Acórdão nº 0997/19.7BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Agosto de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução14 de Agosto de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional do despacho indeferimento liminar proferido no processo de reclamação judicial do acto do órgão da execução fiscal com o n.º 997/19.7BEBRG Recorrente: A………… Recorrida: Fazenda Pública 1. RELATÓRIO 1.1 O acima identificado Recorrente interpôs recurso jurisdicional para o Supremo Tribunal Administrativo do despacho por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, considerando verificado o erro na forma do processo e inviável a convolação para a forma processual adequada, lhe indeferiu liminarmente a reclamação que deduziu enquanto executado e ao abrigo do disposto no art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Viana do Castelo, que recusou extinguir a execução fiscal.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso, o Recorrente apresentou a motivação do recurso, com conclusões do seguinte teor: «1.ª Surge o presente recurso jurisdicional como forma de reacção contra a douta sentença de fls…, proferida pelo Tribunal Tributário (TAF) de Braga, que indeferiu liminarmente a reclamação deduzida pelo ora Recorrente ao abrigo do art. 276.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) com fundamento em erro na forma de processo.

  1. A douta sentença recorrida não faz uma correcta interpretação e aplicação da Lei e do Direito.

  2. O Recorrente pretende ver apreciadas neste recurso as seguintes questões: A) - Nulidades processuais (questão prévia); B) - Inexistência de erro na forma de processo.

  3. A douta sentença recorrida está inquinada pela violação do direito ao contraditório em dois momentos processuais diferentes, a saber: 1.º- Falta de notificação do reclamante e ora recorrente dos documentos juntos ao processo pelo órgão da execução fiscal, para que sobre eles se pudesse pronunciar, violando o disposto no art. 3.º, n.º 3 do CPC em conjugação com o disposto no art. 115.º, n.º 2 do CPPT, aplicável supletivamente nos presentes autos.

    1. - Falta de notificação das partes para se pronunciarem sobre o eventual erro na forma de processo e sua convolação, violando do disposto no art. 3.º, n.º 3 do CPC em conjugação com o disposto no art. 98.º, n.º 4 do CPPT.

  4. A douta decisão recorrida levou ao probatório os seguintes factos, entre outros: E) - “O reclamante apresentou requerimento no SF dirigido ao PEF a que se alude em… a pedir a extinção da execução com fundamento na nulidade de todo o processo” (Sic) H) - “Em data não concretamente apurada, mas antes de 24-05-2019 foi levantada a penhora da pensão do aqui reclamante”(Sic) 6.ª O Recorrente não juntou à PI o requerimento referido na alínea E) do probatório, acima referida.

  5. O Recorrente também desconhece o documento referido na alínea H) do probatório, acima referida.

  6. Ocorre assim falta de notificação que viola o direito do Reclamante ao contraditório, o que consubstancia uma nulidade processual, nos termos do art. 195.º do CPC, porque pode ter influência na decisão final, que só chegou ao conhecimento do recorrente com a notificação da douta sentença recorrida.

  7. Por outro lado, a douta decisão recorrida constitui uma decisão-surpresa para as partes, visto que não foram ouvidas previamente sobre o eventual erro na forma de processo, bem como da eventual convolação, como seria mister, em cumprimento do art. 3.º, n.º 3 do CPC em conjugação com o disposto no art. 98.º, n.º 4 do CPPT.

  8. Estamos, assim, perante mais uma violação do direito ao contraditório, o que consubstancia uma nulidade processual, nos termos do art. 195.º do CPC, porque pode ter influência na decisão final, que só chegou ao conhecimento do recorrente com a notificação da douta sentença recorrida.

  9. A arguição destas nulidades processuais pode e deve ser feita no recurso interposto da decisão e respectivas alegações, como vem sendo uniforme e reiteradamente assente pela jurisprudência dos tribunais superiores.

  10. O tribunal a quo considerou que o meio contencioso utilizado pelo Reclamante e ora recorrente (reclamação de actos do órgão da execução fiscal) configura erro na forma de processo, levando ao indeferimento liminar da petição inicial, estribando-se nos argumentos seguintes: - a) […] Sucede que a reclamação (…) formulada no curso da execução pendente tem por objecto determinado acto nela praticado pelo órgão da execução e por finalidade a apreciação da validade desse acto e não a extinção da execução fiscal, que constitui objecto da oposição (…) (Sic) - b) Em face do exposto, resulta manifesto que a presente reclamação se encontra desprovida de objecto, por inexistência de qualquer “despacho reclamável”(…) (Sic) - c) A isto acresce que o reclamante deveria ter deduzido oposição à execução fiscal quando foi citado (…) (Sic) - d) […] o pedido que formula nesta acção é compatível com a oposição e já a argumentação/causa de pedir é enquadrável em sede de impugnação judicial (Sic) - e) O erro na forma de processo afere-se pelo pedido ou pretensão que o autor pretende obter (…) (Sic) - f) No caso dos autos, o pedido formulado em juízo, tal como sintetizado supra, é a extinção da execução fiscal (…) (Sic) 13.ª De acordo com a argumentação do tribunal a quo [alíneas a) e b)] acima referidas, a reclamação prevista no art. 276.º do CPPT destina-se apenas a atacar judicialmente actos expressos do órgão da execução fiscal.

  11. De acordo com a opinião sustentada de SOUSA, Jorge Lopes de, in CPPT Anotado e Comentado, 6.ª Ed, Áreas Editora (2011), Vol. IV, p. 271, este meio de contencioso tributário também se aplica aos casos de omissão ou inércia do órgão da execução fiscal, porque isso resulta do princípio da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrado [cfr art. 20.º e art. 268.º, n.º 4 da Lei Fundamental].

  12. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida acaba por negar ao Reclamante e ora recorrente uma pronúncia sobre aquela omissão, assim precludindo o direito do Reclamante à almejada tutela jurisdicional dos seus direitos e interesses legítimos, correndo o risco de ter de pagar uma dívida que não é da sua responsabilidade.

  13. É que, com esta decisão o tribunal a quo veda ao Reclamante o direito de ver extinta uma execução indevidamente instaurada contra si, uma vez que não antevê outra forma de obter esse resultado.

  14. A dívida de IRS proveniente da venda do imóvel é da responsabilidade da massa insolvente, como manda o art. 51.º, n.º 1 – alínea c) do CIRE.

  15. A PI deduzida pelo reclamante e ora Recorrente deve ser admitida, tendo por objecto o indeferimento tácito do pedido dirigido ao órgão da execução fiscal.

  16. No que respeita ao argumento invocado na douta sentença recorrida [alíneas c) e d)] acima referidas, verifica-se que, salvo o devido respeito, o tribunal a quo não está a raciocinar correctamente.

  17. Na verdade, o Recorrente e então executado não se opôs à execução porquanto, ao tempo, não possuía bens, razão pela qual não tinha interesse em agir.

  18. Portanto, o recorrente apenas tem interesse em agir no que toca à extinção da execução.

  19. Não tendo deduzido oportunamente oposição à execução, nada impede que invoque agora a nulidade do processo executivo, porquanto a nulidade é invocável a todo o tempo, como decorre do art. 102.º, n.º 3 do CPPT aqui aplicável.

  20. Sendo o que aconteceu quando o Recorrente decidiu arguir junto do OEF, a nulidade do processo executivo com a consequente extinção da execução, embora sem sucesso.

  21. Conclui-se, portanto, que não ocorre erro na forma de processo, não existindo, neste momento, outro meio contencioso que permita ao Recorrente o mesmo efeito jurídico.

  22. No que concerne ao argumento invocado na douta sentença recorrida conforme alíneas e) e f), acima referidas, constata-se que o tribunal a quo foi demasiado exigente no que toca à interpretação do pedido e da causa de pedir formulados na PI, prejudicando, desse modo, os princípios da tutela jurisdicional efectiva e do princípio pro actione.

  23. Seguindo de perto a doutrina que emerge do Ac. do STA de 03.05.2017 – Proc. n.º 0777/16, proferido sobre questão idêntica, disponível em www.dgsi.pt, apresenta-se o seguinte excerto, na parte que importa aqui considerar: IV - “Deve, pois, proceder-se a uma interpretação dos pedidos e causas de pedir formulados orientada pela exigência constitucional da outorga de tutela jurisdicional efectiva que nos permita concluir de tudo quanto o recorrente diz no processo qual é a pretensão que formula em juízo”.(Sic) V - O Tribunal deverá sempre colocar com clareza a questão ao impugnante dizendo-lhe o que entende que é incompatível (…) (Sic) 27.ª Deveria o Recorrente ter requerido o reconhecimento da nulidade de todo o processo, com a consequente extinção da execução fiscal, sendo certo que do ponto de vista linguístico e prático é tudo uma questão de semântica (interpretação).

  24. Tanto faz pedir a extinção da execução com fundamento na nulidade de todo o processo, como pedir o reconhecimento da nulidade de todo o processo com a consequente extinção da execução.

  25. Com efeito, uma vez reconhecida a nulidade de todo o processo a extinção da execução será uma consequência automática e inexorável de tal reconhecimento, não carecendo, sequer, de ser requerida.

  26. Deste modo, o tribunal a quo deveria ter dirigido convite ao reclamante para aperfeiçoar o pedido.

  27. Seria uma forma de dar efectividade prática ao princípio pro actione e uma forma de não inviabilizar o princípio da tutela jurisdicional efectiva, princípios enformadores de todo o sistema de contencioso administrativo e fiscal.

  28. A douta sentença recorrida viola os artigos 3.º, n.º 3 e 195.º do CPC; 98.º, n.º 4 e 115.º, n.º 2 do CPPT; 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP».

    1.3 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo e a Fazenda Pública não apresentou contra-alegações, apesar de notificada para tanto.

    1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto...

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