Acórdão nº 0328/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I-RELATÓRIO 1.A………………………, S.A. e o INSTITUTO POLITÉCNICO DO PORTO interpõem 2 recursos jurisdicionais de revista, para o STA, da decisão de 19.01.2017 proferida no TCAS, em sede de recurso jurisdicional da decisão do TAF de Sintra, que julgou a acção de contencioso pré-contratual, instaurada pela A…………………, S.A., parcialmente procedente, nos seguintes termos: “A. nos termos da fundamentação supra julgar procedente a questão suscitada nas conclusões sob os itens 22 a 86 e 87 a 103, no tocante aos pontos IX, VI e VII n.º 1 c) e d) do Convite, na parte em que tomam por padrão de referência a Recomendação da ACT de 12. Abril. 2012, e revogar a sentença proferida no segmento decisório da alínea a) em que declarou a ilegalidade das mencionadas disposições; B. julgar improcedente o recurso relativamente à questão constante das conclusões sob os itens 22 a 86 na parte respeitante ao desconto comercial de 14% sobre o preço normal de cada Lote na proposta apresentada pela ora Recorrida A…………………., SA; C. cabendo ao Instituto Politécnico do Porto, ora Recorrente, retomar o procedimento em consequência do efeito anulatório dos actos retroagido à fase de análise e avaliação das propostas, com admissão da proposta a todos os 7 Lotes apresentada pela A………………, SA, ora Recorrida, e prosseguir na competente tramitação.

D. julgar improcedente o recurso quanto à questão suscitada sob os itens 1 a 21, no tocante à caducidade do direito de acção impugnatória de disposições do Convite; E. confirmar e manter a sentença proferida, no tocante aos demais segmentos decisórios.” 1.1. A A………………., S.A. conclui as suas alegações nos seguintes termos: “1. Considerando a Recomendação da Autoridade para as Condições do Trabalho de 12 de Abril de 2012 como uma referência obrigatória que se impõe aos concorrentes nos procedimentos de contratação pública para a aquisição de serviços de vigilância humana, o recorrente, no Convite do Procedimento Ref AQ/PA.099.2015.005: (i) Fixou como limiar do preço anormalmente baixo os valores indicados na Recomendação da ACT (cf. ponto VI do Convite - alínea E) dos factos provados); (ii) Exigiu como documentos da proposta: um documento do concorrente em que declara que a sua proposta respeita a Recomendação da ACT e uma nota justificativa do preço de acordo com a Recomendação da ACT (cf. ponto VII n.° 1 al. c) e d) do Convite — alínea F) dos factos provados) (iii) Fixou como critério de adjudicação a justificação do preço de acordo com a Recomendação da ACT (cf. ponto IX do Convite — alínea G dos factos provados).

  1. Por sentença de 21 de Abril de 2016, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, declarou ilegais os pontos VI, VII n.° 1 al. c) e d) e IX do Convite por violação dos princípios da proporcionalidade e da concorrência e, quanto ao ponto IX do Convite, também por extravasar o consentido pelo Acordo-Quadro ESPAP.

  2. Não o entendeu assim o Tribunal Central Administrativo Sul no Acórdão recorrido, o qual, sustentando que o preço proposto tem que ser suficiente para suportar os custos mínimos resultantes da legislação laboral, social e fiscal, revogou a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra no segmento decisório em que declarou a ilegalidade dos pontos VI, VII n.° 1 al. c) e d) e IX do Convite.

  3. Vem o presente recurso interposto do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 19 de Janeiro de 2017 na parte em que decidiu “julgar procedente a questão suscitada nas conclusões sob os itens 22 a 86 e 87 a 103 no tocante aos pontos IX, VI e VII n.° 1 a) e d) do Convite, na parte em que tomam por padrão de referência a Recomendação da ACT de 12 de Abril de 2012 e revogar a sentença proferida no segmento decisório da alínea a) em que declarou a ilegalidade das mencionadas disposições”.

  4. São as seguintes as questões que se colocam na presente revista: (i) o preço proposto tem que se revelar suficiente para cumprir os custos mínimos resultantes da legislação laboral, social e fiscal, sob pena de exclusão da proposta nos termos do Art.° 70º n.° 2 alíneas e), f) e g) do CCP? E, em consequência: (ii) A entidade adjudicante pode impor a observância pelas propostas da estrutura de custos constante da Recomendação da ACT, sob pena de exclusão? (iii) A entidade adjudicante pode impor a justificação do preço de acordo com a Recomendação da ACT, sob pena de exclusão? (iv) A entidade adjudicante pode fixar o preço anormalmente baixo por referência aos custos indicados na Recomendação da ACT? (v) A observância da estrutura de custos constante da Recomendação da ACT pode constituir critério de adjudicação? VI. O Acórdão recorrido decidiu em sentido oposto ao decidido, em sede de revista, pelo Supremo Tribunal Administrativo, em sucessivos Acórdãos, que tem vindo a decidir pela inadmissibilidade de exclusão de propostas com fundamento na alegada desconformidade dos preços propostos com os custos constantes da Recomendação da ACT ou com os custos legalmente impostos (cf. Acórdãos de 14/02/2013, proc.° 0912/12, de 03/12/2015, proc.° 0657/15, de 16/12/2015, proc.° 01047/15, de 07/01/2016, processo 01021/15, de 28/01/2016, processo 01255/15, de 14/12/2016, proc.° 0579/16, e de 19/01/2017, processo 0817/16).

  5. Tendo o Acórdão recorrido decidido em sentido oposto à jurisprudência estabilizada do Supremo Tribunal Administrativo, afigura-se plenamente justificada a sua reapreciação pelo órgão de cúpula da jurisdição administrativa com vista a uma melhor aplicação do direito.

  6. As questões colocadas estão relacionadas com a liberdade do concorrente de formulação do preço e com a legalidade das restrições que a entidade adjudicante pode impor, questões que têm aptidão para se repercutir num elevado número de casos futuros, assumindo, pois, importância jurídica e social.

  7. As questões respeitantes à exclusão das propostas motivada pelos preços delas constantes, são questões que versam sobre um aspecto relevantíssimo (senão o mais relevante) dos procedimentos de contratação pública pelo que a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo pode contribuir para uma maior clareza e previsibilidade do direito e, consequentemente, uma melhor administração da justiça, para a uniformidade das decisões dos tribunais e para orientação quer para a Administração quer para os particulares que com ela pretendem contratar.

  8. Termos porque, preenchidos que estão os respectivos pressupostos, deverá ser admitida a presente Revista nos termos do artigo 150º n.° 1 do CPTA.

  9. De acordo com a jurisprudência estabilizada do Supremo Tribunal Administrativo: - A alegada insuficiência do preço proposto para suportar os custos legais não constitui causa de exclusão da proposta; - Da análise do preço não deriva ou não decorre, lógica e necessariamente, que aquele vá cumprir ou não as suas obrigações legais e contratuais, se o conseguirá vir a fazer ou não, tanto mais que, isoladamente, o preço proposto não é conditio sine qua non para se poder concluir, sem mais, que determinado concorrente pelo simples facto de haver oferecido um preço superior ao de outro concorrente irá cumprir as suas obrigações e que este último o não fará ou não conseguirá fazer pela simples razão de haver apresentado um preço inferior àquele; - São os resultados económico-financeiros dum contratante no cômputo geral da sua actividade e, em última análise, todo o seu património que garantem que, nomeadamente, na execução de cada contrato se mostrem observadas e cumpridas pelo mesmo todas as obrigações legais; - Os valores constantes da Recomendação da ACT são valores meramente indicativos, recomendados, não constituindo ou gozando dum qualquer valor impositivo obrigatório e absoluto como valor mínimo que importe ser estritamente observado sob pena de ilegalidade, já que não constam de lei ou regulamento; - Os valores que nela se mostram apostos foram produto dum cálculo no qual foram incluídos os vários custos/encargos obrigatórios que derivam de imposições legais diversas, mas desse cálculo não podem fazer parte unicamente tais custos porquanto para o mesmo contribuem todos os outros custos variáveis imanentes ao funcionamento, operacionalidade e rentabilidade duma empresa do sector da prestação de serviços de segurança privada; a proporção com que uns custos e outros contribuem para o resultado obtido na operação de estudo e cálculo a que a ACT chegou é ou pode ser muito diverso, tal como muito diverso será, necessariamente, a estrutura de custos fixos e variáveis que cada empresa possui e terá de suportar no desempenho da sua actividade pelo que a exclusão de proposta não tem cobertura legal através do apelo à Recomendação da ACT visto a mesma não possuir carácter absoluto nem força jurídica e normatividade bastante.

  10. Entre as componentes do preço mínimo mensal constantes da Recomendação da ACT, incluem-se não apenas custos previstos na lei, mas também outros custos não regulados por lei, o que significa que, em relação a estes últimos, não há, nessa parte do tal preço mínimo da Recomendação, qualquer correspondência com exigências ou imposições legais na matéria, muito menos de valor determinado.

  11. Mas, mesmo em relação aos custos previstos na lei, existem mecanismos (v.g. os incentivos de apoio à contratação previstos no DL 89/95) que determinam a sua redução e que a Recomendação pura e simplesmente desconsidera, sendo que, utilizando as empresas tais mecanismos, as mesmas não suportam os custos salariais e/ou sociais com os valores fixados na Recomendação.

  12. Mais, da liberdade de gestão empresarial constitucionalmente consagrada (artigo 61º da CRP) resulta que cada empresa é gerida de acordo com os seus próprios critérios e opções de gestão, nada impedindo que os custos inerentes a determinado contrato sejam repartidos por outros contratos.

  13. Por não corresponderem a imposições legais, não têm os...

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