Acórdão nº 0982/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelPIMENTA DO VALE
Data da Resolução21 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A… e B…, melhor identificados nos autos, deduziram impugnação judicial contra o acto de liquidação de IRS, respeitante a 2000, no valor de € 1.792,16, que foi julgada improcedente por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé.

Inconformados, os impugnantes interpuseram recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, formulando as seguintes conclusões: 1) Desconformidade formal do artº 2 nº 3 alínea h) do C.I.R.S. com o disposto no art. 168/2 e art. 103/2 todos da C.R.P.

De facto, constata-se que o conceito de retribuição do trabalho prescrito na lei de autorização legislativa apenas abrange rendimentos que constituem pagamentos ou contraprestações de certo trabalho ou a ele equiparado (ex. trabalho à peça, tarefa etc. com subordinação do beneficiário da prestação) e não "gorjetas" enquanto liberalidades atribuídas por terceiros e que não têm directamente em vista pagar determinado trabalho.

É que, como se sabe, decorre do art. 168/2 da C.R.P. que do sentido da lei de autorização legislativa, enquanto seu limite interno, terá que dele claramente resultar quais os fins, ainda que genéricos, que o Governo deve prosseguir no uso de poderes delegados, conformado assim, a lei delegada aos ditames do órgão delegante bem como dar ao contribuinte, cidadão, a possibilidade efectiva de calcular, tão aproximadamente quanto possível o encargo fiscal que vai suportar, ainda que de forma não exaustiva, evidentemente.

Assim, tendo em conta o percurso histórico atribulado da tributação das gratificações com sucessivas declarações de inconstitucionalidade pelo então Conselho de Revolução, no mínimo o legislador parlamentar teria que definir claramente se as "gorjetas" continuavam ou não a integrar o conceito fiscal de rendimento, o que não o fez.

Ora, da leitura de tal omissão necessariamente terá que retirar-se a única conclusão constitucionalmente possível, isto é, não permitir intencionalmente o legislador parlamentar a tributação das "gorjetas" pelo que o art. 2 nº 3 alínea h) do C.I.R.S. é organicamente inconstitucional por violar a lei de autorização legislativa nº 106/88 que lhe serviu de suporte, violando assim o art. 168/2 e art. 103/2 todos da C.R.P.

2) Desconformidade material do art. 2 nº 3 alínea h) do C.I.R.S. face aos art. 13°, art. 104/1 e 3 da C.R.P. por violação do princípio da igualdade tributária neles plasmado.

De facto, é comummente sabido que aquela norma apenas visará a tributação das "gorjetas" recebidas por terceiros, pelos profissionais de banca dos casinos sabendo-se que tais rendimentos pelo volume atingido, não têm natureza acessória, não tributando os demais profissionais que também as auferem nomeadamente ex. cabeleireiros, taxistas, empregados de hotelaria, etc., o que só por si conduz a uma desigualdade tributária não justificável, materialmente intolerável, provocando uma situação de injustiça social grave, não pretendida pelo legislador parlamentar.

É que tais rendimentos a tributar não servirão de suporte do regime de segurança social nem para o cômputo do valor devido a título de indemnização por despedimento sem justa causa, apesar de tributado ao contrário dos rendimentos auferidos por via da sua entidade patronal.

Assim, sabendo de antemão o legislador fiscal que tal norma apenas poderá ser aplicada a um número restrito de contribuintes passivos de imposto, tal viola o princípio da igualdade constitucionalmente plasmado na C.R.P., art. 13° e art. 104/1 e 3 da C.R.P...

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