Acórdão nº 0725/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução23 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1. “MUNICÍPIO DO BARREIRO”, devidamente identificado nos autos, instaurou no TAF de Lisboa a presente providência cautelar contra o CONSELHO DE MINISTROS [doravante e abreviadamente «CM»] e os contrainteressados “MUNICÍPIO DE ALCOCHETE” [«MA»], “MUNICÍPIO DE ALMADA” [«MdA»], “MUNICÍPIO DA MOITA”, [«MM»] “MUNICÍPIO DO MONTIJO” [«MdM»], “MUNICÍPIO DE PALMELA” [«MP»], “MUNICÍPIO DO SEIXAL” [«MS»], “MUNICÍPIO DE SESIMBRA” [«MdS»] e “MUNICÍPIO DE SETÚBAL” [«MSe»], nos termos e com a motivação aduzida no requerimento inicial corrigido de fls. 51/70 dos autos [paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário] apresentado na sequência da decisão a suscitar a incompetência daquele TAF [cfr. fls. 39/41], sustentando estarem verificados os requisitos exigidos no art. 120.º, n.ºs 1, als. a) e b) e 2 do CPTA, pelo que peticiona que se adote a requerida providência cautelar de “suspensão de eficácia do ato administrativo” e se ordene “a suspensão, com alcance geral, dos efeitos do ato suspendendo, contido na Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014, publicada a 08 de abril, nos números 1, 2 e 3 da abertura do concurso constante da mesma e artigo 1.º do caderno de encargos a ela anexo”.

1.2.

Após decisão do TAFL, datada de 04.06.2014, a julgar-se incompetente para a apreciação da presente providência [cfr. fls. 93/96] e uma vez remetida a mesma a este Supremo Tribunal foi determinada a citação dos requeridos nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 117.º e 118.º do CPTA [cfr. fls. 106 e segs.].

1.3.

O ente requerido «CM», nos termos e para os efeitos previstos no art. 128.º, n.º 1 do CPTA, aprovou a resolução fundamentada [cfr. fls. 131/138 que aqui se dá por integralmente reproduzida], na qual reconhece que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.

1.4.

O mesmo ente deduziu oposição [cfr. fls. 153/216] na qual se defende, por um lado, por exceção sustentando que o litígio está excluído do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal uma vez que o que o requerente verdadeiramente pretende obter com os presentes autos é a suspensão de eficácia das normas legislativas contidas no DL n.º 45/2014 e a opção política que as mesmas encerram. E, por outro lado, enquanto defesa por impugnação, respondeu, ponto a ponto, à argumentação do requerente, invocando, em resumo, que o ato suspendendo não enferma de qualquer das ilegalidades que aquele lhe imputa e que não estão verificados os requisitos do fumus boni iuris previstos nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, bem como que não há periculum in mora e que, de todo o modo, deve recusar-se a providência requerida, uma vez que, ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa.

1.5.

Dos demais entes requeridos apenas o «MS», enquanto contrainteressado, veio apresentar articulado onde se pronuncia sobre a pretensão cautelar deduzida sustentando, todavia, a sua decretação [cfr. fls. 347/445], tendo os restantes entes se limitado a juntar requerimento e respetivo instrumento forense de representação [cfr. «MP» - fls. 150/151; «MdS» - fls. 334/337- 341/342; «MSe» - fls. 465/467].

1.6.

Notificados da resolução fundamentada referida em 1.3) o contrainteressado «MS», veio, nos termos do art. 128.º, n.º 4 do CPTA, deduzir incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida [cfr. fls. 450/459] requerendo que fosse “declarada a ineficácia dos atos materialmente administrativos constantes dos artigos 4.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 104/2014” [relativos à alteração dos Estatutos da “A……….. …, SA”], no que foi secundado pelo requerente [cfr. fls. 471].

1.7.

Notificado do incidente mencionado no número anterior, a entidade demandada veio, ao abrigo do disposto no art. 128.º, n.º 6 do CPTA, pronunciar-se sobre o mesmo, defendendo a sua recusa liminar dado tratar-se de “pretensão manifestamente ilegal” visto o “CPTA não admitir a declaração de ineficácia de normas legais” ou, caso assim se não entenda, o seu indeferimento, “por não se verificarem quaisquer os vícios que pudessem assacar-se à resolução fundamentada, designadamente o de deficiente fundamentação” [cfr. fls. 473/500].

1.8. Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1.

    DE FACTO Com interesse para a decisão a proferir, considera-se como assente o seguinte quadro factual: I) No Diário da República, Iª Série, n.º 69, de 08.04.2014, foi publicada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida, donde se extrai, nomeadamente, o seguinte: “O Governo aprovou, através do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, o processo de reprivatização do capital social da participação detida pela AdP - Águas de Portugal, SGPS, S.A., no capital da B…………, S.A. (B…………).

    O referido diploma determinou que o processo de reprivatização se faria através de um concurso público, a realizar nos termos previstos na Lei n.º 11/90 (…) e do referido decreto-lei, e ao qual não se aplica o disposto no Código dos Contratos Públicos.

    O caderno de encargos que agora se aprova regula o referido concurso público de modo a assegurar todas as garantias de transparência, igualdade e concorrência que caracterizam um procedimento desta natureza, e a permitir ao Governo a escolha da proposta que melhor se conforme com os objetivos da reprivatização, assegurando -se que o adquirente da B............ estará dotado dos requisitos de idoneidade, e capacidade financeira e técnica indispensáveis à sua gestão, assegurando a qualidade do serviço público prestado às populações.

    (…) O Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, concedeu, no âmbito do processo de reprivatização, direito aos municípios de alienação das participações sociais por eles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a B............ é acionista, alienação essa sujeita ao exercício de direito de preferência por parte de municípios que detenham participações no capital da mesma entidade gestora e que tenham decidido não alienar as respetivas ações. Mais estabeleceu que tais direitos seriam exercidos nos termos e condições, designadamente de prazo e de preço, a fixar no caderno de encargos, pelo que se vem agora proceder a essa regulamentação.

    Fixa-se em 5% do capital social da B............ o montante das ações que são reservadas para aquisição pelos trabalhadores da B............, direito esse previsto no artigo 12.º do referido decreto-lei, em linha com o estabelecido na Lei n.º 11/90 (…).

    (…) Assim: Nos termos do n.º 1 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, e das alíneas c) e g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve: 1 - Determinar que são alienadas 100% das ações da B…………, S.A. (B............) e que o concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, tenha por objeto ações representativas de 95 % do capital social da B.............

    2 - Aprovar o caderno de encargos do concurso público, constante do anexo I à presente resolução, da qual faz parte integrante, no qual se estabelecem os termos e condições específicos a que obedece o concurso público previsto no número anterior.

    3 - Aprovar os termos do exercício pelos municípios da opção de alienação das participações sociais por aqueles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a B............ é acionista, bem como do exercício do direito de preferência pelos restantes municípios da mesma entidade gestora, relativamente à referida alienação, os quais constam do caderno de encargos a que se refere o número anterior.

    4 - Determinar a abertura do concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014 (….) através do envio para publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia e no Diário da República.

    5 - Aprovar, no anexo II à presente resolução, da qual faz parte integrante, algumas condições da oferta pública de venda de ações da B............, dirigida exclusivamente a trabalhadores da B............, no âmbito da qual os referidos trabalhadores podem adquirir ações representativas de 5% do capital social da B.............

    6 - Determinar que as ações que não sejam vendidas a trabalhadores, assim como aquelas cuja transmissão não se concretize, acrescem automaticamente às ações a adquirir pelo vencedor do concurso público, obrigando-se este a adquirir tais ações pelo preço por ação constante da sua proposta vinculativa.

    7 - Determinar que ao abrigo do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 45/2014 (…) compete à Ministra de Estado e das Finanças, com faculdade de subdelegação no Secretário de Estado das Finanças, aprovar o convite e todos os aspetos que, nos termos do caderno de encargos, devam ser fixados no mesmo.

    8 - Constituir uma comissão especial nos termos do artigo 20.º da Lei n.º 11/90, (…), a qual é composta por três membros a nomear por despacho do Primeiro -Ministro.

    9 - Determinar que, nos termos do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 45/2014 (…), o Governo, através da PARPÚBLICA, coloca à disposição do Tribunal de Contas toda a documentação que integra o processo de venda, incluindo os pareceres e relatórios previstos na lei que regula estes processos.

    10 - Determinar que a presente resolução entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação”; II) No Diário da República, IIª Série, n.º 71, de 10.04.2014, foi publicado o Anúncio de Procedimento n.º 1988/2014 relativo ao “Concurso público para a reprivatização da B…………, SA” e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; III) O presente processo cautelar deu entrada em juízo no dia 19.05.2014 [cfr. fls...

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