Acórdão nº 075/18.6BCLSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução21 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A……… - Futebol, SAD (A……..), instaurou no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), ao abrigo do disposto no artigo 4.º, n.

os 1 e 3, al. a), da Lei n.º 74/2013, de 06.09 (na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 33/2014, de 16.06) contra a Federação Portuguesa de Futebol (FCF) recurso de impugnação do acórdão do Conselho de Disciplina da FPF/Secção Profissional, de 27.03.18, que, em sede de recurso hierárquico, manteve a sanção disciplinar de multa no montante de € 6.078,00 pela prática dos ilícitos previstos e punidos pelo art. 127.º, n.º 1, e 187.º, n.º 1, als. a) e b), do Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional de 2017 (RDLPFP/17).

O TAD, por acórdão de 18.07.2018, julgou improcedente o recurso e manteve a decisão recorrida, condenando o A…….., SAD, nas custas que, tendo em conta o valor da causa considerado (€ 6.078,00), foram fixadas em 4.150,00 €, valor a que acresce IVA à taxa legal, perfazendo o montante de € 5.104,50.

Inconformado, o A…….., SAD, interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS). Por decisão singular do relator, de 21.09.18, foi concedido parcial provimento ao recurso e revogado o acórdão do TAD na parte recorrida, anulando-se os actos disciplinares impugnados.

Inconformada com esta decisão, a FPF reclamou para a conferência da decisão singular do relator, a qual, por acórdão de 18.10.18, desatendeu a reclamação e confirmou a decisão reclamada. É desta última decisão que agora se recorre para este Supremo Tribunal.

  1. A FPF, ora recorrente, apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (cfr. fls. ….): “1. A Recorrente vem interpor recurso de revista para o STA do Acórdão proferido pelo TCA Sul em 18 de outubro de 2018, que revogou o acórdão arbitral proferido pelo Tribunal Arbitral do Desporto. Esta instância, por seu turno, havia decidido confirmar a decisão de aplicação à ora Recorrida de multas por comportamento incorreto do público, punidas através dos artigos 127.º e 187.º do RD da LPFP; 2. A questão em apreço diz respeito à responsabilização dos clubes pelos comportamentos incorretos dos seus adeptos por ocasião de jogos de futebol, o que, para além de levantar questões jurídicas complexas, tem assinalável importância social uma vez que, infelizmente, os episódios de violência em recintos desportivos têm sido uma constante nos últimos anos em Portugal e o sentimento de impunidade dos clubes dado por decisões como aquela de que agora se recorre nada ajudam para combater este fenómeno; 3. O Acórdão proferido, salvo o devido respeito, carece de fundamentação pois limita-se a remeter a sua fundamentação para outro Acórdão que por sua vez remete para um parecer do Ministério Público – que se considera inadmissível – e, por sua vez, tal parecer do Ministério Público remete para os argumentos apresentados pela ora Recorrida, o que equivale a falta de fundamentação; 4. A questão essencial trazida ao crivo deste STA – responsabilização dos clubes pelos comportamentos incorretos dos seus adeptos – revela uma especial relevância jurídica e social e sem dúvida que a decisão a proferir é necessária para uma melhor aplicação do direito; 5. Assume especial relevância social a forma como a comunidade olha para o crescente fenómeno de violência generalizada no futebol – seja a violência física, seja a violência verbal, seja perpetrada por adeptos, seja perpetrada pelos próprios dirigentes dos clubes; 6. Em causa nos presentes autos estão, essencialmente, comportamentos dos adeptos relacionados com o rebentamento de engenhos pirotécnicos (v. g. petardos, potes de fumo, etc.) por ocasião de jogos de futebol. Ora, como é sabido, para além de serem objetos proibidos, por lei, a entrarem em recintos desportivos, tais engenhos têm a potencialidade de ferirem gravemente os seus utilizadores e os que os rodeiam; 7. São deveres dos clubes assegurar que tais objetos não entram nos estádios de futebol e que os seus adeptos não tenham comportamentos incorretos, o que decorre dos regulamentos federativos, é certo, mas também da lei e da Constituição; 8. Admitir, como fez o TCA Sul, que os clubes devem ser desresponsabilizados pelos comportamentos dos seus adeptos – ao arrepio do entendimento de toda a comunidade desportiva e das instâncias internacionais do Futebol, onde esta questão, de tão clara e evidente que é, nem sequer oferece discussão – é fomentar este tipo de comportamentos o que se afigura gravíssimo do ponto de vista da repercussão social que este sentimento de impunidade pode originar; 9. Esta questão tem conhecido posições contraditórias por parte do TAD, sendo que em treze processos arbitrais a questão foi decidida de forma contrária à que fez o Tribunal a quo. Com efeito, não se ignora que a questão é complexa do ponto de vista jurídico e implica um profundo conhecimento das especificidades da realidade e do direito desportivo, o que, salvo o devido respeito, parece ter falhado ao Tribunal a quo; 10. A questão em apreço é suscetível de ser repetida num número indeterminado de casos futuros, porquanto desde o início de 2017 até à presente data deram entrada no Tribunal Arbitral do Desporto mais de 50 processos relativos a sanções aplicadas à ora Recorrida por comportamento incorreto dos seus adeptos; 11. Tais números não só demonstram de forma incontestável que a Recorrida nada tem feito ao nível da intervenção junto dos seus adeptos para que não tenham comportamentos incorretos nos estádios, como demonstram que a Recorrida tem traçado um “plano de ataque” que não verá um fim num futuro próximo; 12. É por demais evidente que o coletivo de juízes que proferiu o Acórdão não analisou devidamente o processo. Aliás, o Tribunal limitou-se copiar integralmente decisão anteriormente proferida pelo TCA Sul – o que é usual – mas sem curar de que a parte que copia nem sequer traz nada de relevante para o julgamento da questão. Mais grave do que fazer o chamado copy paste é que essa decisão tirada no processo n.º 144/17.0BCLSB, entretanto revogada em sede de recurso de revista por este STA – havia remetido toda a sua fundamentação para o parecer que o Magistrado do Ministério Público havia elaborado nos autos; 13. No parecer apresentado pelo MP nos autos, não é minimamente indicado ou sugestionado qual o fundamento constante do CPTA (ou até da CRP, admita-se) que estará subjacente à emissão do mesmo, qual o interesse que o MP se encontra a proteger, quais os valores que estará a amparar com a sua vinda aos autos ou quais os direitos fundamentais que pretende com ela salvaguardar; 14. E essa era uma indicação (por incidental que fosse) indispensável à emissão do parecer a que fazemos referência – só assim se poderia entender como legítima a intervenção processual do MP; 15. Sendo ilegítima a intervenção do Ministério Público, é também ilegítima a apropriação dos seus fundamentos por parte dos juízes do TCA Sul; 16. Ora, no final deste jogo de remissões, acaba por não ser apreensível qual a fundamentação do Acórdão recorrido para decidir como decide; 17. O artigo 154.º do CPC, aplicável por via do artigo 1.º do CPTA, sob a epígrafe “dever de fundamentar a decisão”, diz-nos que “1. As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas.” e o n.º 2 que “2. A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade”: 18. Não se trata de despacho interlocutório, pelo que a fundamentação do Acórdão não podia limitar-se a uma remissão para um parecer do MP (ainda para mais, inadmissível) que por sua vez remete e adere aos argumentos apresentados pela ora Recorrida A………. - Futebol SAD. Tal é expressamente vedado pelo n.º 2 do artigo 154.º do CPC; 19. O próprio sentido do n.º 5 do artigo 94.º do CPTA é este, assim como o do n.º 5 do 663.º do CPC; a remissão apenas pode operar para uma decisão procedente, de que se junte cópia, e nunca para um parecer do MP, muito menos para a peça processual de defesa apresentada por uma das partes. Também neste sentido, veja-se o Acórdão do TCA Sul, de 25.06.2015; 20. A Recorrente fica sem saber, afinal, quais os fundamentos determinantes para que o Tribunal a quo tivesse decidido pela improcedência do recurso apresentado; 21. Face ao exposto, o Acórdão de que se recorre é, desde logo, nulo por falta de fundamentação pelo que é imperioso que sobre esta matéria recaia, efetivamente, uma decisão; 22. Não existe nenhuma crítica a fazer à decisão proferida pelo TAD, ao contrário do que entendeu o TCA Sul; 23. Em suma, de acordo com o Relatório de Ocorrências – que, recorde-se, não foi colocado em causa pela A……… - Futebol SAD nos presentes autos nem sequer foi requerida prova para contrariar o seu conteúdo –, na bancada Sul do Estádio ……….., durante jogo contra B……….., os adeptos do A……… rebentaram petardos e entoaram cânticos ofensivos; 24. A Recorrida não colocou em momento algum em causa que estes factos aconteceram, colocou em causa, sim, que tenham sido adeptos do A………. os responsáveis pelos mesmos e que tenha qualquer responsabilidade sobre o comportamento levado a cabo por outras pessoas; 25. Tal como consta dos Relatórios de Jogo cujo teor se encontra a fls. … do processo arbitral, os Delegados da Liga são absolutamente claros ao afirmar que tais condutas foram perpetradas pelos adeptos do A………, sem deixar qualquer margem para dúvidas; 26. Com base nesta factualidade, o Conselho de Disciplina instaurou os competentes processos sumários à Recorrida. Nos termos do artigo 258.º, n.º 1 do RD da LPFP, o processo sumário é instaurado tendo por base o relatório da equipa de arbitragem, das forças...

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