Acórdão nº 0306/13.9BELRS 0424/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

*Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1– Relatório Notificado do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, exarado nos autos, a Representante da Fazenda Pública, vem, nos termos do art. 615º n.º 1 al. d) e n.º 4 e do art. 666º n.º 1, ambos do CPC, aplicáveis subsidiariamente por força do art. 2º al. e) do CPPT, arguir a sua nulidade, conforme expõe e peticiona: “I. Dos Fundamentos: 1) A al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, prevê que a sentença é nula quando: “d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”.

2) Por outro lado, de acordo com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo, tal nulidade só pode ser arguida “perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário”.

3) O mesmo regime legal se aplica ao acórdão agora proferido, nos termos do art. 666º n.º 1 do CPC.

4) Nesta conformidade, vem a Fazenda Pública, perante o tribunal que proferiu o acórdão, arguir a nulidade consubstanciada no facto do mesmo não se pronunciar sobre questões que devia apreciar.

Assim, 5) No douto acórdão proferido, quanto ao ponto “Da interpretação efectuada do n.º 14 do artigo 88.º do CIRC” ficou decidido: “Vejamos.

A julgadora arrimou-se a dada jurisprudência firmada pelo Tribunal Constitucional para concluir pela conformidade à Lei Fundamental da norma interpretativa consagrada no n.º 20 do artigo 88.º do CIRC.

Todavia, conforme bem assinalou a Recorrente, a jurisprudência do Tribunal Constitucional, mormente o douto Acórdão n.º 172/2000, da 29 Secção, no Processo n.º 762/98, veio declarar a incompatibilidade das normas interpretativas com o princípio da proibição de retroactividade dos impostos.” (págs. 31 e 32 do acórdão) E “sufragando plenamente o seu discurso fundamentador” (pág. 32 do acórdão), isto é, do aludido acórdão n.º 172/2000, este alto Tribunal concluiu: “Por esse prisma, procedem inteiramente as razões supra aduzidas pela recorrente quanto ao fundamento recursório sob análise.” (pág. 36 do acórdão).

Ora, 6) Os argumentos e as questões colocadas pelo Recorrente no acórdão proferido, conforme melhor consta destacado na pág. 31, são, em concreto, se: - A interpretação preconizada pelo Tribunal a quo, era uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar; - Mesmo a ser admitido esse entendimento, estamos perante uma situação de retroatividade autêntica, violando a decisão recorrida o art. 12º n.º 1 da LGT, e o art. 103º n.º 3 da CRP; - Não se entendendo desta forma, o art. 88º n.º 20 do CIRC, introduzido pela Lei n.º 7-A/2016, de 30/03, conjugada com a norma do art. 135.º do mesmo diploma, interpretadas e aplicadas no sentido de, independentemente da respetiva natureza interpretativa, abrangerem no seu âmbito de vigência temporal factos tributários ocorridos antes da sua entrada em vigor, viola o princípio da proibição da retroactividade previsto no art. 103º n.º 3 da CRP; - O art. 88 n.° 14 do CIRC, numa interpretação que tome em consideração os elementos gramatical, histórico, teleológico e sistemático, aponta claramente no sentido de que os "sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal” a que se refere o dispositivo são as empresas individualmente consideradas e não o grupo empresarial.

7) Conforme elencado no acórdão lavrado, a primeira questão a analisar passaria por apreciar se a interpretação preconizada pelo Tribunal a quo, era uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar.

Esta questão não ficou minimamente tratada, já que o acórdão lavrado apenas decidiu, por remissão para o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 172/2000, que, em termos gerais, as normas interpretativas são incompatíveis com a proibição da retroatividade em matéria fiscal, consagrado no n.º 3 do art. 103º da CRP.

8) Verifica-se, assim, que o douto Tribunal deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, dado que, conforme elencado no acórdão lavrado, a primeira questão a analisar passaria por apreciar se a interpretação preconizada pelo Tribunal a quo, era uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar.

9) Conforme resulta da jurisprudência do Tribunal Constitucional, para efeitos de apreciar se a interpretação preconizada pelo Tribunal a quo, era uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar, importa verificar se “tendo os tribunais sido chamados a pronunciarem-se sobre a interpretação a dar a leis ambíguas e controvertidas, se tenha a propósito delas estabelecido uma controvérsia jurisprudencial. Se os tribunais, aos quais cabe a autoridade de dizer o direito ─ através de decisões juridicamente fundamentadas e no termo de um processo de partes com igualdade de armas ─, refletem e alimentam a controvérsia propiciada pela ambiguidade da lei, é inevitável concluir que a questão jurídica é, no momento presente, incerta ou insanável; os destinatários desta não têm, nessas circunstâncias, qualquer razão para formarem expectativas na prevalência de uma das posições compreendidas nos «quadros da controvérsia», e não podem, por essa mesma razão, invocar a frustração das suas expectativas legítimas contra a decisão do legislador de interpretar a lei num dos sentidos já acolhidos em decisões judiciais. O mesmo se diga, por maioria de razão, nos casos em que a jurisprudência dominante for no sentido da solução consagrada pela lei interpretativa.” (vide acórdão do Tribunal Constitucional n.º 395/2017, lavrado no processo n.º 751/2016, pela 3ª Secção, em 12/07/2017, acessível no site do Tribunal Constitucional).

10) No acórdão lavrado esta análise não foi feita, o que se afigurava fundamental, dado que a questão de interpretação que na presente situação apresenta relevo, foi feita não só pelo Tribunal a quo, bem como por jurisprudência arbitral, nomeadamente nos acórdãos proferido pelo CAAD nos processos n.º 239/2014-T, de 01/09/2014, n.º 659/2014-T, de 24/04/2015.

Também o Supremo Tribunal Administrativo já procedeu a esta interpretação no acórdão lavrado no processo n.º 01065/17.1BEPRT, de 19/02/2020, acessível integralmente em www.dgsi.pt.

Sendo ainda pertinente sublinhar que, inclusive, o próprio Tribunal Constitucional também já fez essa interpretação no acórdão n.º 395/2017 (processo n.º 751/2016), de 12/07/2017 (vide www.tribunalconstitucional.pt).

11) E, nestes dois arestos identificados (acórdão do STA 01065/17.1BEPRT e acórdão do Tribunal Constitucional n.º 395/2017) ficou concluído por uma “interpretação jurisdicional” da norma interpretanda (art. 88º n.º 14 do CIRC, por via da norma interpretativa constante do art. 135º da Lei n.º 7-A/2016, de 30/03) com o mesmo sentido fixado pelo art. 88º n.º 20 do CIRC, convocando os princípios hermenêuticos aplicáveis.

12) Ou seja, no Supremo Tribunal Administrativo ficou decidido que: “III - O teor literal do art.88º nº 14 CIRC permite, por mera interpretação declarativa atribuir a qualificação de sujeito passivo à sociedade dominante dos grupos submetidos ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS), por subsunção ao conceito legal de sujeito passivo e em virtude da sua qualidade de responsável, em primeira linha, pelo pagamento do IRC do grupo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT