Acórdão nº 0579/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução14 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

“B…………, LDA.”, devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante TAC/L] a presente ação administrativa de impugnação urgente [contencioso pré-contratual], nos termos dos arts. 100.º e segs. do CPTA/2002-04 [cfr. art. 15.º, n.º 2, do DL n.º 214-G/2015, de 02.10] [versão a que dirão respeito todas as ulteriores referências salvo expressa indicação em contrário], contra “INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, IP” [abreviadamente «IEFP»] e as contrainteressadas “A…………, LDA.”, “C…………, LDA.”, “D…………, SA”, “E…………, SA”, “F…………, SA”, “G…………, SA”, peticionando, pela motivação inserta na petição inicial [ilegalidades: i) violação do art. 70.º, nº 2, al. f), do CCP (apresentação de proposta por parte da contrainteressada “A…………” que não refletiria ou observaria os custos obrigatórios com o pessoal determinados por vinculações legais ou regulamentares - arts. 109.º/167.º daquele articulado); ii) violação do art. 70.º, n.º 2, al. g), do CCP (apresentação de proposta por parte da mesma contrainteressada falseadora das regras de concorrência - arts. 168.º/174.º daquele articulado); iii) falta de fundamentação (arts. 68.º, n.º 3, 69.º do CCP, 124.º e 125.º do CPA/91 - arts. 175.º/245.º do mesmo articulado], que: A) fosse declarado “inválido o ato administrativo impugnado [deliberação do Conselho Diretivo do «IEFP» tomada em 30.10.2014] … de adjudicação à A………… … dos lotes 2, 4 e 5” relativos ao concurso aberto ao abrigo do AQ-HL/2010 que tinha por objeto a “prestação de serviços de limpeza das instalações das unidades orgânicas do Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP”; B) fosse a entidade demandada “condenada no dever de nova decisão do concurso público e de prática do ato de adjudicação à B………… quanto aos lotes 2, 4 e 5”.

1.2.

O TAC/L, por acórdão de 24.09.2015, julgou totalmente improcedente a pretensão impugnatória dado inverificados os fundamentos de ilegalidade aduzidos pela A., absolvendo, em consequência, os RR. daquele pedido e julgado prejudicado o conhecimento do demais pedido.

1.3.

A A., inconformada, recorreu para o TCA Sul tendo este, por acórdão de 24.02.2016, concedido provimento ao recurso, revogado a decisão do TAC/L e, em consequência, anulado o ato impugnado, condenando o «IEFP» “a proferir deliberação que adjudique os lotes 2, 4 e 5 do procedimento concursal em apreço à proposta apresentada pela ora recorrente”.

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o R.

IEFP

, inconformado agora com o acórdão proferido pelo TCA Sul, interpôs, então, recurso de revista no qual apresenta o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

Da admissibilidade do presente recurso de revista (…) Da procedência do presente recurso de revista 33.ª Salvo o devido e elevado respeito, a decisão do douto Acórdão recorrido enferma de vários vícios, traduzidos em nulidades e erros de julgamento, que postulam a necessidade da sua revogação.

  1. Com efeito, o douto Acórdão recorrido aprecia de forma ilegal uma questão … não alegada nem de facto nem de direito pela ora Recorrida na petição inicial, não obstante o cuidado do Acórdão da Conferência do TAC de Lisboa, por força do princípio da preclusão, em delimitar o âmbito da sua apreciação à factualidade alegada na petição inicial e não à invocada nas audiências prévias realizadas no procedimento concursal, mas não reproduzida em concreto na petição inicial.

  2. Aliás, a eventual alegação pela ora Recorrida na sua petição inicial em relação a uma hipotética inferioridade do valor do subsídio de alimentação tido em conta pela 1ª C.I. na formulação do preço proposto seria totalmente descabida e até impossível, pois por nenhum dos concorrentes foram indicados quaisquer custos diretos ou indiretos incorridos com a prestação de serviços, nem sequer a título informativo, nem tinham que ser, porque pura e simplesmente as peças do procedimento não os solicitaram, nem que apresentassem qualquer nota justificativa dos preços propostos, apenas tendo sido exigido a indicação do preço/hora Homem para cada tipologia de serviço e nunca a sua decomposição nos custos que formam os mesmos.

  3. O douto Acórdão recorrido, contudo, com base no referido na contestação da 1ª C.I. e ao abrigo do disposto no art. 662.º do CPC, veio dar como provado [n.º 36] que nos preços apresentados por este concorrente, o valor do subsídio de alimentação tido em conta para a formação dos mesmos foi de 0,225 €/hora.

  4. De facto, a ora Recorrida na sua petição inicial, insista-se, limitou-se apenas a alegar, de forma genérica, que o preço de 4,70 €/hora não permite cobrir os custos com a prestação de serviços em causa.

  5. Assim, a questão relativa à desconformidade ou não do valor do subsídio de alimentação com o valor decorrente do CCT aplicável não foi objeto de apreciação pelo douto Acórdão da Conferência do TAC de Lisboa, aliás, corretamente, ao invés do que fez o douto Acórdão recorrido.

  6. Com efeito, a ora Recorrida ao não cumprir o «ónus de alegação e prova dos factos concretos consubstanciadores das causas de invalidade que imputa à deliberação impugnada», nem o podendo fazer em articulados supervenientes, pois já era matéria do seu conhecimento, invocada em audiência prévia, mas não transposta na petição inicial, obstou ao seu conhecimento pelo Acórdão da Conferência do TAC de Lisboa.

  7. Por isso, sob pena de violação do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, o douto Acórdão recorrido não podia ter tomado conhecimento da referida questão sobre o valor do subsídio de alimentação tido em conta na formação do preço apresentado pela 1ª C.I., pois a mesma não tinha sido suscitada na petição inicial, nem poderia ter sido validamente alegada em momento posterior.

  8. Tal questão, aliás, nem era suscetível de ser suscitada, pois nenhum dos concorrentes indicou nas suas propostas qual o valor do subsídio de alimentação considerado na formulação dos preços apresentados.

  9. Assim, o douto Acórdão recorrido, ao invés do que fez o douto Acórdão da Conferência do TAC de Lisboa, tendo tomado conhecimento da questão sobre o valor do subsídio de alimentação tido em conta pela 1ª C.I. na formação do preço proposto ser inferior ao previsto no CCT de 2010, enferma da nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.

  10. Com efeito, salvo o devido respeito, não é lícita a apreciação pelo TCA Sul de uma questão não suscitada, nem de facto nem de direito, na petição inicial, embora alegadamente invocada em sede de audiência prévia, o que determina a sua nulidade nos termos da citada disposição da lei processual.

  11. Porém, ainda que o conhecimento dessa questão fosse válido, a verdade é que a factualidade provada e a asserção de que o valor do subsídio de alimentação de € 0,225 é inferior ao de 0,2275 resultante do CCT/2010, não permitem lógica e factualmente retirar a conclusão de que a proposta 1ª C.I. apresenta um preço cujo valor não suporta os encargos legais obrigatórios.

  12. O douto Acórdão recorrido não demonstra a sua conclusão de que o preço de 4,70 € da proposta da 1ª C.I. não acomoda a diferença entre os 0,225 € e os 0,2275 € previstos no CCT/2010, ou seja, uma diferença de 0,0025 €, quando é certo que, nos termos do facto provado n.º 31, o custo mínimo/hora dos serviços de limpeza com os encargos legais obrigatórios (sem acréscimo de hora noturna, como é o caso) é de 4,5529 €, sendo a diferença para os 4,70 €, por isso, suficiente para acomodar os tais 0,0025 € a menos do subsídio de alimentação.

  13. Não poderia, pois, o douto Acórdão recorrido ter concluído como concluiu, sem mais, que o preço de 4,70 € da proposta da 1ª C.I. não suporta os encargos legais obrigatórios, sob pena de manifesta oposição com a factualidade dada como provada e, também, de apresentar fundamentação não consistente e contraditória com as asserções enunciadas, incorrendo, assim, não só em erro de julgamento, mas igualmente na nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC.

  14. Acresce que o salto lógico do douto Acórdão recorrido não pode deixar de ser sancionado com a nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, por falta de especificação da fundamentação de facto e de direito justificativa da sua decisão, pois é omitida qualquer demonstração de que o preço global da proposta de 4,70 € não acomoda a diferença ínfima de 0,0025 € face ao valor de 4,5529 € (facto 31).

  15. Além disso, a decisão do douto Acórdão recorrido suscita a questão de saber se era lícito ao júri do procedimento, na análise das propostas, verificar a correção dos valores dos encargos obrigatórios, caso tivessem sido indicados, como justificativos do preço/hora apresentados, quando é certo que a indicação de tais valores ou a justificação do preço/hora apresentado não eram exigidas nas peças do procedimento, como também nem nenhum dos concorrentes o fez.

  16. Na verdade, não consta sequer da factualidade provada que, por um lado, as peças do procedimento exigissem aos concorrentes, de algum modo, a indicação dos vários custos legais obrigatórios que formam o valor hora/Homem apresentado nas suas propostas ou que, por outro lado, a aplicação do critério de adjudicação fixado e dos respetivos fatores de ponderação exigisse a verificação desse aspeto das propostas, ou seja, a justificação do preço apresentado.

  17. Por conseguinte, não só os concorrentes não tinham de indicar, como, de facto, não indicaram, quais os custos com os encargos legais obrigatórios (v.g. subsídio de alimentação) que consideraram na formulação do preço/hora apresentado, como também estava vedado ao júri do procedimento a averiguação da eventual conformidade dos respetivos valores indicados (caso os indicassem, pois a isso não estavam obrigados), sob pena de ilegalidade de eventuais decisões de exclusão das propostas com esse fundamento.

  18. De forma indubitável, estava, pois, arredada da...

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