Acórdão nº 01532/12.3BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução05 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    A…………, B…………, e C………… - identificados os autos - interpõem «recurso de revista» do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte [TCAN], de 28.06.2018, que concedendo provimento ao «recurso de apelação» do réu, INSTITUTO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I.P.

    [IEFP], revogou a sentença que tinha sido proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga [TAF] e absolveu este último da instância.

    Culminam assim as suas alegações de revista: 1- Vem pedida revista do acórdão do TCAN que concedeu provimento à apelação, revogou a sentença proferida pelo TAF e absolveu da instância o recorrido, por considerar verificar-se um «erro na forma do processo» insusceptível de convolação para a forma adequada, por ocorrer, nesse caso, a caducidade do direito de acção; 2- O douto acórdão recorrido colocou termo ao processo sem se pronunciar sobre o mérito da causa; 3- A admissão deste recurso é essencial à correcta aplicação do direito adjectivo, mormente do estatuído nos artigos 31º, nº2, 32, nº7, 142º, nº1, e 145º, nº2 alínea a), do CPTA, 6º, nº3, do ETAF e 44º da Lei nº62/2013, de 26.08; 4- Efectivamente, estando em causa uma «coligação de autores» com pedidos individualizados, que ficam aquém do valor da alçada da 1ª instância, o TCAN deveria ter indeferido a apelação, não conhecendo do objecto do recurso, pelo que, salvo o devido respeito, ao decidir em sentido diverso incorreu em «erro grosseiro na aplicação do direito», violando as referidas normas, em dissonância com jurisprudência desse - AC TCAN de 09.10.2015, processo nº291/12.4BEPNF; 5- A apreciação da revista é ainda essencial à correcta aplicação do artigo 58º, nº4, do CPTA [redacção aplicável ao tempo], porquanto, salvo o devido respeito por opinião diversa, que é muito, o douto acórdão recorrido errou, grosseiramente, ao conhecer da caducidade do direito de acção como obstáculo à convolação da acção administrativa comum em acção administrativa especial, desconsiderando que a acção foi proposta muito antes de expirar o prazo de um ano «a contar da notificação da deliberação» que a mesma entende ter a natureza de acto administrativo, e, ainda, violando o princípio do contraditório, visto que, nos articulados [réplica, no caso], os agora recorrentes alegaram factos demonstrativos da desculpabilização do atraso, e requereram, para tanto, a produção de prova; 6- Por outro lado, a admissão deste recurso é essencial à apreciação de «três questões» que se revestem de importância fundamental, pela sua relevância jurídica e social; 7- Em primeiro lugar, está em causa a apreciação da noção de acto administrativo, porquanto o acórdão recorrido qualifica assim a deliberação do réu, de 30.12.2011 - exarada na Informação de Serviço nº1086/0E-PE/2011, de 28.12.2011 - do que os recorrentes discordam por entenderem que essa deliberação - que não foi precedida da audiência prévia dos recorrentes, em violação do disposto nos artigos 266º, nº2, e 267º da CRP e nos artigos 3º e 100º do CPA, nem fez menção aos meios e prazos de que estes dispunham para a respectiva impugnação, violando, também, o artigo 68º do CPA - não é um verdadeiro acto administrativo, uma vez que o recorrido, no caso, se apresenta despido do seu ius imperii, encorpando vestes comuns a qualquer empregador, público ou privado, e portanto, não dispunha de poderes para definir unilateral e vinculativamente a pretensão dos recorrentes, mediante acto administrativo, a sua posição e a do respectivo co-contratante, nem estes o chamaram a pronunciar-se sobre a pretensão ora formulada, ou seja, a decidir sobre o reconhecimento [deferimento da pretensão] ou a negar [indeferimento da pretensão] o direito à compensação que reclamam através desta acção, que configura um dever de prestar que directamente decorre de normas jurídico-administrativas; 8- Em segundo lugar, está em causa a distinção do campo de aplicação das formas de processo - comum e especial - de quadro normativo ambíguo, que se conclui, nomeadamente pelo diferente tratamento doutrinário e jurisprudencial dado às questões jurídicas ora suscitadas - em sentido diverso do da decisão recorrida, entre outros, AC TCAS, de 25.01.2007, processo nº02010/06; 9- Por último, está em crise a «decisão de mérito sobre o direito à compensação», extensível a 214 técnicos superiores [1º escalão], a quem o recorrido comunicou a caducidade dos respectivos contratos de trabalho [deliberação do Conselho Directivo do recorrido de 25.10.2011, exarada na Informação nº866/0E-PE/2011, de 13.10.2011], e que, em casos coincidentes, foram julgados procedentes, com condenação do ora recorrido a pagar as compensações devidas - sentenças transitadas em julgado nos seguintes autos: TAF Porto: 783/12.5BEPRT, 978/12.1BEPRT e 1070/12.4BEPRT; TAF Coimbra: 291/12.4BECBR; TAF Aveiro: 538/12.7BEAVR [esta última, proferida em acção comum, como a dos presentes autos]; 10- A apreciação de tais questões tem uma importância prática inequívoca, pois o esclarecimento intelectual da controversa aplicação das referidas normas, cuja interpretação não surge evidente, ultrapassa o mero interesse deste caso, atribuindo utilidade ou relevância jurídica à revista, que pode constituir um paradigma ou orientação para a apreciação de outros casos; 11- Os contornos do recurso têm, ainda, uma dimensão social, que lhe é conferida pela aptidão de se expandir ou repercutir perante um conjunto alargado de pessoas; 12- Termos em que deve ser admitido o presente recurso ordinário de revista.

    Posto isto, 13- O douto acórdão recorrido não fez uma correcta apreciação e aplicação dos pressupostos de admissibilidade da apelação; 14- Os três recorrentes coligaram-se voluntariamente para pedir a condenação do recorrido a pagar, individualmente, a quantia de 4.631,76€ a cada um deles; 15- Não obstante a soma desses pedidos individuais ascender a 13.895,98€ [4.631,76€x3] - quantia em que se fixou o valor da acção - a coligação não determina a perda da individualidade das acções de cada um dos autores, ora recorrentes, a que corresponde o valor da utilidade que cada uma retira do processo, ou seja, 4.631,76€; 16- Estando em causa coligação de autores, apesar do valor da acção corresponder à soma de todos os seus pedidos, «para efeitos de recurso» atende-se ao valor de cada pedido, não à sua globalidade; 17- Conforme estipula o artigo 142º, nº1, do CPTA, «O recurso das decisões que, em primeiro grau de jurisdição, tenham conhecido do mérito da causa é admitido nos processos de valor superior à alçada do tribunal do qual se recorre»; 18- No caso, o valor de cada pedido não ultrapassa o valor da alçada do tribunal de primeira instância, pelo que a apelação não é legalmente admissível; 19- Pelo exposto, o acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 641º, nºs 1 e 5, 652º, nº2, alínea b), 653º a 655º, todos do CPC - ex vi do disposto nos artigos 1º e 140º do CPTA - 27º, 31º, nº2, 32, nº7, 142º, nº1, e 145º, nº2 alínea a), do CPTA, 6º, nº3, do ETAF e 44º da Lei nº62/2013, de 26.08; 20- Deverá, por isso, ser revogado e substituído por outro que declare não tomar conhecimento da apelação, por inadmissibilidade legal do recurso, mantendo-se a sentença de 1ª instância, com a rectificação do erro material no cálculo da compensação; Subsidiariamente, mas sem prescindir: 21- A «forma de processo» determina-se em função do tipo de pretensão deduzida em juízo pelo autor, equivalente ao efeito jurídico, finalidade ou resultado que ele visa alcançar, e deve ser entendida como um pedido, enraizado numa causa de pedir, que constitui vinculação temática para o tribunal; 22- No confronto do pedido feito pelo autor com o fim a que, segundo a lei, o seu processo, se destina, havendo coincidência [entre o fim concretamente visado pelo autor e o fim abstractamente figurado pela lei] o processo é próprio; 23- Os recorrentes apresentaram a presente acção administrativa comum, na qual formularam o pedido de condenação do réu a pagar a cada um deles uma compensação, que enraizaram na cessação, por «caducidade», dos seus contratos de trabalho em funções públicas, que integra a respectiva causa de pedir; 24- Segundo o nº1 do artigo 37º do CPTA, seguem a forma da acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que, nem neste Código nem em legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial, exemplificando nas diversas alíneas do nº2 vários processos que seguem aquela forma, entre eles, aqueles que tenham por objecto a condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar que directamente decorram de normas jurídico-administrativas e não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável, ou que tenham sido constituídos por actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo, e que podem ter por objecto o pagamento de uma quantia, a entrega de uma coisa ou a prestação de um facto [alínea e]; 25- Por seu turno, diz o artigo 46º, nº1, do CPTA que seguem a forma da acção administrativa especial […] os processos cujo objecto sejam pretensões emergentes da prática ou omissão ilegal de actos administrativos, bem como de normas que tenham ou devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo; 26- O campo de aplicação de cada uma destas formas de processo é estabelecido por referência aos diferentes tipos de pretensões que podem ser deduzidos em juízo, e a contraposição que o CPTA estabelece entre as formas da acção administrativa comum e especial assenta no critério de saber se o processo diz ou não respeito ao exercício de poderes de autoridade por parte da Administração; 27- Na circunstância, a presente acção visa a resolução de um litígio no qual a Administração se apresenta despida do ius imperii, encorpando vestes comuns a qualquer empregador, público ou privado; 28- Os recorrentes pedem o cumprimento de um dever obrigacional do recorrido, que decorre das...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT