Acórdão nº 02386/16.6BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | ADRIANO CUNHA |
Data da Resolução | 18 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recursos de revista de acórdãos dos TCA Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1. A……………..
veio interpor o presente recurso jurisdicional de revista do Acórdão proferido em 14/2/2020 pelo Tribunal Central Administrativo Norte, “TCAN” (cfr. fls. 433 e segs. SITAF), o qual confirmou a sentença, de 2/8/2019, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, “TAF/Porto” (cfr. fls. 341 e segs. SITAF) que julgara improcedente a presente ação administrativa por si intentada contra o “Estado Português”, representado pelo Ministério Público, e, em consequência, absolvera o Réu do pedido indemnizatório formulado com fundamento em responsabilidade civil extracontratual do Estado por alegada violação do direito da Autora a uma decisão em prazo razoável no processo nº 990/08.5TVPRT que correu termos na 1ª Vara Cível do Porto.
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Inconformada com este julgamento do “TCAN”, a Autora interpôs para este STA o presente recurso de revista, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 497 e segs. SITAF): «1. O recurso de revista é admissível.
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O TCAN decidiu à revelia da jurisprudência do Tribunal Europeu e do STA em matéria de prova, não dando como provados factos que se presumem provados e não considerando o Estado-cobrador de impostos responsável pelas delongas dos peritos.
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As instâncias violaram a jurisprudência do TEDH, nomeadamente a respeitante ao artigo 6º, nº 1, da CEDH, que assim foi violado.
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A duração excessiva de um processo causa danos morais que se presumem.
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A autora tem de se defender. A autora tem de se servir de todos os meios legais ao seu alcance.
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O Estado é responsável pelos serviços das perícias.
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E se não tem peritos profissionais que os crie, que ponha um IML em cada concelho.
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A requerente foi submetida a exames periciais a partir de 14/12/2009 até 24/01/2013, por MAIS DE TRÊS ANOS, sendo os exames adiados ou retardados por inércia ou falta dos peritos.
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O raciocínio do tribunal já foi condenado várias vezes pelo TEDH, nomeadamente tendo Portugal como réu.
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A duração do processo, inclusive das perícias, é excessivo.
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O atraso na duração das perícias não tem justificação.
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O Estado é responsável pela duração das perícias.
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O tribunal não pode retirar conclusões negativas de factos não escrutinados no processo. Isso é questão nova, portanto são violados artigos 3º e ss. do CPC.
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A autora em nada concorreu para o atraso do processo.
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Foi violado o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o artigo 3º e seguintes do CPC.
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Que deveriam ser interpretados no sentido destas conclusões.
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Deve condenar-se como consta na PI, assim se revogando a sentença: “Nestes termos e nos demais de direito deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e, em consequência, deve: 1. Declarar-se que o Estado Português violou o artigo 20º, n ºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável”; 2. Condenar-se o Estado Português a pagar à autora: a) Uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a doze mil euros, pela duração do processo 990/08.5TVPRT, na 1ª Vara Cível do Porto; b) Uma indemnização de dois mil euros por cada ano de duração do presente processo sobre a morosidade, agora instaurado, após o decurso de dois anos, até ao seu termo incluindo liquidações, também a título de danos morais.
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Juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento sobre as verbas em a) a b); 3. Despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pela autora, despesas de certidões, todas as despesas de tradução de documentos; 4. Condenar-se o Estado Português a pagar os honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos em quantia a fixar equitativamente conforme consta desta petição inicial ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados.
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Deve condenar-se o Estado a pagar uma sanção pecuniária compulsória de cem euros por dia, por cada despacho, decisão do tribunal ou acto dos funcionários que ultrapasse os prazos legais, ou caso o processo dure mais de dois anos, incluindo liquidação de honorários.
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E a todas as verbas atrás referidas devem acrescer quaisquer quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado; 7. Deve ainda ser condenado em custas e demais encargos legais, como o reembolso de taxas de justiça inicial e outras e quaisquer outras pagas pela autora.
Justiça!”» 3. O Réu/Recorrido, conquanto para tanto notificado (cfr. fls. 534 e segs. SITAF), não apresentou contra-alegações.
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O presente recurso de revista foi admitido por Acórdão de 10/9/2020 (cfr. fls. 542 e segs. SITAF) proferido pela formação de apreciação preliminar deste STA, prevista no nº 5 do art. 150º do CPTA, designadamente nos seguintes termos: «(…) A autora e aqui recorrente propôs contra o Estado a presente acção de indemnização fundada em atraso na realização da justiça, pois considera inadmissível e ilícito que as perícias médicas a que foi submetida — num processo que instaurou nas Varas Cíveis do Porto contra uma seguradora por causa dos danos que sofrera num acidente de viação — demorassem cerca de quatro anos, circunstância que prolongou a pendência da causa por quase cinco anos e meio.
As instâncias convieram na improcedência da acção porque a multiplicidade e a complexidade dos exames médicos à autora — ademais, dificultados pela necessidade de destrinçar certas patologias anteriores ao acidente de viação das lesões e sequelas por este provocadas — tomariam justificável e lícita aquela demora de («circa») quatro anos.
Na sua revista, a recorrente insurge-se contra esse entendimento, considerando-o desconforme à jurisprudência do TEDH e, até, à deste Supremo.
Ora, a posição das instâncias, desvalorizadora do tempo consumido nos exames médico-legais, não é isenta de controvérsia, sobretudo à luz da jurisprudência internacional. E convém que o Supremo reanalise o assunto para garantir uma correcta aplicação do direito e, ainda, para aportar directrizes na matéria e para eventualmente prevenir um hipotético accionamento do Estado em instâncias europeias.
Justifica-se, portanto, o recebimento do recurso (…)».
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Colhidos os vistos, o processo vem submetido à Conferência, cumprindo apreciar e decidir.
* II - DAS QUESTÕES A DECIDIR 6. Constitui objeto do presente recurso e revista: Apreciar se o Acórdão TCAN recorrido julgou com acerto ao confirmar a sentença do TAF/Porto, que julgara improcedente a presente ação administrativa intentada pela Autora/Recorrente e, em consequência, absolvera o Réu “Estado” pedido indemnizatório formulado com fundamento em responsabilidade civil extracontratual do Estado por alegada violação do direito da Autora/Recorrente a uma decisão em prazo razoável no processo nº 990/08.5TVPRT que correu termos na 1ª Vara Cível do Porto.
Cumpre, em suma, apreciar se se encontram reunidos, no caso, os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual em causa – como defende a Autora/Recorrente -, ou não, como decidiram as instâncias.
* III - FUNDAMENTAÇÃO III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 7. As instâncias deram como provados os seguintes factos: «1) Em 24/10/2008 a autora propôs acção contra a “Companhia de Seguros ………………, S. A.”, por causa dum acidente de viação que tinha ocorrido em 8/11/2005, na qual a autora peticionava, a título de ressarcimento de danos o pagamento da quantia de 233.173,77 euros, acção essa que correu na lª Vara Cível com o n° 990/08.5TVPRT – cf. p.i. da acção; 2) Os danos sofridos vêm relatados a folhas 169 e ss; 210 e ss; 226 e ss; 238 e ss; 249 e ss; 258 e ss; 277 e ss; 299 e ss; 345 e ss; 368 e ss; 370 e ss; 375; 377 e ss; 409 e ss; 3) A folhas 278, em 14/07/2011, foi-lhe atribuída uma IPP de 40,6%; 4) Os relatórios médicos mostram, nomeadamente, que a autora por causa do acidente teve agressões ao seu pescoço que deixaram cicatrizes de 4 cm (folhas 411), diminuição da sensibilidade no braço e antebraço e no primeiro e segundo dedo; 5) A “Companhia de Seguros ……………, S. A.” contestou em 05/12/2008 – fls. 54; 6) Em 18/02/2009 foi elaborado despacho saneador – fls.106; 7) Em 02/03/2009 e 06/03/2009 foram apresentados pelas partes requerimentos de prova – fls. 118 e 125; 8) Na sequência de requerimento das partes, em 14/12/2009, foi ordenada a realização de perícia pelo INML – fls. 181; 9) A A. foi submetida a vários exames periciais, de várias especialidades, entre 28/1/2010 e 30/1/2014, com a sequência temporal seguinte: I. A A. foi convocada para ser submetida a perícia médico-legal cível – avaliação do dano corporal para o dia 28/1/2010; II. Para realização de perícia médico-legal de psiquiatria para o dia 2/6/2010; III. Em 28/1/2010 o INML apresentou relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito cível, no qual vem referido, entre o mais, que a autora terá tido no ano de 2004 um acidente de viação de características semelhantes ao acidente ocorrido em 8/11/2005, tendo sido solicitado para uma avaliação mais completa da ora A., o envio de diversos registos clínicos; IV. Em 1/6/2010 foi apresentado o relatório da perícia médico-legal de psiquiatria; V. Por ofício de 21/6/2010, o INML voltou a solicitar os elementos clínicos da Autora existentes noutros estabelecimentos de saúde; VI. Em 24/11/2010 foram remetidos ao INML os relatórios clínicos; VII. Em 10/3/2011 o Tribunal solicitou ao INML informação sobre o estado do exame pericial feito à A.; VIII. Com data de 8/4/2011 o INML enviou ao Tribunal o relatório da perícia do qual consta que, para esclarecimento de nexo de causalidade e para uma avaliação mais completa, a examinada, ora A. devia ser submetida a exame da especialidade de neurocirurgia a ter lugar em 2/6/2011; IX. Em 7/6/2011 o INML apresentou o relatório da perícia médico-legal de...
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