Acórdão nº 01023/15.0BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução12 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações A Representante da Fazenda Pública vem recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 30 de outubro de 2018, a qual julgou procedente a impugnação deduzida pelo BANCO A…………, S.A., melhor identificado nos autos, contra o indeferimento do recurso hierárquico n.º R02320 12005651 interposto da decisão de indeferimento da reclamação graciosa por sua vez, foi interposta contra as liquidações adicionais de IVA n.º 11002626, n.º 11002628 e n.º 1102630 referentes aos meses de setembro, outubro e dezembro de 2008, respetivamente, e respetivos juros compensatórios, no montante total € 1.040.668,70.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

  1. Na presente situação não há uma “errada aplicação do método de dedução do IVA”, nem “erro de direito” (pág. 22 da sentença), pois o Impugnante usou na dedução inicial e na regularização da dedução inicial o método de dedução preconizado sob o art. 23º do CIVA, só que na dedução inicial o valor de percentagem admitida para efeitos de dedução teve por base o volume de negócios (pro rata) e na regularização da dedução inicial teve por base outros critérios objetivos, ou seja, dois segmentos de negócios (TPA’s e débitos diretos).

  2. A única alteração que se verificou foi que o Impugnante, para apurar a percentagem de dedução, deixou de usar o volume de negócios total e passou a usar outros critérios, e assim apurou uma percentagem de dedução diferente, o que não encerra “errada aplicação do método de dedução do IVA”, nem “erro de direito”.

  3. O sentenciado não fez a distinção entre a dedução de imposto e a regularização da dedução inicial efetuada, o que se afigurava essencial dado que são atos distintos, com prazos de execução diferentes, o que gera erro de julgamento, ao concluir-se que estamos perante um “erro de direito” ou uma “errada aplicação do método de dedução do IVA”, que será sempre suscetível de dedução no prazo de 4 anos, nos termos do art. 98º n.º 2 do CIVA.

  4. A confirmar esta necessária e obrigatória diferença de procedimentos existem as instruções de preenchimento da própria declaração periódica de IVA que distinguem claramente a dedução (inicial), da regularização (da anterior dedução), determinando que os valores correspondentes à primeira sejam inscritos nos campos 20 a 24, e os valores correspondentes à segunda (a favor do Sujeito Passivo) sejam inscritos no campo 40.

  5. O art. 98º n.º 2 do CIVA transpõe para o direito interno o art. 180º da Diretiva 2006/112/CE da Diretiva IVA que refere: “Os Estados-Membros podem autorizar o sujeito passivo a proceder a deduções que não tenham sido efetuadas em conformidade com os artigos 178.º e 179.º.”, por esse efeito, o art. 98º n.º 2 do IVA nos termos dos arts. 22° e 23° do CIVA.

  6. Ou seja, as regularizações das deduções iniciais só são passíveis de enquadramento no âmbito do art. 98º n.º 2 do CIVA em razão da superveniência dum novo facto ou situação não anteriormente contemplada na contabilidade do Sujeito Passivo, a qual se mostrasse suscetível de alterar o apuramento do imposto dedutível com recurso ao pro rata ou à afetação real.

  7. O sentenciado pratica erro de julgamento ao conferir ao n.º 2 do art. 98º do CIVA um caráter de usualidade, validando a dedução e, ou a regularização da dedução no período de 4 anos, independentemente da factualidade verificada, e de acordo com a vontade do Sujeito Passivo.

  8. No procedimento de dedução de imposto, encontra-se estabelecido no art. 22º do CIVA que o direito à dedução do imposto suportado (por parte do adquirente/cliente) nasce no momento em que esse mesmo imposto se torna exigível (para o prestador/fornecedor), e que tal direito deve ser exercido na declaração do período (correspondente à emissão da respetiva fatura ou documento equivalente na qual foi liquidado o IVA que se pretende deduzir), ou em período posterior à sua receção (quando a receção da fatura ou documento equivalente ocorre em período diferente ao da sua emissão; nestes casos, a dedução também poderá efetuar-se no período correspondente ao da emissão da respetiva fatura, se ainda for possível, atendendo aos correspondentes prazos de entrega da declaração periódica).

  9. A dedução de imposto pressupõe ainda o registo contabilístico da fatura ou documento equivalente, o que, de acordo com o art. 48º n.º 1 do CIVA, deve ser efetuado após a receção dos documentos, até à data de apresentação da declaração periódica do IVA, ou até ao termo do prazo para a sua apresentação, o que, só por si, já se afigura bastamente indiciador da preponderância que os registos contabilísticos têm para aferir o prazo disponível para o exercício do direito à dedução do imposto suportado.

  10. O art. 22º n.º 2 do CIVA não autoriza qualquer diferimento temporal após o registo da respetiva fatura ou documento equivalente na contabilidade do Sujeito Passivo.

  11. Por sua vez, o procedimento de regularização do imposto deduzido tem, necessária e obrigatoriamente, subjacente uma dedução anteriormente efetuada, pelo que sobrevindo a necessidade de proceder à correção da dedução já efetuada teremos de recorrer às normas de regularização e não às regras da dedução.

  12. O art. 184º da Diretiva IVA institui o direito geral dos Sujeitos Passivos procederem à regularização da “dedução inicialmente efetuada”, remetendo para os Estados membros a aplicação das normas relativas a esse direito, nos termos do art. 186º da Diretiva IVA, e em Portugal, as regras de regularização da dedução encontram-se consagradas nos arts. 23º n.º 6, 24º a 26º e 78º a 78º-D, todos do CIVA.

  13. Quanto à regularização do dedução do IVA relativo a bens de utilização mista, no art. 23º n.º 6 do CIVA está estabelecido que a dedução definitiva a considerar em cada ano (quer com recurso à percentagem do pro rata, quer com recurso a critérios de afetação real), deve constar na “declaração do último período do ano a que respeita”, ou seja, a última declaração do ano é, por conseguinte, o prazo definido pelo legislador nacional para a regularização da dedução já efetuada anteriormente, com recurso à percentagem do pro rata ou a critérios de afetação real.

  14. Após ter sido efetuado o registo das operações na contabilidade e de ter sido promovida a correspondente dedução de imposto com recurso ao uso de uma percentagem apurada segundo o volume de negócios (pro rata), o Sujeito Passivo tem direito a proceder à regularização dessa dedução anteriormente efetuada, mas apenas no prazo estabelecido pelo direito interno, o qual elege a declaração do último período do ano para esse concreto efeito (art. 23º n.º 6 do CIVA), mesmo quando altere a percentagem de dedução de acordo com outros critérios (afetação real), pelo que o sentenciado sofre de erro de julgamento, por considerar “in casu” aplicável o prazo de 4 anos estabelecido no art. 98º n.º 2 do CIVA.

  15. Situação distinta era se a dedução efetuada na declaração do último período do ano se visse prejudicada em virtude de, por motivos alheios ao Sujeito Passivo, não ter sido possível registar na contabilidade uma fatura ou documento equivalente relevante para o cálculo do pro rata ou para o apuramento segundo o critério da afetação real naquele ano, como por exemplo pode acontecer se em momento posterior ao da entrega da declaração periódica do último período do ano, um ou vários fornecedores do Sujeito Passivo fossem sujeitos a ação de inspeção no âmbito da qual se efetuassem correções em sede de IVA suscetíveis de produzir alterações no imposto liquidado e, consequentemente, por repercussão à esfera do Sujeito Passivo, no montante de imposto por ele suportado, suscetível de, por sua vez, alterar o apuramento segundo o critério da afetação real.

  16. Para estas situações, e outras de idêntica natureza, que não têm correspondência com a dos autos, é que o prazo de dedução pode estender-se até ao limite dos 4 anos.

  17. Na presente situação, os factos e valores eram perfeitamente conhecidos do Impugnante, encontravam-se registados na sua contabilidade, não advindo de qualquer circunstância que lhe fosse alheia, pelo que o direito à dedução e, ou regularização da dedução inicial não pode ser efetuado no prazo previsto no n.º 2 do artigo 98º do CIVA, mas apenas nos prazo previsto no n.º 6 do art. 23º do CIVA.

  18. A interpretação da norma ínsita no art. 98º n.º 2 do CIVA, que melhor se coaduna com as regras de dedução expressamente previstas pelo legislador em sede de IVA, confere a este comando legal um caráter de excecionalidade, visando acautelar situações que não se encontram previstas no âmbito de outros preceitos legais, ou que têm subjacente condições que não dependeram da vontade e, ou opção do Sujeito Passivo.

  19. A tese da AT é sufragada pelo acórdão do STA lavrado no proc. n.º 0966/10, de 18/05/11, do qual resulta que, em regra a dedução do imposto deve ser efetuada em conformidade com o previsto no art. 22º do CIVA, ou seja, o sujeito passivo não pode escolher, dentro daqueles quatro anos, o momento em que quer efetuar a dedução, mas sim que lhe é fixado um limite máximo, de caráter geral, que não pode ser excedido, sendo que tal caráter resulta da primeira parte do n.º 2 do art. 98.º (“Sem prejuízo de disposições especiais”) do CIVA, não operando tal prazo quando exista uma norma especial que estabeleça um prazo diferente t) O prazo de 4 anos previsto no n.º 2 do art 98º do CIVA aplica-se a situações em que o direito à dedução pelo Sujeito Passivo vai ser exercido pela primeira vez, por só nessa altura estarem reunidas as condições para efetuar a dedução (dedução inicial), e não aos casos de regularização do imposto anteriormente deduzido, não se afigurando acertado o decidido que configurou a situação dos autos como um caso de “aplicação incorreta do método de prorrata de dedução”, um “erro de direito”, com aplicação do art. 98º n.º 2 do CIVA.

  20. O sentenciado sofre de erro de julgamento...

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