Acórdão nº 02030/15.9BEPNF 0702/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução03 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO O Município de Santo Tirso e o Agrupamento de Empresas CIA, formado por Rede Ambiente - Engenharia de Serviços, SA, e Ecorede - Engenharia e Serviços, Ld., interpuseram, na Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, distintos recursos de revista do acórdão do TCA Norte confirmativo da sentença em que o TAF de Penafiel, na acção de contencioso pré-contratual deduzida pelo Agrupamento constituído por Ferrovial Serviços, SA, e por Naturgreen, SA, contra aquele município e vários contra-interessados.

A sentença do TAF de Penafiel decidira em 08.11.2018, o seguinte: i) anular o acto de adjudicação praticado no âmbito do concurso para “a prestação de serviços de recolha de resíduos urbanos e limpeza urbana do concelho de Santo Tirso”; condenar a entidade demanda a solicitar, nos termos do disposto no art. 71º, nº 3 do CCP, esclarecimentos e elementos adicionais à CIA sobre o preço anormalmente baixo; iii) condenar esta Entidade a elaborar um novo relatório de avaliação das propostas que não reincidisse nas ilegalidades julgadas verificadas; iv) condenar a Entidade demandada a praticar novo acto de adjudicação expurgado de tais ilegalidades, prosseguindo o concurso até final, com as legais consequências; v) anular o contrato celebrado.

O Município de Santo Tirso, tendo sido notificado do Acórdão proferido em segunda instância, e com o mesmo não se conformando, veio interpor Recurso de Revista nos termos do art. 150º do CPTA, apresentando alegações com o seguinte quadro conclusivo: Questão prévia: Incumprimento pelo TCAN do acórdão do STA de 06/12/2018: i. O douto acórdão ora recorrido surgiu em consequência de um outro do STA que decidiu o seguinte: “O TCAN poderá ter em consideração a questão do «caso julgado» autonomamente suscitada pelo Município de Santo Tirso” ii. Perante isto, o TCAN, no último parágrafo da penúltima página (154) do douto acórdão ora recorrido respondeu o seguinte: “Está-nos, assim, legalmente vedado apreciar a questão do caso julgado — formado no processo n° 267/17- esta matéria não foi suscitada nos textos das alegações ou nas conclusões das apelações dirigidas a este TCAN, mas tão só numa “comunicação autónoma”, dirigida aos Senhores Conselheiros do STA; somos, pois, absolutamente incompetentes para a enfrentar”.

iii. O STA, quando escreveu que “o TCAN poderá ter em consideração a questão do «caso julgado» autonomamente suscitada pelo MST”, decidiu que o TCAN tinha competência e estava obrigado a decidir a questão do caso julgado, pelo que, este não pode, porque é um tribunal hierarquicamente inferior, contrariar tal decisão, violando assim o disposto no artigo 212° da Constituição da República Portuguesa.

iv. Pelo que, o TCAN incumpriu ostensivamente o acórdão de STA, impondo-se, sem mais, a revogação do acórdão ora recorrido e a baixa dos autos para apreciação da questão do «caso julgado», ou, dado tratar-se de uma exceção de conhecimento oficioso, ser decidida pelo presente STA, o que aqui expressamente se requer Da admissibilidade do Recurso de Revista v. É o próprio TCAN, na parte final no seu douto acórdão, que reconhece o “labor jurídico das alegações dos Recorrentes”, ou seja, de certa maneira, o próprio TCAN reconhece a necessidade da presente revista para uma melhor aplicação do direito.

vi. Por outro lado, o presente processo já foi objeto de dois recursos de revista para o STA, sendo este o terceiro, o que por si só demonstra a relevância jurídica e social das questões em causa e consequente necessidade de admissão do presente recurso para melhor aplicação do direito.

vii. As questões colocadas, principalmente, a questão sobre a existência de caso julgado, revela-se jurídica e socialmente relevante, sob pena de existirem decisões contraditórias, colocando em causa a unidade do sistema jurídico e a confiança nas decisões.

viii. Além disso, as questões estão relacionadas com os poderes legais da entidade adjudicante na valoração das propostas e na reserva da discricionariedade técnica do júri, na apreciação das justificações do PAB e na apreciação e avaliação das propostas.

ix De igual de modo, importa saber se a periodicidade, circuitos e os horários do serviço de limpeza urbana são condições de execução do contrato predefinidas no CE e impostas aos concorrentes ou se são aspetos da execução do contrato submetido à concorrência (atributos), em particular, saber se o douto acórdão do TCAN proferido nos autos n° 2037/15.6BEPNF tem força de caso julgado.

x. E, quanto ao afastamento do efeito anulatório, a questão de saber em que termos deve ser aplicado, quando o contrato está a ser executado há quase quatro anos e a autora perdeu o interesse direto e pessoal na ação, é de relevante importância jurídica e que pode surgir em múltiplos casos. Em particular saber se o acórdão proferido pelo STA nos autos n° 2037/15.6BEPNF, em relação a esta matéria, tem força de caso julgado.

Posto isto: xi. As questões acima enunciadas versam sobre aspetos revelantes dos procedimentos da contratação pública, com forte probabilidade de replicação, tratando-se de questões em que a solução jurídica pode servir de referência para as decisões dos tribunais e de orientação para a administração e para os particulares no âmbito da contratação pública.

xii. Importa ainda realçar a relevância social da causa advinda das consequências económicas e financeiras e indiretas para os concorrentes, população e trabalhadores da CIA e pelos significativos valores que estão em causa.

xiii. Em face de todo o exposto, por estarem preenchidos os pressupostos para tal, deve o presente Recurso de Revista ser admitido e, em consequência, conhecido o seu mérito.

Do fundo das questões: Da desnecessidade de esclarecimentos adicionais quanto à justificação do preço anormalmente baixo” xiv. A primeira e segunda instância fizeram errada interpretação do disposto no artigo 71° do CCP, dado que este deve ser interpretado no sentido que as dúvidas têm de ser do júri e não do Tribunal e consequentemente a apreciação do júri é insindicável pelo Tribunal, a não ser em caso de erro grosseiro, crasso ou palmar, o que não é seguramente o caso dos autos.

xv. Fizeram ainda errada interpretação do conceito de preço anormalmente baixo, dado que, ao apreciarem as razões justificavas do PAB, não consideraram o preço globalmente proposto; a diferença irrisória em relação ao limiar do PAB, e bem como não tiveram em consideração que o preço base do concurso, atendendo ao valor médio das propostas apresentadas, foi muito alto.

xvi. O preço globalmente proposto pela CIA ficou apenas € 22.905,32 abaixo do limiar do PAB, o que corresponde apenas a 0,29% do preço base, o que é irrelevante em mais de OITO MILHÕES DE EUROS, pelo que, é manifesta a desnecessidade de abertura de um sub-procedimento para pedir esclarecimentos ou elementos adicionais ao CIA, pois que, o preço apresentado não pode ser considerado como anormalmente baixo.

xvii. Fez, pois, o TCAN errada interpretação do conceito de Preço anormalmente baixo (artigo 71º do CCP) e das razões justificativas apresentadas.

xviii. Tal norma deve ser interpretada no sentido de que o júri goza de ampla discricionariedade quanto à aferição da razoabilidade e pertinência dos esclarecimentos prestados, desde que respeite os princípios a que se subordina a contratação pública, nomeadamente, proporcionalidade, justiça, razoabilidade e concorrência, o que foi seguramente o caso.

Errada interpretação das peças procedimentais / violação do caso julgado xix. O acórdão ora recorrido pronunciou-se no sentido de que a periocidade, circuito e horários constituem aspetos da execução do contrato, submetidos à concorrência pelo Cadernos de Encargos.

xx. Sucede que, paralelamente, aos presentes autos, correu termos os autos nº 2037/15.6BEPNF, intentado por outro concorrente, a SUMA, onde por douto acórdão do TCAN de 30/11/2016, já junto aos autos com as anteriores alegações para este tribunal, foi decidido, de forma definitiva, que a periodicidade, circuitos e horários da limpeza urbana são condições de execução do contrato predefinidas no Caderno de Encargos e assim impostas aos concorrentes e, por isso, suscetíveis de serem adotadas, por remissão ou transcrição, pelas concorrentes nas suas propostas.

xxi. Esta decisão constitui caso julgado material em relação aos presentes autos, pois que, as partes são as mesmas e há identidade de objeto.

xxii. Assim sendo, o acórdão recorrido, nessa parte, violou o caso julgado formado nos autos nº 2037/15.6BEPNF.

Errada interpretarão do conceito e âmbito de plano de trabalhos previsto na cláusula 13 do CE / Inexistência de erro na avaliação: xxiii. Conforme resulta da transcrição / colagem acima feita da cláusula 13 do CE e constante do ponto F) da matéria assente, o plano de trabalhos é composto por seis sub-planos.

xxiv. O TCAN reduziu o plano de trabalhos ao sub-plano de limpeza urbana, o que é manifestamente errado, pois que não teve em consideração a composição do plano de trabalhos, tendo confundido o TODO (plano de trabalhos) com a PARTE (sub-plano de limpeza urbana) e ainda com a sub-parte (sub-planos de varredura e de lavagem).

xxv. Não se pode “pegar”, como fez a primeira instância e o TCAN, numa ínfima parte (varredura e lavagem) de um sub-plano (limpeza urbana), para concluir que houve erro grosseiro na avaliação do TODO.

Assim sendo, xxvi. O TCAN fez errada interpretação da cláusula 13 do CE e acima transcrita, não havendo qualquer erro na avaliação, se mais não fosse, porque a Periodicidade (frequência), “Circuitos” e “Horários” do Serviço de Limpeza Urbana constituem condições de execução do contrato predefinidas no Caderno de encargos e assim impostas aos concorrentes, compatíveis, por isso, com a repetição nas propostas de tais condições, ou seja, não são atributos valorados autonomamente.

DA VIOLAÇÃO DA RESERVA DE...

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