Acórdão nº 0678/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.

A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida em 5/11/2015 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………. Limited contra a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa relativa a actos de retenção na fonte de IRC incidente sobre dividendos pagos por sociedade residente a sociedade residente noutro estado membro da União Europeia (Reino Unido).

1.2.

Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: I- Em apreço está o regime legal interno relativo à retenção na fonte à taxa liberatória dos dividendos distribuídos por sociedades residentes a sociedades não residentes e a pressuposta violação do Direito Comunitário.

II- Nesse sentido, o Tribunal a quo concluiu que os atos tributários impugnados nos presentes autos padecem de vício de violação de lei, por considerar que a retenção na fonte em IRC dos dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal à recorrida impugnante enquanto Fundo de Pensões não residente, efetuada nos termos do art. 16º, nº 1 do EBF conjugado com os arts. 87º, nº 4, al. c), 94º, nº 1, al. c) e 98º, nº 1 do CIRC (na redação vigente à data dos factos), viola o princípio da livre circulação de capitais previsto no art. 56º do TCE e, consequentemente, o art. 8º, nº 4 da CRP.

III- Contudo não o fez sem previamente se ter pronunciado sobre a tempestividade do meio procedimental/processual utilizado pela impugnante.

Refere a sentença recorrida que o objeto imediato dos autos é o do indeferimento do pedido de revisão oficiosa (que se pronunciou sobre a questão de mérito alegada pela ora impugnante), sendo por referência ao mesmo que deve ser aferida a tempestividade dos presentes autos.

IV- Por outro lado, refere ainda a douta sentença que o invocado pela AT, acerca da tempestividade da presente impugnação, deve entender-se como mérito da mesma, improcedendo a exceção da intempestividade.

V- Todavia, a AT considera a reclamação graciosa intempestiva quanto ao ano de 2009 e improcedente quanto ao ano de 2010.

VI- São pois duas questões colocadas no âmbito dos presentes autos recursais, tal como as define a sentença proferida pelo tribunal ad quo: saber se o ato de indeferimento é ilegal por tempestividade do pedido e por outro se os atos de retenção sobre os dividendos distribuídos são atentatórios do direito comunitário.

Precise-se contudo que nos termos do nº 1 do art. 78º da L.G.T. a revisão oficiosa a pedido do sujeito passivo apenas pode ser efetuada desde que seja por este no prazo de reclamação administrativa e, se feita para além desse prazo, o deve ser com fundamento em erro imputável aos serviços e nunca com fundamento em qualquer ilegalidade.

VII- Referindo Jorge Lopes de Sousa “… É, assim, inequívoco que se admite, a par da denominada revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte (dentro do prazo de reclamação administrativa que se faça, também na sequência de sua iniciativa a «revisão oficiosa» (que a Administração deve realizar também por sua iniciativa).

No entanto, não será indiferente para o contribuinte impugnar ou não o ato de liquidação dentro do prazo da «reclamação administrativa», referido no nº 1 do art. 78º da L.G.T. (Não interessa, para apreciação do caso dos autos, esclarecer o sentido da referência feita no nº 1 do art. 78º da L.G.T. à «reclamação administrativa», designadamente se quer significar «reclamação graciosa» ou a reclamação administrativa prevista nos art.ºs 161º e seguintes do C.P.A..

Na verdade, no caso em apreço, o pedido formulado pelo contribuinte foi apresentado para além do prazo máximo de qualquer desses tipos de reclamações), pois, enquanto o pedido de revisão formulado naquele prazo pode ter por fundamento qualquer ilegalidade, o pedido formulado para além daquele prazo apenas pode ter por fundamento erro imputável aos serviços ou duplicação de coleta, para além de serem diferentes as consequências a nível do direito a juros indemnizatórios.” (negrito nosso).

VII- Nas presentes circunstâncias a impugnante evoca a ilegalidade das retenções de IRC efetuadas em 2009 e 2010, por força do disposto no art. 16º do EBF, clamando que deveria ter ficado isenta à semelhança dos fundos de pensões constituídos e a operar de acordo com a legislação portuguesa, à face do que deveria ser aplicável por força do princípio da liberdade de circulação de capitais consagrada no art. 63º e seguintes do TUE.

VIII- É inequívoco que não está em causa duplicação de coleta. E salvo melhor entendimento, conforme supra-exposto em sede de alegações, também não estamos perante um erro imputável aos serviços - não está em causa autoliquidação senão em sentido impróprio porque as retenções na fonte foram efetivadas a título definitivo e, não pela própria impugnante, mas pelo substituto tributário.

Ou seja, como a sentença recorrida dá por provado, o pedido de reclamação relativo a 2009 foi interposto para além do prazo legal. Desse modo, o pedido de revisão teria que ter como fundamento erro imputável aos serviços, o que não se verificando, leva à caducidade do direito impugnatório por caducidade do direito de ação.

IX- Por outro lado, considera ainda a AT que, no caso em apreciação, o diferente regime fiscal aplicável aos fundos de pensões estrangeiros não lesa os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais ínsito no Direito Comunitário (arts. 12º e 56º do TCE e actuais arts. 18º e 63º do TFUE), pelo que, a retenção em sede de IRC, em discussão nos autos, não enferma de qualquer ilegalidade.

X- Mesmo que assim não se considere, para concluir pela legalidade dos atos impugnados face às disposições do direito comunitário supra-mencionadas importa atender, em primeiro lugar, às normas vigentes do direito interno em vigor na data dos factos tributários.

XI- Ou seja, o regime dos Fundos de Pensões plasmado no Decreto-Lei 12/2006, de 20/01, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva nº 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 03/06, relativa às atividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais, designadamente, o seu art. 38º, nº 1, al. a), que refere que, entre outros requisitos, as sociedades gestoras de fundos de pensões devem constituir-se sob a forma de sociedades anónimas e ter a sede social e a principal e efetiva localização da administração, em Portugal; Ademais, atentemos ao art. 16º, nº 1 do EBF que estatuía que nos exercícios em apreciação “são isentos de IRC os rendimentos dos fundos de pensões e equiparáveis que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional” (realce e sublinhado nossos); Ora, os arts. 87º, nº 4, al. c), 94º, nº 1, al. c) e 98º, nº 1 do CIRC (na redação vigente à data dos factos) por força dos quais o regime de tributação aplicável aos Fundos de Pensões residentes era diferente do aplicável aos não residentes, na medida em que os rendimentos destes obtidos em Portugal estavam sujeitos a retenção na fonte a uma taxa liberatória de 20%, não era em qualquer caso discriminatório.

Portanto, será ainda de atender à Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CDT).

XII- Ao nível comunitário relevam, além dos art.ºs 12º e 56º do TCE já acima mencionados, o art. 58º do mesmo Tratado, na parte que ora se transcreve: “1. O disposto no artigo 56º não prejudica o direito de os Estados-Membros:

  1. Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido; b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infracções às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública. (...) 3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida rio artigo 56º. (...)”.

Refere o citado art. 58º do TCE que a proibição de restrições aos movimentos de capitais não constitui um impedimento a que um EM consagre um regime diferente para os contribuintes que não se encontrem em idêntica situação.

XIII- Posto o que, antes de concluir pelo carácter discriminatório de uma determinada norma nacional (no caso está em discussão a admissibilidade à luz do direito comunitário do disposto no art. 16º, nº 1 do EBF) e da existência ou não de causas de justificação que legitimem o carácter discriminatório da mesma, importa determinar, em primeiro lugar, se estamos perante situações comparáveis. Isto porque, só existe discriminação quando o direito interno de um EM aplica regras diferentes a situações comparáveis ou sujeita situações diferentes a um regime idêntico.

XIV- Assim, é necessário proceder à comparação concreta dos casos em litígio a fim de saber se uma situação caracterizada por um tratamento diferente é ou não constitutiva de discriminação proibida pelo Tratado, colocando os não residentes de outros Estados Membros em desvantagem face aos residentes. Ora, tal apreciação não foi considerada na sentença do Tribunal de 1ª instância.

XV- A sentença em crise limita-se a remeter, neste ponto, para os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais previstos, respetivamente, nos arts. 12º e 56º do TCE (atuais arts. 18º e 63º do TFUE) e para acórdãos do TJUE, nos quais são manipulados esses mesmos princípios, sem apurar se o imposto retido pela recorrida é recuperado no imposto devido no país do seu domicílio fiscal ou, se se encontra sujeita a um nível de tributação idêntico...

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