Acórdão nº 0147/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução09 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1. "ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS DA COVA DA BEIRA" [doravante «AMCB»], devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra [TAF/C] a presente ação declarativa de condenação com processo comum, forma ordinária, nos termos dos arts. 71.º e ss. da LPTA, contra o “MUNICÍPIO DA COVILHÔ [«MC»], peticionando, pelos fundamentos aduzidos no articulado inicial de fls. 03/08 e correção de fls. 606/615 dos autos, a condenação do R. no pagamento à mesma da quantia de 1.043.760,00 €, quantia essa acrescida de juros vincendos a partir de 31.05.2002 até efetivo e integral pagamento e que se decompõe nas seguintes parcelas: a) 65.340,92 € [relativos a quotas dos meses de novembro de 1998 a janeiro de 2000 devidas e não liquidadas à «AMCB»]; b) 130.138,79 € [relativos a quotas dos meses de janeiro 2000 até à data da propositura da ação (12.06.2002) devidas e não liquidadas à «AMCB» ou, se assim não for entendido, respeitantes a contrapartida pelos bens que usufruiu e custos dos serviços prestados]; c) 4.489,09 € [referente a 200$00 por habitante e por cada mês vincendo desde a data da propositura da ação até efetivo e integral pagamento]; d) 60.028,46 € [respeitantes a responsabilidade do R. nos pagamentos devidos à firma “A………., Ld.ª”]; e) 619.405,77 € [relativos à deposição de resíduos sólidos urbanos no ……………., entre fevereiro de 1998 e novembro de 2001]; f) 13.335,46 € [referentes à deposição de resíduos sólidos urbanos no Centro de Tratamento relativamente ao período de dezembro de 2001 a março de 2002]; g) 151.021,55 € [relativa a juros de mora vencidos desde janeiro de 2000 até 31.05.2002].

1.2.

Na sua contestação o R. «MC» apresentou defesa por exceção [compensação de crédito de que é detentor no montante global de 211.853,33 € a operar face eventual crédito da A.] e, por impugnação, concluindo, afinal, tão só pela improcedência da ação e pela sua total absolvição do pedido, sem que haja formulado qualquer pedido reconvencional [cfr. fls. 250 e ss.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário].

1.3.

No prosseguimento dos autos, determinado pelo acórdão deste Supremo de 02.06.2005 que revogou a decisão do TAF/C de 13.05.2003 que havia julgado verificada a exceção de ilegitimidade ativa [cfr. fls. 296/297 e fls. 342/348], aquele TAF, após instrução e julgamento, veio a proferir a decisão recorrida [cfr. fls. 1503/1529], datada de 27.02.2013, a julgar a presente ação parcialmente procedente, condenando o R. no pagamento à A. da quantia de 583.333,83 € [respeitante às quantias parcelares de 65.091,90 € (quotas relativas ao período de novembro de 1998 a janeiro de 2000); de 130.183,79 € (custos de gestão de fevereiro 2000 até à data da propositura da ação - 12.06.2002); de 12.552,16 € (serviços prestados pela “A……….., Ld.ª” - deposição e tratamento de lixo entre março de 1995 e fevereiro de 1998); de 364.627,16 € (correspondente a custos de prestação de serviços de deposição e tratamento de lixo entre março de 1998 e novembro de 2001 que totalizam 563.835,94 € e a que foi deduzido o montante de 199.208,78 € relativo aos valores liquidados pelo R. de janeiro a novembro de 2001); de 10.878,82 € (referente à diferença entre o faturado pela A. ao R. quanto aos custos com a deposição de resíduos sólidos no Centro de Tratamento no período de dezembro de 2001 a março de 2002 e aquilo que o R. liquidou à A.

)], quantia essa acrescida de juros de mora à taxa legal desde o vencimento de cada fatura até integral pagamento; e a A. no pagamento ao R. da quantia de 46.413,31 € [relativa à soma dos valores de 3.232,88 € (referente à quantia despendida no pagamento de reservatórios destinados e utilizados pela A.

) e de 43.180,43 € (referente às despesas com funcionário que o R. colocou ao serviço da A. para desempenho de funções de aferidor entre setembro de 1995 a março de 2002)].

1.4.

O R., inconformado, interpôs o presente recurso jurisdicional apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cfr. fls. 1561 e ss.]: “...

  1. A sentença do Tribunal a quo, aqui recorrida, é nula, visto condenar em quantidade superior e em objeto diverso do pedido - alínea e) do número 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil (CPC).

  2. A dita sentença viola o dever de fundamentação, ínsito no disposto no número 1 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), no número 1 do artigo 158.º e no artigo 659.º, número 2 do CPC, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, preceitos que, in casu, são violados, sendo, por isso, nula a mencionada sentença, como advém do que dispõe a alínea b) do número 1 do artigo 668.º do CPC.

  3. Viola, também, o que dispõem os artigos 493.º, números 1 e 3 do CPC e o que dispõe o artigo 847.º e seguintes do Código Civil, uma vez que tendo apurado um crédito do Réu sobre a Autora não julgou procedente respetiva a exceção perentória, fazendo operar, de imediato a compensação arguida.

  4. A sentença do Tribunal a quo viola o número 3 do artigo 805.º do CC, pois, atenta a iliquidez do crédito da Autora, o Réu devia ter sido absolvido do pagamento de juros.

  5. Por outro lado, a sentença dos autos viola, ainda, designadamente o que dispunham, nos respetivos períodos de vigência, o Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de setembro, o Decreto-Lei n.º 321/99, de 11 de agosto, Decreto-Lei n.º 194/2000, de 21 de agosto e o Decreto-lei n.º 152/2002, de 23 de maio, os quais não permitiam ao Réu o depósito de resíduos sólidos urbanos senão no aterro sanitário da Autora.

  6. E viola, manifestamente, o princípio de liberdade de associação consagrado no artigo 45.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso ...

    ”.

    Termina peticionando que “… deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, as nulidades arguidas serem julgadas procedentes, declarando-se nula a sentença proferida pelo Tribunal a quo e, admitindo, sem, no entanto, conceder, que assim se não entenda, deve a dita sentença ser revogada, substituindo-se a mesma por outra que opere a matéria de exceção arguida, opere a respetiva compensação, absolva o Réu do pagamento do que a Autora apelidou de custos de gestão e absolva o Réu do pagamento de juros, tudo com as consequências legais …”.

    1.5.

    Devidamente notificada a A., aqui ora recorrida, não veio produzir quaisquer contra-alegações [cfr. fls. 1622 e ss.].

    1.6.

    O Digno Magistrado do Ministério Público (MP) junto deste Tribunal teve vista dos autos e emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso [cfr. fls. 1648/1649], sendo que esta pronúncia objeto de contraditório não mereceu qualquer resposta [cfr. fls. 1651 e ss.].

    1.7.

    Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir em Conferência.

    1. DAS QUESTÕES A DECIDIR No essencial, o R./Recorrente discorda do julgado sob impugnação elencando para o efeito os seguintes fundamentos: - Nulidade da decisão por condenação em quantidade superior e em objeto diverso do pedido dada a infração do disposto no art. 668.º, n.º 1, al. e) do CPC [na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 303/2007 e pela Lei n.º 41/2013 - cfr., respetivamente, seus arts. 21.º e 23.º e 05.º e 07.º, n.º 1 - salvo expressa indicação em contrário] já que na decisão se condenou, por um lado, a A. no pagamento ao R. da quantia de 46.413,31 € quando para o efeito não havia sido deduzido qualquer pedido reconvencional e, por outro lado, se condenou o R. no pagamento à A. da quantia de 583.333,83 € sem levar em linha de conta com a compensação de crédito invocada pelo R. na sua defesa, no que se traduziu numa condenação em valor superior aquele que seria devido pelo operar da compensação; - Nulidade da decisão no segmento relativo à condenação do R. no pagamento dos juros de mora e no pagamento dos valores das quotizações e dos custos de gestão da A. por falta de fundamentação de facto e de direito mercê do desrespeito ao previsto nos arts. 205.º, n.º 1 da CRP, 158.º, n.º 1, 659.º, n.º 2 e 668.º, n.º 1, al. b) todos do CPC; - E erros de julgamento, dada a incorreta interpretação e aplicação do que se mostra disposto: (a) nos arts. 493.º, n.ºs 1 e 3 do CPC e 847.º do CC [ao não proceder a exceção de compensação arguida pelo R.

      ]; (b) no art. 805.º, n.º 3 do CC [ao haver condenado o R. no pagamento de juros de mora quando o crédito da A. era ilíquido]; (c) nos princípios da liberdade de associação [art. 46.º da CRP (não «45.º» como certamente por lapso se refere nas conclusões já que este respeita ao «direito de reunião e de manifestação»)], da proporcionalidade ou da proibição do excesso, no DL n.º 239/97, de 09.09, no DL n.º 321/99, de 11.08, no DL n.º 194/2000, de 21.08, e no DL n.º 152/2002, de 23.05 [quanto à impossibilidade do R. poder depositar resíduos sólidos urbanos sem ser no aterro sanitário da A. e ao ter condenado o R. no pagamento das quotizações e dos custos de gestão da A.

      ] [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

    2. FUNDAMENTAÇÃO 3.1.

      DE FACTO Resulta como assente na decisão judicial recorrida o seguinte quadro factual: I) A A. é uma associação intermunicipal, pessoa coletiva de direito público, constituída por escritura pública de 31.03.1981, que constitui fls. 11 e seguintes dos autos e aqui se dá por integralmente reproduzida, regida pelos Estatutos que constituem fls. 15 e seguintes dos autos e aqui se dão por reproduzidos.

      II) O R. foi membro constituinte da referida Associação.

      III) Em reunião de 24.11.1998, o Conselho de Administração, considerando “imprescindível o reforço do valor das quotizações dos atuais 100$00/habitante/ano para 200$00/habitante/ano”, decidiu propor à Assembleia Intermunicipal “alteração do valor das quotizações para 200$00/habitante/ano” - cfr. fls. 28 e...

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