Acórdão nº 046416 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelPIRES ESTEVES
Data da Resolução13 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: A..., viúva, residente na ... nº..., ... Salvaterra de Magos e B..., casada, residente na ... nº..., ... Salvaterra de Magos interpuseram recurso contencioso de anulação do despacho do Sr. Ministro da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas de 3/2/2000 e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças de 24/2/2000, que lhes atribuiu a cada uma a indemnização de 1 640 080$00 pelo valor da cortiça extraída na campanha de 1976 durante a ocupação do prédio ..., da freguesia de ...., concelho de Coruche, por estarem tais actos inquinados com vários vícios de violação de lei.

Por acórdão da Secção do Contencioso deste Supremo Tribunal Administrativo foi negado provimento a tal recurso contencioso (fls.86 a 109) e por com o mesmo não se conformarem, dele interpuseram as recorrentes o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formulam as seguintes conclusões: "1ª - Existe uma manifesta oposição entre os fundamentos e a decisão proferida pelo Acórdão recorrido, o que nos termos do art. 668 n° 1 c) determina a nulidade do Acórdão.

  1. - O Acórdão recorrido não se pronunciou sobre todas as questões que constituem o objecto do recurso, o que também nos termos do art. 668 n° 1 d) implica a sua nulidade.

  2. - A indemnização a que se referem os autos é devida pela privação temporária do uso e fruição de um prédio rústico indevidamente expropriado e ocupado.

  3. - Neste processo e em concreto está em causa a indemnização pelo valor de uma cortiça extraída e comercializada em 1976.

  4. - A cortiça extraída em 1976 no prédio das recorrentes constitui um fruto pendente, à data da ocupação do prédio em 05/12/75, urna vez que só pode ser extraída com a idade mínima de 9 anos de criação.

  5. - Trata-se de uma indemnização devida pelos lucros cessantes e o proprietário deixou de auferir, o qual deve ser colocado na mesma situação, caso não se tivesse verificado a ocupação e expropriação do prédio (Recs. nºs 44 044 e 44 146 - Pleno).

  6. - Esta indemnização está subtraída ao princípio nominalista, devendo ser reconstituída a situação que existiria se não tivesse ocorrido a expropriação e ocupação do prédio, art. 562 do C.P.C. e Rec. 44.146.

  7. - A indemnização em causa corresponde ao princípio de que o valor do bem expropriado deve ser calculado, em momento tão próximo quanto possível da data em que a indemnização vem a ser fixada e paga.

  8. - Não seria justo que o expropriado além do prejuízo sofrido pela privação do bem viesse ainda a suportar os prejuízos emergentes do atraso da fixação e pagamento da indemnização.

  9. - Seria profundamente injusto fixar uma indemnização sem atender à actualização do rendimento do prédio, quando são decorridos mais de 25 anos de privação desse rendimento.

  10. - Não existe proximidade temporal entre a privação do rendimento da cortiça e o pagamento da sua indemnização, tendo decorridos mais de 25 anos da data da sua extracção e comercialização por parte do Estado.

  11. - As indemnizações da Reforma Agrária «serão fixadas com base no valor real e corrente desses bens e direitos...», de modo a assegurar uma justa compensação pela privação dos mesmos bens e direitos, artº 7º nº1 do DL. nº199/88, de 31/5.

  12. - A indemnização para ser justa tem de garantir ao expropriado o valor real do bem no momento do pagamento.

  13. - Todos os bens e direitos objecto de indemnização da Reforma Agrária, foram actualizados para preços correntes ou valores de 94/95, artº 11º nºs 5 e 6 do DL. nº38/95, 14/2, artº 2º nº1 e artº 3º als. a), b) e c) da Portaria nº197-A/95 de 17/3.

  14. - A cortiça extraída em 1976, tendo a natureza de fruto pendente, teria assim de ser indemnizada por valores de 94/95, artº 3º al.c) da Portaria nº194-A/95.

  15. - Mesmo que não pudesse ser considerada como fruto pendente, teria igualmente de ser indemnizada por valores de 94/95, por analogia com o que se passa com os demais bens indemnizáveis pela privação temporária do uso e fruição, Portaria nº197-A/95, de 17/3.

  16. - A Lei nº80/77, de 26/10 e o DL. nº213/79, de 14/7 só são aplicáveis às indemnizações pela perda de património.

  17. - A capitalização e juros previstos nos arts. 19º e 24º da Lei nº80/77 apenas são aplicáveis às indemnizações pela perda de património, artº 1º nº2 da Portaria nº197-A de 17/3 e não à indemnização pela privação temporária do uso e fruição que é o caso dos presentes autos.

  18. - Mesmo que fosse aplicável à indemnização pela privação do uso e fruição o disposto nos arts. 19º e 24º da Lei nº80/77, o acréscimo decorrente dessa aplicação ao valor da cortiça reportada a 1976, nunca atingiria o valor real e corrente por forma a alcançar a justa indemnização, como é imposto pelo art. 7º n° 1 do Decreto-Lei 199/88.

  19. - Os juros a que se reporta o art. 24º da Lei nº80/77 de 26/10 são remuneratórios, não se destinando a atender a qualquer actualização da moeda (Rec. 44.146).

  20. - Os juros e capitalização previstos nos arts. 19º e 24º da Lei nº80/77, são igualmente aplicáveis aos demais componentes indemnizatórios actualizados para valores de 94/95 (Rec. 46.298).

  21. - É a própria entidade recorrida que expressamente o reconhece, na declaração junta aos autos, e que a Lei nº80/77 não se aplica à indemnização pela privação temporária do uso e fruição.

  22. - As normas de direito internacional sobre indemnizações por expropriação acolhidas no direito constitucional, artº 8º e no direito interno, preâmbulo do DL. nº199/88 e bem assim as normas do ordenamento jurídico português sobre indemnizações, impõem a actualização dos danos à data da respectiva liquidação e pagamento.

  23. - O artº 62º n°2 da Constituição da República é aplicável às indemnizações da Reforma Agrária como entendeu o Acórdão do Pleno da Secção do STA de 17/5/2000, Recurso 44.144. e Rec. 46.298 (Secção).

  24. - A redacção do artº 62º resultante da 4ª revisão constitucional ao eliminar a expressão "fora dos casos previstos na Constituição", determina a aplicação desta disposição constitucional às indemnizações pela expropriação no âmbito da Reforma Agrária.

  25. - O artº 94º da Constituição da República nada tem a ver com expropriações da Reforma Agrária, definitivamente encerrada, mas com as expropriações futuras a definir pela Lei Ordinária.

  26. - É no entanto irrelevante e constitui uma falsa questão, fazer depender a actualização da cortiça ou de qualquer outro bem indemnizável, para o seu valor real e corrente, de não aplicação do art. 62º n° 2 da Constituição da República ou da aplicação do art. 94º do mesmo diploma fundamental.

  27. - Valor real e corrente, só existe um, ou seja, o valor do bem a indemnizar actualizado para data do pagamento ou tão próximo quanto possível, por forma a reintegrar no património do expropriado o quantum de que foi desapossado, artº 7º n° 1 do Decreto-Lei 199/88.

  28. - Pela Constituição da República, os critérios de avaliação e direitos a indemnizar têm de respeitar os princípios da justiça, da igualdade e da proporcionalidade.

  29. - Todos estes princípios se encontram ausentes no acórdão recorrido quando negou a actualização da cortiça extraída em 1976 para valores de 94/95.

  30. - O acórdão recorrido por oposição entre os fundamentos e a decisão, é nulo e violou o disposto no artº 668º nº1 al.c) do CPC.

  31. - O acórdão recorrido por omissão de pronúncia é nulo e violou o disposto no artº 668º nº1 al.d) do CPC.

  32. - O critério de cálculo da indemnização defendido pelo acórdão recorrido ao não proceder à actualização da cortiça é incompatível com o principio da justa indemnização consignada no artº 62 n°2 da CRP.

  33. - O acórdão recorrido por errada interpretação dos dispositivos normativos da lei especial das indemnizações da reforma agrária, afronta o princípio da igualdade do artº 13º nº1 da Constituição.

  34. - As recorrentes, no que se refere à não actualização da cortiça foram tratadas de forma particularmente desfavorável e sem qualquer fundamento legal, relativamente a outros cidadãos que receberam os bens indemnizáveis actualizados.

  35. - O acórdão recorrido ao não proceder à actualização da cortiça, por erro de interpretação violou o disposto no artº 1º n°s. 1 e 2 e artº 7º do Decreto-Lei nº199/88 de 31/05, o artº 5º n° 2 d) e artº 14º n° 1 do mesmo diploma na redacção do Decreto-Lei nº38/95 de 14/02, o artº 2º n° 1 e artº 3º c) da Portaria nº197-A/95 de 17/03, os arts. 22 e 23 do Código das Expropriações o art. 133 n° 2 d) do CPA e os arts. 10° e 551° do Código Civil.

  36. - A interpretação que o acórdão recorrido fez do art. 24° da Lei 80/77 de 26/10, como fundamentação para a não actualização da cortiça, ter-se-à de considerar, nessa parte inconstitucional uma vez que viola o disposto nos arts. 62º n° 2 e 13° n° 1 da Constituição da República por colocar os recorrentes em situação de manifesta desigualdade relativa aos demais titulares de indemnização da Reforma Agrária, que receberam os seus bens por valores actualizados.

  37. - O acórdão recorrido ao não aceitar o principio de actualização previsto na Lei Geral e no art. 7º n° 1 do Decreto-Lei 199/88, no artº 2º n° 1 e art. 3º a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03, violou ainda por erro de interpretação desses normativos, os princípios constitucionais previstos no art. 62º n° 2 e ainda o art. 13º n° 1 da Constituição da República, uma vez que colocam as recorrentes numa situação de manifesta desigualdade, relativamente aos demais titulares das indemnizações da Reforma Agrária, que receberam os seus bens por valores actualizados.

  38. - O Tribunal não pode abster-se de fixar um critério de actualização da cortiça dentro dos princípios de legislação especial das indemnizações da Reforma Agrária".

Apresentou contra alegações o recorrido Ministro, onde formula as seguintes conclusões: "1 - No recurso contencioso não se colocou a questão da fixação da indemnização da cortiça e muito menos das rendas não recebidas, mas sim a actualização de indemnização da cortiça, extraída e comercializada em 1976...

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