Acórdão nº 01444/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DO C
Data da Resolução11 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO O Município da Figueira da Foz, inconformado com a decisão proferida em 15 de Julho de 2016 no TCAN, no âmbito da acção administrativa especial intentada pelo Ministério Público com vista à declaração de nulidade dos actos devidamente identificados na PI, [que negou provimento ao recurso pelo mesmo interposto] interpôs o presente recurso.

Apresentou, para o efeito, as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: «1) Estão verificados os pressupostos de admissão do recurso de Revista quando a recorrente pretende através dela afastar a declaração de nulidade de 4 actos de licenciamento - o despacho de 18/12/2001 do Vereador em exercício de funções no sector do urbanismo da CMFF e três despachos do Presidente da CMFF de 18/05/2004, de 23/02/2005 e de 30/05/2005, todos relativos ao licenciamento de construção de uma moradia bifamiliar geminada, tipologia (por fogo) T4, composta por cave, r/c e 1º andar edificada no lote B do loteamento titulado pelo alvará 1/00 - assente numa errada interpretação do art. 8º do PDM da Figueira da Foz, feita pelo Tribunal recorrido.

2) A consequência dessa nulidade tem implicações gravosas nos particulares interessados na manutenção do licenciamento – na medida em que em execução de sentença podem vir a ter de demolir parcialmente as suas habitações -, bem como no apuramento da responsabilidade extracontratual do Município, com os inerentes efeitos no erário público.

3) É certo também que, estando em causa a interpretação de uma norma do PDM em vigor, considerada na aprovação dos projectos urbanísticos, a interpretação que se consumar nestes autos não deixará de ter influência num número indiscriminado de casos, tantos quantos forem os processos de licenciamento apresentados nos serviços de urbanismo da autarquia que demandem a aplicação daquele art. 8º.

4) Ao prever no art. 8º do PDM da Figueira da Foz a exclusão das áreas de estacionamento para a contabilização da superfície de pavimento, o legislador assumiu que essas áreas assumem irrelevância ou diminuta relevância urbanística.

5) Para interpretar a noção de “áreas de estacionamento” vertida naquele diploma deve atender-se à função desempenhada pelo espaço. Assim, se no piso destinado a estacionamento existem umas escadas que lhe dão acesso, devem as mesmas ser excluídas do cálculo da superfície de pavimento.

6) Ao excluir as escadas situadas na cave, que servem a garagem, da noção de área de estacionamento,- contrariando inclusive uma interpretação que há muito vinga nos serviços de urbanismo do recorrente - o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, por errada interpretação da norma.

7) Erro de interpretação que repete quando admite a contabilização da área das varandas para cálculo da superfície bruta de todos os pisos acima e abaixo do solo (cfr. art. 8º do PDM).

8) Não ocupando as varandas qualquer parte do solo, por se apresentarem estas como construções salientes de uma parede (Ac. de 5/6/2015, processo 562/05.6BEBRG), logo se conclui dever excluir-se a sua área para contabilizar a superfície bruta, pois o art. 8º do PDM, reportando-se às superfícies brutas de todos os pisos acima e abaixo do solo, aponta claramente para as superfícies que efectivamente ocupam o solo.

9) Mesmo que assim não se entenda, e não oferecendo o art. 8º do PDM qualquer noção do que seja a superfície bruta, haverá que recorrer a outras fontes.

10) O Tribunal recorrido, sem embargo de reconhecer que efectivamente o PDM não define o que seja superfície bruta de cada piso e que o TCAN teve já ocasião de expressar que antes da definição constante do DR 9/2009 de 29 de Maio, devia atender-se à definição dada pelo DGOTU, impondo-se a exclusão das varandas e platibandas da noção de superfície bruta (Ac. 5/6/2015, processo 562/05.6BERG), entendeu, ainda assim, que sendo o RGEU a referência normativa contemporânea mais próxima do Regulamento do PDM aprovado em 1994, então a definição da superfície bruta há-de incluir todo o edificado, incluindo as varandas, por força do que dispõe o art. 67/2, a) do RGEU.

11) O apelo a esta norma revela-se desadequado: a) o preceito está inserido no Capítulo III que trata sobre “Disposições Interiores das edificações e espaços livres”; b) as normas que integram este capítulo fixam valores mínimos da altura das edificações, da dimensão dos compartimentos, das instalações sanitárias, etc; c) o art. 67º dispõe sobre os valores mínimos das áreas brutas dos fogos, consagrando o nº 2 desse preceito a definição de algumas noções que devem presidir à verificação do cumprimento desses valores mínimos sendo que, quando o art. 8º do PDM fala em superfícies brutas de todos os pisos está a falar da área bruta de construção do edifício e não à área bruta do fogo, conceitos que não se confundem. A este propósito veja-se, com interesse, o que veio a ficar estipulado na Ficha 8 do Quadro 2 do Anexo ao DR 9/2009 de 29 de Maio: a área bruta de construção de um edifício não “deve confundir-se com a noção de “área bruta do fogo” definida no Regulamento Geral das Edificações Urbanas (…) bem como nas recomendações técnicas de habitação social aprovadas pelo Despacho 41/MES/85 de 5 de Fevereiro.

12) De resto, este diploma reconhecia no seu preâmbulo que as diferentes autarquias adoptavam diferentes definições técnicas, sendo seu objectivo “evitar a actual dispersão e imprecisão de conceitos utilizados por instrumentos de gestão territorial, nomeadamente o recurso a expressões que não são objecto de definição, a utilização do mesmo conceito com diferentes significados ou do mesmo instituto jurídico com diferentes designações, bem como a utilização de conceitos indeterminados ou incorrectos.” 13) Se a referência normativa contemporânea mais próxima do PDM é o RGEU também é verdade que a referência doutrinal mais próxima é o Vocabulário Urbanístico da DGOTDU de 1994, nascido da necessidade de suprir a ausência de conceitos técnicos, como se reconhece na referida Nota de Apresentação.

14) Por outro lado, se considerarmos a data dos despachos anulados, temos que a referência mais próxima é a do Vocabulário do Ordenamento do Território, edição da Direcção-Geral de Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano, 2000. E este Vocabulário, recorde-se, “teve como desígnio precisar definições e normalizar a linguagem técnica utilizada por todos os que interferem na elaboração e implementação de instrumentos de gestão territorial”, sendo que a definição aí veiculada para superfície bruta não se aproxima da noção de área bruta de fogo do RGEU.

15) Mesmo que os serviços do urbanismo não tomassem em linha de conta este Vocabulário, e tomavam, sempre se impunha ao Acórdão recorrido que fizesse uma interpretação actualista da noção de superfície bruta, tendo em conta a realidade vigente ao tempo dos actos, mostrando essa realidade que a DGOTDU, ciente que estava da necessidade de normalizar a linguagem técnica, publicou um Vocabulário a ter em conta na aplicação dos instrumentos de gestão territorial. E nesse Vocabulário excluem-se as varandas da noção de superfície bruta.

16) E, assim, dúvidas não restam que para a noção de superfície bruta constante do art...

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