Acórdão nº 058/20.6BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1– Relatório A Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), aplicável ex vi artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributaria — “RJAT”) interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no processo n.º 748/2019-T, em 07.04.2020, do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em que é Recorrida A………………….., sinalizada nos autos, no que respeita à tributação no âmbito de IRS a sujeitos passivos não residentes em território nacional - subsumível ao disposto no artigo 43º, nº 2 do CIRS, invocando oposição entre a decisão arbitral anteriormente identificada e a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral com o nº 539/2018-T, que se indica como fundamento.

Inconformada, formulou a recorrente Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, as seguintes conclusões: A – O Acórdão arbitral recorrido (748/2019-T) incorreu em erro de julgamento, porquanto decidiu o Tribunal Arbitral “(…)Anular parcialmente a liquidação subjacente, na parte correspondente ao acréscimo de tributação resultante da consideração total da mais-valia imobiliária, ii. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira na restituição do valor correspondente ao valor do imposto indevidamente pago, iii. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios desde a data em que a Requerente efectuou o pagamento (2019-08- 28) até à data da verificação do seu reembolso (…)”.

B – E sustenta o referido acórdão arbitral que “ (…)“ Face à circunstância de a AT ter convocado o acórdão do TJUE de 6 de Setembro (processo nº C-184/18) sempre se actualiza que, o mesmo versando sobre residentes em país terceiro, concretamente em Angola, veio a pronunciar-se no seguinte sentido: “(…) 24. Importa constatar que, como resulta da sua letra, o artigo 63º do TFUE estabelece a livre circulação de capitais não apenas entre Estados-Membros mas igualmente entre Estados Membros e Estados terceiros (v., neste sentido, Acórdão de 18 de janeiro de 2018, Jahin, C45/17, EU:C 2018:18, nº 19). 25. Para esse efeito, o artigo 63º TFUE proíbe de modo geral todas as restrições aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros e entre os Estados-Membros e países terceiros. 26. Nestas condições, há que declarar que, uma legislação de um Estado-Membro, como a que está em causa no processo principal que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado nesse Estado-Membro, efetuada por um residente num Estado terceiro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, nesse mesmo tipo de operações, sobre as mais-valias realizadas por um residente no referido Estado-Membro constitui uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo artigo 63º, nº 1 do TFUE”. Concluindo o Acórdão do TJUE no seguinte sentido: “Uma legislação de um Estado-Membro, como a que está em causa no processo principal, que sujeita as mais valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado nesse Estado Membro, efetuada por um residente num Estado terceiro, a uma carga fiscal superior à que incindiria, nesse mesmo tipo de operações, sobre as mais-valias realizadas por um residente naquele Estado-Membro constitui uma restrição à livre circulação de capitais que, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, não é abrangida pela exceção prevista no artigo 64º, nº 1, TFUE e não pode ser justificada pelas razões referidas no artigo 65º, º 1, TFUE”.

De modo similar, e pelo claro paralelismo com a situação que vem de analisar-se, retira-se do Acórdão Gielen de 18/03/2010 (Processo nº C-440/08): “(…) O Tribunal de Justiça precisa, que apresenta uma vantagem fiscal cujo benefício é retirado a não residentes, uma diferença de tratamento entre essas duas categorias de contribuições pode ser qualificado de discriminação, na acepção do Tratado FUE, quando não houver nenhuma diferença objetiva situação suscetível de justificar diferenças de tratamento, quanto a esse aspecto, entre categorias de contribuintes (…)“ a opção de equiparação permite a um contribuinte não residente (…) escolher entre um regime fiscal discriminatório e um outro regime supostamente não discriminatório, frisando que essa escolha não é passível de excluir os efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais.

“O reconhecimento de um efeito dessa natureza à referida escolha teria por consequência (…) validar um regime fiscal que continuaria, em si mesmo, a violar o artigo 49º do TFUE em razão do seu carácter discriminatório”.

“O Tratado se opõe a uma regulamentação nacional que discrimina os contribuintes não residentes na concessão de um benefício fiscal (…) apesar de esses contribuintes poderem optar, no que se refere a esse benefício, pelo regime aplicável aos contribuintes residentes”. Igualmente, em caso paralelo, se pronunciou o Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 21 de Fevereiro de 2013, Processo C-123/11), sobre a garantia da igualdade de tratamento fiscal entre os residentes e não residentes (embora aqui com referência a pessoas colectivas); “(…) As regras de cálculo dos prejuízos da filial não residente para efeitos da sua assunção pela sociedade-mãe residente, em operações (…) “não devem constituir uma desigualdade de tratamento em relação às regras de cálculo aplicáveis caso essa fusão tivesse sido realizada com uma filial residente (…)” Acresce ainda que, o Supremo Tribunal Administrativo tem, inequivocamente, alinhado a sua posição no sentido de que o regime da tributação das mais-valias imobiliárias incidentes sobre não residentes, constitui uma clara violação aos tratados europeus.

A título meramente exemplificativo, mas pelo seu carácter recente, convoca-se o que vem dito no âmbito do Acórdão do STA proferido em 20.02. 2019 (no âmbito do processo nº 0901); “(…) Por imperativo constitucional as disposições do Tratado que rege a União Europeia prevalecem sobre as normas de direito ordinário nacional, nos termos definidos pelos órgãos de direito da União, desde que respeitem os princípios fundamentais do Estado de direito democrático. Nos termos do art. 8º, nº 4, da CRP, “as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.

Tendo Portugal competência para legislar quanto ao imposto sobre o rendimento, por tal não ser matéria de competência exclusiva da EU, não pode incluir nesse regulamentação normas que, em concreto, sejam violadoras dos Tratados, na interpretação que deles faça, como fez, o Tribunal de Justiça da EU(…)” Ainda com realce e interesse para o que antecedentemente vem dito, extrai-se do aresto do Tribunal Central Administrativo do Sul de 08-05-2019 (processo nº 1358/08.9BESNT) o seguinte: A operação de alienação de um bem imobiliário constitui um movimento de capitais, à face da jurisprudência do Tribunal Justiça da União Europeia, sendo, por isso, abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 56º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia” “A legislação nacional ao prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pela norma comunitária supracitada, sendo o nº 2 do artº 43º do CIRS, incompatível com o referido artº 56º do TJUE (…)” Face ao exposto, sem necessidade de quaisquer outras considerações, e revertendo à situação dos autos, inexiste base legal que permita à Requerida excluir da tributação das mais-valias o regime previsto sob o nº 2 do artigo 43º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

Procedendo, em consequência e neste segmento o pedido de pronúncia formulado pela Requerente.” C – Ao contrário do que decidiu a Decisão Arbitral fundamento (processo n.º 539/2018-T), na qual o Tribunal arbitral considerou que: “14 - Apresenta-se, pois, neste processo, uma dupla situação que encerra incongruências, entre si, quanto ao que o Requerente pretende, porquanto:

  1. Por um lado, pretende a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, que é aplicável às mais valias obtidas em território português, que, de facto manda considerar a tributação de 50% saldo das mais-valias de imóveis, respeitantes às transmissões efetuadas por residentes, previstas na alínea a)2 do n.º 1 do artigo 10.º.

  2. Por outro lado, exige que seja feita uma tributação do referido saldo, reduzido em 50%, com aplicação da taxa aplicável a não residentes de 25%, conforme opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da sua Declaração mod. 3 de IRS, e não pela aplicação das taxas gerais do artigo 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.

    15 - Ora, esta forma de tributação mista, de escolha do melhor dos regimes de tributação, ou seja, ser considerado como residente para efeitos de aplicação do artigo 43.º, n.º 2 e não residente para efeitos de aplicação da taxa do artigo 72.º, n.º 1, ambos do CIRS, o que é incongruente e inaplicável, e nem sequer se pode argumentar que há violação dos Tratados da União Europeia, por não se estar perante uma qualquer discriminação.

    16 - Isto porque o Requerente tinha ao seu dispor a possibilidade de ver tributadas as suas mais-valias de harmonia com todas as regras aplicáveis aos residentes, se, para tanto, tivesse feito essa opção, ao abrigo do n.º 9 do artigo 72.º do Código do IRS, como a lei lhe permite - o que não aconteceu.

    17 - Assim, ao não ter optado pela tributação das suas mais-valias imobiliárias, pela aplicação das taxas do artigo 68.º...

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