Acórdão nº 032/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução27 de Junho de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório -1 – A……… e mulher, B………, com os sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, de 16 de Abril de 2007, que julgou improcedente a impugnação deduzida pelos ora recorrentes contra liquidações adicionais de IRS dos anos de 2000 e 2001, apresentando as seguintes conclusões: A. Andou logo mal a sentença recorrida ao considerar improcedente o invocado vício de incompetência dos actos impugnados.

B. Com efeito, a decisão a quo procedeu a um equívoco enquadramento da questão, que decidiu negativamente considerando a competência da entidade que realizou os relatórios de inspecção tributária e o facto de, quer a decisão de alteração dos rendimentos, quer os actos de liquidação adicional de IRS terem sido notificados aos impugnantes pela Direcção de Finanças de Lisboa.

C. No caso dos autos, e como bem resulta dos documentos referidos na al. h) da matéria de facto, todos os actos de alteração do rendimento declarado nos anos de 2000 e 2001 foram praticados pela Direcção de Finanças do Porto que não tinha, face ao disposto no citado art.º 65º, nº5, do Código do IRS, competência para o efeito, conclusão que não é contrariada pelo facto de ter sido a Direcção de Finanças de Lisboa a transmitir o teor daqueles actos aos ora recorrentes, pacífica que é, na doutrina e jurisprudência, a não confundibilidade entre o acto de notificação e o acto notificado.

D. Aliás, é o próprio acto de notificação da Direcção de Finanças de Lisboa muito claro ao referir que a alteração do rendimento foi da competência e da responsabilidade da Direcção de Finanças do Porto.

E. Inexistindo nos autos qualquer declaração de adesão ou concordância da Direcção de Finanças de Lisboa relativamente aos fundamentos constantes do relatório inspectivo que alterou os rendimentos de 2000 e 2001, também não é admissível atribuir ao referido ofício de notificação efectuado pela Direcção de Finanças de Lisboa, a natureza de acto de alteração de rendimentos por remissão – que teria de ser expressa, nos termos dos arts. 77º, nº1 da LGT do nº 1 do artigo 63º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária – para os fundamentos constantes do relatório que é objecto de notificação.

F. Merece, pois, censura a douta decisão recorrida por não ter anulado, nos termos do disposto no artigo 135º do CPA a alteração dos rendimentos do IRS de 2000 e 2001 – e as liquidações a que aquelas deram origem -, por violação do disposto no art. 65º, nº5, do Código do IRS, dado que todos os actos de determinação do rendimento, foram praticados pela DSIPT do Porto, claramente incompetente para o efeito uma vez que o domicílio fiscal dos recorrentes é em Lisboa.

G. Mas o problema central que se discute no presente processo é o de averiguar da tributabilidade de compensações pagas ao recorrente marido pela C………, S.A. em virtude da cessação de funções como membro do Conselho de Administração desta sociedade em 30 de Março de 2000.

H. Com efeito, como consequência dessa cessação de funções foram pagos ao recorrente as verbas seguintes: - € 299.278,74 paga em 15 de Julho de 2000; - € 149.639,37 paga em 29 de Dezembro do mesmo ano; - € 143.653,79 paga em 27 de Dezembro de 2001.

I. Acontece que dias antes, em 22 de Março de 2000, o recorrente marido havia sido reeleito para o cargo de membro do Conselho de Administração da D………., S.A. – sociedade totalmente detida pela C……… – que desempenhava desde 1997.

J. Face a esta situação, a sentença recorrida entendeu que a totalidade das verbas recebidas pelo recorrente marido eram integralmente tributáveis, na medida em que lhe não era aplicável o benefício constante da primeira parte do n.º 4 do art. 2.º do CIRS, por estar abrangido pela restrição prevista na parte final deste número: criação de um novo vínculo com a mesma entidade ou com outra que com ela esteja em relação de domínio ou de grupo, nos 12 meses seguintes à cessação.

K. Desde logo, a sentença recorrida comete o erro de considerar aplicável à última das verbas recebidas pelo recorrente - € 143.639,37 pagos em 27 de Dezembro de 2001 – a mesma redacção do n.º 4 do artigo do CIRS vigente em 2000 e por isso aplicável às duas primeiras prestações, sem atentar que ela tinha sido alterada pela Lei n.º 30-G/2000 de 29 de Dezembro.

L. Nenhuma dúvida pode existir quanto a este ponto porque a sentença transcreve integralmente a norma que considera aplicável à situação, por aí se vendo que se trata de uma redacção que, na parte que interessa para o caso, foi revogada por aquela lei n.º 30-G/2000.

M. Ora, enquanto a norma vigente em 2000, previa efectivamente como relevante a criação de um novo vínculo não só com a entidade pagadora das verbas, mas também com outra que com ela se encontrasse em relação de domínio ou de grupo, a redacção que vigora desde 1 de Janeiro de 2001 até hoje, apenas considera relevante para afastar o benefício a criação de um novo vínculo com a mesma entidade que pagou a compensação.

N. É manifesto que o legislador, tendo alargado a natureza do novo vínculo relevante – passando a incluir o vínculo empresarial – restringiu o universo das empresas com as quais a constituição desse novo vínculo por parte do contribuinte implicaria a perda do benefício constante do n.º 4 em análise, única interpretação possível em face da literalidade do preceito e do disposto nos arts. 9º nº3 do Código Civil e 11º nº 3 da Lei Geral Tributária.

O. Por outro lado, é indiscutível que a norma que define a tributabilidade da situação dos autos é a que vigora no momento em que é efectuado o pagamento da compensação, como têm unanimemente defendido a doutrina e a jurisprudência. Entre todos, pela clareza e indicação da doutrina, salientamos o Acórdão do STA de 26 de Junho de 2002, onde preto no branco se afirma: “sempre se entendeu no direito fiscal português que a obrigação do imposto se constitui pela recepção efectiva dos rendimentos tributáveis” e que em consequência é a lei vigente nesse momento a aplicável.

P. Acresce que constituindo a parte final do n.º 4 claramente uma restrição ao conteúdo inicial da norma “tanto basta para o intérprete não deva alargar a restrição a hipóteses não contempladas pelo legislador, sem o que estaria a fazer uma interpretação analógica de uma norma de incidência, com clara violação do disposto nos artigos e 11º nº3 da LGT e 103º da CR (vide. Ac. da 2.ª Secção do STA de 1 de Janeiro de 2007).

Q. Assim, apenas o lapso de não ter considerado a alteração legislativa verificada, impediu que a sentença considerasse como não sujeita a tributação a verba de € 143.653,79, paga ao recorrente em 27 de Dezembro desse ano de 2001 devendo, em qualquer caso, por se tratar de situação claramente enquadrável na alínea a) do n.º 2 do artigo 669.º do C.P.C., a sentença ser reformada, excluindo-se da tributação este terceiro pagamento efectuado. Mas não só.

R. A razão de ser da restrição constante da parte final do n.º 4 em análise está no intuito de evitar que, através de conluios celebrados com a entidade empresarial, os contribuintes acabem por arranjar um forma de manter a situação em termos de recepção de rendimentos que detinham antes da simulada cessação de funções, recebendo, sem sujeição a imposto, verbas importantes a título de compensação por uma ruptura que não existiu de facto ou que só existiu em parte (Cfr. Ac do STA de 25 de Fevereiro de 1998 e CIRS Anotado do Dr. André Salgado de Matos).

S. No caso dos autos, estando provado que o recorrente em 22 de Março de 2000 limitou-se a ser reeleito para as mesmas funções que já...

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