Acórdão nº 0463/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução07 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório 1.1. A……, devidamente identificado nos autos recorreu, nos termos dos art.s 140º, 143º, 1 e 151º do CPTA (recurso “per saltum”) para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida no TAC de Lisboa que julgou procedente a OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA intentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, terminando a motivação com as conclusões seguintes: 1. O réu tem a profissão de juiz Conselheiro do Tribunal Supremo de Angola, conforme documento de folhas 15 dos autos - Ponto F) dos factos provados.

  1. Em Angola, tal como em Portugal, aos juízes cabe aplicar a lei, com total independência do poder político, ou de outros poderes.

  2. Nestas circunstâncias, as funções do réu são de carácter predominantemente técnico.

  3. Porquanto, o cargo de magistrado não exige um comprometimento com as linhas condutoras da política interna ou externa do país de que é natural.

  4. Assim não tendo decidido, a douta decisão recorrida interpretou incorrectamente o disposto na alínea c) do art.º 9.° da Lei n.° 37/81, de 3/10 (Lei da Nacionalidade), com a redacção que lhe foi dada pela Lei Orgânica n° 2/2006, de 17/04, e artigo 56°, n° 2, alínea c) do Decreto-Lei no 237- A/2006 de 14/12 (Regulamento da Nacionalidade Portuguesa).

    1.2. O M.P. contra alegou, concluindo:

    1. Constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade “O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico” (cfr. alínea e), 1ª parte do art.°9° da Lei n°37/81 de 3 Outubro, na redacção que lhe foi dada pela Lei Orgânica n°2/2006 de 17Abril); b) “O exercício de funções de magistrado do Ministério Público e magistrado judicial, incluindo nesse percurso funções de Procurador-Geral da República e de Presidente do Supremo Tribunal de Justiça de Cabo Verde, constitui “exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico “, para os efeitos do art. °9°, alínea c), da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro.” (Neste sentido, Acórdão do STA de 29/11/2011, proc. 0653/11, in www.dgsi.pt.); c) O Requerido, enquanto Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo da República Popular de Angola, não exerceu funções públicas, sem carácter predominantemente técnico, em Estado estrangeiro.

    d) Logo, não pode adquirir a nacionalidade portuguesa, por vontade, nos termos do art.°3° da Lei n.°37/8I, de 03.10.

    1.3. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência, tendo o relator inicial ficado vencido.

  5. Fundamentação 2.1. Matéria de facto A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos: A) A…….. nasceu em 22 de Abril de 1939 no bairro da Ingombota, Luanda, Angola. - Cfr. documentos de folhas 15 e 25dos autos.

    1. A......... tem nacionalidade angolana. - Cfr. documentos de folhas 15 e 29 dos autos, C) A…….. reside habitualmente no Largo do ………, n° …., …..° andar, Bairro da …….., …….., Angola. - Cfr. documentos de folhas 15 e 30 dos autos.

    2. A……… casou em Sumbe, Angola, em 23 de Dezembro de 1967 com B…….. - Cfr. cópia de assento de casamento junta aos autos.

    3. B……. (…… após o casamento) tem nacionalidade portuguesa. - Cfr. documento de folhas 20 dos autos (cópia do bilhete de identidade da República Portuguesa).

    4. A……… tem a profissão de Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo de Angola. - Cfr. documento de folhas 15 dos autos.

    5. A……… foi incorporado no exército português em 7 de Setembro de 1960, tendo passado à disponibilidade em 31 de Janeiro de 1965, tendo entretanto cumprido o serviço militar. - Cfr. documento de folhas 35 dos autos.

    6. A…….. tem o número de identificação fiscal português ………. - Cfr. documento de folhas 36 dos autos.

    7. A……. é sujeito passivo de IMI relativamente ao prédio …….., sito em ……., município do ……., Portugal. - Cfr. documento de folhas 36 dos autos.

    8. B…….. é sujeito passivo de IMI relativamente ao prédio …….., sito na ……., município de ………, Portugal - Cfr. documento de folhas 38 dos autos.

    9. B……... casada e regime de comunhão geral com A…….. adquiriu mediante contrato de compra e venda celebrado em 4 de Novembro de 1994 a fracção autónoma “…” …. andar ….., para habitação, do prédio urbano sito no ….. lote ….. e …., freguesia da ……., (então) ……, descrito na Conservatória do Registo Predial de Odivelas sob o número 01141/921110, da freguesia da Pontinha. - Cfr. documento de folhas 42 a 44 dos autos.

    10. Em 20 de Novembro de 2007 junto do Consulado Geral de Portugal em Luanda A…….. prestou declarações para aquisição de nacionalidade portuguesa, tendo declarado designadamente o seguinte:”é casado com a nacional portuguesa B………. com quem contraiu casamento aos 23 de Dezembro de 1967. (...) Para fins do disposto no artigo 9.° da mencionada Lei, declarou: a) Que tem ligação efectiva à comunidade portuguesa pelos seguintes motivos: É casado com uma portuguesa. Fala e escreve a língua portuguesa. B) que não praticou crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos segundo a lei portuguesa. c) Que não exerceu funções públicas de carácter político nem prestou serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.” - Cfr. documento de folhas 13 dos autos.

    11. Aquela declaração foi remetida à Conservatória dos Registos Centrais onde foi iniciado o procedimento n°22619/08 NACA, no qual foi em 29 de Setembro de 2008 proferido despacho pelo respectivo conservador auxiliar, no sentido da remessa do processo ao Exmo. Procurador da República junto do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa, com fundamento no facto das funções públicas exercidas pelo requerido em Angola não terem carácter predominantemente técnico cfr despacho de folhas 95 e 96 dos autos.

    12. O capítulo V da Constituição da República de Angola estatui designadamente o seguinte: “CAPÍTULO IV PODER JUDICIAL SECÇÃO I PRINCÍPIOS GERAIS Artigo 174.° (Função jurisdicional)1.

    Os tribunais são o órgão de soberania com competência de administrar a justiça em nome do povo.

  6. No exercício da função jurisdicional, compete aos tribunais dirimir conflitos de interesses público ou privado, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, bem como os princípios do acusatório e do contraditório e reprimir as violações da legalidade democrática.

  7. Todas as entidades públicas e privadas têm o dever de cooperar com os tribunais na execução das suas funções, devendo praticar, nos limites da sua competência, os actos que lhes forem solicitados pelos tribunais.

  8. A lei consagra e regula os meios e as formas de composição extra-judicial de conflitos, bem como a sua constituição, organização, competência e funcionamento.

  9. Os tribunais não podem denegar a justiça por insuficiência de meios financeiros.

    Artigo 175.° (Independência dos tribunais)No exercício da função jurisdicional, os Tribunais são independentes e imparciais, estando apenas sujeitos à Constituição e à lei.

    Artigo 176.° (Sistema jurisdicional)1.

    Os Tribunais superiores da República de Angola são o Tribunal Constitucional, o Tribunal Supremo, o Tribunal de Contas e o Supremo Tribunal Militar.

  10. O sistema de organização e funcionamento dos Tribunais compreende o seguinte:

    1. Uma jurisdição comum encabeçada pelo Tribunal Supremo e integrada igualmente por Tribunais da Relação e outros Tribunais; b) Uma jurisdição militar encabeçada pelo Supremo Tribunal Militar e integrada igualmente por Tribunais Militares de Região.

  11. Pode ser criada uma jurisdição administrativa, fiscal e aduaneira autónoma, encabeçada por um Tribunal superior.

  12. Podem igualmente ser criados tribunais marítimos.

  13. É proibida a criação de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de determinadas infracções.

    Artigo 177.° (Decisões dos...

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