Acórdão nº 0267/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução13 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A…………….. intentou, no TAF de Braga, acção administrativa especial, contra o Município de Guimarães pedindo (1) a anulação do despacho, de 3/10/2008, do Vereador da sua Câmara Municipal que alterou o horário de funcionamento do estabelecimento comercial denominado “………..”, de que é proprietária, restringindo o seu encerramento para as 22 horas e (2) a condenação do Réu a reconhecer que tinha o direito de o encerrar às 2 horas.

Em resumo, alegou que o mesmo estava inquinado por vícios de forma - não estava fundamentado e fora proferido sem que, previamente, lhe fosse concedido o direito de audiência - e de violação de lei - infracção ao disposto na al.ª a) do art. 3° do Decreto-Lei n° 48/96, de 15/05.

O TAF julgou a acção procedente e anulou o acto impugnado por ter entendido que este incumprira o disposto no art.º 100.º do CPA e violara o estatuído no art.º 3.º/a) do DL 48/96.

Decisão que o TCA Norte confirmou.

É desse Acórdão que vem a presente revista, interposta pelo Município de Guimarães, onde se formularam as seguintes conclusões: 1.

Vem o presente recurso interposto do acórdão que manteve a sentença da 1ª instância que julgou procedente a acção administrativa especial procedente anulando-se o acto administrativo de restrição do bar da A, tendo em conta que se considerou que não foi realizada a audiência prévia e que deveriam ter sido ouvidos os sindicatos, associações patronais e de consumidores em momento anterior à decisão.

  1. É entendimento do recorrente que, tendo em conta o circunstancialismo factual envolvente, não havia lugar a audiência prévia uma vez que era urgente a prolação do acto administrativo, tal como não havia lugar à audição dos sindicatos, associações patronais e de consumidores, tendo em conta que a lei deve ser interpretada no sentido de que estas entidades apenas devem ser ouvidas no quadro da preparação e elaboração dos regulamentos municipais.

  2. Defende-se no acórdão recorrido, tal como no acórdão da 1ª instância que não existia qualquer urgência na decisão, tendo em conta que o Município já tinha conhecimento da situação desde Março de 2006.

  3. Ora, a primeira queixa apresentada relativa ao funcionamento do ………. data de Março de 2006, sendo que, outras se seguiram apresentadas por vizinhos do bar da A. e ainda da Junta de Freguesia de ………….., como se pode constatar do PA e dos factos supra enunciados de 1 a 12.

  4. No entanto, as decisões camarárias não se podem basear apenas em desabafos, reclamações mais ou menos findadas de vizinhos quanto ao encerramento de um determinado estabelecimento fora de horas, que podem muito bem ser fundados em má disposição dos reclamantes ou até má vontade dos mesmos contra o dono do estabelecimento ou contra os clientes que o frequentam.

  5. O que determinou a situação de urgência alegada no ato administrativo e na contestação do Réu Município foi a comunicação do Comandante do Posto da Guarda Nacional Republicana de Guimarães que afirmava que nesse bar se traficavam estupefacientes - que apesar de datada de 13 de Agosto de 2008, como consta dos factos assentes, deu entrada nos serviços do Réu Município no dia 4 de Setembro de 2008 - cfr. fls. 42 a 44 do PA.

  6. Os factos narrados nesse comunicado da GNR que, volta-se a sublinhar, chegaram ao conhecimento do Réu Município em 4 de Setembro de 2008, determinaram que o Réu Município realizasse uma audiência com as presenças da Presidente da Junta de Freguesia de ……….., do Comandante do Posto da GNR e dos contra interessados no dia 10 de Setembro de 2008, conforme atesta a acta dessa reunião constante de fls. 45 e 46 do PA.

  7. Nessa reunião foi decidido que se aguardasse que a Presidente da Junta de Freguesia fizesse chegar um documento ao Réu Município narrando as queixas recebidas e os factos que conhece, bem como, uma exposição dos moradores do prédio e prédios vizinhos, circunstanciando tanto quanto possível as queixas motivadas pelo estabelecimento.

  8. Tal documento deu entrada nos serviços do Réu Município no dia 17 de Setembro de 2008, revelando-se a manutenção do barulho, sendo que no dia 24 do mesmo mês deu entrada novo abaixo-assinado dos vizinhos relativamente aos factos descritos na comunicação da GNR (cfr. fls. 47 a 50 do PA).

  9. Estes factos e não as meras reclamações por parte dos vizinhos determinaram que o Réu Município considerasse urgente, em defesa do bem-estar e da saúde pública dos seus administrados, a tomada de medidas relativamente ao estabelecimento da Autora, tal como, aliás, decorre da acta da reunião de 10 de Setembro de 2008 (cfr. fls. 46 do PA), sendo que tais medidas, passariam, como foi sugerido pelo Comandante do posto da GNR, pela restrição do horário do estabelecimento da Autora.

  10. Assim, é errado e redutor dizer-se que nenhuma urgência havia na prolação do acto administrativo em crise tendo em conta que as queixas de barulho já remontavam a Março de 2006, quando apenas em 4 de Setembro de 2008 foi comunicado ao Réu Município que, para além do barulho fora das horas normais de funcionamento do estabelecimento, ainda existia a notícia de que se praticava, no estabelecimento, o crime de tráfico de estupefacientes e a contra ordenação relativa ao consumo dos mesmos.

  11. A urgência da decisão é aferida em relação à situação objectiva, real, que a decisão procedimental se destina a regular, não em relação à urgência procedimental, que esta (em regra, pelo menos) não justifica a preterição de formalidades essenciais do procedimento - cfr. Mário Esteves de Oliveira supra citado.

  12. A urgência da resolução prevenida na al. a) do n° 1, dependerá como bem se compreende das circunstâncias do caso concreto e do específico interesse público em questão, já que em tese é urgente o que se torna inadiável - critério que, por si só e nestes termos utilizado, a nada servirá. - cfr José Luís Araújo e João Abreu Costa, in Código do Procedimento Administrativo Anotado, Vª edição, pg. 476.

  13. Relembre-se que na comunicação apresentada pela GNR se afirmava que o explorador do Bar era conivente com a prática dos actos ilícitos acima referidos, o que por si só configura a prática de um crime previsto no art.° 30°, n° 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01.

  14. Por outro lado, tendo em conta que, nos termos do disposto no art.° 30°, nºs 3, 4 e 5 do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01 a apreensão de substâncias ilícitas num determinado estabelecimento comercial determina o seu encerramento, deve-se considerar que, tendo em conta o circunstancialismo decorrente da questão discutida nos autos, designadamente o barulho produzido pelo estabelecimento para além do horário normal do seu funcionamento, os rumores de que nesse estabelecimento se praticava o tráfico e o consumo de substâncias estupefacientes, a comunicação da GNR de que o explorador era conivente com tais práticas e a apreensão de 40 gramas de haxixe a um cliente desse estabelecimento quando este se encontrava no mesmo, torna a decisão do Município Réu justa, adequada e proporcional ao circunstancialismo apurado.

  15. As circunstâncias que determinaram a prolação do acto administrativo devem ser encaradas como circunstâncias que tomaram a decisão em causa urgente, nos termos do art.° 103º, n.º 1, al. a) do CPA, pelo que não havia lugar a audiência prévia.

  16. Mas, mesmo que assim não se entendesse foi realizada uma audiência oral prévia realizada na reunião de 02.10.2008 na sede do Município Réu, na qual já se dizia «Foi recordado uma intervenção inicial em Abril de 2007 pelo Sr. Comandante do Posto da GNR ao explorador do Bar para um conjunto de práticas ilícitas e geradoras de queixas dos moradores, como foi recordado que perante a indiferença e total continuação das mesmas actividades se tornou necessário realizar operação policial que aponta factos graves sendo certo que uma boa parte de registos de vária natureza nesse processo se encontram ainda em segredo de justiça», sendo que como se refere também nessa acta «trata-se de factos relacionados com o tráfico e consumo de estupefacientes praticados no estabelecimento sendo certo que ficou patente não haver de facto da parte do explorador do estabelecimento nem atitude nem convicção séria de que a resolução também passa ou passa principalmente pelas suas mãos».

  17. Acresce que a A. demitiu-se de qualquer responsabilidade esquecendo que ruído produzido pelos seus clientes no exterior do café é potenciado pelo facto de servir bebidas depois do encerramento do mesmo, o que a A. expressamente confessa nos art.°s 44° e 45° da p.i..

  18. Em face da factualidade vinda de expor revestia carácter urgente a restrição do horário de funcionamento do estabelecimento da R., a fim de terminar com a violação ilícita dos direitos de personalidade dos moradores do prédio onde se localiza o estabelecimento da A. e dos demais vizinhos e ainda limitar a acção do tráfico e dos traficantes, pelo que o R. se encontrava dispensado de realizar a audiência dos interessados nos termos do disposto no art.° 103° n.º 1 al. a) do CPA e artigo 68° n.º 3 da Lei n.º 169/99, de 18/09.

  19. Ao contrário do que se diz no acórdão recorrido, a urgência do proferimento do acto administrativo está bem espelhada no mesmo, designadamente quando se diz que “porque a exploradora do estabelecimento não toma medidas que corrijam as situações que urge corrigir e na prossecução do interesse público que deve nortear a sua acção, cabe à edilidade adoptar procedimentos capazes de resolver o problema criado pelo ……….. de modo a assegurar um normal funcionamento e um equilíbrio salutar com o meio envolvente”.

  20. A qualificação do acto administrativo como urgente é contemporânea do acto administrativo, neste vindo alegada, sendo que não tinha que ser alvo de acto administrativo avulso, mas sim de constar do próprio acto, como, aliás, se diz no acórdão citado no acórdão recorrido - Ac. STA proc. n° 04378, de 28/5/02.

  21. Com efeito, “para que seja considerada dispensada a audiência de interessados não é...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT