Acórdão nº 01047/17.3BEPRT 0777/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução24 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações I. Z…………, com os demais sinais dos autos, inconformada com douto Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 17 de Julho de 2020, que negou provimento ao recurso por ela interposto da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra determinação de rendimentos de IRS do ano de 2010 por métodos indirectos, vem interpor recurso, nos termos do artigo 284º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), com a redação dada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro, de uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal.

A recorrente invoca que o referido acórdão colide com o Acórdão proferido por este Supremo Tribunal Administrativo (STA), datado de 12 de outubro de 2011, proferido no processo nº 0524/11 (acórdão fundamento).

  1. Por despacho a fls. 1773 do SITAF, o Ex.ª Juíza Desembargadora do TCA Norte veio admitir o recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal.

  2. A recorrente veio apresentar alegação de recurso a fls. 1605 a 1735 do SITAF, no sentido de demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: i. A identificação do acórdão recorrido e do acórdão fundamento: a) O acórdão recorrido é o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 14 de julho de 2020 – processo aqui em causa n.º 1047/17.3BEPRT (CRISTINA DA NOVA) (Doc. 1); b) O acórdão fundamento é o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de outubro de 2011 - processo n.º 0524/11 (ISABEL MARQUES DA SILVA) (Doc. 2).

    ii. A contradição sobre a mesma questão fundamental de Direito c) Os aspetos de identidade que determinam a contradição sobre a mesma questão fundamental de Direito entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento são os seguintes: ➢ A AT corrigiu a matéria tributável através da avaliação indireta, nos termos dos artigos 83º, 85º e 87º, todos da LGT; ➢ Discute-se se a AT tinha a obrigação de recorrer preferencialmente à avaliação direta, atendendo à natureza subsidiária da avaliação indireta, inclusive na modalidade de acréscimos patrimoniais injustificados (artigo 87.º, n.º 1, alínea f) da LGT), que radica no princípio da tributação das empresas pelo rendimento real (artigo 104º, n.º 2 da CRP) e no princípio da capacidade contributiva, corolário do princípio da igualdade (artigo 13º da CRP).

    d) Face a estes aspetos, sucederam-se duas decisões superiores contraditórias: o acórdão recorrido e o acórdão fundamento.

    e) A questão fundamental de Direito que aqui se coloca, no âmbito do presente recurso para uniformização de jurisprudência, é a seguinte: ➢ Considerando que a avaliação indireta é subsidiária (ou residual, conforme a interpretação) da avaliação direta, ao abrigo do princípio da tributação pelo lucro real e do princípio da capacidade contributiva, a AT, no âmbito do procedimento de avaliação indireta na modalidade de acréscimos patrimoniais injustificados (artigo 87º, n.º 1, alínea f) da LGT), se conhece a fonte e a origem dos ditos acréscimos patrimoniais, como ficou assente nos autos em apreço, tem a obrigação legal de recorrer à avaliação direta e de preferir os elementos objetivos de quantificação e não de lançar mão da avaliação indireta? f) Deste modo, podemos concluir que se encontram integralmente verificados os pressupostos para a admissão do presente recurso para uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 284º do CPPT.

    iii. A infração imputada ao acórdão recorrido g) Quer se adote a natureza subsidiária, quer se adote a natureza residual da avaliação indireta na modalidade de acréscimos patrimoniais injustificados, a AT está sempre obrigada a preferir a avaliação direta, por ser o mecanismo de avaliação, de correção mais próximo da tributação pelo lucro real, isto é, da capacidade contributiva do contribuinte; h) A avaliação indireta, independentemente da sua modalidade, é sempre uma avaliação que se encontra mais afastada da tributação pelo lucro real e, portanto, mais geradoras de iniquidades fiscais, muitas vezes, de dupla tributação jurídica e ou económica; i) Quer se entenda que a avaliação indireta na modalidade de acréscimos patrimoniais injustificados reveste natureza subsidiária, quer se entenda que reveste natureza residual, o certo é que apenas se pode recorrer a esse instrumento quando não seja possível proceder à avaliação direta, isto é, não existam elementos objetivos para determinar a matéria tributável; j) No caso concreto, como ficou perfeitamente assente no acórdão recorrido, a AT tinha perfeito conhecimento da origem e da fonte dos (alegados) acréscimos patrimoniais; k) Como estamos no exercício de poderes vinculados, a AT tinha a obrigação legal de, ao abrigo do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material, de investigar na esfera das sociedades aqui em causa, X…………, V…………, U………… e T…………, a natureza de tais movimentos financeiros; l) Sobretudo tratando-se como disse o Tribunal a quo de sociedades relacionadas com S………… e o seu filho, R…………; m) A fonte dos movimentos financeiros aqui em causa está perfeitamente identificada, a divergência aqui em causa situa-se quanto à qualificação desses movimentos; n) No caso em apreço, a AT, conhecendo a fonte dos movimentos financeiros – as empresas relacionadas do pai S............ e do filho R............ – e atendendo à natureza excecional e subsidiária da avaliação indireta, a AT tinha a obrigação de corrigir ex officio a liquidação e reconduzir esses movimentos a factos tributários passíveis de avaliação direta; o) Ao contrário do decidiu o acórdão recorrido; p) Essa avaliação direta pressuporia qualificar tais rendimentos no caso de empresas em que o pai S............ era sócio, como distribuição de dividendos, e no caso de empresas em que o pai S............ era gerente, como rendimentos de trabalho dependente.

    q) Não pode, assim, ser legítimo admitir que a AT possa lançar mão da avaliação indireta por acréscimos patrimoniais injustificados, que conduzirá a uma tributação de 60%, sobre factos dos quais era conhecida a sua origem e fonte e dos quais era possível reconstituir os factos tributários, através dos elementos objetivos disponíveis; r) No caso concreto, resulta, assim, ofendido o princípio da tributação fundamentalmente pelo lucro real e, em bom rigor e no que diz respeito à Recorrente, sujeito passivo de IRS, o princípio da capacidade contributiva, corolário do princípio da igualdade fiscal (artigo 13º da CRP); s) Deste modo, podemos concluir que a avaliação indireta, inclusive na modalidade de acréscimos patrimoniais injustificados, tem natureza excecional, subsidiária ou residual, conforme a interpretação, mas deverá sempre constituir a ultima ratio fisci e deverá apenas ser utilizada quanto a AT desconhece a origem e a fonte do facto base; t) No caso concreto, a AT conhecendo a fonte dos acréscimos patrimoniais e a relação estabelecida entre a fonte e o sujeito, tinha a obrigação legal de preferir a avaliação direta, mais próxima dos paradigmas da tributação pelo lucro real e da capacidade contributiva e da igualdade fiscal, do que atalhar pela avaliação indireta, assente em presunções que se afastam do rendimento real(mente) obtido; u) Deste modo, podemos concluir que a questão controvertida aqui em causa deve ser resolvida de acordo com a fundamentação e interpretação do acórdão fundamento do Supremo Tribunal Administrativo e, consequentemente, deve ser anulado o acórdão recorrido, nos termos do artigo 284º do CPPT.

    I.2 – Contra-alegações Foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância com o seguinte quadro conclusivo: i. Inconformado com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, vem o Recorrente interpor Recurso por Recurso por Uniformização de Jurisprudência interposto ao abrigo do disposto no Art.º 284.º do CPPT, na redacção dada pela Lei 118/2019 de 17 de Setembro, invocando que o entendimento vertido no presente Acórdão se encontra em manifesta oposição com o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no que respeita à mesma questão fundamental de direito qual seja a de que considerando que a avaliação indirecta é susbsidiária da avaliação directa, em caso de se conhecer a fonte e a origem dos acréscimos patrimoniais, tem a Recorrida obrigação legal de recorrer à avaliação directa e não lançar mão da avaliação indirecta, alegando que o acórdão recorrido encontra-se em manifesta contradição com o Acórdão proferido pelo STA, proferido no Proc. n.º 0524/11 de 12.10.2011.

    ii. Todavia, entende a entidade Recorrida que (i) não só não existe identidade de facto e de Direito entre o presente acórdão e o referido “acórdão fundamento”, como ainda (ii) o acórdão sob escrutínio procede a uma exacta apreciação dos factos e correta aplicação do Direito, razão pela qual o mesmo deverá ser mantido, conforme se passará a demonstrar de seguida.

    iii. As regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recurso, resulta que, para que se tenha por verificado, é necessário que cumulativamente as situações de facto sejam substancialmente idênticas; Haja identidade na questão fundamental de direito; Se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; O “acórdão fundamento” tenha transitado em julgado; A oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas; Não tenha ocorrido alteração substancial na regulamentação jurídica; e A orientação no acórdão recorrido está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.

    iv. Analisados os requisitos de que a lei e a jurisprudência faz depender a propositura do recurso por Uniformização de jurisprudência, importa desde já referir que no caso vertente, não se verificam os pressupostos, desde logo, por falta de identidade das situações...

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