Acórdão nº 01242/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | ARAGÃO SEIA |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A……………. SA, inconformada, recorreu para o TCA Sul, da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa datada de 29 de Fevereiro de 2011, que julgou improcedente a impugnação judicial contra os actos de liquidação da taxa municipal por parte da Câmara Municipal de Lisboa, pela realização de infra-estruturas, no valor de 81.701.575$00 e de coima no valor de 10.050.000$00. O TCA Sul por decisão de 25 de Junho de 2013, declarou-se incompetente em razão da hierarquia, considerando competente este Supremo Tribunal, para onde os autos foram remetidos.
Alegou, tendo concluído como se segue: A – DA INEXEGIBILIDADE DOS TRIBUTOS SUB JUDICE 1.ª A exigibilidade dos tributos em causa dependia, em primeira linha, da verificação dos pressupostos previstos no art. 1° do RTRIU: (i) Existência de uma prestação efectiva e específica por parte do Município de Lisboa - “...contrapartida devida ao município pelas utilidades prestadas aos particulares pelas infra estruturas urbanísticas primárias e secundárias…”; (ii) Realização, remodelação ou reforço de concretas infra-estruturas urbanísticas por aquela entidade pública - realização, remodelação ou reforço…; (iii) Consequência do licenciamento de determinada operação urbanística - “…consequência de operações de construção, reconstrução ou ampliação de edifícios ou de alterações na forma de utilização destes …” - cfr. texto nºs 1 a 5; 2ª. No caso sub judice não se verificam os pressupostos de que dependia a exigibilidade das quantias em causa, contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, pelo que é manifesto que não se constituiu qualquer facto tributário, não sendo exigível qualquer taxa pela realização de infra estruturas urbanísticas (v. art. 1º do RTRIU), pois:
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No presente processo não se provou a existência de qualquer prestação efectiva e específica por parte do Município de Lisboa, traduzida na realização, remodelação ou reforço de quaisquer infra-estruturas urbanísticas, primárias ou secundárias, em consequência da operação urbanística em causa; b) No presente processo ficou claramente demonstrado e provado que, decorridos mais de doze anos sobre a data do licenciamento concedido à ora recorrente, não se verificou qualquer abertura, alargamento ou regularização da via pública e, além disso, os serviços da CML não identificaram qualquer infra - estrutura urbanística a realizar, remodelar ou a reforçar em consequência da construção e nunca especificaram para que infra-estruturas urbanísticas era efectuado aquele pagamento; c) Com o pagamento dos tributos em causa, a ora recorrente não adquiriu o direito à utilização individualizada ou efectiva de qualquer infra-estrutura - cfr. texto nº 1 a 5; B – DA INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE DO RTRIU 3.ª Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, o tributo denominado “taxa urbanística” integra in casu um imposto ou contribuição especial (v. art. 4º/3 da LGT), estando assim sujeito ao regime jurídico dos impostos (v. art.º 4° da LGT) - cfr. texto nºs. 6 a 10; 4.ª As normas do RTRIU com o sentido normativo que lhes foi atribuído e na sua aplicação ao caso sub judice, são inconstitucionais, pois criaram uma contribuição especial, que, nos termos do art. 4°/3 da LGT, tem a natureza de imposto não previsto na lei (v. arts. 103°/2/ e 165º/1/i da CRP) cfr.- texto nºs. 6 a 10; C – DA NULIDADE DOS TRIBUTOS SUB JUDICE 5.ª Os actos sub judice são nulos, pois os órgãos e agentes das autarquias locais não podem criar tributos que não se encontrem previstos na lei, traduzindo-se na criação de obrigações tributárias sem base legal (v. arts. 103° e 165°/1/i) da CRP; cfr. art.º 88°/1/a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março e art. 1°/4 da Lei 1/87, de 6 de Janeiro e art.º 2°/4 da Lei 42/98, de 6 de Agosto) - cfr. texto n°. 11 a 17; 6.ª Os actos sub judice são nulos, pois violaram o princípio reforçado da legalidade tributária (v. art. 103° da CRP e art. 133°/1 e 2/d) do CPA) e o direito fundamental de propriedade privada (v. art. 62° da CRP) - cfr. texto nºs. 11 a 17; 7.ª Os actos sub judice são ainda claramente nulos, por inexistência de factos tributários, por falta de elementos essenciais e por falta de atribuições (v. art. 133°/1 e 2/b do CPA) - cfr. texto nºs. 11 a 17; D – DO DIREITO À DEVOLUÇÃO DOS TRIBUTOS PAGOS PELA ORA RECORRENTE 8.ª O tributo em causa foi ilegalmente exigido à ora recorrente, que sempre terá o “direito, decorrente, do carácter bilateral das taxas, de pedir e de obter a devolução do que houver antecipadamente pago a tal título” pois o ML não realizou, remodelou ou reforçou quaisquer infra - estruturas urbanísticas, em consequência da operação urbanística em causa (v. Ac. TC nº 258/2008; cfr. art. 30°/1/c) da LGT) - cfr. texto nºs. 18 a 20; E – DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO 9.ª O acto tributário sub judice enferma de manifesta e absoluta falta de fundamentação de facto e de direito, pois: - Não se verificam nem foram invocados os pressupostos de facto que permitiriam a liquidação e cobrança do tributo, da coima e do factor de majoração (v. art. 268º/3 da CRP; cfr. arts. 19°/b, 21°, 64° e 82° do CPT, art. 77° da LGT e arts. 124° e 125° do CPA); - Não foram invocados quaisquer fundamentos de direito, não se indicando, nem concretizando a aplicação de quaisquer normas jurídicas, ao abrigo das quais, pudesse ser liquidado e cobrado o tributo, e aplicados a coima e o factor de majoração (v. art. 268°/3 da CRP; cfr. arts. 19/b, 21°, 64° e 82° do CPT, art. 77° da LGT e arts. 124° e 125° do CPA) - cfr. texto nºs 21 a 25; 10.ª Do acto sub judice não constam os fundamentos de facto que permitiriam a aplicação do art. 1° RTRIU, nomeadamente, que infra-estruturas urbanísticas primárias ou secundárias em concreto foram realizadas, remodeladas ou reforçadas pelo Município de Lisboa, e consequência da operação urbanística em causa - cfr. texto nºs 21 a 25: 11.ª O acto sub judice no qual apenas se refere “a ampliação, taxa urbanística e coima para o prédio sito Rua ………………, n.º …….. (v. FP, als. h) a k) e doc. junto com o r.i.) não indica os fundamentos de facto e de direito que pudessem justificar a inexistência de audição prévia da recorrente, tanto mais que estão em causa actos autónomos, lesivos e sancionatórios - cfr. texto nºs 21 a 25; 12.ª O acto em análise enferma assim de manifesta falta de fundamentação de facto e de direito, ou, pelo menos, esta é insuficiente, obscura ou incongruente, pelo que foram frontalmente violados o art. 268°/3 da CRP, os arts. 124° e 125° do CPA e o art. 77° da LGT - cfr. texto nºs. 21 a 25; F – DA PRETERIÇÃO DO DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA DA ORA RECORRENTE 13.ª No caso sub judice estamos claramente perante um processo sancionatório pois, além da TRIU, o ML exigiu à ora recorrente o pagamento de uma coima e aplicou um factor de majoração, pelo que foi frontalmente violado o disposto nos arts. 2°, 18°, 32°/10 e 267°/5 da CRP, no art. 60° da LGT, nos arts. 8° e 100° e segs. do CPA e no art. 19°/c do CPC - cfr. texto nºs 26 a 30; 14.ª No caso em análise não se verificou qualquer facto ou situação que permitisse a dispensa de audiência prévia da ora recorrente (v. arts. 2°, 18°, 32°/10 e 267°/5 da CRP, e, mesmo que existisse - o que não se aceita -, sempre teria que ser invocado fundamentadamente (v. art. 103°/2 do CPA) - cfr texto nºs 26 a 30.
NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.
Contra-alegou a recorrida, tendo concluído: 1. O presente Recurso foi incorrectamente dirigido ao Tribunal Central Administrativo Sul.
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Com efeito, a Recorrente no presente recurso não põe em causa, em momento algum, seja no corpo alegatório, seja nas conclusões que deduz, a matéria assente, pelo contrário, inicia as suas alegações aceitando a matéria de facto dada como provada na douta Sentença recorrida.
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Neste contexto, nas Conclusões apresentadas pela Recorrente, e que fixam o objecto do Recurso, não é referida matéria de facto, tendo por exclusivo fundamento matéria de direito e questões jurídicas que entende enfermarem a decisão do Tribunal a quo.
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Tratando-se exclusivamente de matéria de direito, o presente recurso deveria ter sido Interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sob pena de violação das regras de competência em razão da matéria, facto que nos termos do n.º 2, do artigo 18° do CPPT, determina a incompetência absoluta deste Venerando Tribunal Superior.
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Não assiste razão à Recorrente quando pretende demonstrar a inexigibilidade da TRIU, fazendo-a consubstanciar na inexistência de facto tributário que legitime a liquidação impugnada. Argumento este que faz assentar não na prova produzida nos autos, mas antes, em considerações que lhe são próprias e que não encontram na matéria assente qualquer fundamento, porquanto, não resulta provado nestes autos que o Município de Lisboa não tenha realizado, ou que não tenha tido que realizar as infra estruturas urbanísticas de que a TRIU constitui contrapartida. Nem tão pouco, a Recorrente, ao contrário do que sistematicamente faz, ao aludir o hiato temporal de doze anos, pode afirmar e muito menos sustentar que tais infra-estruturas não foram realizadas ou mesmo que não tenham que ser realizadas pelo Município de Lisboa; 6. O facto tributário da TRIU opera com o licenciamento, titulado pelo alvará, momento em que simultaneamente, surge para o respectivo titular, por um lado, o direito a construir, de acordo com o projecto licenciado e, por outro lado, o dever de compensar o município pela readequação das infra-estruturas urbanísticas, pelo mesmo motivadas, cuja necessidade se afere, através de critérios objectivos disciplinados no Regulamento da TRIU e que, no caso dos autos, se aplicaram ao cálculo da base tributável.
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Como consta da matéria assente na douta Sentença do Tribunal a quo [alíneas a), b), c) e i) dos Factos...
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