Acórdão nº 0836/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – O INFARMED – AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, IP, que sucedeu nas atribuições do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (art. 19.º do DL n.º 269/2007, de 26 de Julho, interpôs o presente recurso excepcional de revista para este Supremo Tribunal Administrativo de um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que confirmou o acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa especial contra si intentada pela SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE ESPINHO, anulou a deliberação do Conselho de Administração do INFARMED n.º CA/845/2005, de 7-12-2005, e condenou o INFARMED a apreciar, através do órgão competente, o requerimento de 2-4-2004 da Autora, à luz dos requisitos enunciados do n.º 4 da Base II da Lei 2125, de 20-3-1965, prosseguindo na instrução do processo.

O presente recurso excepcional de revista foi admitido pela Formação deste Supremo Tribunal Administrativo referida no art. 150.º, n.º 5, do CPTA.

O Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões, na parte relativa ao mérito do recurso: 7.ª A Base II da Lei n.° 2125, de 20 de Março de 1965, começa por estabelecer e distinguir dois momentos essenciais nas farmácias de oficina: (1) o que é necessário para se pôr em funcionamento uma farmácia — deter um alvará; (2) quem pode deter tal alvará — o proprietário da farmácia /quem pode ser proprietário de farmácia.

  1. Nesta decorrência, e excepcionalmente, o n.° 4 da mesma Base II vinha dispor que as Misericórdias e as instituições de assistência e previdência social podiam ser proprietárias de farmácias, em expressa derrogação da restrição genérica ao direito de propriedade de farmácia a não farmacêuticos, ficando limitadas aos seus serviços privativos.

  2. Complementarmente, o n.° 5 determinava os termos em que seriam atribuídos alvarás às farmácias supra excepcionalmente detidas: quando houvesse interesse público na sua abertura e não houvesse farmacêutico interessado na sua instalação.

  3. Assim a atribuição de alvará a farmácias privativas implicava a interpretação e aplicação conjunta dos n.°s 4 e 5 da Base II, prevendo o primeiro destes preceitos a possibilidade de Misericórdias e instituições de assistência e previdência social serem proprietárias de farmácias e o segundo os termos em que lhes podia ser atribuído alvará.

  4. A letra dos preceitos (n.° 4: "as misericórdias e outras instituições de assistência (...) poderão ser proprietárias de farmácias... , n.° 5: "poderá ser passado alvará às instituições de assistência (...)') e a sua ratio e sistematicidade na própria Base II (assentes na distinção que já vinha dos n.°s anteriores, entre propriedade de farmácia e funcionamento de farmácia mediante alvará) impunha esta complementaridade interpretativa.

  5. Em especial, a tese da Recorrida sufragada pelo Tribunal a quo, em reservar o âmbito de aplicação do n.° 5 a situações de falta de provimento pelas farmácias regulares das necessidades de determinada população não só força a letra e a teleologia da norma, criando implícita e consequentemente uma excepção à já excepcional propriedade de farmácias por parte daquelas entidades, como retira qualquer âmbito de aplicação à Base VI da mesma Lei. Neste sentido, concluíram igualmente o Ministério Público junto deste venerando Tribunal, em parecer de 21106/2006, proferido no Processo n.° 00648104.4BEPRT, e os Professores Diogo Freitas do Amaral e Caria Amado Gomes.

  6. Depois, in casu, dado o excesso de farmácias no local onde a Recorrida pretendia instalar a sua, manifestamente capazes de responder às necessidades dos beneficiários daquela, não havia interesse público em atribuir o referido alvará, não ficando, assim, preenchidos os pressupostos do n.° 5 da Base II da Lei n.° 2125.

  7. Pelo que, andou mal o Tribunal a quo ao condenar o INFARMED à prática de um acto que não é de todo devido, uma vez que no cumprimento do princípio da legalidade a que o INFARMED está sujeito, não lhe era possível atribuir o alvará à Recorrida, sendo legal e válido o acto de indeferimento do seu pedido.

Com o Douto suprimento deste Venerando Tribunal, deve o presente recurso ser considerado procedente e alterado o Acórdão Recorrido Só assim se fazendo a tão acostumada Justiça (!) A Santa Casa de Misericórdia de Espinho contra-alegou, defendendo que o recurso não merece provimento.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: 1. Como se escreveu no Ac. de admissão da presente revista a questão jurídica a apreciar passa, designadamente, por apurar se no acto da admissibilidade para a atribuição de licença e emissão de alvará para a instalação de farmácia ao abrigo do número 4 da Base II da Lei 2125, de 20 de Março de 1965, não cabe qualquer averiguação quanto ao interesse público da instalação de farmácia num determinado local, a que se refere o n° 5 da aludida Base II.

  1. No fundo, a questão dos presentes autos resume-se à interpretação conjugada dos n°s. 4 e 5 da Base II da Lei n° 2125 acima referida , não descurando o disposto nos arts. 45° e 46° do DL n° 48547, de 27 de Agosto. E já no processo n° 841/09 (referido no Ac. que admitiu esta revista) proferimos parecer que agora nos limitamos a seguir.

  2. Tal questão jurídica já foi tratada por este STA no Ac. de 10.9.08, rec. n° 1006/07 da 2a Subsecção do C.A. e nos termos que, com a devida vénia, passamos a transcrever — "O punctum saliens da discussão, que aqui importa ter em conta, reside justamente nas normas vertidas nos transcritos n°s 4 e 5 da Base II.

    Assim, para a entidade recorrente o seu entendimento, que ora reafirma, e em defesa do princípio da indivisibilidade entre a propriedade e direcção técnica da farmácia, sempre foi o de que os campos de aplicação daquelas normas não detêm autonomia. Ou seja, a possibilidade de as instituições de assistência e previdência social poderem ser proprietárias de farmácias haveria que compaginar-se com o estatuído no citado n° 5; concretamente quando haja interesse público na abertura de farmácia em determinado local ou na manutenção da já existente, e, mesmo assim, caso não apareçam farmacêuticos interessados na sua instalação ou aquisição.

    No entanto, quer para o TAF, quer para o TCAN, a previsão do citado no 4 da Base II constitui hipótese distinta da contida no n° 5, reportando-se a situações em que, para o cumprimento dos seus fins estatutários, aquelas instituições podem ser proprietárias dos estabelecimentos em causa, desde que destinados aos seus fins privativos.

    Nesta sede, intenta a mesma entidade convencer da bondade do seu entendimento, para o que aduz, no essencial: - O n.° 2 da Base II da Lei n.° 2125 contém a regra geral, segundo a qual a propriedade das farmácias foi limitada pelo legislador a farmacêuticos, consagrando assim o aludido princípio da indivisibilidade entre a propriedade e direcção técnica da farmácia; - as excepções ao mencionado princípio visaram exclusivamente promover e garantir o acesso a meios de prevenção e tratamento em todas as situações em que tal não seria garantido dada a insuficiente implantação dos serviços de saúde e de...

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