Acórdão nº 0335/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução11 de Julho de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: B………, SA, e C………, Ld.ª, por um lado, e o Município de Oliveira do Bairro, por outro, interpuseram recursos de revista do acórdão do TCA-Norte de fls. 2124 e ss., confirmativo da sentença do TAF de Aveiro que, julgando procedente a acção de contencioso pré-contratual instaurada pela autora A………, SA, anulara o acto de adjudicação ao consórcio formado pelas duas primeiras recorrentes de uma empreitada de obras públicas para construção de uma escola em Oiã Poente.

Aqueles dois primeiros recorrentes terminaram a sua revista oferecendo as conclusões seguintes: I. A sentença recorrida enferma de erro na aplicação do direito.

  1. A douta decisão recorrida viola, de forma flagrante, o disposto no artigo 57º do Decreto-Lei nº 59/99, de 2 de Março, os artigos 26.° e 31.°/2 do Decreto-Lei nº 12/2004, de 2 de Janeiro, a Portaria nº 104/2001, de 21 de Fevereiro (diploma onde obrigatoriamente deveriam beber os Programas de Concurso e Cadernos de Encargos dos concursos para execução de empreitadas de obras públicas até à entrada em vigor do CCP) e bem a jurisprudência firme e em sentido contrário, quer do Supremo Tribunal Administrativo, quer do Tribunal de Contas.

  2. O acto adjudicatório praticado pelo Município Réu não padece de qualquer ilegalidade tendo este cumprido escrupulosamente a lei ao admitir a concurso as firmas Recorrentes.

  3. Determina o artigo 31.° do Decreto-Lei nº 12/2004 de 9 de Janeiro que “nos concursos de obras públicas e no licenciamento municipal, deve ser exigida uma única subcategoria em classe que cubra o valor global, a qual deve respeitar ao tipo de trabalhos mais expressivo, sem prejuízo da eventual exigência de outras subcategorias relativas aos restantes trabalhos a executar nas classes correspondentes” (nº 1), e que “a habilitação de empreiteiro geral ou construtor geral, desde que adequada à obra em causa e em classe que cubra o seu valor global, dispensa a exigência a que se refere o número anterior” (nº 2) - a de uma única subcategoria em classe que cubra o valor global da obra.

  4. O que acontece, nesta última hipótese (que foi o que aconteceu no processo de concurso sub judice), é que os empreiteiros gerais, por força do nº 2 do referido artigo, estão sempre habilitados a concorrer, não podendo, por isso, ser excluídos.

  5. O consórcio externo composto pelas Recorrentes apresentou-se a concurso sendo detentor da classificação em empreiteiro geral da 1.ª categoria, mais concretamente em empreiteiro geral de edifícios de construção tradicional em classe que cobre o valor global da proposta apresentada — a 5.ª, detida pela firma C……… — (Ponto XXVI da factualidade dada como provada).

  6. Classe de alvará que, nos termos da Portaria n° 6/2008, de 2 de Janeiro, abrangia, à data, os valores de € 1.280.000,00 até € 2.560.000,00.

  7. Ora, o valor da proposta apresentada pelo Consórcio Recorrente foi de Eur. 2.138.747,79, ou seja, perfeitamente dentro dos valores da classe detida pelo consórcio (Pontos XXIV, XXV e XXV da factualidade dada como provada em primeira instância).

  8. Razão pela qual, nos termos do nº 2 do artigo 31º do já amplamente mencionado artigo 31.° do Decreto-Lei nº 12/2004, de 9 de Janeiro, jamais poderia ser excluída do concurso, independentemente do que a este propósito ali fosse exigido, porquanto esta norma sempre terá de prevalecer sobre as normas concursais.

  9. Por outro lado, o n° 2 do artigo 26.° do Decreto-Lei nº 12/2004, de 9 de Janeiro, estipula que “Os consórcios ou agrupamentos de empresas aproveitam das habilitações das empresas associadas, devendo, pelo menos, uma das empresas de construção deter a habilitação que cubra o valor total da obra e respeite ao tipo de trabalhos mais expressivo e cada uma das outras empresas de construção a habilitação que cubra o valor da parte da obra que se propõe executar”.

    XL.

    A firma C……., ora Recorrente, e membro do consórcio, detinha a classe 5 de alvará em classe que cobria o valor global das suas propostas, sendo inequívoco que o outro membro do consórcio — a firma B………, S.A. - satisfazia as disposições legais relativas ao exercício da actividade de empreiteiro de obras públicas, na parte dos trabalhos que iria executar, pelo que também aqui é inexplicável o entendimento do Tribunal a quo - vide neste mesmo sentido Acórdão do Tribunal de Contas, 1.ªS-SS, de 30 de Maio de 2006, proferido no processo nº 265/06 e Acórdão do STA, de 17 de Abril de 2002 proferido no processo nº 0191/02.

  10. Uma coisa é a habilitação detida pelos membros do consórcio para efeitos de comprovação de habilitação a um dado concurso outra, completamente distinta, é a detenção de habilitação para a execução dos trabalhos específicos em concreto que cada membro do consórcio, posteriormente, se propõe executar.

  11. O Programa de Concurso não exigia que ambas as empresas fossem detentoras de alvará em classe que cubra a respectiva proposta, exigia, como determina a Portaria nº 104/2001 de 21 de Fevereiro, o artigo 26.° do Decreto-Lei nº 12/2004, de 9 de Janeiro e o artigo 57.° do Decreto-Lei nº 59/99, de 2 de Março, que uma empresa, pelo menos, do consórcio fosse detentora da alvará em classe habilitante que cobrisse o valor da respectiva proposta e o outro membro do consórcio fosse detentor de alvará que lhe permitisse o exercício da actividade e dos valores dos trabalhos que esta (dentro do consórcio) se propõe executar, beneficiando este último, para efeitos de concurso, da habilitação detida pelo primeiro; XIV. Mas mesmo que se entendesse que exigia, como parece ser o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, que ambas as empresas fossem detentoras de alvará em classe que cobrisse o valor da proposta do consórcio — facto tanto mais absurdo, porquanto torna absolutamente inútil a simples constituição do mesmo — então sempre se terá que entender que essas exigências do Programa do Concurso, ao violar as normas imperativas atrás descritas, teriam que ser consideradas nulas e de nenhum efeito.

  12. É que sendo certo que as regras e condições do PC são imperativas, imutáveis a partir do momento em que este é dado a conhecer, isso não implica que o mesmo prevaleça à custa da violação da lei e de normas imperativas públicas.

  13. Tal significaria a transformação de condições/requisitos ilegais e, como tal, ilegítimos, em normas imperativas apenas porque previstas no procedimento, que por tal facto passariam a “intocáveis” ainda que limitando o acesso ao procedimento a empresas legalmente habilitadas.

    Por sua vez, o recorrente Município de Oliveira do Bairro concluiu a sua minuta de recurso do modo seguinte: 1. O presente recurso vem interposto do Acórdão do TCA Norte, que confirmou a sentença de primeira instância proferida nos presentes autos que têm por objecto a adjudicação da empreitada de obra pública de “Construção da Escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico e Educação Pré-Escolar de Oiã Poente”.

    1. As questões que se colocam nos presentes autos relacionam-se com a legalidade da admissão e da adjudicação do concurso público a um Consórcio, constituído por duas empresas, tendo ambas alvará de empreiteiro ou construtor geral e sendo um deles (o Alvará da C………, Lda) de classe 5, sendo ainda necessário abordar as questões da inconstitucionalidade do programa do concurso (rectius, da interpretação que dele é feita), por violação do direito/liberdade fundamental de iniciativa económica privada (art. 61º da CRP), e, por último, da própria legitimidade da Autora A……….

    2. As questões que se debatem nos presentes revestem-se de uma particular relevância social, pois, na eventualidade de o acórdão recorrido ser mantido, a execução da construção da Escola de Oiã Poente (que se encontra a ser executada pelo Consórcio) poderá ter que parar, por tempo indeterminado, colocando-se, assim mesmo, em causa a abertura do ano lectivo 2012/2013, com claro prejuízo para o interesse público em geral e o da comunidade escolar, em particular (sendo que a Escola irá servir, pelo menos, cerca de 96 alunos no 1.º Ciclo e 72 alunos do ensino pré-escolar).

    3. Tudo isto quando as existentes instalações escolares são insuportavelmente vetustas, obsoletas e degradadas, não dando, assim, o mínimo cumprimento aos direitos fundamentais ao ensino e acesso a uma educação de qualidade, com equipamentos e tecnologias adequadas à vida moderna e à própria dignidade da pessoa humana e ao desenvolvimento da personalidade, como supra se alegou (cfr. arts. 2º, 9º, als. d) e f), 26º, 74º e ss. 81º, a), todos da CRP).

    4. O investimento público na...

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