença V. Relativamente à prescrição, considerou a Sentença recorrida que, tratando-se a prescrição de vício que só pode conhecer-se, em impugnação judicial, incidentalmente, como eventual causa de inutilidade superveniente da lide, se o processo disponibilizar, sem necessidade de averiguação, todos os elementos factuais necessários, esta circunstância não ocorreria nos presentes autos.

  4. Verifica-se, porém, que a Sentença recorrida não especificou, minimamente, quais os concretos “elementos factuais necessários” ao conhecimento da prescrição que, no seu entender, não seriam disponibilizados pelo presente processo.

  5. É, por isso, absolutamente impossível conhecer qual a fundamentação da Sentença relativamente a este segmento decisório e, designadamente, confirmar a conclusão alcançada.

  6. Isto quando é certo que se afigura que o Tribunal a quo dispunha de todos os “elementos factuais necessários” ao conhecimento da prescrição, designadamente: a. A data em que foram pagos o subsídio de transporte e as 'gratificações’; b. A data em que o Recorrente foi notificado para exercício do direito de audição prévia; e c. Todos os demais actos que foram praticados pela Segurança Social no âmbito deste processo (constantes do Processo Administrativo junto aos autos) IX. A Sentença recorrida é, assim, nula, nos termos do número 1 do artigo 125.° do CPPT, por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, devendo, em consequência, ser anulada.

    Dos erros de julgamento X. Sem prescindir do exposto, o regime de prescrição das contribuições e cotizações para a Segurança Social em vigor no ano de 2004 encontrava-se previsto no artigo 49.° da Lei n.° 32/2002, de 20 de Dezembro, de acordo com o qual “A obrigação do pagamento das cotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida”.

  7. Do mesmo passo, à data, a obrigação de pagamento das cotizações e das contribuições para a Segurança Social deveria ser efectuada até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que dissessem respeito.

  8. Sendo que resultava do número 4 do artigo 49.° do referido Decreto-Lei que a "prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida".

  9. Ora, em causa, estão contribuições, mensais, referentes aos anos económicos de 2004 a 2009.

  10. Conforme decorre das alíneas L) e M) dos factos provados identificados na Sentença recorrida, a Segurança Social notificou o Recorrente para exercer o Direito de Audição relativamente à sua intenção de proceder à liquidação oficiosa de contribuições, por ofício de 30 de Setembro de 2009, XV. O qual foi recebido pelo Recorrente a 6 de Outubro de 2009.

  11. Assim, os prazos de prescrição, que tiveram início nos dias 15 dos meses seguintes àquele a que as contribuições diriam respeito, interromperam-se, apenas, com a notificação da Recorrente para o exercício do direito de Audição Prévia relativamente ao Projecto de Decisão da Segurança Social de liquidar oficiosamente as contribuições ora sindicadas, ou seja, no dia 6 de Outubro de 2009.

  12. Em face dos factos e do regime de prescrição acima expostos, e tendo em consideração os mapas de apuramento de remunerações anexos ao Relatório Final de Inspecção, constata-se que, à data em que foram liquidadas oficiosamente, se encontravam, já, prescritas as contribuições referentes aos períodos de 2004/01, 2004/02, 2004/03, 2004/04, 2004/05, 2004/06, 2004/07 e 2004/08.

  13. Verificando-se, assim, que o Tribunal dispunha de todos os “elementos factuais necessários” ao conhecimento da prescrição e não tendo conhecido da prescrição das contribuições acima referidas, a Sentença recorrida é violadora, entre outros, do artigo 49.° da Lei n.° 32/2002, de 20 de Dezembro, incorrendo em evidente erro de julgamento, ao não reconhecer a prescrição das contribuições relativas ao período compreendido entre Janeiro de 2004 e Agosto de 2004 e, devendo, em consequência, ser anulada e substituída por outra Decisão que reconheça a predita prescrição e a consequente anulação das liquidações impugnadas.

  14. No que se refere ao montante atribuído pelo Recorrente aos seus colaboradores a título de despesas de transporte, considerou a Sentença recorrida que, uma vez que o mesmo visava, apenas, suportar o encargo pela deslocação entre a residência dos trabalhadores do Recorrente e as instalações deste, e vice-versa, não cabe no conceito de “despesa ao serviço da entidade patronal”, encontrando-se, por isso, excluída do âmbito de aplicação da norma consagrada no citado artigo 3.°, alínea a), do Decreto Regulamentar n.° 12/83, de 12 de Fevereiro.

  15. Sucede que as quantias, assim, pagas aos trabalhadores encontravam-se definidas à priori, e indexadas ao valor do Passe Social disponibilizado pela Rodoviária do Tejo, S.A., deduzidas de uma percentagem de 10%, imputada ao uso a título pessoal.

  16. Mais ainda: a quantia paga individualmente a cada um dos seus trabalhadores era apurada pelo Recorrente com base no custo do passe social, também, individualmente apurado para cada um dos trabalhadores, em função do respectivo domicílio e apenas em função do número de dias efectivamente trabalhado.

  17. Ora, a própria lei previa, à data a que se reportam os factos em apreço (tal como, hoje, continua a prever) a possibilidade de as despesas de transportes dos trabalhadores poderem ser compensadas pela respectiva entidade empregadora, mesmo quando aqueles se deslocam em viatura própria.

  18. Com efeito, à data dos factos, a questão encontrava-se expressamente prevista no Decreto Regulamentar n.° 12/83, de 12 de Fevereiro, que regulava a base de incidência das contribuições para a segurança social, resultando, então, cristalinamente, do disposto na alínea a) do artigo 3.° deste Decreto Regulamentar n.° 12/83, de 12 de Fevereiro, que "não se consideram remunerações (...) as despesas de transporte’’.

  19. Aqui, o legislador não fazia qualquer distinção sobre o tipo de despesas de transporte que se consideravam excluídas da base de incidência das contribuições para a Segurança Social, por não serem consideradas remuneração.

  20. Assim sendo, não só o pagamento das quantias em causa não constituía contrapartida do trabalho prestado pelos trabalhadores do Recorrente, como, pelo contrário, tinha uma função eminentemente social e que visava suprir uma carência na rede de transportes públicos na Zona Industrial de Santarém, que, aliás, ainda hoje se sente.

  21. Acresce que, se o legislador tivesse querido excluir as deslocações entre o domicílio dos trabalhadores e as instalações dos empregadores do conceito de despesas de deslocação que não integram o conceito de retribuição para efeitos de determinação da base de incidência das contribuições para a Segurança Social ao abrigo do Decreto Regulamentar n.° 12/83, de 12 de Fevereiro, não deixaria de o afirmar expressamente. Em concreto, porém, o legislador não o fez.

  22. E onde o legislador não distingue, não cabe ao intérprete distinguir.

  23. Refira-se, finalmente, que tal interpretação da exclusão constante da referida alínea a) do artigo 3.° deste Decreto Regulamentar n.° 12/83, de 12 de Fevereiro, encontra, também, suporte no elemento histórico, já que o Código Contributivo, actualmente em vigor, veio, na alínea t) do n.° 2 do seu artigo 46.°, delimitar as despesas de transporte que integram a base de incidência contributiva às "despesas de transporte, pecuniárias ou não, suportadas pela entidade empregadora para custear as deslocações em benefício dos trabalhadores, na medida em que estas não se traduzam na utilização de meio de transporte disponibilizado pela entidade empregadora ou em que excedam o valor de passe social ou, na inexistência deste, o que resultaria da utilização de transportes coletivos, desde que quer a disponibilização daquele quer a atribuição destas tenha caráter geral”.

  24. Ou seja, do exposto resulta que, por um lado, no âmbito da vigência do Decreto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT