Acórdão nº 087882 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Maio de 1996 (caso None)

Magistrado ResponsávelMIRANDA GUSMÃO
Data da Resolução09 de Maio de 1996
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Montalegre, A intentou a presente acção com processo ordinário contra Companhia de Seguros o Trabalho, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe: - o conserto da máquina Ford, usada, 6000 - o prejuízo já apurado de 2104000 escudos e os prejuízos futuros que lhe advém da não utilização da referida máquina até ao conserto, prejuízos que por perdurarem no tempo se relegam para a liquidação em execução de sentença - os juros de mora, da quantia já apurada, de 2104000 escudos, a partir da citação e aqueles que resultarem dos danos a fixar em execução de sentença. - Fundamenta os seus pedidos de, em consequência, de um acidente de viação, ocorrido em 30 de Abril de 1992, pelas 10 horas e 15 minutos, na estrada nacional Braga-Chaves, por culpa de C, condutor do veículo automóvel ..., de que era proprietário, ter ficado danificada uma sua máquina Ford, usada, 6000, que esse veículo transportava, de acordo com um contrato de transporte que o mesmo C celebrara com ele (autor), sendo certo que a legitimidade da Ré deriva do facto de o transportador ter transferido para ela a responsabilidade civil pelos danos causados à mercadoria transportada pelo veículo SM. Contestou a Ré, dizendo que reconhece, na sua qualidade de seguradora do transportador, a sua obrigação de ressarcir o Autor; restringe, porém, a sua responsabilidade ao valor da máquina ao tempo do sinistro, excluindo, portanto, dessa responsabilidade, quer o dever de pagar o valor da sua reparação - dada a sua excessiva onerosidade - quer de pagar os pretensos prejuízos do autor emergentes da impossibilidade do uso da máquina - porque excluída de tal responsabilidade no contrato. - Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença no sentido de julgar a acção parcialmente provada, condenando a Ré no pagamento da quantia de 1104000 escudos ao Autor, absolvendo-a do pedido na parte restante. 2. O Autor apelou. A Relação do Porto, no seu acórdão de 18 de Abril de 1995, decidiu julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré a pagar ao Autor as quantias de 2743887 escudos, mais o IVA, e 140400 escudos, acrescida esta de juros a 15 porcento, desde a citação até efectivo pagamento, e confirmou a sentença recorrida na parte restante. 3. A Ré "O Trabalho" Companhia de Seguros, S.A., pede revista - revogação do acórdão recorrido, com manutenção do decidido na 1. instância, formulando conclusões no sentido de que não pode ser condenada a pagar ao autor um valor superior a 1000000 escudos, valor da máquina antes de acidentada, dado que, por um lado, o artigo 566 n. 1 do Código Civil substitui a reconstituição natural pela indemnização em dinheiro, quando aquela se revele excessivamente onerosa para o lesante e, por outro lado, isso resulta da responsabilidade contratual do transportador que não pode ser superior em caso de deterioração da mercadoria ao que seria em caso de perda da mesma. 4. O Autor pede revista subordinada - dever atribuir-se-lhe indemnização pelos lucros cessantes a liquidar em execução de sentença - formulando conclusões no sentido de que, por um lado, os lucros cessantes não se identificam com as "perdas indirectas ou de mercado" excluídas na cláusula 8, alínea j) do contrato de seguro e, por outro lado, esta cláusula ser nula por constituir uma renúncia prévia ao direito de indemnização por lucros cessantes. 5. A Ré apresentou contra-alegações onde conclui pela improcedência do recurso do autor. Corridos os vistos, cumpre decidir. II Questões a apreciar nos presentes recursos. - A apreciação e a decisão dos presentes recursos passam pela análise de duas questões: a primeira, se a Ré não pode ser condenada a pagar ao autor um valor superior ao da máquina antes de acidentada; a segunda, se ao autor deverá atribuir-se indemnização pelos lucros cessantes a liquidar em execução de sentença. - Abordemos tais questões. III Se a Ré não pode ser condenada a pagar ao autor um valor superior ao da máquina antes de acidentada. 1. Elementos a tomar em conta: 1. No dia 30 de Abril de 1992, pelas 10 horas e 15 minutos, pela E.N. Braga - Chaves, e neste mesmo sentido circulava o veículo pesado de mercadorias, de matrícula ..., conduzido pelo respectivo dono, C, e no interesse do mesmo. 2. Na referida estrada, próximo do lugar de Penedones, o veículo SM capotou, o que determinou que a máquina "Ford" usada, modelo ..., da qual é dono o Autor, transportada naquela viatura, sofresse danos. 3. Antram - Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias, celebrou um contrato de seguro com a Ré, transferindo para esta a responsabilidade inerente à perda ou deterioração das mercadorias por aquelas transportadas, até ao limite de capital de 20000000 escudos. 4. O contrato a que se alude no número anterior, abrange os transportes de mercadorias efectuados pelos associados da Antram. 5. C era, à data dos factos, associado da Antram. 6. A reparação dos danos referidos em 2) importava em 2743887 escudos, excluindo o IVA. 7. O autor procedeu à reparação parcial da referida máquina a fim de a utilizar em pequenos trabalhos. 8. A máquina, antes de acidentada, tinha o valor de cerca de 1000000 escudos. 2. Posição da Relação e da recorrente/Ré. 2a) A Relação do Porto decidiu que a Ré terá de pagar ao Autor o custo da reparação da máquina no montante de 2743887 escudos, mais IVA, porquanto se, por um lado, importando a reparação dos danos da máquina quasi o triplo do valor que a mesma tinha ao tempo do sinistro revela-se ela mesma bastante onerosa para Ré; por outro lado, a Ré não logrou fazer a prova da excessiva onerosidade dessa reparação; não alegou quanto passou a máquina a valer após o sinistro ou qual era o valor duma máquina nova e não alegou que, pelo preço de 1000000 escudos, seria ao autor possível adquirir uma outra máquina no estado em que, antes de danificada, se encontrava a sinistrada. 2b) Por sua vez, a recorrente sustenta ser um dado da experiência comum haver uma enorme desproporção entre o valor do bem danificado e o custo da sua reparação de sorte que não poderá deixar de concluir-se que o nosso legislador estabeleceu a referida "excepção ao princípio da restauração natural" para situações como a presente. Que dizer? 3. O artigo 562 do Código Civil estabelece o princípio da reposição natural quanto à indemnização: o dever de se reconstituir a situação anterior à lesão, isto é, o dever de reposição das coisas no estado em que estariam, se não se tivesse produzido o dano. A reposição natural, conforme sublinha Vaz Serra, "não supõe necessariamente que as coisas são repostas com exactidão na situação anterior: é suficiente que se dê a reposição de um estado que tenha para o credor valor igual e natureza igual aos que existiam antes do acontecimento que causou o dano. Com isto, fica satisfeito o seu interesse". E acrescenta: "É discutível se o credor pode exigir que o devedor substitua o velho pelo novo, indemnizando ele credor a diferença de valor. Enquanto uns defendem esse critério, outros impugnam-no. É assim que Enneccesus - Lehmann, contra Ocrtmann, julgam que tal critério não é equitativo e que, se o devedor quiser, pode repor o velho pelo novo, mas sem direito de reclamar a diferença de valor. "E deverá admitir-se, sem mais, o critério expresso no adágio popular: "quem estraga velho, paga novo". E acrescenta: "Em regra, não é razoável que tenha de adquirir um objecto já usado e com valor igual ao que perdeu. Temos, portanto, que, para a reparação do dano, deve dar-se o preço do objecto a...

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