Acórdão nº 0669/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução10 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, julgando procedente a impugnação judicial deduzida por A………….. (a seguir Impugnante ou Recorrido), anulou a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) efectuada com referência à mais-valia apurada pela venda de um imóvel, ocorrida no âmbito do processo em que aquele foi declarado insolvente.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor: «A. Com a ressalva do sempre devido respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto considera existir erro de julgamento em matéria de direito na interpretação efectuada pelo Tribunal a quo sobre o âmbito e alcance do disposto no n.º 1 do art. 268.º do CIRE.

  1. A liquidação em causa tem subjacente as mais-valias obtidas com a alienação onerosa de bens imóveis integrados na massa insolvente que, segundo o entendimento da Autoridade Tributária, não se encontram abrangidas pela isenção de IRS prevista no preceituado do n.º 1 do art. 268.º do CIRE.

  2. As referidas mais-valias não foram realizadas por efeito de uma dação em cumprimento de bens do devedor, no sentido da realização de uma prestação, diferente da que é devida, com o fim de extinguir imediatamente a cobrança.

  3. As mais-valias também não resultam de uma cessão de bens aos credores, em que o devedor encarrega os credores de liquidar o seu património ou de parte dele e de repartirem entre si o respectivo produto para satisfação dos seus créditos, a que expressamente se refere o n.º 1 do art. 268.º do CIRE.

  4. A questão a dirimir, prende-se, como aliás o douto decisório aponta, em saber se a venda de bens imóveis da massa insolvente é susceptível de gerar uma mais-valia do insolvente, sujeita a tributação em sede de IRS.

  5. De acordo com o estabelecido nos artigos 1.º e 2.º n.º 1 al. a), do CIRE, o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e, designadamente, a repartição do produto obtido pelos credores.

  6. Proferida a sentença de declaração de insolvência o juiz decreta a apreensão, para imediata entrega ao administrador de insolvência, dos elementos da contabilidade do devedor e de todos os seus bens, cfr. alínea g) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRE.

  7. Com a declaração de insolvência, o insolvente fica imediatamente privado de poder administrar e dispor dos bens integrantes da massa insolvente, uma vez que é o administrador de insolvência que fica incumbido de tais poderes (cfr. n.º 1 do artigo 81.º do CIRE).

    I. A massa insolvente destina-se, por isso, à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo, competindo, todavia, os poderes de administração e de disposição dos respectivos bens integrantes ao administrador da insolvência, cfr. n.º 1 do art. 46.º do CIRE.

  8. Do mesmo modo prescreve o artigo 149.º do CIRE, quando determina a imediata apreensão de todos os bens integrantes da massa insolvente após ter sido proferida sentença declaratória de insolvência.

  9. Ainda sobre a entrega dos bens apreendidos, refere o artigo 150.º do CIRE, que o administrador de insolvência, a quem são entregues os bens, fica depositário dos mesmos.

    L. Deste modo facilmente se apreende que o insolvente embora fique na indisponibilidade de dispor e administrar os bens da massa insolvente, não deixa de continuar a ser o efectivo proprietário dos mesmos.

  10. Pelo que, os ganhos obtidos com a alienação do imóvel, mesmo fazendo parte integrante da massa insolvente, deverão ser sujeitos a tributação em sede de IRS na esfera do seu proprietário, de harmonia com o disposto na alínea a), do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS.

  11. Sendo certo que tais ganhos não se encontram abrangidos pelas isenções estabelecidas no art. 268.º do CIRE O. Seguindo a doutrina, da anotação n.º 2 ao artigo 268.º do CIRE, constante do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, da autoria de Luís Carvalho Fernandes e João Labareda extraímos o seguinte entendimento: “(...) a de isentar de tributação, em impostos sobre o rendimento de pessoas singulares ou colectivas, mais-valias resultantes de actos de dação em cumprimento de bens do devedor e de cessão, aos credores, de bens ou de elementos do activo da empresa, taxativamente enumerados no seu n.º 1.

    As mais-valias em causa não serão, assim, levadas em conta na determinação da matéria colectável aos referidos impostos.

    O beneficiário desta isenção fiscal é o próprio devedor”.

  12. Como bem se compreende, no caso sub judice não estamos perante qualquer acto de dação em cumprimento ou cessão de bens aos credores, mas sim perante a venda de um bem cuja propriedade pertence ao devedor e que gerou um rendimento passível de tributação em sede de mais-valias.

  13. Questão diferente é o destino ou afectação do rendimento e aí sim, por força da declaração de insolvência, o mesmo é afecto à satisfação dos credores de insolvência.

  14. Deste modo, entende a Fazenda Pública que a operação em causa configurou a alienação de um imóvel que, embora integrando a massa insolvente, não inviabiliza a tributação dos ganhos daí advenientes na esfera do seu proprietário [impugnante].

  15. Atento ao exposto, considera a Fazenda Pública que a liquidação em causa respeitou em pleno todos os pressupostos legais não padecendo de qualquer vício passível de suscitar a sua anulabilidade, sendo de manter firme o acto de liquidação na ordem jurídica.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as devidas consequências legais».

    1.3 O Recorrido não apresentou contra-alegações.

    1.4 Remetidos os autos a este Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer...

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